Textos sobre Tempo

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Textos de tempo escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Amigos para Sempre

Os amigos cada vez mais se vêem menos. Parece que era só quando éramos novos, trabalhávamos e bebíamos juntos que nos víamos as vezes que queríamos, sempre diariamente. E, no maior luxo de todos, há muito perdido: porque não tínhamos mais nada para fazer.
Nesta semana, tenho almoçado com amigos meus grandes, que, pela primeira vez nas nossas vidas, não vejo há muitos anos. Cada um começa a falar comigo como se não tivéssemos passado um único dia sem nos vermos.
Nada falha. Tudo dispara como se nos estivera – e está – na massa do sangue: a excitação de contar coisas e partilhar ninharias; as risotas por piadas de há muito repetidas; as promessas de esperanças que estão há que décadas por realizar.
Há grandes amigos que tenho a sorte de ter que insistem na importância da Presença com letra grande. Até agora nunca concordei, achando que a saudade faz pouco do tempo e que o coração é mais sensível à lembrança do que à repetição. Enganei-me. O melhor que os amigos e as amigas têm a fazer é verem-se cada vez que podem. É verdade que, mesmo tendo passado dez anos, sente-se o prazer inencontrável de reencontrar quem se pensava nunca mais encontrar.

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O Ciclo da Vida

O homem domina a natureza e é por ela dominado. Só ele lhe resiste e ao mesmo tempo ultrapassa as suas leis, amplia o seu poderio graças à sua vontade e actividade. Afirmar no entanto que o mundo foi criado para o homem é algo que está longe de ser evidente. Tudo o que o homem constrói é, como ele, efémero: o tempo derruba os edifícios, atulha os canais, apaga o saber – e até o nome das nações. (…) Dir-me-ão que as novas gerações recebem a herança das gerações que as precederam e que, por consequência, a perfeição ou o aperfeiçoamento não têm limites. Mas o homem está longe de receber intacta a súmula dos conhecimentos acumulados pelos séculos que o precederam e se aperfeiçoa algumas dessas invenções no que diz respeito a outras fica bastante atrás dos seus próprios inventores; um grande número dessas invenções chega mesmo a perder-se.
Não preciso sequer de sublinhar como certos pretensos melhoramentos foram nocivos à moral e ao bem-estar. Determinada invenção, suprimindo ou diminuindo o trabalho e o esforço, enfraqueceu a dose de paciência necessária para suportar as contrariedades – ou a energia que temos de dar provas para as vencer.

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Alimentar o Amor

Começar é fácil. Acabar é mais fácil ainda. Chega-se sempre à primeira frase, ao primeiro número da revista, ao primeiro mês de amor. Cada começo é uma mudança e o coração humano vicia-se em mudar. Vicia-se na novidade do arranque, do início, da inauguração, da primeira linha na página branca, da luz e do barulho das portas a abrir.
Começar é fácil. Acabar é mais fácil ainda. Por isso respeito cada vez menos estas actividades. Aprendi que o mais natural é criar e o mais difícil de tudo é continuar. A actividade que eu mais amo e respeito é a actividade de manter.
Em Portugal quase tudo se resume a começos e a encerramentos. Arranca-se com qualquer coisa, de qualquer maneira, com todo o aparato. À mínima comichão aparece uma «iniciativa», que depois não tem prosseguimento ou perseverança e cai no esquecimento. Nem damos pela morte.
É por isso que eu hoje respeito mais os continuadores que os criadores. Criadores não nos faltam. Chefes não nos faltam. Faltam-nos continuadores. Faltam-nos tenentes. Heróis não nos faltam. Faltam-nos guardiões.

É como no amor. A manutenção do amor exige um cuidado maior. Qualquer palerma se apaixona, mas é preciso paciência para fazer perdurar uma paixão.

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Um Herói não se Declara

Aquele que se expõe à morte deve estar à altura de incutir à sua época a força da exasperação. Se, pois, vejo um homem até então completamente desconhecido dos seus contemporâneos aparecer afirmando que está pronto a sacrificar a sua vida e a enfrentar a morte, muito tranquilamente então (…) eu demitiria este profeta. Nunca um tal homem chegaria ao ponto de ser condenado à morte pela sua época, ainda que, por outro lado, tivesse realmente a coragem de morrer e a isso estivesse disposto. Ele não conhece o segredo; pensa evidentemente que os seus contemporâneos, os mais fortes, se encarregarão da execução, quando ele deveria ser de tal modo superior ao seu tempo que não o deixasse, permanecendo ele próprio passivo, cumprir sozinho o seu trabalho de tal modo superior que não lho indicasse mas livremente o constrangesse a sair-se bem dele.

Para Quê e Porquê

Vê se não insistes muito em perguntar porquê ou para quê, se não queres ficar paralítico. Porque a maior grandeza da vida tem o valor nela própria e não fora dela. Não se pode justificar a vida senão nela. Ou a luz. Ou a fraternidade humana. Ou a justiça. E o mais assim. E é o que é indiscutível que pode fundar um comportamento e uma razão de se estar vivo.
É fácil ainda inventar ou ter razões para se atentar contra o que é indiscutível. Porque se é indiscutível, não se pode discutir. E se se discute, o valor deixa de existir. Toda a cultura ou civilização assenta em pressupostos que não exigem uma demonstração e permanecem assim no intocável que é seu. Eis que no nosso tempo, como em nenhum outro, o fundamental para a vida se determina pela negação. A arte foi como sempre o grande arauto da nossa terra queimada. Negar. Destruir. Porque tudo se contamina da possibilidade de negação. Das artes e as letras ao comportamento social.
E curiosamente a mais manifesta negação é a que se refere ao tabu sexual. E o que mais se destaca aí é o uso a frio das maiores obscenidades.

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Símios Aperfeiçoados

É preciso viver em estado de prevenção. Não ir na enxurrada do colectivismo e morrer afogado num bairro económico ou numa colónia balnear, resistir às pressões políticas mirabolantes, quer sejam de uma banda ou de outra, manter a condição do homem-artista em luta com o homem-massa foi sempre o que em mim se tornou claro desde que aos poucos tomei posse da minha personalidade. É fatal que se caminhe para a sanidade de vida das classes baixas, é humano que isso se faça, no entanto também é humano, mais talvez, que se lute desesperadamente para que a condição mais sagrada do homem evolua libertando-se das massas satisfeitas com a assistência médica, televisão e funeral pago. Essa massa vai criar um novo espírito animal, vai catalogar-se em Darwin e, convencidos que essa massa está feliz, constatamos ao fim de pouco tempo que esses grandes grupos de populações standardizadas deixaram de pensar e o seu sentir é apenas tactual, sem nada de sublimação em momentos mais íntimos.
O mundo que pensa, do artista e do intelectual, tem de libertar-se do incómodo desses homens que trouxeram como contribuição para a humanidade uma ideia abstracta do colectivo em marcha, que passaram a emitir sons,

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O Elogio da História

Nenhuma realidade é mais essencial para a nossa autocertificação do que a história. Mostra-nos o mais largo horizonte da humanidade, oferece-nos os conteúdos tradicionais que fundamentam a nossa vida, indica-nos os critérios para avaliação do presente, liberta-nos da inconsciente ligação à nossa época e ensina-nos a ver o homem nas suas mais elevadas possibilidades e nas suas realizações imperceptíveis.
Não podemos melhor aproveitar os nossos ócios do que familiarizando-nos com as magnificências do passado, conservando viva essa recordação e, ao mesmo tempo, contemplando as calamidades em que tudo se subverteu. A experiência do presente compreende-se melhor reflectida no espelho da história. O que a história nos transmite vivifica-se à luz da nossa época. A nossa vida processa-se no esclarecimento recíproco do passado e do presente.
Só de perto, na intuição concreta e sensível, e prestando atenção aos pormenores, a história realmente interessa. Filosofando procedemos a considerações que se mantêm abstractas.

Viver com o Coração ou com a Razão

Viver segundo a razão, alvitre que os filósofos pregoam, é bom de dizer-se e desejar-se, mas enquanto os filósofos não derem uma razão a cada homem, e essa razão igual à de todos os homens, o apostolado é de todo inútil. Melhor avisados andam os moralistas religiosos, subordinando a humanidade aos ditames de uma mesma fé; todavia, e sem menoscabo dos preceitos evangélicos que altamente venero, parece-me que o homem, sincero crente, e devotado cristão, no meio destes mouros, que vivem à luz do século, e meneiam os negócios temporais a seu sabor, tal homem, se pedir a seu bom juízo religioso a norma dos deveres a respeitar, e dos direitos a reclamar, ganha créditos de parvo, e morre sequestrado dos prazeres da vida, se quiser poupar-se ao desgosto de ser apupado, procurando-os.

Como sabem, eu nunca andei em boas-avenças com a religião de meus pais; e por isso me abstenho de lhe imputar a responsabilidade das minhas quedas, seja dos pináculos aéreos onde o coração me alçou, seja do raso da razão, onde as quedas, bem que baixas, são mais igminiosas. Eu comparo o cair das alturas do coração à queda que se dá dum garboso cavalo: quem nos vê cair pode ser que nos deplore;

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Não há Civilização sem Constrangimento

Toda a civilização traduz constrangimento e sujeição. Aprendendo, sob a rigorosa lei das primeiras obrigações sociais, a dominar um pouco as suas impulsões, o primitivo desprendeu-se da animalidade pura e chegou à barbárie. Forçado a refrear-se mais, ele elevou-se até à civilização. Esta só se mantém enquanto persiste o domínio do homem sobre si mesmo.
Semelhante sujeição exige um esforço em todos os instantes. Seria quase impossível se os hábitos, que a educação pode fixar, não acabassem por o facilitar, tornando-o inconsciente.
Suficientemente desenvolvida, a disciplina interna pode chegar assim a substituir a disciplina externa; mas, quando não se soube criar uma, cumpre resignar-se a suportar a outra. Recusar uma e outra é retroceder aos tempos de barbárie. Os sentimentos conduzem-nos sempre, mas nenhuma sociedade pode subsistir sem que os membros aprendam a mantê-los nos limites abaixo dos quais começam a anarquia e a decadência.
Os sentimentos refreados pelas necessidades sociais, que codificam as leis, não são por essa razão destruídos. Libertadas das suas peias, as impulsões naturais primitivas reaparecem sempre. Explicam-se assim as violências que acompanham as revoluções. O civilizado retrocede à barbárie.

Não Podemos Escrever Sem a Força do Corpo

A escrita torna-nos selvagens. Regressamos a uma selvajaria de antes da vida. E reconhecêmo-la sempre, é a das florestas, tão velha como o tempo. A do medo de tudo, distinta e inseparável da própria vida. Ficamos obstinados. Não podemos escrever sem a força do corpo. É preciso sermos mais fortes que nós para abordar a escrita, é preciso ser-se mais forte do que aquilo que se escreve. É uma coisa estranha, sim. Não é apenas a escrita, o escrito, são os gritos dos animais da noite, os de todos, os vossos e os meus, os dos cães. É a vulgaridade maciça, desesperante, da sociedade. A dor é, também, Cristo e Moisés e os faraós e todos os judeus e todas as crianças judias e é, também, o lado mais violento da felicidade. Acredito nisso, sempre.

A Desventura Máxima é a Solidão

A desventura máxima é a solidão. É tão verdade que o reconforto supremo – a religião – consiste em encontrar uma companhia que nunca falhe – Deus. A oração é um desabafo, como com um amigo. A obra equivale à oração, porque nos põe em contacto com os que dela tirarão proveito. O problema da vida é, portanto, o seguinte: como romper a nossa solidão, como comunicar com os outros. Assim se explica a existência do matrimónio, da paternidade, das amizades. Mas que a felicidade resida nisto, balelas! Porque se deva estar melhor comunicando com os outros do que só, é estranho. É talvez apenas uma ilusão: a maior parte do tempo, estamos muitíssimo bem sós. É agradável ter, de tempos a tempos, um odre em que nos possamos despejar e, em seguida, bebermo-nos a nós próprios: dado que pedimos aos outros apenas aquilo que já temos em nós. É um mistério o motivo por que não basta perscrutar e beber em nós próprios e seja preciso reavermo-nos por intermédio dos outros. (O sexo é um incidente: o que recebemos é momentâneo e casual; pretendemos algo de mais secreto e misterioso de que o sexo é apenas um sinal, um símbolo).

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Portugal Necessita de um Projecto Mobilizador

Portugal necessita de um projecto mobilizador. É tempo de que este país encontre um rumo definido de recuperação e de desenvolvimento. Somos um país pobre em recursos materiais, mas mesmo os poucos que temos estamos a desperdiçá-los. Somos ricos em recursos humanos que se encontram abandonados.

Só com uma política que em matéria de recursos nacionais privilegie a agricultura e as pessoas, que aproveite todas as potencialidades dos serviços e da indústria, conjugada com uma política de investigação científica e tecnológica, com uma política cultural, com uma política de educação, poderemos sair da situação dramática em que nos encontramos.