A Base e o Progresso da Civilização
Os homens mais felizes e mais úteis são feitos de um conjunto harmonioso de actividades intelectuais e morais. E é a qualidade destas actividades e a igualdade do seu desenvolvimento que que conferem a este tipo a sua superioridade sobre os outros. Mas a sua intensidade determina o nível social de um dado indivíduo e faz dele um comerciante ou um director de banco, um pequeno médico ou um professor célebre, um presidente de uma junta de freguesia ou um presidente dos Estados Unidos. O desenvolvimento de seres humanos completos dever ser o objectivo dos nossos esforços. Só neles pode assentar uma civilização sólida.
Existe ainda uma classe de homens que, apesar de tão desarmónicos como os criminosos e os loucos, são indispensáveis à sociedade moderna. São os génios. Estes indivíduos caracterizam-se pelo crescimento monstruoso de uma das actividades psicológicas. Um grande artista, um grande cientista, um grande filósofo é geralmente um homem comum em que uma função se hipertrofiou. Pode também ser comparado a um tumor que se tivesse desenvolvido num organismo normal. Estes seres não equilibrados são, em geral, infelizes. Mas produzem grandes obras, das quais toda a sociedade beneficia. A sua desarmonia gera o progresso da civilização.
Passagens sobre Dever
310 resultadosTrazendo a sua consciência tranquila, nos deveres que a vida lhe deu a cumprir, você pode e deve viver a sua vida tranquila, sem qualquer necessidade de ser infeliz.
Têm-se Deveres Conforme o Alcance do Espírito
Em quase todos os acontecimentos da vida, uma alma generosa vê a possibilidade duma acção de que uma alma comum não tem a mesma ideia. No próprio instante em que a possibilidade dessa acção se torna visível para a alma generosa, é de seu interesse levá-la a cabo. Se não executasse essa acção que acaba de lhe surgir no espírito, desprezar-se-ia a si própria; seria infeliz. Têm-se deveres conforme o alcance do espírito. (…) É contra a natureza do homem, é impossível para o homem não fazer sempre, e em qualquer momento que se queira examiná-lo, o que nesse momento é possível e lhe dá prazer.
A defesa não quer dizer o panegírico da culpa ou do culpado. Sua função consiste em ser, ao lado do acusado, inocente ou criminoso, a voz dos seus direitos legais.(O dever do advogado)
A Racionalidade Irracional
Eu digo muitas vezes que o instinto serve melhor os animais do que a razão a nossa espécie. E o instinto serve melhor os animais porque é conservador, defende a vida. Se um animal come outro, come-o porque tem de comer, porque tem de viver; mas quando assistimos a cenas de lutas terríveis entre animais, o leão que persegue a gazela e que a morde e que a mata e que a devora, parece que o nosso coração sensível dirá «que coisa tão cruel». Não: quem se comporta com crueldade é o homem, não é o animal, aquilo não é crueldade; o animal não tortura, é o homem que tortura. Então o que eu critico é o comportamento do ser humano, um ser dotado de razão, razão disciplinadora, organizadora, mantenedora da vida, que deveria sê-lo e que não o é; o que eu critico é a facilidade com que o ser humano se corrompe, com que se torna maligno.
Aquela ideia que temos da esperança nas crianças, nos meninos e nas meninas pequenas, a ideia de que são seres aparentemente maravilhosos, de olhares puros, relativamente a essa ideia eu digo: pois sim, é tudo muito bonito, são de facto muito simpáticos,
Um Segredo de um Casamento Feliz
Desde que a Maria João e eu fizemos dez anos de casados que estou para escrever sobre o casamento. Depois caí na asneira de ler uns livros profissionais sobre o casamento e percebi que eu não percebo nada sobre o casamento.
Confesso que a minha ambição era a mais louca de todas: revelar os segredos de um casamento feliz. Tendo descoberto que são desaconselháveis os conselhos que ia dar, sou forçado a avisar que, quase de certeza, só funcionam no nosso casamento.
Mas vou dá-los à mesma, porque nunca se sabe e porque todos nós somos muito mais parecidos do que gostamos de pensar.
O casamento feliz não é nem um contrato nem uma relação. Relações temos nós com toda a gente. É uma criação. É criado por duas pessoas que se amam.
O nosso casamento é um filho. É um filho inteiramente dependente de nós. Se nós nos separarmos, ele morre. Mas não deixa de ser uma terceira entidade.
Quando esse filho é amado por ambos os casados – que cuidam dele como se cuida de um filho que vai crescendo -, o casamento é feliz. Não basta que os casados se amem um ao outro.
Mente ou Pedra
Esta cidade é conhecida em todos os arredores por possuir as maiores estrebarias para bois, vacas e cavalos, construções que não ficam a dever nada nem sequer aos edifícios públicos; por outro lado contam-se aqui pelos dedos os locais onde se pode rezar ou discursar com total liberdade.
Em vez de se autocelebrarem por meio da arquitectura, não deveriam as nações fazê-lo pelo poder do seu pensamento abstracto? O Bagavad-Gita é muito mais admirável do que todas as ruínas do oriente. Torres e templos são luxo de príncipes. A mente simples e livre não moureja sob as ordens de nenhum príncipe. O espírito não é privilégio de nenhum imperador, nem são exclusivos deste, a não ser em insignificante medida, a prata, o ouro e o mármore. Com que finalidade, digam-me lá, se talha tanta pedra?
Quando estive na Arcádia, não vi pedras a serem lavradas. As nações são possuídas pela louca ambição de perpetuarem a sua memória com a soma das esculturas que deixam. Que tal se esforços semelhantes fossem despendidos no sentido de aperfeiçoar e polir a sua conduta? Uma obra de bom senso seria mais memorável que um momumento da altura da Lua. Prefiro contemplar as pedras no seu local de origem.
Colocar ao lado da noção de direito a noção de dever, é a tarefa daqueles a quem cabe a missão de solidificar o edifício que a revolução social fundou.
És como o Ar que Respiro
Qual é a força extraordinária que possuis? — pergunto muitas vezes a mim mesmo. Dois ou três princípios cristãos inabaláveis — e por trás milhares de seres que desapareceram ignorados, cumprindo a vida ignorada. Nem sequer se debateram. Entregaram-se. Confiaram. A mulher portuguesa comunica ao lar a ternura com que os pássaros aquecem o ninho. Sua vida dá luz, para alumiar os outros. Foi assim com tão pequenos meios, que me ensinaste. Com uma palavra e mais nada, com um simples olhar, com silêncio e mais nada. Uma atitude fazia-me pensar. E mal sabes tu quando Os teus dedos ágeis trabalhavam a meu lado, teciam ao mesmo tempo o pano grosso de casa e a nossa vida espiritual.
E como tu milhares de seres têem cumprido a vida em silêncio, aceitando-a sem exageros. Nas mãos das mulheres até as coisas vulgares que se fazem na aldeia, cozer o pão, lançar a teia — assumem um carácter sagrado. Elas passam desconhecidas e dispõem dum poder extraordinário. Mantêem a vida ordenada com um sorriso tímido. A mulher está mais perto que nós da natureza e de Deus.
Cada vez me aproximo mais de ti. O que há de puro em mim a ti o devo.
A Vida não me Desapontou
Não, a vida não me desapontou! Pelo contrário, todos os anos a acho melhor, mais desejável, mais misteriosa… desde o dia em que vejo a mim a grande libertadora, a ideia de que a vida podia ser experiência para aqueles que procuram saber, e não dever, fatalidade, duplicidade!… Quanto ao próprio conhecimento, seja ele para outros aquilo que quiser, um leito de repouso, ou o caminho para um leito de repouso, ou distracção ou vagabundagem, para mim é um mundo de perigos, é um universo de vitórias onde os sentimentos heróicos têm a sua sala de baile. «A vida é um meio de conhecimento»; quando se tem este princípio no coração, pode viver-se não somente corajoso mas feliz, pode-se rir alegremente!
Não Creio nesse Deus
I
Não sei se és parvo se és inteligente
— Ao disfrutares vida de nababo
Louvando um Deus, do qual te dizes crente,
Que te livre das garras do diabo
E te faça feliz eternamente.II
Não vês que o teu bem-estar faz d’outra gente
A dor, o sofrimento, a fome e a guerra?
E tu não queres p’ra ti o céu e a terra..
— Não te achas egoísta ou exigente?III
Não creio nesse Deus que, na igreja,
Escuta, dos beatos, confissões;
Não posso crer num Deus que se maneja,
Em troca de promessas e orações,
P’ra o homem conseguir o que deseja.IV
Se Deus quer que vivamos irmãmente,
Quem cumpre esse dever por que receia
As iras do divino padre eterno?…
P’ra esses é o céu; porque o inferno
É p’ra quem vive a vida à custa alheia!
Viver para os outros não é somente a lei do dever, mas também a da felicidade.
Só engrandeceremos nosso direito à vida, cumprindo o nosso dever de cidadão do mundo.
Sempre considerei que escrever fosse o meu dever na terra.
Sou um Verdadeiro Solitário
O meu sentido ardente de justiça social e de dever social estiveram sempre em estranho desacordo com uma marcada carência de necessidade directa de ligação com os homens e com as comunidades humanas. Sou um verdadeiro solitário («Einspänner»), que nunca pertenceu inteiramente e de todo o coração ao Estado, à Pátria, ao círculo dos amigos ou até mesmo à família mais chegada, mas antes pelo contrário experimentou sempre, em relação a todas essas ligações, um sentimento indomável de estranheza e de ânsia de isolamento, um sentimento que com a idade mais se intensifica. Apercebemo-nos nitidamente, mas sem o lamentarmos, que nos é limitada a convivência em sociedade com outros seres humanos. Um homem desta natureza perde, de certo modo, uma parte da sua maneira de ser inocente e despreocupada mas ganha em se sentir largamente independente das opiniões, dos hábitos e juízos dos homens, e não cai na tentação de estabelecer o seu equilíbrio numa base tão pouco sólida.
Política e Moral
Não sabemos se haverá ingenuidade em desejar moral na política e se não terá havido em qualquer nação governantes em que o carácter e a dignidade pessoal tenham julgado de um dever entrar também na vida pública, regrando processos de administração. Não sabemos.
O que sabemos é que a desordem e imoralidade políticas têm um efeito corrosivo na alma das nações. E o abastardamento do carácter nacional não pode deixar de influir no desenvolvimento e progresso de um povo, sob qualquer aspecto que o queiramos considerar.
Nenhum Animal é Insatisfeito
Eu penso que poderia retornar e viver com animais, tão plácidos e autocontidos; eu paro e me ponho a observá-los longamente. Eles não se exaurem e gemem sobre a sua condição; eles não se deitam despertos no escuro e choram pelos seus pecados; eles não me deixam nauseado discutindo o seu dever perante Deus. Nenhum deles é insatisfeito, nenhum enlouquecido pela mania de possuir coisas; nenhum se ajoelha para o outro, nem para os que viveram há milhares de anos; nenhum deles é respeitável ou infeliz em todo o mundo.
O Bem e o Mal
Quando os acontecimentos nos colocam em oposição ao meio envolvente, todos desenvolvemos as forças de que dispomos, ao passo que nas situações em que apenas fazemos o nosso dever nos comportamos, compreensivelmente, como quem paga os seus impostos. Daqui se conclui que tudo o que é mau se pratica com mais ou menos imaginação e paixão, enquanto o bem se caracteriza por uma inconfundível pobreza de afecto e mesquinhez.
(…) Se abstrairmos daquela grande fatia central do mundo e da vida ocupada por pessoas em cujo pensamento as palavras bem e mal deixaram de ter lugar desde que largaram as saias da mãe, então as margens, onde ainda há propósitos morais deliberados, ficam hoje reservadas àquelas pessoas boas-más ou más-boas, das quais algumas nunca viram o bem voar nem o ouviram cantar e por isso exigem de todas as outras que se extasiem com elas diante de uma natureza da moral com pássaros empalhados pousados em árvores mortas; o segundo grupo, por seu lado, os mortais maus-bons, espicaçados pelos seus rivais, manifestam, pelo menos em pensamento, uma tendência para o mal, como se estivessem convencidos de que é apenas nas más acções, menos desgastadas do que as boas, que ainda pulsa alguma vida moral.
O primeiro dever do bom inquisidor é o de suspeitar antes dos que te parecem sinceros.
Vida Incipiente
O facto real da vida é que estamos de novo todos juntos sem se saber como nem porquê, é o imponderável que liga os seres e os deixa andar á deriva como pedaço de cortiça em praia batida pelo norte – o resto, se se quiser analisar, é uma babugem de relações sem eira nem beira ao deslizar da corrente que tanto vem dos outros lados do Atlântico como da disposição em cada um de nós. Os dias foram andando dentro de cada um de nós e na marcha de pormenores domésticos gastámos horas preciosas de nós mesmos. Acerca de comédias fizemos considerações pessoais e quando se tratava de analisar uma tragédia usufruíamos um gozo espiritual de dever cumprido sexualmente.
Passaram-se anos, também não sei quantos. Houve uns que casaram, outros que ficaram para ornamento ímpar de jantares familiares e ainda outros que se ambulanteiam pelas esquinas do vício à procura de óleo para uma máquina donde se desprendeu já a mola real do entendimento.
Afinal também não importa que o ritmo das coisas tenha sido o mesmo, se todas as coisas existem para um ritmo que lhes é íntimo à sua própria expressão de coisas. Houve sábados e domingos sextas e quintas segundas e terças e sempre uma quarta-feira a comandar no equilíbrio do princípio e do fim.