Textos sobre Zonas de VergĂ­lio Ferreira

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Textos de zonas de VergĂ­lio Ferreira. Leia este e outros textos de VergĂ­lio Ferreira em Poetris.

Um Mundo de Vidas

NĂłs vivemos da nossa vida um fragmento tĂŁo breve. NĂŁo Ă© da vida geral – Ă© da nossa. É em primeiro lugar a restrita porção do que em cada elemento haveria para viver. Porque em cada um desses elementos há a intensidade com o que poderĂ­amos viver, a profundeza, as ramificações. NĂłs vivemos Ă  superfĂ­cie de tudo na parte deslizante, a que Ă© facilidade e fuga. O resto prende-se irremediavelmente ao escuro do esquecimento e distracção. Mas há sobretudo a zona incomensurável dos possĂ­veis que nĂŁo poderemos viver. Porque em cada instante, a cada opção que fazemos, a cada opção que faz o destino por nĂłs, correspondem as inumeráveis opções que nada para nĂłs poderá fazer. Um golpe de sorte ou de azar, o acaso de um encontro, de um lance, de uma falĂŞncia ou benefĂ­cio fazem-nos eliminar toda uma rede de caminhos para se percorrer um sĂł. Em cada momento há inĂşmeros possĂ­veis, favoráveis ou desfavoráveis, diante de nĂłs. Mas Ă© um sĂł o que se escolheu ou nos calhou.
Assim durante a vida vão-nos ficando para trás mil soluções que se abandonaram e não poderão jamais fazer parte da nossa vida. Regresso à minha infância e entonteço com as milhentas possibilidades que se me puseram de parte.

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O Ser entre o Interior e o Exterior

Era um tipo estranho. Digo bem «um tipo». Olho um homem, uma mulher, e nem sempre me Ă© possĂ­vel tentar sequer abordar-lhe a pessoa por dentro. Porque há indivĂ­duos que irresistivelmente reduzimos a «objectos». SĂŁo os indivĂ­duos «caracterĂ­sticos» com tiques, com uma aparĂŞncia de traços nĂ­tidos. Compreendo a tentação da caricatura: a um olhar sem mistĂ©rio, os homens sĂŁo a caricatura do homem. Por isso o romance tem ignorado a outra zona. Ah, escrever um romance que se gerasse nesse ar rarefeito de nĂłs prĂłprios, no alarme da nossa prĂłpria pessoa, na zona incrĂ­vel do sobressalto! Atingir nĂŁo bem o que se Ă© «por dentro», a «psicologia», o modo Ă­ntimo de se ser, mas a outra parte, a que está antes dessa, a pessoa viva, a pessoa absoluta. Um romance que ainda nĂŁo há… Porque há sĂł ainda romances de coisas – coisas vistas por fora ou coisas vistas por dentro. Um romance que se fixasse nessa iluminação viva de nĂłs, nessa dimensĂŁo ofuscante do halo de nĂłs…