Natureza
Aos Poetas
Tudo por ti resplende e se constela,
Tudo por ti, suavĂssimo, flameja;
És o pulmão da racional peleja,
Sempre viril, consoladora e bela.Teu coração de pérolas se estrela,
E o bom falerno dás a quem deseja
Vigor, saúde a crença que floreja,
Que as expansões do cérebro revela.Toda essa luz que bebe-se de um hausto
Nos livros sĂŁos, todo esse enorme fausto
Vem das verduras brandas que reluzem!Esse da idéia esplêndido eletrismo,
O forte, o grande, audaz psicologismo,
Os organismos naturais produzem…
Sonetos sobre Pulmões
6 resultadosVĂŁo-Se De Todo Os Pardacentos Nimbos
VĂŁo-se de todo os pardacentos nimbos…
Chovem da luz as nĂtidas faĂscas
E no esplendor de irradiações mouriscas,
Abrem-se as flores em gentis corimbos.Muito mais lestas do que amigos fimbos,
Do Azul cortando as bordaduras priscas,
Pombas do mato esvoaçando, ariscas,
Do cĂ©u se perdem nos profundos limbos.A natureza pulsa como a forja…
Pássaros vibram no clarim da gorja,
As retumbantes, fortes clarinadas.A grande artĂ©ria dos assombros pula…
E do oxigênio, a força que regula
Enche os pulmões a largas baforadas.
Tese e AntĂtese
I
Já não sei o que vale a nova idéia,
Quando a vejo nas ruas desgrenhada,
Torva no aspecto, Ă luz da barricada,
Como bacchante apĂłs lĂşbrica ceia…Sanguinolento o olhar se lhe incendeia;
Respira fumo e fogo embriagada:
A deusa de alma vasta e sossegada
Ei-la presa das fúrias de Medeia!Um século irritado e truculento
Chama Ă epilepsia pensamento,
Verbo ao estampido de pelouro e obuz…Mas a idea Ă© n’um mundo inalterável,
N’um cristalino cĂ©u, que vive estável…
Tu, pensamento, não és fogo, és luz!II
N’um cĂ©u intemerato e cristalino
Pode habitar talvez um Deus distante,
Vendo passar em sonho cambiante
O Ser, como espectáculo divino.Mas o homem, na terra onde o destino
O lançou, vive e agita-se incessante:
Enche o ar da terra o seu pulmĂŁo possante…
Cá da terra blasfema ou ergue um hino…A idĂ©ia encarna em peitos que palpitam:
O seu pulsar sĂŁo chamas que crepitam,
Paixões ardentes como vivos sóis!Combatei pois na terra árida e bruta,
Enquanto outros Combatem
Empunhasse eu a espada dos valentes!
Impelisse-me a acção, embriagado,
Por esses campos onde a Morte e o Fado
Dão a lei aos reis trémulos e ás gentes!Respirariam meus pulmões contentes
O ar de fogo do circo ensanguentado…
Ou caĂra radioso, amortalhado
Na fulva luz dos gládios reluzentes!Já não veria dissipar-se a aurora
De meus inĂşteis anos, sem uma hora
Viver mais que de sonhos e ansiedade!Já não veria em minhas mãos piedosas
Desfolhar-se, uma a uma, as tristes rosas
D’esta pálida e estĂ©ril mocidade!
Auréola Equatorial
A Teodoreto Souto
Fundi em bronze a estrofe augusta dos prodĂgios,
Poetas do Equador, artĂsticos Barnaves;
Que o facho — Abolição — rasgando as nuvens graves
De raios e bulcões — triunfa nos litĂgios!— O rei Mamoud, o Sol, vibrou p’raquelas bandas
do Norte — a grande luz — elĂ©trico, explodindo,
Assim como quem vai, intrépido, subindo
Ă€ luz da idade nova — em claras propagandas.— Os pássaros titĂŁs nos seus conciliábulos,
— Chilreiam, vĂŁo cantando em mĂsticos vocábulos,
Alargam-se os pulmões nevrálgicos das zonas;Abri alas, abri! — Que em tĂşnica de assombros,
Irá passar por vós, com a Liberdade aos ombros,
Como um colosso enorme o impávido Amazonas!
A MĂşsica
A mĂşsica p’ra mim tem seduções de oceano!
Quantas vezes procuro navegar,
Sobre um dorso brumoso, a vela a todo o pano,
Minha pálida estrela a demandar!O peito saliente, os pulmões distendidos
Como o rijo velame d’um navio,
Intento desvendar os reinos escondidos
Sob o manto da noite escuro e frio;Sinto vibrar em mim todas as comoções
D’um navio que sulca o vasto mar;
Chuvas temporais, ciclones, convulsõesConseguem a minh’alma acalentar.
— Mas quando reina a paz, quando a bonança impera,
Que desespero horrĂvel me exaspera!Tradução de Delfim GuimarĂŁes