Adamastor Cruel! De Teus Furores
Adamastor cruel! De teus furores
Quantas vezes me lembro horrorizado!
Ó monstro! Quantas vezes tens tragado
Do soberbo Oriente os domadores!Parece-me que entregue a vis traidores
Estou vendo Sepúlveda afamado,
Co’a esposa e co’os filhinhos abraçado,
Qual Mavorte com Vénus e os Amores.Parece-me que vejo o triste esposo,
Perdida a tenra prole e a bela dama,
Às garras dos leões correr furioso.Bem te vingaste em nós do afoito Gama!
Pelos nossos desastres és famoso.
Maldito Adamastor! Maldita fama!
Sonetos sobre Traidores
9 resultadosMarília De Dirceu
Soneto 10
Adeus, cabana, adeus; adeus, ó gado;
Albina ingrata, adeus, em paz te deixo;
Adeus, doce rabil; neste alto freixo
Te fica, ao meu destino consagrado.Se te for meu sucesso perguntado,
não declares, rabil, de quem me queixo;
não quero que se saiba vive Aleixo
por causa de uma infame desterrado.Se vires a pastor desconhecido,
lhe dize então piedoso: – Ah! vai-te embora,
atalha os danos, que outros têm sentido.Habita nesta aldeia uma pastora,
de rosto belo, coração fingido,
umas vezes cruel, e as mais traidora.
A Inocência
Caminhando no mundo vai segura
A Inocência, com grave firme passo.
Sem temor de cair no infame laço
Que arma a traidora mão, a mão perjura.Como não obra mal, nem mal procura
Para os seus semelhantes, corre o espaço
Sem lança, sem arnês, sem peito de aço,
Armada só de consciência pura.Pois que ofensa não faz, não teme ofensa
E por isso passeia, satisfeita,
Sem as feras temer na selva densa.Traições, ódios, vinganças não espreita.
Certa no bem que faz, só nele pensa:
Quem remorsos não tem, mal não suspeita.
Marília De Dirceu
Soneto 6
Quantas vezes Lidora me dizia,
Ao terno peito minha mão levando:
– Conjurem-se em meu mal os astros, quando
Achares no meu peito aleivosia!Então que não chorasse lhe pedia,
Por firme seu amor acreditando.
Ah! que em movendo os olhos, suspirando,
Ao mais acautelado enganaria!Um ano assim viveu. Oh! céus, agora
Mostrou que era mulher: a natureza,
Só por não se mudar, a fez traidora.Não, não darei mais cultos à beleza,
Que depois de faltar à fé Lidora,
Nem creio que nas deusas há firmeza.
Marília De Dirceu
Soneto 3
Enganei-me, enganei-me – paciência!
Acreditei às vezes, cri, Ormia,
Que a tua singeleza igualaria
A tua mais que angélica aparência.Enganei-me, enganei-me – paciência!
Ao menos conheci que não devia
Pôr nas mãos de uma externa galhardia
O prazer, o sossego e a inocência.Enganei-me, cruel, com teu semblante,
E nada me admiro de faltares,
Que esse teu sexo nunca foi constante.Mas tu perdeste mais em me enganares:
Que tu não acharás um firme amante,
E eu posso de traidoras ter milhares.
A uns Olhos Negros
Olhos negros, que da alma sois senhores
Duvido com razão desse atributo,
Que é muito, que quem mata, traga o luto,
E é muito ver na noite resplendores:Se de negros, meus olhos, tendes cores,
Como as almas vos dão hoje tributo.
Quem viu que os negros com rigor astuto
Os brancos prenda com grilhões traidores.Mas ah, que foi discreta providência
O fazê-lo da cor da minha sorte,
Por não sentir rigor tão desabrido.Para que veja assim toda a prudência
Que foi prodígio grande, e pasmo forte,
Em duas noites ver o Sol partido.
Classicismo
Longínquo descendente dos helenos
pelo espírito claro, a alma panteísta,
– amo a beleza esplêndida de Vênus
com uma alegria singular de artista!Amo a aventura e o belo, amo a conquista!
Nem receio os traidores e os venenos…
– Trago na alma engastada uma ametista,
– meus olhos de esmeraldas são serenos!Com os pés na terra tenho o olhar no céu;
a alma, pura e irrequieta como as linfas
soltas no chão; nos lábios, tenho mel…Meu culto é a liberdade e a vida sã.
E ainda hoje sigo e persigo as ninfas
com a minha flauta mágica de Pã!
Marília De Dirceu
Soneto 9
Mudou-se enfim Lidora, essa Lidora
Por quem mil vezes fé me foi jurada.
Que vos detém, ó céus, que castigada
Ainda não deixais tão vil traidora?Não haja piedade; sinta agora
A dita sem remédio em mal trocada:
Pois, se assim não sucede, fica ousada
Para ser outra vez enganadora.Vingai, ó justos céus…, mas ah! que digo?
Que maltrateis Lidora? – O sentimento
Privou-me do discurso; eu me desdigo.Não, não vibreis o raio violento;
Pois se que a compaixão do seu castigo
Há de aumentar depois o meu tormento.
XLVIII
Traidoras horas do enganoso gosto,
Que nunca imaginei, que o possuía,
Que ligeiras passastes! mal podia
Deixar aquele bem de ser suposto.Já de parte o tormento estava posto;
E meu peito saudoso, que isto via,
As imagens da pena desmentia,
Pintando da ventura alegre o rosto.Desanda então a fábrica elevada,
Que o plácido Morfeu tinha erigido,
Das espécies do sono fabricada:Então é, que desperta o meu sentido,
Para observar na pompa destroçada,
Verdadeira a ruína, o bem fingido.