Câmara Escura
A meu pai
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A biografia. Revejo-a em tecidos
fibrosos, retraindo-se. É já visível
a anquilose o vento austero
disperso pelos gestos, mais lentose difíceis. A migração das aves
inicia-se. Junto à costa
atlântica, falava-me do tempo, a viração
nefasta, o nevoeiroporoso, sobre os ossos. Era o período
de estado: rajadas cubitais, golpes
de vento, as migrações da dor, articulares…
As metáforas clínicas. Procura,apesar disso, algum sossego. Invoca ainda
o elemento natal, o livro prematuro
do inverno. E a dureza da neve,
os domínios do gelo, imprevisíveis.Com as chuvas de abril, a migração
atinge órgãos vitais. A violência
perdida pelos móveis, nas janelas
translúcidas, no rumo vagarosoda voz. Vigia os gestos, os indícios de
pânico, a previsível eclosão
da crise. Deformações, desvio dos
dedos no lado cubital, arthritis– o peso das noções.
Endurecem os sons, as linhas vistas
até ao declínio, o vento imóvel
semeado nos campos. Todo o regressopersiste na matéria: os vários
motores de frio,
Passagens sobre Difícil
790 resultadosNão há coisa tão fácil como dar conselho, nem mais difícil que sabê-lo dar.
Não é porque certas coisas são difíceis que nós não ousamos; é justamente porque não ousamos que tais coisas são difíceis.
Eu gostaria de fazer outro filme que nos fizesse rir e chorar e nos fazer sentir bem acerca do mundo em que vivemos. Eu gostaria de fazer qualquer outra coisa que nos pudesse fazer sorrir. Este é um tempo em que precisamos de sorrir mais e é suposto que os filmes de Hollywood façam isso às pessoas que vivem em termpos difíceis.
Creio que seriam desejáveis ambas as coisas, mas, como é difícil reuni-las, é mais seguro ser temido do que amado.
Sem um plano, o que é fácil torna-se difícil; com um plano, o difícil torna-se fácil.
Tirar a batuta de um maestro é tão fácil quanto difícil é reger com ela a quinta sinfonia de Beethoven.
Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta
Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta,
Em que as coisas têm toda a realidade que podem ter,
Pergunto a mim próprio devagar
Porque sequer atribuo eu
Beleza às coisas.Uma flor acaso tem beleza?
Tem beleza acaso um fruto?
Não: têm cor e forma
E existência apenas.
A beleza é o nome de qualquer coisa que não existe
Que eu dou às coisas em troca do agrado que me dão.
Não significa nada.
Então porque digo eu das coisas: são belas?Sim, mesmo a mim, que vivo só de viver,
Invisíveis, vêm ter comigo as mentiras dos homens
Perante as coisas,
Perante as coisas que simplesmente existem.Que difícil ser próprio e não ser senão o visível!
Ser bom é fácil. O difícil é ser justo.
As Minhas Fraquezas
Há uma certa fraqueza, uma falha em mim que é suficientemente clara e distinta mas difícil de descrever: é uma mistura de timidez, reserva, verbosidade, tibieza; pretendo com isto caracterizar qualquer coisa de específico, um grupo de fraquezas que sob um certo aspecto constituem uma única fraqueza claramente definida (o que não tem nada a ver com esses vícios graves que são a mentira, a vaidade, etc.). Esta fraqueza impede-me de enlouquecer, eu cultivo-a; com medo da loucura, sacrifico toda a ascensão que eu poderia fazer e perderei de certeza o negócio, porque não é possível fazerem-se negócios nesta esfera. A menos que a sonolência não se misture e com o seu trabalho diurno e nocturno não quebre todos os obstáculos e não prepare o caminho. Mas nesse caso serei apanhado pela loucura — porque para se fazer uma ascensão é preciso querer-se e eu não queria.
É tão fácil converter os outros. É tão difícil converter a nós mesmos.
A liberdade. Como é difícil. Numa carroça, quem tem menos problemas é o cavalo.
Difícil é reconhecer de longe
a índole de muitos, por mais que sejamos sábios:
de facto, alguns escondem sob a riqueza a sua maldade,
outros, sob a miserável pobreza, escondem a sua virtude.
Qual é a tarefa mais difícil do mundo? Pensar.
O Amor em Portugal
Mesmo que Dom Pedro não tenha arrancado e comido o coração do carrasco de Dona Inês, Júlio Dantas continua a ter razão: é realmente diferente o amor em Portugal. Basta pensar no incómodo fonético de dizer «Eu amo-o» ou «Eu amo-a». Em Portugal aqueles que amam preferem dizer que estão apaixonados, o que não é a mesma coisa, ou então embaraçam seriamente os eleitos com as versões estrangeiras: «I love you» ou «Je t’aime». As perguntas «Amas-me?» ou «Será que me amas?» estão vedadas pelo bom gosto, senão pelo bom senso. Por isso diz-se antes «Gostas mesmo de mim?», o que também não é a mesma coisa.
O mesmo pudor aflige a palavra amante, a qual, ao contrário do que acontece nas demais línguas indo-europeias, não tem em Portugal o sentido simples e bonito de «aquele que ama, ou é amado». Diz-se que não sei-quem é amante de outro, e entende-se logo, maliciosamente, o biscate por fora, o concubinato indecente, a pouca vergonha, o treco-lareco machista da cervejaria, ou o opróbio galináceo das reuniões de «tupperwares» e de costura.
Amoroso não significa cheio de amor, mas sim qualquer vago conceito a leste de levemente simpático, porreiro, ou giríssimo.
É que eu estava só. Sem precisar de ninguém. É difícil porque preciso repartir contigo o que sinto.
Falar é completamente fácil, quando se tem palavras em mente que expressem sua opinião. Difícil é expressar por gestos e atitudes o que realmente sentimos.
O interesse explica os fenómenos mais difíceis e complicados da vida social.
As conquistas são fáceis de alcançar, pois fazemo-las com todas as nossas forças; mas são difíceis de conservar, uma vez que apenas as mantemos com uma parte das nossas forças.
A vida de casado é apenas um hábito… um mau hábito. Mas é difícil perder um hábito, mesmo o pior. Os maus hábitos são uma parte essencial da nossa personalidade.