Amar Demais
A alegria genuĂna de duas crianças que brincam. TĂŁo grande que nem o pensamento a inibe. E a alegria genuĂna de dois adultos que amam. TĂŁo grande que nem o medo a inibe. SĂł o que Ă© grande demais nĂŁo encolhe. SĂł amar Ă© tĂŁo grande como o que nĂŁo acaba. As crianças brincam e saltam e gritam. E tudo aquilo – o brincar, o saltar, o gritar – vale por tudo o que Ă©: tudo aquilo Ă© tudo o que Ă©. Sem que pensem no que vem depois, sem que pensem que tudo – sobretudo aquilo que agora as conquista e as arrebata – vai acabar. SĂł o que Ă© curto demais, tĂŁo curto que parece sempre de menos, Ă© eterno. SĂł o que acaba cedo demais Ă© eterno. E amar-te, meu amor, Ă© sempre cedo demais. E depois, quando acaba, Ă© sempre tarde demais. Amar-te, meu amor, Ă© sempre demais. SĂł o que nĂŁo conseguimos segurar nos segura.
Textos sobre Adultos de Pedro Chagas Freitas
3 resultadosNo Teu Colo
No teu colo cabem todos os meus medos.
E se Deus existir, Ă© a calma do teus ombros, o sossego divino que vai do teu pescoço ao teu peito. E eu ali, tĂŁo pequeno que nem meço os centĂmetros que tenho, e ainda assim tĂŁo grande que nem o cĂ©u teria espaço para me guardar assim. Somos criaturas para alĂ©m do mundo, pares Ăşnicos de uma viagem que nem o final dos corpos conseguirá parar.
Até o pior da vida se acalma quando estou nos teus olhos.
Há pessoas más, mãe. Pessoas que não imaginam o que é resistir por dentro deste corpo, por trás destes ossos, sob os escombros de uma idade por descobrir. Há pessoas que não sabem que sou uma criança com medo como todas as crianças (uma pessoa com medo como todas as pessoas: os adultos também têm medo, não têm, mãe?, toda a gente tem medo, não tem, mãe?), e ontem um adulto disse-me para crescer e aparecer, e uma criança menos criança do que eu agarrou-me pelos cabelos e atirou-me ao chão, a escola toda a olhar e a rir, e o adulto a dizer «cresce e aparece» e a criança a dizer «toma lá que é para aprenderes».
A Grande Vantagem da Vida
– A grande vantagem da vida Ă© ensinar-nos outra vez a chorar. A vida infantiliza. Fica-se maior no que nos faz ser mais pequenos. Cresce-se fora o que se vai perdendo por dentro. Passamos a infância a querer crescer, a adolescĂŞncia a querer crescer. E depois percebemos que sĂł quer crescer quem ainda se sente pequeno. Um adulto sente-se pequeno mas pensa ao contrário. Sente-se pequeno e quer ficar mais pequeno. Voltar ao tempo em que havia sonhos.
– Onde se perdem os sonhos?
– Todos os sonhos se perdem. Mesmo aqueles que vais ganhar, e vais ganhar muitos, se vão perder. Porque já deixaram de ser sonhos. Sonhaste aquilo, tiveste aquilo. E acabou. Lá se foi o sonho. O segredo é conseguir gerar novos sonhos. Sonhos que consigam ocupar o espaço em branco deixado pelo sonho perdido.
– Mesmo que tenha sido ganho.
– Mesmo que tenha sido ganho.
– Queria ser como tu.
– E eu queria ser como tu. Queria olhar para a frente e ver que o caminho não acaba, o caminho a perder de vista.
– O teu não se perde de vista?
– O meu faz-me perder a vista.