Sonetos sobre Deus de Manuel Maria Barbosa du Bocage

4 resultados
Sonetos de deus de Manuel Maria Barbosa du Bocage. Leia este e outros sonetos de Manuel Maria Barbosa du Bocage em Poetris.

Raios não Peço ao Criador do Mundo

LX

Raios não peço ao Criador do Mundo,
Tormentas nĂŁo suplico ao Rei dos Mares,
VulcÔes à terra, furacÔes aos ares,
Negros monstros ao bĂĄratro profundo:

NĂŁo rogo ao deus de amor que furibundo
Te arremesse do pé de seus altares;
Ou que a peste mortal voe a teus lares,
E murche o teu semblante rubicundo.

Não imploro em teu dano, ainda que os laços
Urdidos pela fé, com vil mudança
Fizeste, ingrata Nise, em mil pedaços:

Não quero outro despique, outra vingança,
Mais que ver-te em poder de indignos braços,
E dizer quem te perde, e quem te alcança.

O poeta asseteado por amor

Ó CĂ©us! Que sinto n’alma! Que tormento!
Que repentino frenesi me anseia!
Que veneno a ferver de veia em veia
Me gasta a vida, me desfaz o alento!

Tal era, doce amada, o meu lamento;
Eis que esse deus, que em prantos se recreia,
Me diz: “A que se expĂ”e quem nĂŁo receia
Contemplar Ursulina um sĂł momento!

“Insano! Eu bem te vi dentre a luz pura
De seus olhos travessos, e cum tiro
Puni tua sacrĂ­lega loucura:

“De morte, por piedade hoje te firo;
Vai pois, vai merecer na sepultura
À tua linda ingrata algum suspiro.”

Dos Tórrido SertÔes, Pejados De Oiro

Dos tórridos sertÔes, pejados de oiro,
Saiu um sabichĂŁo de escassa fama,
Que os livros preza, os cartapĂĄcios ama,
Que das lĂ­nguas repartem o tesoiro.

Arranha o persiano, arranha o moiro,
Sabe que Deus em turco Allah se chama;
Que no grego alfabeto o G Ă© gama,
Que taurus em latim quer dizer toiro.

Para papaguear saiu do mato:
Abocanha talentos, que nĂŁo goza;
É mono, e prega unhadas como gato.

É nada em verso, quase nada em prosa:
NĂŁo conheces, leitor, neste retrato
O guapo charlatão Tomé Barbosa?

Meu Ser Evaporei na Luta Insana

Meu ser evaporei na luta insana
Do tropel de paixÔes que me arrastava:
Ah! cego eu cria, ah! mĂ­sero eu sonhava
Em mim quasi imortal a essĂȘncia humana!

De que inĂșmeros sĂłis a mente ufana
ExistĂȘncia falaz me nĂŁo dourava!
Mas eis sucumbe Natureza escrava
Ao mal, que a vida em sua origem dana.

Prazeres, sĂłcios meus, e meus tiranos!
Esta alma, que sedenta em si nĂŁo coube,
No abismo vos sumiu dos desenganos

Deus, Ăł Deus!… quando a morte a luz me roube,
Ganhe um momento o que perderam anos,
Saiba morrer o que viver nĂŁo soube.