Cinco Sentidos
Cinco sentidos são os cinco dedos
Com que o homem tacteia a escuridão,
Rodeado de sombras e segredos
De que busca, e não acha, a solução.Mas decerto haverá mundos mais ledos
Onde outros seres, de maior visão,
Rompendo brumas, dissipando medos,
A treva finalmente vencerão.E sendo sete as cores, e outros tantos
Os sons da escala, mas com mil matizes
Que prolongam seu eco e seus encantos,Talvez nos seja um dia transmitido,
Por esses mundos fortes e felizes,
Um novo sexto e sétimo sentido!
Sonetos sobre Seres
30 resultadosDemônios
A língua vil, ignívoma, purpúrea
Dos pecados mortais bava e braveja,
Com os seres impoluídos mercadeja,
Mordendo-os fundo injúria por injúria.É um grito infernal de atroz luxúria,
Dor de danados, dor do Caos que almeja
A toda alma serena que viceja,
Só fúria, fúria, fúria, fúria, fúria!São pecados mortais feitos hirsutos
Demônios maus que os venenosos frutos
Morderam com volúpia de quem ama…Vermes da Inveja, a lesma verde e oleosa,
Anões da Dor torcida e cancerosa,
Abortos de almas a sangrar na lama!
Soneto
(Oferecido e dedicado ao llmo. Sr. M. Bernardino A. Varela pelo autor.)
Vir bonus dicendi peritus laudandum est.Senhor de nobre alma, tão
D’entre os sábios conhecido,
De pais excelsos nascido,
Aceitai a minha canção.Probo pai, bom cidadão,
Sois dos seres melhor ser
Por saber tão profundo ter,
Sois ilustre qual Catão.Recebei esta prova mesquinha
De penhor e de oração,
Produto da pena minha.Perdoai, mui digno varão,
Se na mente eu pobre tinha
Cometer-vos indiscrição.
Vida Obscura
Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro,
Ó ser humilde entre os humildes seres.
Embriagado, tonto dos prazeres,
O mundo para ti foi negro e duro.Atravessaste num silêncio escuro
A vida presa a trágicos deveres
E chegaste ao saber de altos saberes
Tornando-te mais simples e mais puro.NinguémTe viu o sentimento inquieto,
Magoado, oculto e aterrador, secreto,
Que o coração te apunhalou no mundo.Mas eu que sempre te segui os passos
Sei que cruz infernal prendeu-te os braços
E o teu suspiro como foi profundo!
Vê Minha Vida à Luz da Protecção
Vê minha vida à luz da protecção
que dás disposta a dar-se por amor
e quando a mãe te deu à luz com dor
o espírito adensou-se nela entãoo mesmo que em espigas pelo verão
a negra fronte bela foi compor
de inverno em voz amarga acusador
a cuja vista as lágrimas virãoMeu amor em teu corpo se cinzela
e dele os outros seres recebem vida
perante ti criança os que da feridasangram exposta ao mundo que flagela
A mim foste mais bálsamo porém
do que as curas balsâmicas que tem.Tradução de Vasco Graça Moura
Ser Poeta
Ser Poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim…
É condensar o mundo num só grito!E é amar-te, assim, perdidamente…
É seres alma e sangue e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda gente!
A Um Gérmen
Começaste a existir, geléia crua,
E hás de crescer, no teu silêncio, tanto
Que, é natural, ainda algum dia, o pranto
Das tuas concreções plásmicas flua!A água, em conjugação com a terra nua,
Vence o granito, deprimindo-o … O espanto
Convulsiona os espíritos, e, entanto,
Teu desenvolvimento continua!Antes, geléia humana, não progridas
E em retrogradações indefinidas,
Volvas à antiga inexistência calma!…Antes o Nada, oh! gérmen, que ainda haveres
De atingir, como o gérmen de outros seres,
Ao supremo infortúnio de ser alma!
Oceano Nox
Junto do mar, que erguia gravemente
A trágica voz rouca, enquanto o vento
Passava como o vôo do pensamento
Que busca e hesita, inquieto e intermitente,Junto do mar sentei-me tristemente,
Olhando o céu pesado e nevoento,
E interroguei, cismando, esse lamento
Que saía das coisas, vagamente…Que inquieto desejo vos tortura,
Seres elementares, força obscura?
Em volta de que idéia gravitais?Mas na imensa extensão, onde se esconde
O Inconsciente imortal, só me responde
Um bramido, um queixume, e nada mais…
Abrigo Celeste
Estrela triste a refletir na lama,
Raio de luz a cintilar na poeira,
Tens a graça sutil e feiticeira,
A doçura das curvas e da chama.Do teu olhar um fluido se derrama
De tão suave, cândida maneira
Que és a sagrada pomba alvissareira
Que para o Amor toda a minh’alma chama.Meu ser anseia por teu doce apoio,
Nos outros seres só encontra joio
Mas só no teu todo o divino trigo.Sou como um cego sem bordão de arrimo
Que do teu ser, tateando, me aproximo
Como de um céu de carinhoso abrigo.
Parece Que Nasceste, Oh! Pálida Divina
Parece que nasceste, oh! pálida divina,
Para seres o farol, a luz das puras almas!…
Parece que ao estridor, ao frêmito das palmas
Exalças-te feliz a plaga cristalina!…Parece que se partem, angélica Bambina,
As campas glaciais dos Tassos e dos Talmas,
Lá quando no tablado as turbas sempre calmas
Transmutas em vulcão, em raio que fulmina!…E quando majestosa, em lance sublimado
Dardejas do olhar, olímpico, sagrado
Mil chispas ideais, titânicas, ardentes!…Então sente-se n’alma o trêmulo nervoso
Que deve ter o mar, fantástico, espumoso
Nos grossos vagalhões, indômitos, frementes!!…