Sonetos sobre Abrigo de Antero de Quental

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Sonetos de abrigo de Antero de Quental. Leia este e outros sonetos de Antero de Quental em Poetris.

Psalmo

Esperemos em Deus! Ele há tomado
Em suas mĂŁos a massa inerte e fria
Da matĂ©ria impotente e, n’um sĂł dia,
Luz, movimento, acção, tudo lhe há dado.

Ele, ao mais pobre de alma, há tributado
Desvelo e amor: ele conduz Ă  via
Segura quem lhe foge e se extravia,
Quem pela noite andava desgarrado.

E a mim, que aspiro a ele, a mim, que o amo,
Que anseio por mais vida e maior brilho.
Ha-de negar-me o termo d’este anseio?

Buscou quem o nĂŁo quiz; e a mim, que o chamo,
Ha-de fugir-me, como a ingrato filho?
Ă“ Deus, meu pai e abrigo! espero!… eu creio!

Evolução

Fui rocha em tempo, e fui no mundo antigo
tronco ou ramo na incĂłgnita floresta…
Onda, espumei, quebrando-me na aresta
Do granito, antiquĂ­ssimo inimigo…

Rugi, fera talvez, buscando abrigo
Na caverna que ensombra urze e giesta;
O, monstro primitivo, ergui a testa
No limoso paĂşl, glauco pascigo…

Hoje sou homem, e na sombra enorme
Vejo, a meus pés, a escada multiforme,
Que desce, em espirais, da imensidade…

Interrogo o infinito e Ă s vezes choro…
Mas estendendo as mãos no vácuo, adoro
E aspiro unicamente Ă  liberdade.