Sonetos sobre Vinte

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Sonetos de vinte escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Velhinha

Se os que me viram já cheia de graça
Olharem bem de frente em mim,
Talvez, cheios de dor, digam assim:
“Já ela é velha! Como o tempo passa! …”

Não sei rir e cantar por mais que faça!
Ó minhas mãos talhadas em marfim,
Deixem esse fio de oiro que esvoaça!
Deixem correr a vida até o fim!

Tenho vinte e três anos! Sou velhinha!
Tenho cabelos brancos e sou crente …
Já murmuro orações … falo sozinha …

E o bando cor-de-rosa dos carinhos
Que tu me fazes, olho-os indulgente,
Como se fosse um bando de netinhos …

Retorno

Meu ser em mim palpita como fora
do chumbo da atmosfera constritora.
Meu ser palpita em mim tal qual se fora
a mesma hora de abril, tornada agora.

Que face antiga já se não descora
lendo a efígie do corvo na da aurora?
Que aura mansa e feliz dança e redoura
meu existir, de morte imorredoura?

Sou eu nos meus vinte aons de lavoura
de sucos agressivos, qe elabora
uma alquimia severa, a cada hora.

Sou eu ardendo em mim, sou eu embora
não me conheça mais na minha flora
que, fauna, me devora quanto é pura.

Retrospecto

Vinte e seis anos, trinta amores: trinta
vezes a alma de sonhos fatigada.
e, ao fim de tudo, como ao fim de cada
amor, a alma de amor sempre faminta!

Ó mocidade que foges! brada
aos meus ouvidos teu futuro, e pinta
aos meus olhos mortais, com toda a tinta,
os remorsos da vida dissipada!

Derramo os olhos por mim mesmo… E, nesta
muda consulta ao coração cansado,
que é que vejo? que sinto? que me resta?

Nada: ao fim do caminho percorrido,
o ódio de trinta vezes ter jurado
e o horror de trinta vezes ter mentido!

Retrato das Mulheres em Todas as Idades

Mulher, de quinze a vinte é fresca rosa;
De vinte, a vinte e cinco é de exp’rimenta.
De vinte cinco a trinta, a graça aumenta:
Ditoso nesta idade quem a goza!

De trinta a trinta e cinco é mal gostosa
Porém, pode passar, com sal, pimenta,
Mas já dos trinta e cinco aos quarenta
Vai-se tornando assaz fastidiosa.

De quarenta e cinco ela é bachareleira,
Fala fanhoso e é já de pouco gabo.
De cinquenta cerrados é santeira!

Aos sessenta este seu retrato acabo:
Menina, moça, velha benzedeira,
Bruxa gogosa, então, leve-a o diabo!

Soneto 251 Quantitativo

Centenas de sonetos são legado
de nomes tidos como monumentos.
Apenas de Camões, mais de duzentos,
registro que é por poucos superado.

Não fossem os Lusíadas o dado
que faz dele o primeiro entre os portentos,
ainda assim Camões marca outros tentos,
e, entre outros tantos, este é consagrado:

“Sete anos de pastor”, o vinte e nove,
que, se não for mais belo, é o mais perfeito,
a menos que em contrário alguém me prove.

Mas, como dois é dom, três é defeito,
também um “Alma minha”, o dezenove,
ocupa igual lugar no meu conceito.

Maldição

Se por vinte anos, nesta furna escura,
Deixei dormir a minha maldição,
– Hoje, velha e cansada da amargura,
Minh’alma se abrirá como um vulcão.

E, em torrentes de cólera e loucura,
Sobre a tua cabeça ferverão
Vinte anos de silêncio e de tortura,
Vinte anos de agonia e solidão…

Maldita sejas pelo Ideal perdido!
Pelo mal que fizeste sem querer!
Pelo amor que morreu sem ter nascido!

Pelas horas vividas sem prazer!
Pela tristeza do que eu tenho sido!
Pelo esplendor do que eu deixei de ser!…

Realidade

Fomos longe demais, para voltar
Aos antigos canteiros onde há rosas.
Em nós, o ouvido, quase e, quase, o olhar
Buscam nas cores vozes misteriosas…

Mas o mistério é flor da juventude.
Não rima com poemas desumanos.
A idade — a nossa idade! — nunca ilude.
Só uma vez é que se tem vinte anos.

Quebrámos todos, todos os espelhos
E o sol que, neles, está hoje posto
Já não reflecte os lábios tão vermelhos
Que nos iluminam, sempre, o rosto.

Realidade? Há uma: apenas esta!
— Somos espectros na cidade em festa.

A Alma Dos Vinte Anos

A alma dos meus vinte anos noutro dia
Senti volver-me ao peito, e pondo fora
A outra, a enferma, que lá dentro mora,
Ria em meus lábios, em meus olhos ria.

Achava-me ao teu lado então, Luzia,
E da idade que tens na mesma aurora;
A tudo o que já fui, tornava agora,
Tudo o que ora não sou, me renascia.

Ressenti da paixão primeira e ardente
A febre, ressurgiu-me o amor antigo
Com os seus desvarios e com os seus enganos…

Mas ah! quando te foste, novamente
A alma de hoje tornou a ser comigo,
E foi contigo a alma dos meus vinte anos.

A Antônio Nobre

Tu que penaste tanto e em cujo canto
Há a ingenuidade santa do menino;
Que amaste os choupos, o dobrar do sino,
E cujo pranto faz correr o pranto:

Com que magoado olhar, magoado espanto
Revejo em teu destino o meu destino!
Essa dor de tossir bebendo o ar fino,
A esmorecer e desejando tanto…

Mas tu dormiste em paz como as crianças.
Sorriu a Glória às tuas esperanças
E beijou-te na boca… O lindo som!

Quem me dará o beijo que cobiço?
Foste conde aos vinte anos… Eu, nem isso…
Eu, não terei a Glória… nem fui bom.

Dizeres Íntimos

É tão triste morrer na minha idade!
E vou ver os meus olhos, penitentes
Vestidinhos de roxo, como crentes
Do soturno convento da Saudade!

E logo vou olhar (com que ansiedade! …)
As minhas mãos esguias, languescentes,
De brancos dedos, uns bebês doentes
Que hão-de morrer em plena mocidade!

E ser-se novo é ter-se o Paraíso,
É ter-se a estrada larga, ao sol, florida,
Aonde tudo é luz e graça e riso!

E os meus vinte e três anos … (Sou tão nova!)
Dizem baixinho a rir: “Que linda a vida! …”
Responde a minha Dor: “Que linda a cova!”

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Livro, se luz desejas, mal te enganas.
Quanto melhor será dentro em teu muro
Quieto, e humilde estar, inda que escuro,
Onde ninguém t’impece, a ninguém danas!

Sujeitas sempre ao tempo obras humanas
Coa novidade aprazem; logo em duro
Ódio e desprezo ficam: ama o seguro
Silêncio, fuge o povo, e mãos profanas.

Ah! não te posso ter! deixa ir comprindo
Primeiro tua idade; quem te move
Te defenda do tempo, e de seus danos.

Dirás que a pesar meu fostes fugindo,
Reinando Sebastião, Rei de quatro anos:
Ano cinquenta e sete: eu vinte e nove.

Mundos Extintos

São tão remotas as estrelas que,
apesar da vertiginosa velocidade da luz,
elas se apagam. e continuam a brilhar durante séculos.

MORREM OS MUNDOS… Silenciosa e escura,
Eterna noite cinge-os. Mudas, frias,
Nas luminosas solidões da altura
Erguem-se, assim, necrópoles sombrias…

Mas pra nós, di-lo a ciência, além perdura
A vida, e expande as rútilas magias…
Pelos séculos em fora a luz fulgura
Traçando-lhes as órbitas vazias.

Meus ideais! extinta claridade –
Mortos, rompeis, fantásticos e insanos
Da minh’alma a revolta imensidade…

E sois ainda todos os enganos
E toda a luz, e toda a mocidade
Desta velhice trágica aos vinte anos…