Poemas sobre Nomes

180 resultados
Poemas de nomes escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Inominado Nome

Persigo-o no ininteligĂ­vel arbĂ­trio
dos astros, na clandestina linfa
que percorre os tĂşrgidos corredores
do indecifrável, nos falsos indícios
que, de fogos fátuos, escurecem

a persistente incĂłgnita do nome.
Em persegui-lo persisto onde, bem
sei, não lograrei achá-lo, que nunca
achado será em tempo ou espaço
que excedam meu limite e dimensĂŁo.

Um nome, ainda obscuro, pressinto
no sal da boca amarga, Conheço-lhe
o rosto familiar, desfocado embora,
no halo do tempo e da distância.
É, creio, a face indefectível de tudo

quanto tenho de calar. Este nome
(este rosto) habita-me silente, contra
a recusa, a mentira, ou a calĂşnia.
Na epiderme, nos nervos e na carne,
sobre a lĂ­ngua e o palato, adivinho-lhe

forma, sabor e propósito. Ouço-o
dentro de mim, mau grado
o queira ou nĂŁo, que em mim
só está sofrê-lo porque em mim
vive e dura, enquanto eu dure e viva.

E nĂŁo por meu mal, que meu
mal seria, mais que perdĂŞ-lo,
sem ele viver.
Um rosto persigo,
um nome guardo no sal da boca

amarga,

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A Escola Portuguesa

Eis as crianças vermelhas
Na sua hedionda prisĂŁo:
Doirado enxame de abelhas!
O mestre-escola Ă© o zangĂŁo.

Em duros bancos de pinho
Senta-se a turba sonora
Dos corpos feitos de arminho,
Das almas feitas d’aurora.

Soletram versos e prosas
HorrĂ­veis; contudo, ao lĂŞ-las
Daquelas bocas de rosas
Saem murmĂşrios de estrela.

Contemplam de quando em quando,
E com inveja, Senhor!
As andorinhas passando
Do azul no livre esplendor.

Oh, que existĂŞncia doirada
Lá cima, no azul, na glória,
Sem cartilhas, sem tabuada,
Sem mestre e sem palmatĂłria!

E como os dias sĂŁo longos
Nestas prisões sepulcrais!
Abrem a boca os ditongos,
E as cifras tristes dĂŁo ais!

Desgraçadas toutinegras,
Que insuportáveis martírios!
JoĂŁo FĂ©lix co’as unhas negras,
Mostrando as vogais aos lĂ­rios!

Como querem que despontem
Os frutos na escola aldeĂŁ,
Se o nome do mestre é — Ontem
E o do discĂ­p’lo — AmanhĂŁ!

Como é que há-de na campina
Surgir o trigal maduro,
Se Ă© o Passado quem ensina
O b a ba ao Futuro!

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A Mulher que Passa

Meu Deus, eu quero a mulher que passa.
Seu dorso frio Ă© um campo de lĂ­rios
Tem sete cores nos seus cabelos
Sete esperanças na boca fresca!

Oh! Como Ă©s linda, mulher que passas
que me sacias e suplicias
Dentro das noites, dentro dos dias!

Teus sentimentos sĂŁo poesia
Teus sofrimentos, melancolia.
Teus pĂŞlos leves sĂŁo relva boa
Fresca e macia.
Teus belos braços são cisnes mansos
Longe das vozes da ventania.

Meu Deus, eu quero a mulher que passa!

Como te adoro, mulher que passas
Que vens e passas, que me sacias
Dentro das noites, dentro dos dias!

Porque me faltas, se te procuro?
Por que me odeias quando te juro
Que te perdia se me encontravas
E me encontrava se te perdias?

Por que nĂŁo voltas, mulher que passa?
Por que nĂŁo enches a minha vida?
Por que nĂŁo voltas, mulher querida
Sempre perdida, nunca encontrada?
Por que nĂŁo voltas Ă  minha vida
Para o que sofro não ser desgraça?

Meu Deus, eu quero a mulher que passa!

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Menina e Moça

Está naquela idade inquieta e duvidosa,
Que não é dia claro e é já o alvorecer;
Entreaberto botĂŁo, entrefechada rosa,
Um pouco de menina e um pouco de mulher.

Ă€s vezes recatada, outras estouvadinha,
Casa no mesmo gesto a loucura e o pudor;
Tem coisas de criança e modos de mocinha,
Estuda o catecismo e lĂŞ versos de amor.

Outras vezes valsando, e* seio lhe palpita,
De cansaço talvez, talvez de comoção.
Quando a boca vermelha os lábios abre e agita,
Não sei se pede um beijo ou faz uma oração.

Outras vezes beijando a boneca enfeitada,
Olha furtivamente o primo que sorri;
E se corre parece, Ă  brisa enamorada,
Abrir asas de um anjo e tranças de uma huri.

Quando a sala atravessa, Ă© raro que nĂŁo lance
Os olhos para o espelho; e raro que ao deitar
NĂŁo leia, um quarto de hora, as folhas de um romance
Em que a dama conjugue o eterno verbo amar.

Tem na alcova em que dorme, e descansa de dia,
A cama da boneca ao pé do toucador;

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O Menino de Sua MĂŁe

No plano abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas trespassado
— Duas, de lado a lado —,
Jaz morto e arrefece.

Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.

TĂŁo jovem! que jovem era!
(Agora que idade tem?)
Filho Ăşnico, a mĂŁe lhe dera
Um nome e o mantivera:
«O menino da sua mãe».

Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lha a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.

De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço… Deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.

Lá longe, em casa, há a prece:
«Que volte cedo, e bem!»
(Malhas que o império tece!)
Jaz morto, e apodrece,
O menino da sua mĂŁe.

Meu País Desgraçado

Meu país desgraçado!…
E no entanto há Sol a cada canto
e não há Mar tão lindo noutro lado.
Nem há Céu mais alegre do que o nosso,
nem pássaros, nem águas…

Meu país desgraçado!…
Porque fatal engano?
Que malévolos crimes
teus direitos de berço violaram?

Meu Povo
de cabeça pendida, mãos caídas,
de olhos sem fé
— busca, dentro de ti, fora de ti, aonde
a causa da miséria se te esconde.

E em nome dos direitos
que te deram a terra, o Sol, o Mar,
fere-a sem dĂł
com o lume do teu antigo olhar.

Alevanta-te, Povo!
Ah!, visses tu, nos olhos das mulheres,
a calada censura
que te reclama filhos mais robustos!

Povo anémico e triste,
meu Pedro Sem sem forças, sem haveres!
— olha a censura muda das mulheres!
Vai-te de novo ao Mar!
Reganha tuas barcas, tuas forças
e o direito de amar e fecundar
as que sĂł por Amor te nĂŁo desprezam!

Palavra de Homem

Um pouco de amargura nĂŁo resolve.
Um pouco de amargura
se dissolve,
se nesta cidade
nĂŁo conheces o outro
que está perto e pouco.

A palavra de homem em tua boca
espera a palavra e o nome
de peso e cobre.
Espera a voz do outro
que acusa a palavra pouca
e explode a armadura
dessa amargura rouca.

Falar nĂŁo salva o homem.
– Estás na outra
palavra do outro
perto e solto.
Falar nĂŁo abre a porta
nĂŁo abre a cela
nĂŁo salva o foco
de tuas chagas.
Falar sĂł salva, salvo
se o outro
do outro lado
fale por tua boca:
– a fala pouca
que te dissolve
a arma pura
desta amargura
que nĂŁo resolve.

IrmĂŁo

Eu não fiz uma revolução.
Mas me fiz irmão de todas as revoluções.
Eu fiquei irmĂŁo de muitas coisas no mundo.
IrmĂŁo de uma certa camisa.
Uma certa camisa que era de um gesto de céu
e com certo carinho me vestia, como se me
vestisse de árvore e de nuvens.
Eu fiquei irmĂŁo de uma vaca, como se ela
também sonhasse. Fiquei irmão de um vira-lata
com o brio com que ele também me abraçava.
Fiquei irmĂŁo de um riacho, que Ă© nome
de rio pequeno, um pequeno que cabe
todo dentro de mim, me falando,
me beijando, me lambendo, me lembrando.
Brincava e me envolvia, certos dias eu
girava em torno do redemoinho do cachorro
e do riacho e da vaca, sem Ă s vezes saber
se estava beijando o riacho, o cachorro
ou a vaca, com um grande céu
me entornando, com um grande céu
com a vaca no lombo e com o cĂŁo,
com o riacho rindo de nĂłs todos.
Eu fiquei irmĂŁo de livros, de gentes.
Eu fiquei irmĂŁo de uma certa montanha.

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A SolidĂŁo Ă© Sempre Fundamento da Liberdade

A solidĂŁo Ă© sempre fundamento
da liberdade. Mas também do espaço
por onde se desenvolve o alargar do tempo
à volta da atenção estrita do acto.
HĂşmus, e alma, Ă© a solidĂŁo. E vento,
quando da imĂłvel solenidade clama
o mudo susto do grito, ainda suspenso
do nome que vai ser sua prisĂŁo pensada.
A menos que esse nome seja estremecimento
— fruto de solidão compenetrada
que, por dentro da sombra, nomeia o movimento
de cada corpo entrando por sua luz sagrada.

Poesia

Ă© a visita do tempo nos teus olhos,
Ă© o beijo do mundo nas palavras
por onde passa o rio do teu nome;
é a secreta distância em que tocas
o princĂ­pio leve dos meus versos;
é o amor debruçado no silêncio
que te cerca e que te esconde:
como num bosque, lento, ouvimos
o coração de uma fonte nĂŁo sei onde…

A Vida

Ă“ grandes olhos outomnaes! mysticas luzes!
Mais tristes do que o amor, solemnes como as cruzes!
Ă“ olhos pretos! olhos pretos! olhos cor
Da capa d’Hamlet, das gangrenas do Senhor!
Ó olhos negros como noites, como poços!
Ă“ fontes de luar, n’um corpo todo ossos!
Ó puros como o céu! ó tristes como levas
De degredados!

Ă“ Quarta-feira de Trevas!

Vossa luz Ă© maior, que a de trez luas-cheias:
Sois vĂłs que allumiaes os prezos, nas cadeias,
Ó velas do perdão! candeias da desgraça!
Ó grandes olhos outomnaes, cheios de Graça!
Olhos accezos como altares de novena!
Olhos de genio, aonde o Bardo molha a penna!
Ó carvões que accendeis o lume das velhinhas,
Lume dos que no mar andam botando as linhas…
Ă“ pharolim da barra a guiar os navegantes!
Ă“ pyrilampos a allumiar os caminhantes,
Mais os que vĂŁo na diligencia pela serra!
Ó Extrema-Uncção final dos que se vão da Terra!
Ă“ janellas de treva, abertas no teu rosto!
Thuribulos de luar! Luas-cheias d’Agosto!
Luas d’Estio! Luas negras de velludo!
Ă“ luas negras,

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Aquella Orgia

NĂłs eramos uns dez ou onze convidados,
– Todos buscando o gozo e achando o abatimento,
E todos afinal vencidos e quebrados
No combate da Vida inutil e incruento.

Tocava o termo a ceia – e ia surgindo o alvor
Da madrugada vaga, etherea e crystallina,
A alguns trazendo a vida, e enchendo outros de horor,
Branca como uma flor de prata florentina.

Todos riam sem causa. – A estolida batalha
Da Materia e da Luz travara-se afinal,
E eram já côr de vinho os risos e a toalha,
– E arrojavam-se ao ar os copos de crystal.

Crusavam-se no ar ditos como facadas;
Escandalos de amor, historias sensuaes…
– Rolavam nos divans caindo, ás gargalhadas,
Sujos como truões, torpes como animaes.

Um agitando o ar com risos desmanchados,
Recitava canções, farças, Hamlet e Ophelia;
– Outro perdido o olhar, e os braços encruzados,
De bruços, n’um divan, roia uma camelia!

Outros fingindo a dĂ´r, fallavam dos ausentes,
Das amantes, dos paes, com gritos d’afflicção,
– Um brandia um punhal, com ditos incoherentes;

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Proémio

Em nome daquele que a Si mesmo se criou!
De toda eternidade em ofĂ­cio criador;
Em nome daquele que toda a fé formou,
Confiança, actividade, amor, vigor;
Em nome daquele que, tantas vezes nomeado,
Ficou sempre em essĂŞncia imperscrutado:

Até onde o ouvido e o olhar alcançam,
A Ele se assemelha tudo o que conheces,
E ao mais alto e ardente voo do teu ‘spĂ­rito
Já basta esta parábola, esta imagem;
Sentes-te atraĂ­do, arrastado alegremente,
E, onde quer que vás, tudo se enfeita em flor;
Já nada contas, nem calculas já o tempo,
E cada passo teu é já imensidade.

*

Que Deus seria esse entĂŁo que sĂł de fora impelisse,
E o mundo preso ao dedo em volta conduzisse!
Que Ele, dentro do mundo, faça o mundo mover-se,
Manter Natureza em Si, e em Natureza manter-Se,
De modo que ao que nele viva e teça e exista
A Sua força e o Seu génio assista.

*

Dentro de nós há também um Universo;
Daqui nasceu nos povos o louvável costume
De cada qual chamar Deus,

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As Palavras de Adeus

A realidade Ă© maior que a verdade meu amor
somos mais do que o sol e do que o mar e
em nenhuma metáfora cabemos
mesmo quando dizemos eu
sou a mĂşsica tu Ă©s o luar

com cadeias de ferro nos unimos
em nosso nome jurámos
pelas cascas dos frutos bebemos
de mel silvestre nos alimentámos

mas de fora sempre ficou
algo que nos próprios sentimentos já não coube
e um gosto que indicou algo
que a boca já dizer não soube

entre as coisas as palavras e a sua mudez
paira a irrealidade de
que nos fizemos
nem uma sĂł vez foram verdade as
palavras de adeus que nos dissemos

A Senhora de Brabante

Tem um leque de plumas gloriosas,
na sua mĂŁo macia e cintilante,
de anéis de pedras finas preciosas
a Senhora Duquesa de Brabante.

Numa cadeira de espaldar dourado,
Escuta os galanteios dos barões.
— É noite: e, sob o azul morno e calado,
concebem os jasmins e os corações.

Recorda o senhor Bispo acções passadas.
Falam damas de jĂłias e cetins.
Tratam barões de festas e caçadas
à moda goda: — aos toques dos clarins!

Mas a Duquesa é triste. — Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
— Ao luar, sobre os tanques chora a água…
— Cantando, os rouxinĂłis lembram o cĂ©u…

Dizem as lendas que SatĂŁ vestido
de uma armadura feita de um brilhante,
ousou falar do seu amor florido
Ă  Senhora Duquesa de Brabante.

Dizem que o ouviram ao luar nas águas,
mais louro do que o sol, marmĂłreo, e lindo,
tirar de uma viola estranhas mágoas,
pelas noites que os cravos vĂŞm abrindo…

Dizem mais que na seda das varetas
do seu leque ducal de mil matizes…

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Dos Restos de Velhos Tempos

Para exemplo ainda continua a Lua
Nas noites por sobre os novos edifĂ­cios;
Entre as coisas de cobre
É ela
A mais inutilizável.   Já
As mĂŁes contam de animais,
Chamados cavalos, que puxavam carros.
E verdade que quando se fala de continentes
Já não são capazes de acertar com os nomes:
Pelas grandes antenas novas
Já dos velhos tempos
Se nĂŁo conhece nada.

Tradução de Paulo Quintela

Aos Amores!

A vida que tudo arrasta os amores também
uns dão à costa, exaustos, outros vao mais além
navegadores só solitários dois a dois
heróis sem nome e até por isso heróis

Desde que o John partiu a Rosinha passa mal
vive na Loneley Street, Heartbreak Hotel, Portugal
ainda em si mora a doce mentira do amor
tomou-lhe o gosto ao provar-lhe o sabor

Os amores sĂŁo facas de dois gumes
tĂŞem de um lado a paixĂŁo, do outro os ciĂşmes
sĂŁo desencantos que vivem encantados
como velas que ardem por dois lados

Aos amores!

No convento as noviças cantam as madrugadas
e a bela monja escreve cartas arrebatadas
“Ă© por virtude tua que tu Ă©s o meu vĂ­cio
por ti eu lanço os ventos ao precipĂ­cio”

O Rui da Casa Pia sabe que sabe amar
sopra na franja, maneira de se pentear
vai Ă  posta restante para ver quem lhe escreveu
foi uma bela monja que nunca conheceu

Aos amores!
(desordeiros irresistĂ­veis deleituosos entranhantes
verdadeiros evitáveis buliçosos como dantes
bicolores transgressores impostores cantadores)

A Marta,

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Das Pessoas que Atingem Posições Elevadas

Das pessoas que atingem posições elevadas,
cerimónias, riqueza, erudição, e similares:
para mim tudo isso a que chegam tais pessoas
afunda diante delas — a não ser quando acrescenta
um resultado qualquer para seus corpos e almas —
de modo que elas muitas vezes me parecem
desajeitadas e nuas, e para mim
uma está sempre zombando das outras
e a zombar dele mesmo ou dela mesma,
e o cerne da vida de cada qual
(a que se dá o nome de felicidade)
está cheio de pútrido excremento de larvas,
e para mim muitas vezes esses homens e mulheres
passam sem testemunhar as verdades da vida
e andam correndo atrás de coisas falsas,
e para mim sĂŁo muitas vezes pessoas
que pautam as suas vidas por um hábito
que a elas foi imposto, e nada mais,
e para mim Ă© gente triste muitas vezes,
gente afobada, estremunhados sonâmbulos
tacteando no escuro.

A um Mosquito

InvencĂ­vel mosquito,
Émulo do mais livre pensamento,
Sem corpo, e de todo espĂ­rito,
Que deste fim a um tĂŁo alto intento,
Quando precipitado
O céu de Délia acometeste ousado.

As portas de diamante
Cerradas ao clamor de tanta gente
Abriste triunfante,
Zombando da esperança impertinente,
Que entre temor, e espanto
Nunca acabou comigo esperar tanto.

Cupido, que inquieta
DĂ©lia sentiu ferida,
Espera, que o sinta,
A lança, que tiraste em sangue tinta,
Que o peito endurecido
É prova das setas de Cupido.

Porém de nada disto
Te mostres tĂŁo soberbo, e presumido,
Que podes sem ser visto
Passar a mais ferir, sem ser sentido,
E para castigar-te,
NĂŁo ocupas lugar nalguma parte.

Foras de amor ferido,
Se tivera o teu erro algum desconto,
Ou se achara Cupido
Aonde a ponta da seta pĂ´r o ponto.
Condolação bastante;
Pois nĂŁo picaste a DĂ©lia como amante.

Buscaste a noite escura
Por cometer a DĂ©lia mais oculto;
Quem medo te afigura,
Se nĂŁo faz o teu corpo nenhum vulto,

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Sátira

Besta e mais besta! O positivo Ă© nada…
(Perdoa, se em gramática te falo,
Arte que ignoras, como ignoras tudo.)
Besta e mais besta! Na palavra embirro;
Que a besta anexa ao mais teu ser define.

Dás-me louvor servil na voz do prelo,
Grande me crĂŞs, proclamas-me famoso,
Excelso, transcendente, incomparável,
Confessas que d’Elmano a fĂşria temes…
E, débil estorninho, águias provocas,
Aves de Jove, que o corisco empunham!

És de rábula vil corrupta imagem;
Tu vendes o louvor, como ele as partes,
Mas ele na enxovia infâmias paga,
E tu, com tĂşstios, que aos caloiros pilhas,
Compras gravatas, em que a tromba enorme
Sumas ao dia, que de a ver se embrusca,
Qual em tenra mĂŁozinha esconde a face
Mimoso infante de papões vexado.
Útil descuido aos cárceres te furta,
À digna habitação de ti saudosa
(Digo, o Castelo), estância equivalente
Aos méritos morais, que em ti reluzem.

De saloios vinténs larápio sujo,
A glĂłria do teu Ăłdio restitui
A quem no teu louvor desacreditas.
Se honrada pelos sábios d’Ulisseia
(D’Ulisseia nĂŁo sĂł,

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