Poemas sobre InĂșteis

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Poemas de inĂșteis escritos por poetas consagrados, filĂłsofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

ConfissĂŁo

Meus lĂĄbios, meus olhos (a flor e o veludo…)
Minha ideia turva, minha voz sonora,
Meu corpo vestido, meu sonho desnudo…
Senhor confessor! Sabeis tudo — tudo!
Quanto o vulgo, ingénuo, ao saudar-me, ignora!

Sabeis que em meus beijos a fome dormira
Antes que da orgia a fĂ© despertasse…
Sabeis que sem oiro o mundo Ă© mentira
E, como do fruto que Deus proibira,
Um luar tombou, manchando-me a face.

PĂĄssaro, cativo da noite infinita!
Águia de asa inĂștil, pela noite presa!
Ó cruz dos poetas! ó noite infinita!
Ó palavra eterna! minha Ășnica escrita!
Beleza! Beleza! Beleza! Beleza!

Eis as minhas mĂŁos! Quem pode prendĂȘ-las?
SĂŁo frĂĄgeis, mas nelas hĂĄ dedos inteiros.
Senhor confessor! Quem nĂŁo conta estrelas?
Meus dedos, um dia, contaram estrelas…
Quem conta as estrelas nĂŁo conta dinheiros!

Ode Triunfal

À dolorosa luz das grandes lĂąmpadas elĂ©ctricas da fĂĄbrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.

Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fĂșria!
Em fĂșria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lĂĄbios secos, Ăł grandes ruĂ­dos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensaçÔes,
Com um excesso contemporĂąneo de vĂłs, Ăł mĂĄquinas!

Em febre e olhando os motores como a uma Natureza tropical –
Grandes trĂłpicos humanos de ferro e fogo e força –
Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro,
Porque o presente Ă© todo o passado e todo o futuro
E hå Platão e Virgílio dentro das måquinas e das luzes eléctricas
SĂł porque houve outrora e foram humanos VirgĂ­lio e PlatĂŁo,
E pedaços do Alexandre Magno do século talvez cinquenta,

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Adormecer

Vai vida na madrugada fria.

O teu amante fica,
na posse deste momento que foi teu,
amorfo e sem limites como um anjo;
a cabeça cheia de estrelas…
Fica abraçado a esta poeira que teu pé levantou.
Fica inĂștil e hirto como um deus,
desfalecendo na raiva de nĂŁo poder seguir-te!

ConfissĂŁo

É certo que me repito,
Ă© certo que me refuto
e que, decidido, hesito
no entra-e-sai de um minuto.

É certo que irresoluto
entre o velho e o novo rito
atiro Ă  cesta o absoluto
como inĂștil papelito.

É tão certo que me aperto
numa tenaz de mosquito
como Ă© trinta vezes certo
que me oculto no meu grito.

Certo, certo, certo, certo
que mais sinto que reflicto
as fĂĄbulas do deserto
do raciocĂ­nio infinito.

É tudo certo e prescrito
em nebuloso estatuto.
O homem, chamar-lhe mito
nĂŁo passa de anacoluto.

A Lenta Idéia Voa

Solene passa sobre a fértil terra
A branca, inĂștil nuvem fugidia,
Que um negro instante de entre os campos ergue
Um sopro arrefecido.

Tal me alta na alma a lenta idéia voa
E me enegrece a mente, mas jĂĄ torno,
Como a si mesmo o mesmo campo, ao dia
Da imperfeita vida.

SilĂȘncio, Nostalgia…

SilĂȘncio, nostalgia…
Hora morta, desfolhada,
sem dor, sem alegria,
pelo tempo abandonada.

Luz de Outono, fria, fria…
Hora inĂștil e sombria
de abandono.
Não sei se é tédio, sono,
silĂȘncio ou nostalgia.

InterminĂĄvel dia
de indizíveis cansaços,
de funda melancolia.
Sem rumo para os meus passos,
para que servem meus braços,
nesta hora fria, fria?

Abdicação

Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços
E chama-me teu filho.
Eu sou um rei
que voluntariamente abandonei
O meu trono de sonhos e cansaços.

Minha espada, pesada a braços lassos,
Em mĂŁo viris e calmas entreguei;
E meu cetro e coroa — eu os deixei
Na antecùmara, feitos em pedaços

Minha cota de malha, tĂŁo inĂștil,
Minhas esporas de um tinir tĂŁo fĂștil,
Deixei-as pela fria escadaria.

Despi a realeza, corpo e alma,
E regressei Ă  noite antiga e calma
Como a paisagem ao morrer do dia.

O Mesmo

O mesmo Teucro duce et auspice Teucro
É sempre cras — amanhã — que nos faremos ao mar.

Sossega, coração inĂștil, sossega!
Sossega, porque nada hĂĄ que esperar,
E por isso nada que desesperar tambĂ©m…
Sossega… Por cima do muro da quinta
Sobe longĂ­nquo o olival alheio.
Assim na infĂąncia vi outro que nĂŁo era este:
NĂŁo sei se foram os mesmos olhos da mesma alma que o viram.
Adiamos tudo, até que a morte chegue.
Adiamos tudo e o entendimento de tudo,
Com um cansaço antecipado de tudo,
Com uma saudade prognĂłstica e vazia.

Percam para Sempre

Percam para sempre as tuas mĂŁos o jeito de pedir.
Esqueça para sempre a tua boca
O que disse a rezar.
E os teus olhos nunca mais, nunca mais saibam chorar
Porque Ă© inĂștil.

Faz como os outros fizeram
Quando chegou o momento
De perder o medo Ă  morte
Por ter muito amor Ă  vida.

À Memória de Minha Mãe

MĂŁe! Morreste!
Agora Ă© tĂŁo tarde para te dizer as palavras necessĂĄrias.
O relógio bateu duas e meia. É noite escura
E a dor galopa surdamente no meu peito.
Teu corpo jaz ainda morno, jĂĄ sem interesse para ti.
Por tua causa, amanhĂŁ, movimentar-se-ĂŁo pessoas
Diversas
Que nĂŁo te conheceram.
Serão preenchidos papéis: requerimentos, boletins;
PĂĄs ou picaretas (nem eu sei) ferirĂŁo a terra
E sobre ela erguerĂŁo, depois, um nĂșmero qualquer
Que serĂĄ de futuro o teu bilhete de identidade.
Agora, porém, tudo ainda é quieto.
SĂł um galo canta, feliz, na sua inconsciĂȘncia de ser vivo.
As lĂĄgrimas rompem-me incontrolĂĄveis e inĂșteis.
É tarde!
JĂĄ sĂł existem saudades e fotografias.
As palavras que eu amaria ter-te dito
Sobem-me ao silĂȘncio dos lĂĄbios cerrados.
LĂĄ fora a chuva molha a madrugada
Enquanto os familiares se olham
Com o rosto congestionado de lĂĄgrimas
E sono interrompido,
Adorando-te em silĂȘncio,
Mais que nunca,
— Esmagados pelo prestígio da morte.

Embirração

(A Machado de Assis)

A balda alexandrina é poço imenso e fundo,
Onde poetas mil, flagelo deste mundo,
Patinham sem parar, chamando lĂĄ por mim.
NĂŁo morrerĂŁo, se um verso, estiradinho assim,
Da beira for do poço, extenso como ele é,
Levar-lhes grosso anzol; então eu tenho fé
Que volte um afogado, Ă  luz da mocidade,
A ver no mundo seco a seca realidade.

Por eles, e por mim, receio, caro amigo;
Permite o desabafo aqui, a sĂłs contigo,
Que Ă  moda fazer guerra, eu sei quanto Ă© fatal;
Nem vence o positivo o frĂ­volo ideal;
DespĂłtica em seu mando, Ă© sempre fĂĄtua e vĂŁ,
E até da vã loucura a moda é prima-irmã:
Mas quando venha o senso erguer-lhe os densos véus,
Do verso alexandrino hĂĄ de livrar-nos Deus.

Deus quando abre ao poeta as portas desta vida,

NĂŁo lhe depara o gozo e a glĂłria apetecida;
E o triste, se morreu, deixando mal escritas
Em verso alexandrino histĂłrias infinitas,
Vai ter lĂĄ noutra vida insĂ­pido desterro,
Se Deus, por compaixĂŁo, nĂŁo dĂĄ perdĂŁo ao erro;

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Poema Explicativo

InĂșteis sĂŁo os voos. InĂșteis sĂŁo os pĂĄssaros.
Silenciosas sombras tudo extinguem.
Como as vagas de um mar longĂ­nquo e frio,
sĂŁo de inĂșteis palavras estes versos,
pois o calado tempo esmaga tudo.

Moro num rio inĂștil que caminha
entre margens de musgo e subalternas
pontes e ĂĄguas que reflectem
estrelas, luminĂĄrias, desencanto.

Os peixes nĂŁo obstante jĂĄ nĂŁo dormem.
SĂŁo inĂșteis os sonhos e as amarras
que nos prendem ao cais.
E o sangue que nos leva
em artérias eléctricas de desejo.

JĂĄ somos todos poetas — e a poesia Ă© inĂștil —
antepassados simples de um futuro
remoto onde seremos sinais na rocha, apenas.

GerminarĂĄ o trevo entre os alexandrinos
e nenhum pĂĄssaro compreenderĂĄ o sentido
das pĂĄginas dispersas sobre a areia.

Estas palavras nuas se transformarĂŁo
em pó, em lodo, em traças e raízes.

SĂ©culo XXI

Falam de tudo como se a razĂŁo
lhes ensinasse desesperadamente
a mentir, a lançar
sem remorso nem asco um novo isco
à espera que alguém morda
e acredite nessa liturgia
cujos deuses sĂŁo fĂĄceis de adorar
e obedecem Ă s leis do mercado.

Falam desse ludĂ­brio a que chamam
o futuro
como se ele existisse
e as suas palavras ecoam
em flatulentas frases
sempre a favor do vento que as agita
ao ritmo dos sorrisos ou das entrevistas
em que tudo se vende
por um preço acessível: emoçÔes
& sexo & fama & outros prometidos
paraĂ­sos terrestres em horĂĄrio nobre
– matĂ©ria reciclĂĄvel
alimentando o altar do esquecimento.

O poder nĂŁo existe, como sabes
demasiado bem – apenas uma
inĂștil recidiva biolĂłgica
de hormonas apressadas que procuram
ser fiéis aos comércio
dos sonhos sempre iguais, reproduzindo
sedutoras metĂĄstases do nada
nos cĂłdigos de barras ou nos cromossomas
de quem jĂĄ pouco espera dos seus genes.

Coda

InĂștil escapar. A presença perdura.
Desde que sinto chĂŁo
ou de verde
ou de pedra

Ă© teu rastro que encontro e encontro em ti meu chĂŁo.

E quando te pressinto
o de verde Ă© mais terno
e o de mais dura pedra
um sensĂ­vel durĂąmen.

Tu que arrancas até da rocha viva o sangue,
tu que vens pela foz destes veios de eu te amo:
— Em que sĂ©culo, amor, nossas almas se fundem?
Em que terra?

Através de que mar? Ah que céu
velho cĂ©u jĂĄ chorou por nĂłs — perdidos cĂșmulos —
guaiando em nosso mundo impossĂ­veis azuis?
E desde quando o amor se abriu aos nossos olhos?
De que abrolhos e sal de amar nos marejou?

Em meu solo Ă©s madeiro
e nave
e asa que sonha.
Em todo canto te acho e onde Ă© teu canto eu sou.

Assim Choram os Deuses

Os deuses desterrados.
Os irmĂŁos de Saturno,
Às vezes, no crepĂșsculo
VĂȘm espreitar a vida.

VĂȘm entĂŁo ter conosco
Remorsos e saudades
E sentimentos falsos.
É a presença deles,
Deuses que o destronĂĄ-los
Tornou espirituais,
De matéria vencida,
LongĂ­nqua e inativa.

VĂȘm, inĂșteis forças,
Solicitar em nĂłs
As dores e os cansaços,
Que nos tiram da mĂŁo,
Como a um bĂȘbedo mole,
A taça da alegria.

VĂȘm fazer-nos crer,
Despeitadas ruĂ­nas
De primitivas forças,
Que o mundo Ă© mais extenso
Que o que se vĂȘ e palpa,
Para que ofendamos
A JĂșpiter e a Apolo.

Assim até à beira
Terrena do horizonte
Hiperion no crepĂșsculo
Vem chorar pelo carro
Que Apolo lhe roubou.

E o poente tem cores
Da dor dum deus longĂ­nquo,
E ouve-se soluçar
Para alĂ©m das esferas…
Assim choram os deuses.

Pequenos Poemas Mentais

Mental: nada, ou quase nada sentimental.

I

Quem nĂŁo sai de sua casa,
nĂŁo atravessa montes nem vales,
nĂŁo vĂȘ eiras
nem mulheres de infusa,
nem homens de mangual em riste, suados,
quem vive como a aranha no seu redondel
cria mil olhos para nada.
Mil olhos!
ImplacĂĄveis.
E hoje diz: odeio.
Ontem diria: amo.
Mas odeia, odeia com indĂŽmitos Ăłdios.
E se se aplaca, como acha o tempo pobre!
E a liberdade inĂștil,
inĂștil e vĂŁ,
riqueza de miserĂĄveis.

II

Como sempres, hĂĄ-de-chegar, desde os tempos!
Vozes, cumprimentos, ofegantes entradas.
Mas que vos reunirĂĄ, pensamentos?
Chegais a existir, pensamentos?
É provável, mas desconfiados e inválidos,
Rosnando estĂșpidos, com cĂŁes.

Ó inĂșteis, aquietai-vos!
Voltai como os cĂŁes das quintas
ao ponto da partida, decepcionados.
E enrolai-vos tristonhos, rabugentos, desinteressados.

III

Esse gesto…
Esse desĂąnimo e essa vaidade…
A vaidade ferida comove-me,
comove-me o ser ferido!

A vaidade nĂŁo Ă© generosa, Ă© egoĂ­sta,
Mas chega a ser bela,

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Poema da Hora Escoada

Minhas mĂŁos
– duas chamas dĂ©beis de vela
unidas no mesmo destino.

Minhas mĂŁos
derretidas em cera
que vai escorrendo,
gota a gota,
ao longo do corpo hirto
da vela moribunda.
Que vai escorrendo,
lenta,
na calmaria falsa e densa
da luz delida e mortuĂĄria do meu quarto.

E o livro de Anatomia,
grave e inĂștil,
aberto em frente.

E todo o mundo,
que me espera
e desespera,
nas pĂĄginas inĂșteis e graves
do livro de Anatomia.

E as horas
morrendo, morrendo,
como uma vela que se vai derretendo
no quarto frio de um morto.

Ai! minhas mĂŁos, minhas mĂŁos
– duas chamas dĂ©beis de vela
unidas no mesmo destino!

– Que horas serĂŁo?

A vida
Ă© uma vela de corpo hirto
que se vai derretendo, derretendo,
na calmaria falsa e densa
de um quarto de morto.

Nos Foge o Tempo

Se mais que aéreas nuvens pressuroso,
Se mais que inquietas ondas inconstante,
Nos foge o Tempo; Ă© inĂștil o saudoso
Pranto, dado a quem foge; eu incessante
Quero abarcar, e com ardor ansioso
Entranhar na alma cada alegre instante:
Pois que a vida Ă© passagem, as lindas flores
Bom Ă© colher na estrada dos Amores.

Tenho um Corpo a Sentir o que Ă© de Todos

Tenho um corpo a sentir o que Ă© de todos,
um espelho aonde nĂŁo aparece tudo; nem a mĂŁo que
vai ao sonho tornando menor o ultraje da criança
dividida com fantasmas de adultos. Ali, sĂł permanece
a soma dos noivos deitados sobre a prĂłpria imagem.

E subentende-se o espanto da alma que nĂŁo imita
nada do homem. Ficam as medidas do corte por baixo
dos pontos, pois em cada parte do mundo te junto,
crio o que sou na morte adiantando
esse modelo inĂștil que estĂĄ no berço.

E ele embalança por nada. Não sente o que estå
dentro e não começa nunca antes da saudade: esse nó
que damos em nĂłs mesmos depois de passado o tempo.

É InĂștil Querer Parar o Homem

É inĂștil querer parar o Homem,
o que transforma a pedra em piso,
o piso em casa e a casa em fonte
de novas mĂșsicas da carne
sob as velocidades da luz e da sombra.
É inĂștil querer parar o Homem
acolher sempre um pouco de si prĂłprio
no mistério da vida a cavalgar
os cavalos aéreos da semùntica
sob uma indeferida eternidade.
É inĂștil querer parar o Homem
e o impulso que o transforma sempre
na pĂĄtria sem fim do ato livre
que arranca a vida e o tempo e as coisas
do espelho imĂłvel dos conceitos.
Ah, que mistério maior é este
que liga a liberdade e o homem
e une o homem a outros homens
como o curso de um rio ao mar!
(quando a noite Ă© una e indivisĂ­vel,
nos olhos da mulher que eu amo
acende-se o deus deste segredo
-e uma sombra sĂł nos transporta
ao fundo sem nome da vida.)

É inĂștil querer parar o Homem.
Do que morre fica o gesto alto
a ser o germe de outro gesto
que ainda nem vemos no tempo.

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