Poemas sobre Lábios

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Poemas de lábios escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Hino à Dor

Sorri com mais doçura a boca de quem sofre,
Embora amargue o fel que os seus lábios beberam;
É mais ardente o olhar onde, como um aljofre,
A Dor se condensou e as lágrimas correram.

Soa, como se um beijo ou uma carícia fosse,
A voz que a soluçar na Desgraça aprendeu;
E não há para nós consolação mais doce
Que o regaço de quem muito amou e sofreu.

Voz, que jamais vibrou num soluço de mágoa,
Ao nosso coração nunca pode chegar…
Mas o pranto, ao cair duns olhos rasos de água,
Torna mais penetrante e mais profundo o olhar.

Lábio, que só bebeu na fonte da Alegria,
É frio, como o olhar de quem nunca chorou;
A Bondade é uma flor que se alimenta e cria
Dos resíduos que a Dor no coração deixou.

Em tudo quanto existe o Sofrimento imprime
Uma augusta expressão… mesmo a Suprema Graça,
Dando aos versos do Poeta esse esmalte sublime
Que torna imorredoira a Inspiração que passa.

É por isso que a Dor, sem trégua nem guarida,

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Nevermore

Ah, lembrança, lembrança, que me queres? O Outono
Fazia voar os tordos plo ar desmaiado

E o sol dardejava um monótono raio
No bosque amarelado onde a nortada ecoa.

A sonhar caminhávamos os dois, a sós,
Ela e eu, pensamento e cabelos ao vento.
De repente, fitou-me em olhar comovente:
«Qual foi o teu mais belo dia?» disse a voz

De oiro vivo, sonora, em fresco timbre angélico.
Um sorriso discreto deu-lhe a minha réplica
E então, como um devoto, beijei-lhe a mão branca.

— Ah! as primeiras flores, como são perfumadas!
E como em nós ressoa o murmúrio vibrante
Desse primeiro sim dos lábios bem-amados!

Tradução de Fernando Pinto do Amaral

Canção Póstuma

Fiz uma canção para dar-te;
porém tu já estavas morrendo.
A Morte é um poderoso vento.
E é um suspiro tão tímido, a Arte…

É um suspiro tímido e breve
como o da respiração diária.
Choro de pomba. E a Morte é uma águia
cujo grito ninguém descreve.

Vim cantar-te a canção do mundo,
mas estás de ouvidos fechados
para os meus lábios inexatos,
— atento a um canto mais profundo.

E estou como alguém que chegasse
ao centro do mar, comparando
aquele universo de pranto
com a lágrima da sua face.

E agora fecho grandes portas
sobre a canção que chegou tarde.
E sofro sem saber de que Arte
se ocupam as pessoas mortas.

Por isso é tão desesperada
a pequena, humana cantiga.
Talvez dure mais do que a vida.
Mas à Morte não diz mais nada.

Os Filhos São Figuras Estremecidas

Os filhos são figuras estremecidas
e, quando dormem, a felicidade
cerra-lhes as pálpebras, toca-lhes
os lábios, ama-os sobre as camas.
É por mim que chamam quando temem
o eclipse e o temporal. Trazem nos cabelos
o aroma do leite e da festa das rosas.
Voam-me por entre os dedos, por entre
as malhas da rede de espuma
que lanço a seus pés. Reinam
num sítio de penumbra onde não
me atrevo sequer a dizer quem sou.

Para Voltar

A ver-te
Um só instante,
A ti,
Que és mais bela que a lua,
Antes que a manhã recolha
As estrelas
Uma a uma
E as guarde
Do outro lado do céu,

Vou atravessar
O rio
Coberto de holofotes,
Que transformam o verde claro
Numa fosforescência
De água assustada.

Se não me matarem
Nem me apanharem vivo,
Mantém-te alerta
Mantém alerta
O desejo mais antigo
e o mais novo.

Vou passar
Do lado de fora
Da parede
Perfurada
Pelas balas:

Passa-me um lenço
De seda
Com o teu perfume.

Marca-o com o segredo
Dos teus lábios.

Cacida da Mulher Estendida

Despida ver-te é recordar a terra.
A terra lisa, limpa de cavalos.
A terra sem um junco, forma pura
ao futuro cerrada: argêntea fímbria.

Despida ver-te é compreender a ânsia
da chuva que procura débil talhe,
ou a febre do mar de imenso rosto
sem a luz encontrar de sua face.

O sangue soará pelas alcovas
e virá com espada fulgurante,
mas tu não saberás onde se oculta
o coração de sapo ou a violeta.

Teu ventre é uma luta de raízes,
teus lábios, uma aurora sem contorno,
por sob as rosas tépidas da cama
os mortos gemem esperando vez.

Tradução de Oscar Mendes

Nocturno a Duas Vozes

— Que posso eu fazer
senão beber-te os olhos
enquanto a noite
não cessa de crescer?

— Repara como sou jovem,
como nada em mim
encontrou o seu cume,
como nenhuma ave
poisou ainda nos meus ramos,
e amo-te,
bosque, mar, constelação.

— Não tenhas medo:
nenhum rumor,
mesmo o do teu coração,
anunciará a morte;
a morte
vem sempre doutra maneira,
alheia
aos longos, brancos
corredores da madrugada.

— Não é de medo
que tremem os meus lábios,
tremo por um fruto de lume
e solidão
que é todo o oiro dos teus olhos,
toda a luz
que meus dedos têm
para colher na noite.

— Vê como brilha
a estrela da manhã,
como a terra
é só um cheiro de eucaliptos,
e um rumor de água
vem no vento.

— Tu és a água, a terra, o vento,
a estrela da manhã és tu ainda.

— Cala-te, as palavras doem.
Como dói um barco,
como dói um pássaro
ferido
no limiar do dia.

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Gosto de Amar

gosto de amar com os dedos,
encontrar o centímetro em que nasce o orgasmo
em ti, perceber a extensão da forma como te sobressaltas,
e encostar-te o meu ouvido à boca para ouvir a voz de
deus.

gosto de amar com os olhos,
gastar a hipótese do sono e ver-te adormecer,
a noite escura e o silêncio de um abraço,
e se queres que te diga
só te escolhi por engano, queria o amor dos livros
e virei escritor, os dias inteiros à espera do teu corpo
para que as metáforas aconteçam.

gosto de amar com as lágrimas,
praticar o abismo, a largura estreita dos teus lábios,
a sensação de mar excessivo da tua língua,
até a maneira como me percorres o sexo
com a extremidade da tua respiração parada,
e sobretudo submeter-me ao castigo da emoção
de te amar ainda depois do final do prazer,
a pequena morte acabada
e a vida toda outra vez a começar.

gosto de amar com o que me resta,
e tudo o que sei é que me resta amar-te.

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A Dama de Elche

Seus olhos
pararam no limiar. Mas a morte
participa também do mistério da vida,
e essas amêndoas que mantém
explícitas ao nada, anunciam
outra árvore em nós.

Toda a feição já se concentra
no que os olhos não dizem. Antes
fossem fechados,
como os lábios na dureza do mento,
e a ciência ou a razão que nos perturba
não deixariam no berloque aguerrido
essa espantosa serenidade gélida de amor.

Mulher-senhora. Mãe?
Nos adornos
da espera, (nossa
a dúvida) fica a vida
que freme, e os abismos
que a beleza flanqueiam. Até que os pés
alados
despertem a princesa. Então,
Deus a recolhe,
e roça
nossas parcas medidas. A morte
desancora. Pela rigidez
da inacessível máscara, escorre
como as chuvas
o seu íntimo trabalho de existir.

No Meu País

No meu país
dardejado de sol e da caca dos gaios
só há estâncias
(de veraneio) na poesia.
Nossos lábios
a um metro e sessenta e tal
do chão amarelecido
dos símbolos
abrem para fora
por dois gomos de frio.
Nossos lábios outonais, digo,
outonais doze meses.
No entanto
à flor da possível
geografia
um frémito cinde
as estações do ano.

As orações dos homens
Subam eternamente aos teus ouvidos;
Eternamente aos teus ouvidos soem
Os cânticos da terra.

No turvo mar da vida,
Onde aos parcéis do crime a alma naufraga,
A derradeira bússola nos seja,
Senhor, tua palavra.

A melhor segurança
Da nossa íntima paz, Senhor, é esta;
Esta a luz que há de abrir à estância eterna
O fulgido caminho.

Ah ! feliz o que pode,
No extremo adeus às cousas deste mundo,
Quando a alma, despida de vaidade,
Vê quanto vale a terra;

Quando das glórias frias
Que o tempo dá e o mesmo tempo some,
Despida já, — os olhos moribundos
Volta às eternas glórias;

Feliz o que nos lábios,
No coração, na mente põe teu nome,
E só por ele cuida entrar cantando
No seio do infinito.

A Minha Religião é o Novo

A minha Religião é o Novo.
Este dia, por exemplo; o pôr do Sol,
estas invenções habituais: o Mar.
Ainda:
os cisnes a Ralhar com a água. A Rapariga mais bonita que
ontem.
Deus como habitante único.
Todos somos estrangeiros a esta Região, cujo único habitante
verdadeiro é Deus (este bem podia ser o Rótulo do nosso
Frasco).
Dele também se podia dizer, como homenagem:
Hóspede discreto.
Ou mais pomposamente:
O Enorme Hóspede discreto.
Ou dizer ainda, para demorar Deus mais tempo nos lábios ou
neste caso no papel, na escrita, dizer ainda, no seu epitáfio que
nunca chega, que nunca será útil, dizer dele:
em todo o lado é hóspede,
e em todo o lado é Discreto.

A Demora

O amor nos condena:
demoras
mesmo quando chegas antes.
Porque não é no tempo que eu te espero.

Espero-te antes de haver vida
e és tu quem faz nascer os dias.

Quando chegas
já não sou senão saudade
e as flores
tombam-me dos braços
para dar cor ao chão em que te ergues.

Perdido o lugar
em que te aguardo,
só me resta água no lábio
para aplacar a tua sede.

Envelhecida a palavra,
tomo a lua por minha boca
e a noite, já sem voz
se vai despindo em ti.

O teu vestido tomba
e é uma nuvem.
O teu corpo se deita no meu,
um rio se vai aguando até ser mar.

O Amor é o Homem Inacabado

Todas as árvores com todos os ramos com todas
[as folhas
A erva na base dos rochedos e as casas
[amontoadas
Ao longe o mar que os teus olhos banham
Estas imagens de um dia e outro dia
Os vícios as virtudes tão imperfeitos
A transparência dos transeuntes nas ruas do acaso
E as mulheres exaladas pelas tuas pesquisas
[obstinadas
As tuas ideias fixas no coração de chumbo nos
[lábios virgens
Os vícios as virtudes tão imperfeitos
A semelhança dos olhares consentidos com os
[olhares conquistados
A confusão dos corpos das fadigas dos ardores
A imitação das palavras das atitudes das ideias
Os vícios as virtudes tão imperfeitos

O amor é o homem inacabado.

Tradução de António Ramos Rosa

Eternidade

A minha eternidade neste mundo
Sejam vinte anos só, depois da morte!
O vento, eles passados, que, enfim, corte
A flor que no jardim plantei tão fundo.

As minhas cartas leia-as quem quiser!
Torne-se público o meu pensamento!
E a terra a que chamei — minha mulher —
A outros dê seu lábio sumarento!

A outros abra as fontes do prazer
E teça o leito em pétalas e lume!
A outros dê seus frutos a comer
E em cada noite a outros dê perfume!

O globo tem dois pólos: Ontem e hoje.
Dizemos só: — Meu pai! ou só:— Meu filho!
O resto é baile que não deixa trilho.
Rosto sem carne; fixidez que foge.

Venham beijar-me a campa os que me beijam
Agora, frágeis, frívolos e humanos!
Os que me virem, morto, ainda me vejam
Depois da morte, vivo, ainda vinte anos!

Nuvem subindo, anis que se evapora…
Assim um dia passe a minha vida!
Mas, antes, que uma lágrima sentida
Traga a certeza de que alguém me chora!

Adro!

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A Mulher Mais Bonita do Mundo

estás tão bonita hoje. quando digo que nasceram
flores novas na terra do jardim, quero dizer
que estás bonita.

entro na casa, entro no quarto, abro o armário,
abro uma gaveta, abro uma caixa onde está o teu fio
de ouro.

entre os dedos, seguro o teu fino fio de ouro, como
se tocasse a pele do teu pescoço.

há o céu, a casa, o quarto, e tu estás dentro de mim.

estás tão bonita hoje.

os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

estás dentro de algo que está dentro de todas as
coisas, a minha voz nomeia-te para descrever
a beleza.

os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

de encontro ao silêncio, dentro do mundo,
estás tão bonita é aquilo que quero dizer.

Beber Toda a Ternura

Não ter morada
habitar
como um beijo
entre os lábios
fingir-se ausente
e suspirar
(o meu corpo
não se reconhece na espera)
percorrer com um só gesto
o teu corpo
e beber toda a ternura
para refazer
o rosto em que desapareces
o abraço em que desobedeces

Mito

Virá o dia em que o jovem deus será um homem,
sem sofrimento, com o morto sorriso do homem
que compreendeu. Também o sol se move longínquo
avermelhando as praias. Virá o dia em que o deus
já não saberá onde eram as praias de outrora.

Acorda-se uma manhã em que o Verão morreu,
e nos olhos tumultuam ainda esplendores
como ontem e no ouvido os fragores do sol
feito sangue. A cor do mundo mudou.
A montanha já não toca o céu; as nuvens
já não se amontoam como frutos; na água
já não transparece um seixo. O corpo dum homem
curva-se pensativo onde um deus respirava.

O grande sol acabou, e o cheiro da terra
e a rua livre, colorida de gente
que ignorava a morte. Não se morre de Verão.
Se alguém desaparecia, havia o jovem deus
que vivia por todos e ignorava a morte.
Nele a tristeza era uma sombra de nuvens.
O seu passo pasmava a terra.

Agora pesa
o cansaço sobre todos os membros do homem,
sem sofrimento: o calmo cansaço da madrugada
que abre um dia de chuva.

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Mãe, os Meninos Andam Distraídos

Mãe, os meninos andam distraídos junto
ao rio e tu não queres saber de os perder.
Sentaste-te a pensar nesse homem que
apareceu e a desfolhar os malmequeres
da tua bata nova — e não viste que te
largaram a mão nem para onde fugiram
com a pressa do vento. Mãe, os meninos

saíram da tua beira para a beira do rio
e tu não queres saber de os chamar. Eles
estendem agora os braços pequeninos
para o sol que brilha sobre as águas
como um punhado de moedas que nunca

hão-de ter — mas tu hoje só conheces
um nome nos teus lábios e nem sequer te
lembras que esse nome não é o que puseste
a nenhum deles. Mãe, os meninos

são tão pequenos e já vão tão longe que
a luz pode cegá-los para sempre. Andam
perdidos no rio há tanto tempo que será
tarde de mais quando gritarem por ti —
porque a ideia do amor é hoje muito maior
do que a voz deles. Mãe, se tu quiseres, eu

posso tomar conta dos meninos,

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Carpe diem

Confias no incerto amanhã? Entregas
às sombras do acaso a resposta inadiável?
Aceitas que a diurna inquietação da alma
substitua o riso claro de um corpo
que te exige o prazer? Fogem-te, por entre os dedos,
os instantes; e nos lábios dessa que amaste
morre um fim de frase, deixando a dúvida
definitiva. Um nome inútil persegue a tua memória,
para que o roubes ao sono dos sentidos. Porém,
nenhum rosto lhe dá a forma que desejarias;
e abraças a própria figura do vazio. Então,
por que esperas para sair ao encontro da vida,
do sopro quente da primavera, das margens
visíveis do humano? “Não”, dizes, “nada me obrigará
à renúncia de mim próprio – nem esse olhar
que me oforece o leito profundo da sua imagem!”
Louco, ignora que o destino, por vezes,
se confunde com a brevidade do verso.