Passagens sobre Mar

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Frases sobre mar, poemas sobre mar e outras passagens sobre mar para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

O Interesse é a Alma do Amor-Próprio

O interesse é a alma do amor-próprio, de modo que, tal como o corpo privado da sua alma não vê, não ouve, não conhece, não sente e não se move, o amor-próprio, se pode assim dizer-se, separado dos seus interesses, não vê, não escuta, não sente e não se move. Daí que um homem que corra a terra e os mares para seu benefício fique de repente paralisado para os interesses dos outros e daí, também, o adormecimento em que cai de repente, tal como esta espécie de morte que provocamos a todos aqueles a quem narramos a nossa vida. Daí vem também a rápida ressurreição quando na nossa narrativa pomos qualquer coisa que lhes diga respeito, de modo que vemos nas nossas conversas e nos nossos tratados que, no mesmo instante, um homem adormece e volta a si, consoante o interesse se aproxima ou se afasta dele.

Aquela que Cantei na Doce Lira

Aquela que cantei na doce lira,
Que já do Tempo estragos tem sentido,
Inda veio, com seu garbo fingido,
Tentar meu coração, que em paz respira.

Mas, qual duro rochedo que não vira,
Por mais que o bata o mar enfurecido,
Assim firme fiquei, no meu sentido,
Vendo o cepo enfeitado da Mentira.

Encarei-o com dor, mas sem transporte,
Pois de meus longos anos na carreira
Já do Tempo sofri, também, o corte.

Pensando na minha hora derradeira,
Eu vi só entre nós sentada a Morte,
E ao pé de uma caveira, outra caveira.

Pequena Elegia de Setembro

Não sei como vieste,
mas deve haver um caminho
para regressar da morte.

Estás sentada no jardim,
as mãos no regaço cheias de doçura,
os olhos pousados nas últimas rosas
dos grandes e calmos dias de setembro.

Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?

Queria falar contigo,
Dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.

Com que palavras
ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?

Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim.

Todos os Caminhos me Servem

Todos os caminhos me servem.
Em todos serei o ébrio
cabeceando nas esquinas.
Uma rua deserta e o hálito
das pessoas que se escondem,
uma rua deserta e um rafeiro
por companheiro.

Ó mar que me sacode os cabelos
que mulher alguma beijou,
lágrimas que os meus olhos vertem
no suor dos lagares,
que uma onda vos misture
e vos leve a morrer
numa praia ignorada.

Enxugar uma só lágrima merece mais
Honesta fama, do que verter mares de sangue.

Definição

Não ser feliz,
não ser desesperado.
Lutar no campo da clareza,
saber que é inútil.
Amar com toda força a cada vez,
em nome do Amor que não houve.
Ser honesto com os outros;
esperar que Deus seja honesto.
Viver
olhando o mar,
os olhos do cachorro
e o quente coração feminino,
terra úmida
de onde proviemos.

O Andaime

O tempo que eu hei sonhado
Quantos anos foi de vida!
Ah, quanto do meu passado
Foi só a vida mentida
De um futuro imaginado!

Aqui à beira do rio
Sossego sem ter razão.
Este seu correr vazio
Figura, anônimo e frio,
A vida vivida em vão.

A ‘sp’rança que pouco alcança!
Que desejo vale o ensejo?
E uma bola de criança
Sobre mais que minha ‘s’prança,
Rola mais que o meu desejo.

Ondas do rio, tão leves
Que não sois ondas sequer,
Horas, dias, anos, breves
Passam — verduras ou neves
Que o mesmo sol faz morrer.

Gastei tudo que não tinha.
Sou mais velho do que sou.
A ilusão, que me mantinha,
Só no palco era rainha:
Despiu-se, e o reino acabou.

Leve som das águas lentas,
Gulosas da margem ida,
Que lembranças sonolentas
De esperanças nevoentas!
Que sonhos o sonho e a vida!

Que fiz de mim? Encontrei-me
Quando estava já perdido.
Impaciente deixei-me
Como a um louco que teime
No que lhe foi desmentido.

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A Nossa Vida é Estilhaçada pelo Pormenor

Vivemos mesquinhamente, quais formigas, ainda que a fábula nos relate que há muito tempo atrás fomos transformados em homens; como os pigmeus lutamos com gruas; e é erro sobre erro, remendo sobre remendo, e a nossa melhor virtude decorre de uma miséria supérflua e evitável. A nossa vida é estilhaçada pelo pormenor.
Um homem honesto dificilmente precisa de contar para além dos seus dez dedos das mãos, acrescentando, em caso extremo, os seus dez dedos dos pés, e o resto que se amontoe. Simplicidade, simplicidade, simplicidade! Digo: ocupai-vos de dois ou três afazeres, e não de cem ou mil; contai meia dúzia em vez de um milhão e tomai nota das receitas e despesas na ponta do polegar. A meio do agitado mar da vida civilizada, tantas são as nuvens, as tempestades, as areias movediças, tantos são os mil e um imprevistos a ser levados em conta, que para não se afundar, para não ir a pique antes de chegar ao porto, um homem tem de ser um grande calculista para lograr êxito.
Simplificar, simplificar, simplificar. Em vez de três refeições por dia, se preciso for, comer apenas uma; em vez de cem pratos, cinco; e reduzir proporcionalmente as outras coisas.

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Tenho Medo de Escrever

Tenho medo de escrever. É tão perigoso. Quem tentou, sabe. Perigo de mexer no que está oculto — e o mundo não está à tona, está oculto em suas raízes submersas em profundidades do mar. Para escrever tenho que me colocar no vazio. Neste vazio é que existo intuitivamente. Mas é um vazio terrivelmente perigoso: dele arranco sangue. Sou um escritor que tem medo da cilada das palavras: as palavras que digo escondem outras — quais? talvez as diga. Escrever é uma pedra lançada no poço fundo.

As Causas

Todas as gerações e os poentes.
Os dias e nenhum foi o primeiro.
A frescura da água na garganta
De Adão. O ordenado Paraíso.
O olho decifrando a maior treva.
O amor dos lobos ao raiar da alba.
A palavra. O hexâmetro. Os espelhos.
A Torre de Babel e a soberba.
A lua que os Caldeus observaram.
As areias inúmeras do Ganges.
Chuang Tzu e a borboleta que o sonhou.
As maçãs feitas de ouro que há nas ilhas.
Os passos do errante labirinto.
O infinito linho de Penélope.
O tempo circular, o dos estóicos.
A moeda na boca de quem morre.
O peso de uma espada na balança.
Cada vã gota de água na clepsidra.
As águias e os fastos, as legiões.
Na manhã de Farsália Júlio César.
A penumbra das cruzes sobre a terra.
O xadrez e a álgebra dos Persas.
Os vestígios das longas migrações.
A conquista de reinos pela espada.
A bússola incessante. O mar aberto.
O eco do relógio na memória.
O rei que pelo gume é justiçado.
O incalculável pó que foi exércitos.

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A Música

A música p’ra mim tem seduções de oceano!
Quantas vezes procuro navegar,
Sobre um dorso brumoso, a vela a todo o pano,
Minha pálida estrela a demandar!

O peito saliente, os pulmões distendidos
Como o rijo velame d’um navio,
Intento desvendar os reinos escondidos
Sob o manto da noite escuro e frio;

Sinto vibrar em mim todas as comoções
D’um navio que sulca o vasto mar;
Chuvas temporais, ciclones, convulsões

Conseguem a minh’alma acalentar.
— Mas quando reina a paz, quando a bonança impera,
Que desespero horrível me exaspera!

Tradução de Delfim Guimarães

A Uma Dama Dormindo Junto A Uma Fonte

À margem de uma fonte, que corria,
Lira doce dos pássaros cantores
A bela ocasião das minhas dores
Dormindo estava ao despertar do dia.

Mas como dorme Sílvia, não vestia
O céu seus horizontes de mil cores;
Dominava o silêncio entre as flores,
Calava o mar, e rio não se ouvia,

Não dão o parabém à nova Aurora
Flores canoras, pássaros fragrantes,
Nem seu âmbar respira a rica Flora.

Porém abrindo Sílvia os dois diamantes,
Tudo a Sílvia festeja, tudo adora
Aves cheirosas, flores ressonantes.

Ode à Mentira

Crueldades, prisões, perseguições, injustiças,
como sereis cruéis, como sereis injustas?
Quem torturais, quem perseguis,
quem esmagais vilmente em ferros que inventais,
apenas sendo vosso gemeria as dores
que ansiosamente ao vosso medo lembram
e ao vosso coração cardíaco constrangem.
Quem de vós morre, quem de por vós a vida
lhe vai sendo sugada a cada canto
dos gestos e palavras, nas esquinas
das ruas e dos montes e dos mares
da terra que marcais, matriculais, comprais,
vendeis, hipotecais, regais a sangue,
esses e os outros, que, de olhar à escuta
e de sorriso amargurado à beira de saber-vos,
vos contemplam como coisas óbvias,
fatais a vós que não a quem matais,
esses e os outros todos… – como sereis cruéis,
como sereis injustas, como sereis tão falsas?
Ferocidade, falsidade, injúria
são tudo quanto tendes, porque ainda é nosso
o coração que apavorado em vós soluça
a raiva ansiosa de esmagar as pedras
dessa encosta abrupta que desceis.
Ao fundo, a vida vos espera. Descereis ao fundo.
Hoje, amanhã, há séculos, daqui a séculos?
Descereis,

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Viagem

É o vento que me leva.
O vento lusitano.
É este sopro humano
Universal
Que enfuna a inquietação de Portugal.
É esta fúria de loucura mansa
Que tudo alcança
Sem alcançar.
Que vai de céu em céu,
De mar em mar,
Até nunca chegar.
E esta tentação de me encontrar
Mais rico de amargura
Nas pausas da ventura
De me procurar…

Guerra

Tanto é o sangue
que os rios desistem de seu ritmo,
e o oceano delira
e rejeita as espumas vermelhas.

Tanto é o sangue
que até a lua se levanta horrível,
e erra nos lugares serenos,
sonâmbula de auréolas rubras,
com o fogo do inferno em suas madeixas.

Tanta é a morte
que nem os rostos se conhecem, lado a lado,
e os pedaços de corpo estão por ali como tábuas sem uso.

Oh, os dedos com alianças perdidos na lama…
Os olhos que já não pestanejam com a poeira…
As bocas de recados perdidos…
O coração dado aos vermes, dentro dos densos uniformes…

Tanta é a morte
que só as almas formariam colunas,
as almas desprendidas… — e alcançariam as estrelas.

E as máquinas de entranhas abertas,
e os cadáveres ainda armados,
e a terra com suas flores ardendo,
e os rios espavoridos como tigres, com suas máculas,
e este mar desvairado de incêndios e náufragos,
e a lua alucinada de seu testemunho,
e nós e vós, imunes,
chorando,

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Sabes, Pai

sabes, pai

o cachecol bege nos muros da foz
cobria as árvores com o seu pêlo, ao vento
o boné azul, marinheiro nos cabelos louros
sussurrava pequenas frases às silentes águas
o teu sorriso tão leve, enternecia o rosto
esses óculos, teu cabelo nas tardes de sol

ou o barco encalhado na areia breve
junto ao castelo onde nos passeávamos
eu tu a mãe, duas ou três falas e o meu corpo
que se chegava a vós junto à estrada

nestes muros da foz, abertos ao mar
que voava

Tarde no Mar

A tarde é de oiro rútilo: esbraseia
O horizonte: um cacto purpurino.
E a vaga esbelta que palpita e ondeia,
Com uma frágil graça de menino,

Poisa o manto de arminho na areia
E lá vai, e lá segue ao seu destino!
E o sol, nas casas brancas que incendeia.
Desenha mãos sangrentas de assassino!

Que linda tarde aberta sobre o mar!
Vai deitando do céu molhos de rosas
Que Apolo se entretém a desfolhar…

E, sobre mim, em gestos palpitantes,
As tuas mãos morenas, milagrosas,
São as asas do sol, agonizantes…

Eu Me Ausento de Ti, Meu Pátrio Sado

Eu me ausento de ti, meu pátrio Sado,
Mansa corrente deleitos, amena,
Em cuja praia o nome de Filena
Mil vezes tenho escrito, e mil beijado:

Nunca mais me verás entre o meu gado
Soprando a namorada e branda avena,
A cujo som descias mais serena,
Mais vagarosa para o mar salgado:

Devo enfim manejar por lei da sorte
Cajados não, mortíferos alfanges
Nos campos do colérico Mavorte;

E talvez entre impávidas falanges
Testemunhas farei da minha morte
Remotas margens, que humedece o Ganjes.

Ruínas

I

E é triste ver assim ir desfolhando,
Vê-las levadas na amplidão do ar,
As ilusões que andámos levantando
Sobre o peito das mães, o eterno altar.

Nem sabe a gente já como, nem quando,
Há-de a nossa alma um dia descansar!
Que as almas vão perdidas, vão boiando
Nesta corrente eléctrica do mar!…

Ó ciência, minha amante, ó sonho belo!
És fria como a folha dum cutelo…
Nunca o teu lábio conheceu piedade!

Mas caia embora o velho paraíso,
Caia a fé, caia Deus! sendo preciso,
Em nome do Direito e da Verdade.

II

Morreu-me a luz da crença — alva cecém,
Pálida virgem de luzentas tranças
Dorme agora na campa das crianças,
Onde eu quisera repousar também.

A graça, as ilusões, o amor, a unção,
Doiradas catedrais do meu passado,
Tudo caiu desfeito, escalavrado
Nos tremendos combates da razão.

Perdida a fé, esse imortal abrigo,
Fiquei sozinho como herói antigo
Batalhando sem elmo e sem escudo.

A implacável, a rígida ciência
Deixou-me unicamente a Providência,

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Frequentemente chorava ao passear naquele jardim, agora demasiado estreito para ela, como o pátio, a casa, a cidade: lançava-se antecipadamente pela vasta extensão dos mares.