A Embriaguez também é Necessária
Ă€s vezes tambĂ©m Ă© preciso chegar atĂ© a embriaguez, nĂŁo para que ela nos trague, mas para que nos acalme: pois ela dissipa as preocupações, revolve atĂ© o mais fundo da alma e a cura da tristeza assim como de certas enfermidades. E LĂber foi chamado o inventor do vinho nĂŁo porque solta a lĂngua, mas sim porque liberta a alma da escravidĂŁo das inquietações; restabelece-a, fortalece-a e fá-la mais audaz para todos os esforços. Mas, como na liberdade, tambĂ©m no vinho Ă© salutar a moderação. CrĂŞ-se que SĂłlon e ArcĂ©silas eram dados ao vinho; a CatĂŁo, reprovou-se-lhe a embriaguez: mais facilmente se fará honesto esse crime do que CatĂŁo desonroso.
Passagens sobre Embriaguez
50 resultadosA arte de amar reduz-se a dizer exactamente o que o grau de embriaguez do momento requeira.
Entardecer na Praia da Luz
Espreguiçados, os ramos
das palmeiras filtram
a luz que sobra
do dia. É já noite
nas folhas. O branco
das paredes recolhe
o sangue e o vinho
de buganvĂlias
e hibiscos. Bebe-os
de um trago: saberás
que, mais do que cegueira, a noite
Ă© uma embriaguez perfeita.
Aos Realistas
Ă“ seres frios que vos sentis tĂŁo couraçados contra a paixĂŁo e a quimera e que tanto gostarĂeis de fazer da vossa doutrina um adorno e um objecto de orgulho, dais-vos o nome de realistas e dais a entender que o mundo Ă© verdadeiramente tal como vos aparece; que sois os Ăşnicos a ver a verdade isenta de vĂ©us e que sois vĂłs talvez a melhor parte dessa verdade… Ăł queridas imagens de Sais! Mas nĂŁo sereis ainda vĂłs prĂłprios, mesmo no vosso estado mais despojado, seres surpreendentemente obscuros e apaixonados se vos compararmos aos peixes? NĂŁo sereis ainda demasiado parecidos com artistas apaixonados? E o que vem a ser a «realidade» aos olhos de um artista apaixonado? Ainda nĂŁo deixaste de julgar as coisas como fĂłrmulas que tĂŞm a sua origem nas paixões e nos complexos amorosos dos sĂ©culos passados! A vossa frieza está ainda cheia de uma secreta e inextirpável embriaguez!
O vosso amor pela «realidade», se for necessário escolher-vos um exemplo, que coisa antiga! Que velho «amor»! Não há sentimento, sensação, que não contenham uma certa dose, que não tenham sido, também, trabalhados e alimentados por qualquer exagero da imaginação, por um preconceito, uma sem-razão, uma incerteza,
O Amor é uma árvore ampla e rica, de frutos de ouro, e de embriaguez; infelizmente frutifica apenas uma vez.
O Amor em Visita
Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra
e seu arbusto de sangue. Com ela
encantarei a noite.
Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher.
Seus ombros beijarei, a pedra pequena
do sorriso de um momento.
Mulher quase incriada, mas com a gravidade
de dois seios, com o peso lĂşbrico e triste
da boca. Seus ombros beijarei.Cantar? Longamente cantar.
Uma mulher com quem beber e morrer.
Quando fora se abrir o instinto da noite e uma ave
o atravessar trespassada por um grito marĂtimo
e o pĂŁo for invadido pelas ondas –
seu corpo arderá mansamente sob os meus olhos palpitantes.
Ele – imagem vertiginosa e alta de um certo pensamento
de alegria e de impudor.
Seu corpo arderá para mim
sobre um lençol mordido por flores com água.Em cada mulher existe uma morte silenciosa.
E enquanto o dorso imagina, sob os dedos,
os bordões da melodia,
a morte sobe pelos dedos, navega o sangue,
desfaz-se em embriaguez dentro do coração faminto.
– Oh cabra no vento e na urze,
A juventude envelhece, a imaturidade é superada, a ignorância pode ser educada e a embriaguez passa, porém, a estupidez é eterna.
A embriaguez nĂŁo cria vĂcios. Apenas põe-nos em evidĂŞncia.
O Asco da Imprensa
É impossĂvel percorrer uma qualquer gazeta, seja de que dia for, ou de que mĂŞs, ou de que ano, sem aĂ encontrar, em cada linha, os sinais da perversidade humana mais espantosa, ao mesmo tempo que as presunções mais surpreendentes de probidade, de bondade, de caridade, a as afirmações mais descaradas, relativas ao progresso e Ă civilização.
Qualquer jornal, da primeira linha Ă Ăşltima, nĂŁo passa de um tecido de horrores. Guerras, crimes, roubos, impudicĂcias, torturas, crimes dos prĂncipes, crimes das nações, crimes dos particulares, uma embriaguez de atrocidade universal.
E é com este repugnante aperitivo que o homem civilizado acompanha a sua refeição de todas as manhãs. Tudo, neste mundo, transpira o crime: o jornal, a muralha e o rosto do homem.
NĂŁo compreendo que uma mĂŁo pura possa tocar num jornal sem uma convulsĂŁo de asco.
LĂşcia
(Alfred de Musset)
Nós estávamos sós; era de noite;
Ela curvara a fronte, e a mĂŁo formosa,
Na embriaguez da cisma,
TĂŞnue deixava errar sobre o teclado;
Era um murmĂşrio; parecia a nota
De aura longĂnqua a resvalar nas balsas
E temendo acordar a ave no bosque;
Em torno respiravam as boninas
Das noites belas as volĂşpias mornas;
Do parque os castanheiros e os carvalhos
Brando embalavam orvalhados ramos;
OuvĂamos a noite, entre-fechada,
A rasgada janela
Deixava entrar da primavera os bálsamos;
A várzea estava erma e o vento mudo;
Na embriaguez da cisma a sós estávamos
E tĂnhamos quinze anos!LĂşcia era loura e pálida;
Nunca o mais puro azul de um céu profundo
Em olhos mais suaves refletiu-se.
Eu me perdia na beleza dela,
E aquele amor com que eu a amava – e tanto ! –
Era assim de um irmĂŁo o afeto casto,
Tanto pudor nessa criatura havia!Nem um som despertava em nossos lábios;
Ela deixou as suas mĂŁos nas minhas;
TĂbia sombra dormia-lhe na fronte,