Passagens sobre Noite

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Frases sobre noite, poemas sobre noite e outras passagens sobre noite para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Definição

Quem esquece o amor, e o dissipa, saberá
que sentimento corrompe, ou apenas se o coração
se encontra no vazio da memĂłria? O vento
nĂŁo percorre a tarde com o seu canto alucinado,
que sĂł os loucos pressentem, para que tu
o ignores; nem a sabedoria melancólica das árvores
te oferece uma sombra para que lhe
fujas com um riso ágil de quem crê
na superfĂ­cie da vida. Esses sĂŁo alguns limites
que a natureza põe a quem resiste à convicção
da noite. O caminho está aberto, porém,
para quem se decida a reconhecĂŞ-los; e os prĂłpnos
passos encontram a direcção fácil nos sulcos
que o poema abriu na erva gasta da linguagem. EntĂŁo,
entra nesse campo; nĂŁo receies o horizonte
que a tempestade habita, Ă  tarde, nem o vulto inquieto
cujos braços te chamam. Apropria-te do calor
seco dos vestĂ­bulos. Bebe o licor
das conchas residuais do sexo. Assim, os teus lábios
imprimem nos meus uma marca de sangue, manchando
o verso. Ambos cedemos Ă  promiscuidade do poente,
ignorando as nuvens e os astros. O amor
é esse contacto sem espaço,

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A Vingança Da Porta

Era um hábito antigo que ele tinha:
Entrar dando com a porta nos batentes.
– Que te fez essa porta? a mulher vinha
E interrogava. Ele cerrando os dentes:

– Nada! traze o jantar! – Mas Ă  noitinha
Calmava-se; feliz, os inocentes
Olhos revĂŞ da filha, a cabecinha
Lhe afaga, a rir, com as rudes mĂŁos trementes.

Urna vez, ao tornar Ă  casa, quando
Erguia a aldraba, o coração lhe fala:
Entra mais devagar… – Pára, hesitando…

Nisto nos gonzos range a velha porta,
Ri-se, escancara-se. E ele vĂŞ na sala,
A mulher como doida e a filha morta.

Projecto de SucessĂŁo

Para o Mário Henrique

Continuar aos saltos até ultrapassar a Lua
continuar deitado até se destruir a cama
permanecer de pé até a polícia vir
permanecer sentado até que o pai morra

Arrancar os cabelos e não morrer numa rua solitária
amar continuamente a posição vertical
e continuamente fazer ângulos rectos

Gritar da janela até que a vizinha ponha as mamas de fora
por-se nu em casa até a escultora dar o sexo
fazer gestos no café até espantar a clientela
pregar sustos nas esquinas até que uma velhinha caia
contar histĂłrias obscenas uma noite em famĂ­lia
narrar um crime perfeito a um adolescente loiro
beber um copo de leite e misturar-lhe nitro-glicerina
deixar fumar um cigarro só até meio
Abrirem-se covas e esquecerem-se os dias
beber-se por um copo de oiro e sonharem-se Ă­ndias.

Natal Ă  Beira-Rio

É o braço do abeto a bater na vidraça?
E o ponteiro pequeno a caminho da meta!
Cala-te, vento velho! É o Natal que passa,
A trazer-me da água a infância ressurrecta.
Da casa onde nasci via-se perto o rio.
TĂŁo novos os meus Pais, tĂŁo novos no passado!
E o Menino nascia a bordo de um navio
Que ficava, no cais, Ă  noite iluminado…
É noite de Natal, que travo a maresia!
Depois fui nĂŁo sei quem que se perdeu na terra.
E quanto mais na terra a terra me envolvia
E quanto mais na terra fazia o norte de quem erra.
Vem tu, Poesia, vem, agora conduzir-me
Ă  beira desse cais onde Jesus nascia…
Serei dos que afinal, errando em terra firme,
Precisam de Jesus, de Mar, ou de Poesia?

A MĂŁe e o Filho

Teu sĂŞr tragicamente enternecido,
Em desespero de alma transformado,
Vae através do espaço escurecido
E pousa no seu tumulo sagrado.

E ele acorda, sentindo-o; e, comovido,
Chora ao vĂŞr teu espirito adorado,
Assim tĂŁo sĂł na noite e arrefecido
E todo de ĂŞrmas lagrimas molhado!

E eis que ele diz: “Ă“ MĂŁe, nĂŁo chores mais!
Em vez dos teus suspiros, dos teus ais,
Quero que venha a mim tua alegria!”

E só nas horas em que a Mãe descança,
É que ele inclina a fronte de creança
E dorme ao pé de ti, Virgem Maria!

Tenho Tudo

Tenho tudo o que nĂŁo quero.
Perder nĂŁo Ă© senĂŁo o intervalo
entre aguardar e nada ter.
(Que melodia Ă© esta que povoa
o espaço em meu redor?)

Tenho tudo. Nada quero.
Meu coração desconhece
o compasso que amanhece
tudo em torno.
No entanto,
meus passos seguem.
No encalço de quê?

Tenho tudo: a noite
abrigada em meu peito,
a mĂşsica de meus passos,
a relva, a distância coberta
por inesquecĂ­vel melodia.
NĂŁo quero mais do que tenho.
(Um canto flutua no ar vazio.)

Tenho tudo:
os pássaros que me fogem dos olhos
para saudar, no horizonte,
a Ăşmida manhĂŁ que principia.

Conversa Sentimental

No velho parque deserto e gelado
Duas formas passaram há bocado.

Com os olhos mortos e os lábios moles,
Mal se ouvem, a custo, as suas vozes.

No velho parque deserto e gelado
Dois espectros evocaram o passado.

— Recordas-te do nosso êxtase antigo?
— Por que razão acha que ainda consigo?

— Bate, ao ouvires meu nome, o coração?
Vês ainda a minha alma em sonhos? — Não.

— Ah! bons tempos de prazer indizível
Unindo as nossas bocas! — É possível.

— Como era azul, o céu, e grande a esperança!
— Mas é prò negro céu que hoje se lança.

Lá caminhavam plas aveias loucas
E sĂł a noite ouviu as suas bocas.

Tradução de Fernando Pinto do Amaral

À Tua Porta Há um Pinheiro Manso

À tua porta há um pinheiro manso
De cabeça pendida, a meditar,
Amor! Sou eu, talvez, a contemplar
Os doces sete palmos do descanso.

Sou eu que para ti atiro e lanço,
Como um grito, meus ramos pelo ar,
Sou eu que estendo os braços a chamar
Meu sonho que se esvai e não alcanço.

Eu que do sol filtro os ruivos brilhos
Sobre as louras cabeças dos teus filhos
Quando o meio-dia tomba sobre a serra…

E, Ă  noite, a sua voz dolente e vaga
É o soluço da minha alma em chaga:
Raiz morta de sede sob a terra!

Mais Luz!

(A Guilherme de Azevedo)

Amem a noite os magros crapulosos,
E os que sonham com virgens impossĂ­veis,
E os que inclinam, mudos e impassĂ­veis,
Ă€ borda dos abismos silenciosos…

Tu, lua, com teus raios vaporosos,
Cobre-os, tapa-os e torna-os insensĂ­veis,
Tanto aos vicios crueis e inextinguiveis,
Como aos longos cuidados dolorosos!

Eu amarei a santa madrugada,
E o meio-dia, em vida refervendo,
E a tarde rumorosa e repousada.

Viva e trabalhe em plena luz: depois,
Seja-me dado ainda ver, morrendo,
O claro sol, amigo dos heroes!

PĂ´s-se o Sol

PĂ´s-se o sol… Como já na sombra feia
Do dia pouco a pouco a luz desmaia,
E a parda mĂŁo da noite, antes que caia,
De grossas nuvens todo o ar semeia!

Apenas já diviso a minha aldeia;
Já do cipreste não distingo a faia.
Tudo em silêncio está; só lá na praia
Se ouvem quebrar as ondas pela areia.

Co’a mão na face, a vista ao céu levanto;
E cheio de mortal melancolia,
Nos tristes olhos mal sustenho o pranto.

E se inda algum alĂ­vio ter podia,
Era ver esta noite durar tanto
Que nunca mais amanhecesse o dia!

De Noite

Quando me deito ao pé da minha dôr,
Minha Noiva-phantasma; e em derredor
Do meu leito, a penumbra se condensa,
E já não vejo mais que a noite imensa,
Ante os meus olhos intimos, acĂŞsos,
Extaticos, surprĂŞsos,
Aparece-me o Reino Espiritual…
E ali, despido o habito carnal,
Tu brincas e passeias; nĂŁo comigo,
Mas com a minha dĂ´r… o amĂ´r antigo.

A minha dôr está comtigo ali,
Como, outrora, eu estava ao pĂ© de ti…
Se fĂ´sse a minha dĂ´r, com que alegria,
De novo, a tua face beijaria!

Mas eu nĂŁo sou a dĂ´r, a dĂ´r etĂ©rea…
Sou a Carne que soffre; esta miseria
Que no silencio clama!

A Sombra, o Corpo doloroso, o Drama…

Meu Pai

A Eloy

Desce, meu Pai, a noite baixou mansa.
Nem uma nuvem se vê mais no céu:
Aninharam-se aqui no peito meu,
Onde, chorando, a negra dor descansa.

Quando morreste eu era bem criança,
Balbuciava, sim, o nome teu,
Mas d’este rosto santo que morreu
Já não conservo a mínima lembrança.

A noite Ă© clara; e eu, aqui sentada,
Tenho medo da lua embalsamada,
Corta-me o frio a alma comovida.

Se lá no Céu teu coração padece,
Vem comigo rezar a mesma prece:
Tua bênção, meu pai, me dará vida!

Setentrional

Talvez já te não lembres, triste Helena,
Dos passeios que dávamos sozinhos,
Ă€ tardinha, naquela terra amena,
No tempo da colheita dos bons vinhos.

Talvez já te não lembres, pesarosa,
Da casinha caiada em que moramos,
Nem do adro da ermida silenciosa,
Onde nĂłs tantas vezes conversamos.

Talvez já te esquecesses, ó bonina,
Que viveste no campo sĂł comigo,
Que te osculei a boca purpurina,
E que fui o teu sol e o teu abrigo.

Que fugiste comigo da Babel,
Mulher como não há nem na Circássia,
Que bebemos, nĂłs dois, do mesmo fel,
E regamos com prantos uma acácia.

Talvez já te não lembres com desgosto
Daquelas brancas noites de mistério,
Em que a Lua sorria no teu rosto
E nas lajes campais do cemitério.

Talvez já se apagassem as miragens
Do tempo em que eu vivia nos teus seios,
Quando as aves cantando entre as ramagens
O teu nome diziam nos gorjeios.

Quando, à brisa outoniça, como um manto,
Os teus cabelos de âmbar, desmanchados,
Se prendiam nas folhas dum acanto,

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A Voz da TĂ­lia

Diz-me a tĂ­lia a cantar: “Eu sou sincera,
Eu sou isto que vês: o sonho, a graça,
Deu ao meu corpo, o vento, quando passa,
Este ar escultural de bayadera…

E de manhĂŁ o sol Ă© uma cratera,
Uma serpente de oiro que me enlaça…
Trago nas mĂŁos as mĂŁos da Primavera…
E é para mim que em noites de desgraça

Toca o vento Mozart, triste e solene,
E Ă  minha alma vibrante, posta a nu,
Diz a chuva sonetos de Verlaine…”

E, ao ver-me triste, a tĂ­lia murmurou:
“Já fui um dia poeta como tu…
Ainda hás de ser tĂ­lia como eu sou…”

E por Vezes

E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos    E por vezes

encontramos de nĂłs em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites      não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos

No Seu Tumulo

Sobre o seu frio berço sepulcral,
Meu espirito resa ajoelhado;
E sente-se perfeito e virginal
Na sua dĂ´r divina concentrado.

CaĂ­, gotas de orvalho matinal!
Astros, caí do céu todo estrelado!
Sêcas flôres do zéfiro outomnal,
Vinde enfeitar-lhe o tumulo sagrado!

Ă“ luar da meia noite, encantamento
De sombra, vem cobri-lo! Ă“ doido Vento,
Dorme com ele, em paz religiosa…

Sobre ele, Ăł terra, sĂŞ brandura apenas;
Faze-te luz, toma o calor das pennas;
SĂŞ MĂŁe perfeita, bĂ´a e carinhosa.

ConfissĂŁo

Vivo um drama interior.
Já nele pouco a pouco me consumo.
E de tanto te buscar,
Mas sem nunca te encontrar,
Sou como um barco sem leme,
Que perdesse o rumo,
No alto mar.

Da minha vida, assim,
O que vai ser nem sei!
Dias alegres houvesse…
E os dias sĂŁo para mim
Rosas mortas de um jardim
Que um vendaval desfizesse.

Tenho horas bem amargas.
Eu o confesso,
Eu o digo.
E se tudo passa e esqueço,
Esquecer o teu perfil
É coisa que eu não consigo.

Sofro por ti. O frio do que morre
Amortalha a minha alma em saudade.
Atrás de uma ilusão a minha vida corre,
Como se fora atrás de uma verdade.

A Deus peço, por fim, o meu sossego antigo.
NĂŁo me persiga mais o teu busto delgado.
Passo os dias e as noites a sonhar contigo,
Na cruz da tua ausĂŞncia estou crucificado.

A tua falta sinto. NĂŁo o oculto.
Ocultá-lo seria uma mentira.
Vejo por toda a parte a sombra do teu vulto,

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PrĂłlogo

Cavo a cova como um cavalo os cascos cava
se no cavá-lo invoca a fúria de ferir
E tanto mais se cava que a alma nĂŁo se lava
e as águas já me levam léguas a fingir

Cava costura cavo Ă  cava enviesada
e o talhe tinge a sombra em descaĂ­da pena
Nessa escritura a sina foge desgarrada
e o corte torce a mĂŁo e a garra do poema

E dono nĂŁo sou mais senĂŁo o torto artĂ­fice
dessas linhas traçadas a dois e por um
E assim me assino esse uno e esse outro Majnun
que por louca paixĂŁo da noite Ă© seu partĂ­cipe

mesmo sem Laila veste a dor e se vislumbra
nos lobos do deserto donos da penumbra