O Pobre Diabo Face à Guerra
Se tivessem contado ao diabo, que sempre teve uma enorme paixão pela guerra, que um dia haveria homens para quem a continuação desta representa um interesse comercial, que eles nem se dão ao trabalho de disfarçar e cujo produto ainda os ajuda a ocupar um lugar de destaque na sociedade, ele teria dito para irem contar isso à avó dele.
Textos sobre Diabo
27 resultadosMaldade Eterna
É difícil, a vida do pecador. Deus fez este mundo, mas não o fez a contento de todos, pois não?
Não me parece que ele estivesse a pensar muito em mim.
Pois, disse o velho. Mas em que é que as ideias de um homem o ajudam? Que mundos viu ele que preferia a este?
Consigo imaginar lugares melhores e melhores costumes.
E vossemecê consegue fazê-los existir?
Não.
Não. É um mistério. Um homem vê-se em palpos de aranha para entender a própria mente porque só tem a própria mente para entendê-la. Pode entender o próprio coração, mas não quer. E faz muito bem. O melhor é nem espreitar lá para dentro. Não é o coração de uma criatura que esteja no caminho que Deus lhe traçou. Encontra-se ruindade na mais mesquinha das criaturas, mas quando Deus criou o homem tinha o diabo à sua ilharga. Uma criatura capaz de tudo, capaz de criar uma máquina e uma máquina para criar a máquina. E maldade que se perpetua sozinha durante um milhar de anos, sem ser preciso alimentá-la. Vossemecê acredita nisso?
Não sei.
Pois acredite.
É por ter Espírito que me Aborreço
É preciso esconjurar, da forma que nos for possível, este diabo de vida que não sei porque é que nos foi dada e que se torna tão facilmente amarga se não opusermos ao tédio e aos aborrecimentos uma vontade de ferro. É preciso, numa palavra, agitar este corpo e este espírito que se delapidam um ao outro na estagnação e numa indolência que se confunde com um torpor. É preciso passar, necessariamente, do descanso ao trabalho – e reciprocamente: só assim estes parecerão, ao mesmo tempo, agradáveis e salutares. Um desgraçado que trabalhe sem cessar, sob o peso de tarefas inadiáveis, deve ser, sem dúvida, extremamente infeliz, mas um indivíduo que não faça mais do que divertir-se não encontrará nas suas distracções nem prazer nem tranquilidade; sente que luta contra o tédio e que este o prende pelos cabelos – como se fosse um fantasma que se colocasse sempre por detrás de cada distracção e espreitasse por cima do nosso ombro.
Não julgue, cara amiga, que eu só porque trabalho regularmente estou isento das investidas deste terrível inimigo; penso que, quando se tem uma certa disposição de espírito, é preciso termos uma imensa energia de forma a não nos deixarmos absorver e conseguir escapar,
Como te Tens Lembrado Hoje de Mim?
O que tens tu feito, amor? Andarás, como segunda-feira, cavaleiro andante a flirtar às janelas das ruas do Alto do Pina, com damas de cem anos?… Cem anos, pelo menos… Eu creio mesmo que tu disseste mais alguns… Sempre estás uma prenda, um espertalhão… Tenho que te educar convenientemente e ensinar-te que damas de cem anos e mulheres que fazem queijadas, não servem, ou pelo menos não devem servir, a quem tem a suprema felicidade de possuir uma mulher como eu, que sou uma pérola, ou por outra: um colar de pérolas, como ontem gentilmente me chamaste… Estás de acordo, não é verdade?
A tua pequenina fera está há imenso tempo ansiosa que a chuva acabe, para deitar o focinhito fora do covil, ao menos por cinco minutos; mas não há meio, o diabo da chuva continua a cair sem piedade e daqui a pouco a ferazinha sai mesmo com chuva e tudo. Há tanto tempo que não saio! Em horas de concentração de consciência, eu ponho-me a pensar que nunca julguei capaz que um homem pudesse fazer da Miss América, como muita gente me chamava dantes, esta burguezinha pacata, que, detrás dos vidros duma janela, passa a vida a fazer rendas,
Álvaro
… Diabo de homem, este Álvaro… Agora chama-se Álvaro de Silva… Vive em Nova Iorque… Passou quase toda a vida na selva nova-iorquina… Imagino-o a comer laranjas a horas insólitas, queimando com o fósforo o papel dos cigarros, fazendo perguntas vexatórias a toda a gente… Foi sempre um mestre desordenado, possuidor de uma brilhante inteligência, inteligência inquiridora que parecia não o levar a pparte nenhuma, excepto a Nova Iorque. Era em 1925…
Entre as violetas que se lhe escapavam da mão quando corria para as entregar a uma transeunte desconhecida, com a qual queria logo ir deitar-se, sem saber como ela se chamava nem donde era, e as suas intermináveis leituras de Joyce, revelou-me a mim e a muitos outros insuspeitadas opiniões, pontos de vist-a de grande cidadão que vive dentro da urbe, na sua cova, e sai a explorar a música, a pintura, os livros, a dança… Sempre a comer laranjas, a descascar maçãs, insuportável dietético, assombrosamente intrometido em tudo, víamos nele, por fim, o sonhado antiprovinciano que todos nós, os provincianos, tínhamos querido ser, sem as etiquetas coladas nas malas, antes circulando dentro de si próprio, com uma mistura de países e concertos, de cafés ao alvorecer,
Quem É Que Tu Amas?
– Quem é que tu amas? – continuou Murphy. – Eu, tal como sou. Podes desejar o que não existe, não podes amá-lo. – Nada mal, para um Murphy. – Se assim é, por que diabo te esforças tanto para me modificar? Para poderes deixar de me amar – aqui, a voz subiu e atingiu uma nota bastante honrosa – para deixares de estar condenada a amar-me, para seres dispensada de me amar.
Versos Curtos e Compridos
Como poeta actuante, combati o meu próprio ensimesmamento. Por isso, o debate entre o real e o subjectivo se decidiu dentro do meu próprio ser. Sem pretensões de aconselhar ninguém, os resultados podem auxiliar as minhas experiências Vejamo-los de relance.
É natural que a minha poesia esteja exposta tanto à opinião da crítica elevada como submetida à paixão do libelo. Isto faz parte do jogo. Sobre este aspecto da discussão não tenho voz, mas tenho voto. Para a crítica essencial, o meu voto são os meus livros, a minha poesia inteira. Para o libelo inamistoso, tenho também direito de voto — e este também é constituído pela minha própria e constante criação.
Se soa a vaidade o que digo, pode ser que tenham razão. No meu caso, trata-se da vaidade do artesão que exerceu um oficio por muitos anos com amor indelével.
Mas há uma coisa com que estou satisfeito: de uma maneira ou outra, fiz respeitar, pelo menos na minha pátria, o ofício de poeta, a profissão da poesia.Na época em que comecei a escrever, o poeta era de dois géneros. Uns, eram poetas grandes senhores que se faziam respeitar pelo seu dinheiro,