Sonetos sobre Sinos

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Sonetos de sinos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Lápide

(com tema de Virgílio, o Latino,
e de Lino Pedra-Azul, o Sertanejo)

Quando eu morrer, não soltem meu Cavalo
nas pedras do meu Pasto incendiado:
fustiguem-lhe seu Dorso alardeado,
com a Espora de ouro, até matá-lo.

Um dos meus filhos deve cavalgá-lo
numa Sela de couro esverdeado,
que arraste pelo Chão pedroso e pardo
chapas de Cobre, sinos e badalos.

Assim, com o Raio e o cobre percutido,
tropel de cascos, sangue do Castanho,
talvez se finja o som de Ouro fundido

que, em vão – Sangue insensato e vagabundo —
tentei forjar, no meu Cantar estranho,
à tez da minha Fera e ao Sol do Mundo!

Saudade

Aqui outrora retumbaram hinos;
Muito coche real nestas calçadas
E nestas praças, hoje abandonadas,
Rodou por entre os ouropéis mais finos…

Arcos de flores, fachos purpurinos,
Trons festivais, bandeiras desfraldadas,
Girândolas, clarins, atropeladas
Legiões de povo, bimbalhar de sinos…

Tudo passou! Mas dessas arcarias
Negras, e desses torreões medonhos,
Alguém se assenta sobre as lájeas frias;

E em torno os olhos úmidos, tristonhos,
Espraia, e chora, como Jeremias,
Sobre a Jerusalém de tantos sonhos!…

Insónia

Noite calada, como num lamento,
A voz das coisas ponho-me a escutar,
E ela vai, vai subindo ao Firmamento,
Num murmúrio constante, a soluçar.

Noites de Outono, como chora o vento…
Noites sem brilho, noites sem luar.
Noites de Outono, sois o meu tormento,
Tombam as folhas, ponho-me a cismar.

Noite morta. Lá fora a ventania
Passa rezando estranha litania,
Como sinos dobrando ao entardecer.

Vento que choras, dolorido canto,
Unge meus olhos, deixa-mos em pranto,
Para melhor assim adormecer.

A Minha Dor

A minha Dor é um convento ideal
Cheio de claustros, sombras, arcarias,
Aonde a pedra em convulsões sombrias
Tem linhas dum requinte escultural.

Os sinos têm dobres de agonias
Ao gemer, comovidos, o seu mal…
E todos têm sons de funeral
Ao bater horas, no correr dos dias…

A minha Dor é um convento. Há lírios
Dum roxo macerado de martírios,
Tão belos como nunca os viu alguém!

Nesse triste convento aonde eu moro,
Noites e dias rezo e grito e choro,
E ninguém ouve… ninguém vê… ninguém…

Neurastenia

Sinto hoje a alma cheia de tristeza!
Um sino dobra em mim Ave-Marias!
Lá fora, a chuva, brancas mãos esguias,
Faz na vidraça rendas de Veneza…

O vento desgrenhado chora e reza
Por alma dos que estão nas agonias!
E flocos de neve, aves brancas, frias,
Batem as asas pela Natureza…

Chuva…tenho tristeza! Mas porquê?!
Vento…tenho saudades! Mas de quê?!
Ó neve que destino triste o nosso!

Ó chuva! Ó vento! Ó neve! Que tortura!
Gritem ao mundo inteiro esta amargura,
Digam isto que sinto que eu não posso !!…

A Morte – O Sol Do Terrível

(com tema de Renato Carneiro Campos)

Mas eu enfrentarei o Sol divino,
o Olhar sagrado em que a Pantera arde.
Saberei porque a teia do Destino
não houve quem cortasse ou desatasse.

Não serei orgulhoso nem covarde,
que o sangue se rebela ao toque e ao Sino.
Verei feita em topázio a luz da Tarde,
pedra do Sono e cetro do Assassino.

Ela virá, Mulher, afiando as asas,
com os dentes de cristal, feitos de brasas,
e há de sagrar-me a vista o Gavião.

Mas sei, também, que só assim verei
a coroa da Chama e Deus, meu Rei,
assentado em seu trono do Sertão.

Noite Trágica

O pavor e a angústia andam dançando…
Um sino grita endechas de poentes…
Na meia-noite d´hoje, soluçando,
Que presságios sinistros e dolentes!…

Tenho medo da noite!… Padre nosso
Que estais no céu… O que minh´alma teme!
Tenho medo da noite!… Que alvoroço
Anda nesta alma enquanto o sino geme!

Jesus! Jesus, que noite imensa e triste!
A quanta dor a nossa dor resiste
Em noite assim que a própria dor parece…

Ó noite imensa, ó noite do Calvário,
Leva contigo envolto no sudário
Da tua dor a dor que me não ´squece!

Adeus, Adeus, Adeus!

Pareceu-me inda ouvir o nome dela
No badalar monótono dos sinos.
Hermeto Lima

Adeus, adeus, adeus! E, suspirando,
Saí deixando morta a minha amada,
Vinha o luar iluminando a estrada
E eu vinha pela estrada soluçando.

Perto, um ribeiro claro murmurando
Muito baixinho como quem chorava,
Parecia o ribeiro estar chorando
As lágrimas que eu triste gotejava.

Súbito ecoou do sino o som profundo!
Adeus! – eu disse. Para mim no mundo
Tudo acabou-se, apenas restam mágoas.

Mas no mistério astral da noute bela
Pareceu-me inda ouvir o nome dela
No marulhar monótono das águas!

Vae para um Convento!

Falhei na Vida. Zut! Ideaes caidos!
Torres por terra! As arvores sem ramos!
Ó meus amigos! todos nós falhamos…
Nada nos resta. Somos uns perdidos.

Choremos, abracemo-nos, unidos!
Que fazer? Porque não nos suicidamos?
Jezus! Jezus! Resignação… Formamos
No mundo, o Claustro-pleno dos Vencidos.

Troquemos o burel por esta capa!
Ao longe, os sinos mysticos da Trappa
Clamam por nós, convidam-nos a entrar…

Vamos semear o pão, podar as uvas,
Pegae na enxada, descalçae as luvas,
Tendes bom corpo, Irmãos! Vamos cavar…

Campesinas IX

Morreste no campo um dia,
Como uma flor desprezada.
Clareava a madrugada
Azul, vaporosa e fria.

Sobre a agreste serrania,
Numa ermida branqueada
Por uma manhã doirada
Um sino repercutia.

Teu caixão, de camponesas
E camponeses seguido,
Desceu abaixo às devesas.

Ganhou o atalho comprido
De casas em correntezas
E entrou num campo florido.

Vila Rica

O ouro fulvo do ocaso as velhas casas cobre;
Sangram, em laivos de ouro, as minas, que ambição
Na torturada entranha abriu da terra nobre:
E cada cicatriz brilha como um brasão.

O ângelus plange ao longe em doloroso dobre,
O último ouro de sol morre na cerração.
E, austero, amortalhando a urbe gloriosa e pobre,
O crepúsculo cai como uma extrema-unção.

Agora, para além do cerro, o céu parece
Feito de um ouro ancião, que o tempo enegreceu…
A neblina, roçando o chão, cicia, em prece,

Como uma procissão espectral que se move…
Dobra o sino… Soluça um verso de Dirceu…
Sobre a triste Ouro Preto o ouro dos astros chove.

Natal

às moças da Serra

É meia noite … O sino alvissareiro,
Lá da igrejinha branca pendurado,
Como n’um sonho místico e fagueiro,
Vem relembrar o tempo do passado.

Ó velho sino, ó bronze abençoado,
Na alegria e na mágoa companheiro!
Tu me recordas o sorrir primeiro
De menino Jesus imaculado.

E enquanto escuto a tua voz dolente,
Meu ser que geme dolorosamente
Da desventura, aos gélidos açoites …

Bebe em teus sons tanta alegria, tanta!
Sino que lembras uma noite santa,
Noite bendita mais que as outras noites!

Sol Poente

Tardinha… “Ave-Maria, Mãe de Deus…”
E reza a voz dos sinos e das noras…
O sol que morre tem clarões d’auroras,
Águia que bate as asas pelo céu!

Horas que têm a cor dos olhos teus…
Horas evocadoras doutras horas…
Lembranças de fantásticos outroras,
De sonhos que não tenho e que eram meus!

Horas em que as saudades, p’las estradas,
Inclinam as cabeças mart’rizadas
E ficam pensativas… meditando…

Morrem verbenas silenciosamente…
E o rubro sol da tua boca ardente
Vai-me a pálida boca desfolhando…

Soneto A Oxford

Ó Oxford, prende o sol em tuas pontas
Góticas; dormem divinas harmonias
Em tuas torres puras e sombrias
E em teus jardns de grandes flores tontas.

O eterno farfalhar de Christ Church Meadows
E as mesmas águas trêmulas dos Ices
Enchem meu coração da antiga fé
Dos bardos que ilustraram tuas classes.

Rebanhos de hoje e sempre; hoje meninos
De capa preta, que o pastor dos sinos
Tange dos sinos que me estão chamando

Aos claustros de presságio e na penumbra
Sobre os quais, pela noite, se vislumbra
O fantasma de Magdalen, perscrutando…

A Antônio Nobre

Tu que penaste tanto e em cujo canto
Há a ingenuidade santa do menino;
Que amaste os choupos, o dobrar do sino,
E cujo pranto faz correr o pranto:

Com que magoado olhar, magoado espanto
Revejo em teu destino o meu destino!
Essa dor de tossir bebendo o ar fino,
A esmorecer e desejando tanto…

Mas tu dormiste em paz como as crianças.
Sorriu a Glória às tuas esperanças
E beijou-te na boca… O lindo som!

Quem me dará o beijo que cobiço?
Foste conde aos vinte anos… Eu, nem isso…
Eu, não terei a Glória… nem fui bom.

Soneto Italiano

Frescuras das sereias e do orvalho,
Graça dos brancos pes dos pequeninos,
Voz das anhãs cantando pelos sinos,
Rosa mais alta no mais alto galho:

De quem me valerei, se não me valho
De ti, que tens a chave dos destinos
Em que arderam meus sonhos cristalinos
Feitos cinza que em pranto ao vento espalho?

Também te vi chorar… Também sofreste
A dor de ver secarem pela estrada
As fontes da esperança… E não cedeste!

Antes, pobre, despida e trespassada,
Soubeste dar à vida, em que morreste,
Tudo – à vida, que nunca te deu nada!