Textos sobre Vista de José Luís Peixoto

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Textos de vista de José Luís Peixoto. Leia este e outros textos de José Luís Peixoto em Poetris.

Luta de Classes

NĂŁo contem comigo para defender o elitismo cultural. Pelo contrĂĄrio, contem comigo para rebentar cada detalhe do seu preconceito.
A cultura Ă© usada como sĂ­mbolo de status por alguns, alfinete de lapela, botĂŁo de punho. A raridade Ă© condição indispensĂĄvel desse exibicionismo. SĂł pertencendo a poucos se pode ostentar como diferenciadora. Essa colecção de sĂ­mbolos Ă© descrita com pronĂșncia mais ou menos afectada e tem o objectivo de definir socialmente quem a enumera.
Para esses indivĂ­duos raros, a cultura Ă© caracterizada por aqueles que a consomem. Assim, convĂ©m nĂŁo haver misturas. Conheço melhor o mundo da leitura, por isso, tomo-o como exemplo: se, no inĂ­cio da madrugada, uma dessas mulheres que acorda cedo e faz limpeza em escritĂłrios for vista a ler um determinado livro nos transportes pĂșblicos, os snobs que assistam a essa imagem sĂŁo capazes de enjeitĂĄ-lo na hora. ComeçarĂŁo a definir essa obra como “leitura de empregadas de limpeza” (com muita probabilidade utilizarĂŁo um sinĂłnimo mais depreciativo para descrevĂȘ-las).
Este exemplo aplica-se em qualquer outra ĂĄrea cultural que possa chegar a muita gente: mĂșsica, cinema, televisĂŁo, etc. Aquilo que mais surpreende Ă© que estes “argumentos”, esta forma de falar e de pensar seja utilizada em meios supostamente culturais por indivĂ­duos supostamente cultos,

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NĂŁo Podemos Ter a Certeza de Nada

Somos todos iguais na fragilidade com que percebemos que temos um corpo e ilusĂ”es. As ambiçÔes que demorĂĄmos anos a acreditar que alcançåvamos, a pouco e pouco, a pouco e pouco, nĂŁo sĂŁo nada quando vistas de uma perspectiva apenas ligeiramente diferente. Daqui, de onde estou, tudo me parece muito diferente da maneira como esse tudo Ă© visto daĂ­, de onde estĂĄs. Depois, hĂĄ os olhos que estĂŁo ainda mais longe dos teus e dos meus. Para esses olhos, esse tudo Ă© nada. Ou esse tudo Ă© ainda mais tudo. Ou esse tudo Ă© mil coisas vezes mil coisas que nos sĂŁo impossĂ­veis de compreender, apreender, porque sĂł temos uma Ășnica vida.
— PorquĂȘ, pai?
— NĂŁo sei. Mas creio que Ă© assim. SĂł temos uma Ășnica vida. E foi-nos dado um corpo sem respostas. E, para nos defendermos dessa indefinição, transformĂĄmos as certezas que construĂ­mos na nossa prĂłpria biologia. Fomos e somos capazes de acreditar que a nossa existĂȘncia dependia delas e que nĂŁo serĂ­amos capazes de continuar sem elas. Aquilo em que queremos acreditar corre no nosso sangue, Ă© o nosso sangue. Mas, em consciĂȘncia absoluta, nĂŁo podemos ter a certeza de nada. Nem de nada de nada,

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A Leitura Depara-se com uma Série de Obståculos

A leitura depara-se com uma sĂ©rie de obstĂĄculos, Ă© muito mais fĂĄcil sentarmo-nos no sofĂĄ a ver televisĂŁo do que a ler um jornal atĂ©. E a questĂŁo parece ser esta sociedade de facilistismo em que deixou de se perceber que as coisas que dĂŁo algum trabalho tambĂ©m sĂŁo as que dĂŁo mais prazer, porque sĂŁo conquistadas. A leitura dĂĄ algum trabalho e temos de conquistar um espaço para ela na nossa vida, temos de nos empenhar para absorvĂȘ-la completamente, para que faça sentido. Isso Ă© que se perdeu um pouco de vista, mas penso que quem procura acabarĂĄ por encontrar e tenho esperança de que as pessoas nĂŁo deixem de procurar, nĂŁo desistam, porque baixar os braços Ă© ficar sempre no mesmo sĂ­tio.