Poemas sobre Noite

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Poemas de noite escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Aleluia

Era a mulher — a mulher nua e bela,
Sem a impostura inĂştil do vestido
Era a mulher, cantando ao meu ouvido,
Como se a luz se resumisse nela…
Mulher de seios duros e pequenos
Com uma flor a abrir em cada peito.
Era a mulher com bĂ­blicos acenos
E cada qual para os meus dedos feito.
Era o seu corpo — a sua carne toda.
Era o seu porte, o seu olhar, seus braços:
Luar de noite e manancial de boda,
Boca vermelha de sorrisos lassos.
Era a mulher — a fonte permitida
Por Deus, pelos Poetas, pelo mundo…
Era a mulher e o seu amor fecundo
Dando a nĂłs, homens, o direito Ă  vida!

Aqui Onde se Espera

Aqui onde se espera
– Sossego, sĂł sossego –
Isso que outrora era,

Aqui onde, dormindo,
-Sossego, sĂł sossego-
Se sente a noite vindo,

E nada importaria
-Sossego, sĂł sossego-
Que fosse antes o dia,

Aqui, aqui estarei
-Sossego, sĂł sossego –
Como no exĂ­lio um rei,

Gozando da ventura
– Sossego, sĂł sossego –
De nĂŁo ter a amargura

De reinar, mas guardando
– Sossego, sĂł sossego –
O nome venerando…

Que mais quer quem descansa
– Sossego, sĂł sossego –
Da dor e da esperança,

Que ter a negação
– Sossego, sĂł sossego –
De todo o coração ?

O Amor, Meu Amor

Nosso amor Ă© impuro
como impura é a luz e a água
e tudo quanto nasce
e vive além do tempo.

Minhas pernas são água,
as tuas sĂŁo luz
e dĂŁo a volta ao universo
quando se enlaçam
até se tornarem deserto e escuro.
E eu sofro de te abraçar
depois de te abraçar para não sofrer.

E toco-te
para deixares de ter corpo
e o meu corpo nasce
quando se extingue no teu.

E respiro em ti
para me sufocar
e espreito em tua claridade
para me cegar,
meu Sol vertido em Lua,
minha noite alvorecida.

Tu me bebes
e eu me converto na tua sede.
Meus lábios mordem,
meus dentes beijam,
minha pele te veste
e ficas ainda mais despida.

Pudesse eu ser tu
E em tua saudade ser a minha prĂłpria espera.

Mas eu deito-me em teu leito
Quando apenas queria dormir em ti.

E sonho-te
Quando ansiava ser um sonho teu.

E levito, voo de semente,

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A um Retrato

Amo-te, flor! Se te amo, Deus que o sabe
Que o diga a teus irmãos, que o Céu povoam
E ébrios de glória cânticos entoam
A quem no mar, na Terra e Céus não cabe.

Se te amo, flor! que o diga o mar que expele
Quanto Ă© domĂ­nio, e beija humilde a praia…
Se mal que a Lua lá das ondas saia
Nas rochas me nĂŁo vĂŞ gemer com ele!

Amo-te, flor! Se te amo, o Sol que o diga:
Quando lá da montanha aos Céus se eleva,
Se entre os vermes do pĂł, que o vento leva,
Me banha a mim também na luz amiga.

Se te amo, flor? Sem ti… que noite escura,
Meu céu, meu campo em flor, meu dia e tudo!
Diga-te a noite minha se te iludo,
Se em vida já sem ti sonhei ventura!

O anjo que no berço humilde e escasso
Do Céu me veio alumiar piedoso
E em lágrimas e riso, pranto e gozo,
Desde entĂŁo me acompanha passo a passo;

És tu! Amo-te e muito!

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Elegia do Amor

Lembras-te, meu amor,
Das tardes outonais,
Em que Ă­amos os dois,
Sozinhos, passear,
Para fora do povo
Alegre e dos casais,
Onde sĂł Deus pudesse
Ouvir-nos conversar?
Tu levavas, na mĂŁo,
Um lĂ­rio enamorado,
E davas-me o teu braço;
E eu, triste, meditava
Na vida, em Deus, em ti…
E, além, o sol doirado
Morria, conhecendo
A noite que deixava.
Harmonias astrais
Beijavam teus ouvidos;
Um crepĂşsculo terno
E doce diluĂ­a,
Na sombra, o teu perfil
E os montes doloridos…
Erravam, pelo Azul,
Canções do fim do dia.
Canções que, de tão longe,
O vento vagabundo
Trazia, na memĂłria…
Assim o que partiu
Em frágil caravela,
E andou por todo o mundo,
Traz, no seu coração,
A imagem do que viu.

Olhavas para mim,
Ă€s vezes, distraĂ­da,
Como quem olha o mar,
Ă€ tarde, dos rochedos…
E eu ficava a sonhar,
Qual névoa adormecida,
Quando o vento também
Dorme nos arvoredos.
Olhavas para mim…
Meu corpo rude e bruto
Vibrava,

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Jeito de Escrever

NĂŁo sei que diga.
E a quem o dizer?
NĂŁo sei que pense.
Nada jamais soube.

Nem de mim, nem dos outros.
Nem do tempo, do cĂ©u e da terra, das coisas…
Seja do que for ou do que fosse.
NĂŁo sei que diga, nĂŁo sei que pense.

Oiço os ralos queixosos, arrastados.
Ralos serĂŁo?
Horas da noite.
Noite começada ou adiantada, noite.
Como Ă© bonito escrever!

Com este longo aparo, bonitas as letras e o gesto – o jeito.
Ao acaso, sem âncora, vago no tempo.
No tempo vago…
Ele vago e eu sem amparo.
Piam pássaros, trespassam o luto do espaço, este sereno luto das horas. Mortas!
E por mais nĂŁo ter que relatar me cerro.
ExpressĂŁo antiga, epistolar: me cerro.
TĂŁo grato Ă© o velho, inopinado e novo.
Me cerro!

Assim: uma das mĂŁos no papel, dedos fincados,
solta a outra, de pena expectante.
Uma que agarra, a outra que espera…

Ă“ ilusĂŁo!
E tudo acabou, acaba.
Para quĂŞ a busca das coisas novas, Ă  toa e Ă  roda?

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Madrugada

Do fundo de meu quarto, do fundo
de meu corpo
clandestino
ouço (não vejo) ouço
crescer no osso e no mĂşsculo da noite
a noite

a noite ocidental obscenamente acesa
sobre meu paĂ­s dividido em classes

O Primeiro Filho

(Carta ao amigo Bernardo Pindela)

Entre tanta miséria e tantas coisas vis
Deste vil grĂŁo de areia,
Ainda tenho o condĂŁo de me sentir feliz
Com a ventura alheia.

Ă€ minha noite triste, Ă  noite tormentosa,
Onde busco a verdade,
Chegou com asas d’oiro a canção cor-de-rosa
Da tua felicidade.

És pai, viste nascer um fragmento d’aurora
Da tua alma, de ti…
Oh, momento divino em que o sorriso chora,
E em que o pranto sorri!

Que ventura radiante! oh que ventura infinda!
OlĂ­mpicos amores
Ter frutos em Abril com o vergel ainda
Carregado de flores!

Deslumbramento!… ver num berço o teu futuro
Sorrindo ao teu presente!…
Ter a mulher e a mĂŁe: juntar o beijo puro
Com o beijo inocente!…

Eu que vou, javali de flanco ensanguentado,
Pelos rudes caminhos
Ajoelho quando escuto Ă  beira dum valado
Os murmĂşrios dos ninhos!

Em tudo que alvorece há um sorriso d’esperança,
Candura imaculada!…
E quer seja na flor, quer seja na criança
Sente-se a madrugada.

Quando,

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Poder Crer em Santa Bárbara

Esta tarde a trovoada caiu
Pelas encostas do céu abaixo
Como um pedregulho enorme…
Como alguém que duma janela alta
Sacode uma toalha de mesa,
E as migalhas, por caĂ­rem todas juntas,
Fazem algum barulho ao cair,
A chuva chovia do céu
E enegreceu os caminhos …

Quando os relâmpagos sacudiam o ar
E abanavam o espaço
Como uma grande cabeça que diz que não,
Não sei porquê — eu não tinha medo —
pus-me a rezar a Santa Bárbara
Como se eu fosse a velha tia de alguĂ©m…

Ah! é que rezando a Santa Bárbara
Eu sentia-me ainda mais simples
Do que julgo que sou…
Sentia-me familiar e caseiro
E tendo passado a vida
TranqĂĽilamente, como o muro do quintal;
Tendo idéias e sentimentos por os ter
Como uma flor tem perfume e cor…

Sentia-me alguém que nossa acreditar em Santa
Bárbara…
Ah, poder crer em Santa Bárbara!

(Quem crê que há Santa Bárbara,
Julgará que ela é gente e visível
Ou que julgará dela?)

(Que artifĂ­cio!

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Natal de Longe

Natal!…Natal!…
A boca o diz,
A mĂŁo o escreve,
O coração já não sente.

Que a emoção,
Vibração
Das asas da fantasia
No voo do pensamento,
Deixou-se ficar parada
Só porque a noite está quente;
SĂł porque ser indolente
É como parar na estrada
E desistir da jornada,
Sem coragem de voltar
Pelo caminho tĂŁo rude!

Natal!… Natal!…

A doce força que tinha
Devorou-a a latitude.

visto a esta luz

Visto a esta luz és um porto de mar
como reverberos de ondas onde havia mĂŁos
rebocadores na brancura dos braços

Constroem-te um ponte
que deverá cingir-te os rins para sempre

O que há horrível no teu corpo diurno
Ă© a sua avareza de palavras
és tu inutilmente iluminado e quente
como um resto saĂ­do de outras eras
que te fizeram carne e se foram embora
porque verdade sem erro certo verdadeiro
nada era noite bastante para tocarmos melhor
as nossas mãos de nautas navegando o espaço
os corpos um e dois do navio de espelhos
filhos e filhas do imponderável
de cabeça para baixo a ver a terra girar

Quero-te sempre como nĂŁ querer-te?
mas esta luz de sinopla nas calças!
este interposto objecto
e o seu leve peso de eternidade

O DilĂşvio

Há muitos dias já, há já bem longas noites
que o estalar dos vulcões e o atroar das torrentes
ribombam com furor, quais rábidos açoites,
ao crebro rutilar dos coriscos ardentes.

Pradarias, vergéis, hortos, vinhedos, matos,
tudo desapar’ceu ao rude desabar
das constantes, hostis, raivosas cataratas,
que fizeram da Terra um grande e torvo mar.

Ă€ flor do torvo mar, verde como as gangrenas,
onde homens e leões bóiam agonizantes,
imprecando com fĂşria e angĂşstia, erguem-se apenas,
quais monstros colossais, as montanhas gigantes.

É aí que, ululando, os homens como as feras
refugiar-se vão em trágicos cardumes,
O mar sobe, o mar cresce. e os homens e as panteras,
crianças e reptis caminham para os cumes.

Os fortes, sem haver piedade que os sujeite,
arremessam ao chĂŁo pobres velhos cansados.
e as mães largam. cruéis, os filhinhos de leite,
que os que seguem depois pisam, alucinados.

Um sinistro pavor; crescente e sufocante,
desnorteia, asfixia a turba pertinaz:
ouvem-se urros de dor, e os que vĂŁo adiante
lançam pedras brutais aos que ficam pra trás.

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Xácara do Infinito

Fazia papa-luaça
com lama azul dos paĂşis;
e embaciava a vidraça;
ou de olhos baços, azuis,
parados, largos, serenos,
como o silĂŞncio dos mudos,
ou fitos, picos, pequenos,
venenos de ângulos agudos.

Ou gargalhava estridente
como um riscar de repente
de uma faĂşlha de luz
em escuros de urros e uuus
que arrefecia os cabelos!
E a dissonância em novelos
rolava fundo e medonho
a meio do chĂŁo:.. Catrapuz!…
como um vĂłmito de luz
a estoirar dentro dum sonho!

Ou escancarava a vidraça
a rir pedradas de lata;
mas logo o feixe-desfeixe
porque a lata se desata
e cai em pata de pata
na lájea das cousas mortas
das mortas noites sem portas!

E logo a Noite corria,
e a vista via… – nĂŁo via:
porque entre o ver e o nĂŁo ver
há uma distância a correr
que pode ser… – ou nĂŁo ser
uma distância a valer!

Aquele espaço intervalo
dum cabelo ou duma unha
à sensação de ter unha
é uma distância a cavalo
como a distância da unha
ao movimento da unha!

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As Rosas Amo dos Jardins de AdĂ´nis

As Rosas amo dos jardins de AdĂ´nis,
Essas volucres amo, LĂ­dia, rosas,
Que em o dia em que nascem,
Em esse dia morrem.
A luz para elas Ă© eterna, porque
Nascem nascido já o sol, e acabam
Antes que Apolo deixe
O seu curso visĂ­vel.
Assim façamos nossa vida um dia,
Inscientes, LĂ­dia, voluntariamente
Que há noite antes e após
O pouco que duramos.

Auto-retrato

Espáduas brancas palpitantes:
asas no exĂ­lio dum corpo.
Os braços calhas cintilantes
para o comboio da alma.
E os olhos emigrantes
no navio da pálpebra
encalhado em renĂşncia ou cobardia.
Por vezes fĂŞmea. Por vezes monja.
Conforme a noite. Conforme o dia.
Molusco. Esponja
embebida num filtro de magia.
Aranha de ouro
presa na teia dos seus ardis.
E aos pés um coração de louça
quebrado em jogos infantis.

Espaços em Branco

Ao fim da noite, no frio do táxi, pousas
a cabeça no meu ombro – e assim entramos
duma vez e inteiramente na nossa vida.
Lá fora, pelo contrário, tudo perde realidade;

há em toda a parte um sossego abstracto,
as ruas parecem pintadas – betĂŁo entre
as árvores – numa tela baça. Vamos por lugares
que não reconheço, a minha geografia é vaga

e omissa como a dos velhos cartĂłgrafos
que desenhavam um mundo cheio de espaços
em branco. É onde estamos agora, num
intervalo do mapa rente Ă  primeira manhĂŁ –

que será a nossa e também a última.

O Amor no ChĂŁo

O vento da outra noite derrubou o Amor
Que, no mais misterioso recanto do parque,
Nos sorria, ao esticar malignamente o arco,
E cujo ar nos fez meditar com fervor!

O vento da outra noite derrubou-o! O mármore
com o sopro da manhã, disperso, gira. É triste
Olhar o pedestal, onde o nome do artista
Se lê com muito esforço à sombra de uma árvore,

É triste ver em pé, sozinho, o pedestal!
MelancĂłlicos vĂŞm e vĂŁo pensamentos
No meu sonho, onde o mais profundo sofrimento
Evoca um solitário futuro fatal.

É triste! — E mesmo tu, não é? ficas tocada
Plo cenário dolente, embora te divirtas
Com a borboleta rubra e de oiro, que se agita
Sobre a alameda, além, de destroços juncada.

Tradução de Fernando Pinto do Amaral

Existe a Noite

Existe a noite, e existe o breu.
Noite é o velado coração de Deus
Esse que por pudor nĂŁo mais procuro.
Breu Ă© quando tu te afastas ou dizes
Que viajas, e um sol de gelo
Petrifica-me a cara e desobriga-me
De fidelidade e de conjura. O desejo
Esse da carne, a mim nĂŁo me faz medo.
Assim como me veio, também não me avassala.
Sabes por quĂŞ? Lutei com Aquele.
E dele também não fui lacaia.

A Mais Bela Noite do Mundo

Hoje,
será o fim!

Hoje
nem este falso silĂŞncio
dos meus gestos malogrados
debruçando-se
sobre os meus ombros nus
e esmagados!

Nem o luar, pano baço de cenário velho,
escutando
a minha prisĂŁo de viver
a lição que me ditavam:
– Menino! acende uma vela na tua vida,
que o sol, a luz e o ar
sĂŁo perfumes de pecado.
Tem braços longos e tentadores – o dia!

– Menino! recolhe-te na sombra do meu regaço
que teus pés
são feitos de barro e cansaço!

(Era esta a voz do papĂŁo
pintado de belo
na máscara de papelão).

Eram inĂşteis e magoadas as noites da minha rua…
Noites de lua
que lembravam as grilhetas
da minha vida parada.

– AmanhĂŁ,
terás os mestres, as aulas, os amigos e os livros
e o espectáculo da morgue
morando durante dias
nos teus sentidos gorados.

AmanhĂŁ,
será o ultrapassar outra curva
no teu caminho destinado.

(Era esta a voz do papĂŁo
que acendia a vela,

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As mĂŁos pressentem…

As mĂŁos pressentem a leveza rubra do lume
repetem gestos semelhantes a corolas de flores
voos de pássaro ferido no marulho da alba
ou ficam assim azuis
queimadas pela secular idade desta luz
encalhada como um barco nos confins do olhar

ergues de novo as cansadas e sábias mãos
tocas o vazio de muitos dias sem desejo e
o amargor húmido das noites e tanta ignorância
tanto ouro sonhado sobre a pele tanta treva
quase nada