Sonetos sobre Imaginação

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Sonetos de imaginação escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Transforma-se o Amador na Cousa Amada

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois com ele tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
Que como o acidente em seu sujeito,
Assim co’a alma minha se conforma,

Está no pensamento como ideia;
E o vivo e puro amor de que sou feito,
Como a matéria simples busca a forma.

Vou de Suspiros Todo este Ar Enchendo

Vou de suspiros todo est’ ar enchendo,
vou a terra de lágrimas regando,
mais água aos rios, mais às fontes dando,
e com meu fogo em tudo fogo acendo.

E quando os olhos meus, senhora, estendo
para onde o Amor e vós m’estais chamando,
as altas serras em qu’ os vou quebrando
da vista me tolher s’ estão doendo.

Mas nisto acode Amor, que sempre voa;
eu pelas asas, eu pelo arco o tenho,
té me levar consigo onde desejo.

E jurarei, senhora, que vos vejo,
jurarei qu’ essa doce voz me soa.
Nesta imaginação só me sostenho.

Mascarados

Mascarados os dois. Eu, mascarado
na hipocrisia com que levo a vida,
tu, na aparência inútil e fingida
que usas na rua com o maior cuidado …

Passas por mim e segues ao meu lado
como outra qualquer desconhecida,
– quem há de imaginar nosso passado
e a intimidade entre nós dois perdida ?…

Ninguém… Certo ninguém pensa e adivinha
porque eu não digo e porque tu não dizes
Que eu já fui teu… e que tu foste minha…

Mas, quantas vezes, amargurado penso
em como nos sentimos infelizes
no Carnaval do nosso orgulho imenso!

XXVIII

Faz a imaginação de um bem amado,
Que nele se transforme o peito amante;
Daqui vem, que a minha alma delirante
Se não distingue já do meu cuidado.

Nesta doce loucura arrebatado
Anarda cuido ver, bem que distante;
Mas ao passo, que a busco neste instante
Me vejo no meu mal desenganado.

Pois se Anarda em mim vive, e eu nela vivo,
E por força da idéia me converto
Na bela causa de meu fogo ativo;

Como nas tristes lágrimas, que verto,
Ao querer contrastar seu gênio esquivo,
Tão longe dela estou, e estou tão perto.

Barrow-On-Furness I

Sou vil, sou reles, como toda a gente
Não tenho ideais, mas não os tem ninguém.
Quem diz que os tem é como eu, mas mente.
Quem diz que busca é porque não os tem.

É com a imaginação que eu amo o bem.
Meu baixo ser porém não mo consente.
Passo, fantasma do meu ser presente,
Ébrio, por intervalos, de um Além.

Como todos não creio no que creio.
Talvez possa morrer por esse ideal.
Mas, enquanto não morro, falo c leio.

Justificar-me? Sou quem todos são…
Modificar-me? Para meu igual?…
– Acaba lá com isso, ó coração!

Que Amor Sigo?

Que amor sigo? Que busco? Que desejo?
Que enleo é este vão da fantasia?
Que tive? Que perdi? Quem me queria?
Quem me faz guerra? Contra quem pelejo?

Foi por encantamento o meu desejo,
e por sombra passou minha alegria;
mostrou-me Amor, dormindo, o que não via,
e eu ceguei do que vi, pois já não vejo.

Fez à sua medida o pensamento
aquela estranha e nova fermosura
e aquele parecer quase divino.

Ou imaginação, sombra ou figura,
é certo e verdadeiro meu tormento:
Eu morro do que vi, do que imagino.