Sonetos sobre Sonhos de Luís de CamÔes

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Sonetos de sonhos de Luís de CamÔes. Leia este e outros sonetos de Luís de CamÔes em Poetris.

Vejo que nem um Breve Engano Posso Ter

Quando de minhas mĂĄgoas a comprida
Maginação os olhos me adormece,
Em sonhos aquela alma me aparece,
Que para mi foi sonho nesta vida.

LĂĄ numa soidade, onde estendida
A vista por o campo desfalece,
Corro apĂłs ela; e ela entĂŁo parece
Que mais de mi se alonga, compelida.

Brado: − Não me fujais, sombra benina. −
Ela (os olhos em mi c’um brando pejo,
Como quem diz que jĂĄ nĂŁo pode ser)

Torna a fugir-me; torno a bradar: − Dina…
E antes que diga mene, acordo, e vejo
Que nem um breve engano posso ter.

Pensamentos, Que Agora Novamente

Pensamentos, que agora novamente
cuidados vĂŁos em mim ressuscitais,
dizei me: ainda nĂŁo vos contentais
de terdes, quem vos tem, tĂŁo descontente?

Que fantasia Ă© esta, que presente
cad’hora ante meus olhos me mostrais?
Com sonhos e com sombras atentais
quem nem por sonhos pode ser contente?

Vejo vos, pensamentos, alterados
e nĂŁo quereis, d’esquivos, declarar me
que Ă© isto que vos traz tĂŁo enleados?

NĂŁo me negueis, se andais para negar me;
que, se contra mim estais alevantados,
eu vos ajudarei mesmo a matar me.

Se De Vosso Fermoso E Lindo Gesto

Se de vosso fermoso e lindo gesto
nasceram lindas flores para os olhos,
que para o peito sĂŁo duros abrolhos,
em mim se vĂȘ mui claro e manifesto:

pois vossa fermosura e vulto honesto
em os ver, de boninas vi mil molhos;
mas se meu coração tivera antolhos,
nĂŁo vira em vĂłs seu dano o mal funesto.

Um mal visto por bem, um bem tristonho,
que me traz elevado o pensamento
em mil, porém diversas, fantasias,

nas quais eu sempre ando, e sempre sonho;
e vĂłs nĂŁo cuidais mais que em meu tormento,
em que fundais as vossas alegrias.

Quando Cuido No Tempo Que, Contente

Quando cuido no tempo que, contente,
vi as pérolas, neve, rosa e ouro,
como quem vĂȘ por sonhos um tesouro,
parece tenho tudo aqui presente.

Mas tanto que se passa este acidente,
e vejo o quĂŁo distante de vĂłs mouro,
temo quanto imagino por agouro,
porque d’imaginar tambĂ©m me ausente.

JĂĄ foram dias em que por ventura
vos vi, Senhora (se, assi dizendo, posso
co coração seguro estar sem medo);

Agora, em tanto mal nĂŁo mo assegura
a prĂłpria fantasia e nojo vosso:
eu nĂŁo posso entender este segredo!

Doce Sonho, Suave E Soberano

Doce sonho, suave e soberano,
se por mais longo tempo me durara!
Ah! quem de sonho tal nunca acordara,
pois havia de ver tal desengano!

Ah! deleitoso bem! ah! doce engano!
Se por mais largo espaço me enganara!
Se entĂŁo a vida mĂ­sera acabara,
de alegria e prazer morrera ufano.

Ditoso, nĂŁo estando em mim, pois tive,
dormindo, o que acordado ter quisera.
Olhai com que me paga meu destino!

Enfim, fora de mim, ditoso estive.
Em mentiras ter dita razĂŁo era,
pois sempre nas verdades fui mofino.