Boca: no homem, é a porta da alma; na mulher, é a saída do coração.
Passagens sobre Portas
505 resultadosIndução
Há em todas as coisas
a marca estranha
da minha presença.Sons, palavras, imagens,
tudo eu desfiguro e torno falso.As pessoas, à minha volta,
deslizam vagamente como sonâmbulos
– fantoches ocos de lenda…Os sons,
se logram atravessar portas e janelas,
partem-se
no lajedo frio dos meus olhos.Vai-se o sol
Onde o meu pensamento das trevas se poisa.Oh! as minhas ilusões de claridade!
Canção porque (não) Morres
Este é o último livro, prometia
como alguém que tivesse esquecido
que assim sempre tinha sido – aquele
era o último e depois que alguém viesse
fechar a porta contra o som do mar.
– Pagava por jogar no escuro
e por aqueles ardis já gastos
com que pensava e não pensava
enganar a morte branca e vermelha.
– Ah e não esqueças: – deitar fora a chaveCanção como não morres
se é a morte que em ti sobe até à fonte
do sangue, até à flor do sal queimando
os dedos; até à boca que por te cantar
se acende negra; até à copa
das árvores que distribuem o sol
sobre o corpo morto do amor
amante e desamado?Ou antes: de que morres, por que morres
tu, canção já sem voz, já
sem o canto,
– já sem outro assunto
de momento, me despeço de todos vós-
quem falou agora? – Que importa quem falou?
– Que importa? Nada e nonada. E, sim, tudo
é tudo o que importa, para quem veio
mandado a que chamasses quem
tivesse chamado.
Palavra de Homem
Um pouco de amargura não resolve.
Um pouco de amargura
se dissolve,
se nesta cidade
não conheces o outro
que está perto e pouco.A palavra de homem em tua boca
espera a palavra e o nome
de peso e cobre.
Espera a voz do outro
que acusa a palavra pouca
e explode a armadura
dessa amargura rouca.Falar não salva o homem.
– Estás na outra
palavra do outro
perto e solto.
Falar não abre a porta
não abre a cela
não salva o foco
de tuas chagas.
Falar só salva, salvo
se o outro
do outro lado
fale por tua boca:
– a fala pouca
que te dissolve
a arma pura
desta amargura
que não resolve.
Um homem desregrado não pode inspirar afeto; é insociável e fecha as portas à amizade.
Há «portas da consolação» que se devem ter sempre abertas, porque Jesus gosta de entrar por elas: o Evangelho lido todos os dias e trazido sempre connosco, a oração silenciosa e de adoração, a Confissão, a Eucaristia. Através dessas portas, o Senhor entra e dá um novo sabor a todas as coisas.
Jonas ia e profetizava, mas no seu coração dizia: «Merecem o castigo, estavam a pedi-las.» Profetizava, mas não rezava, não pedia ao Senhor perdão para eles, só lhes dava pancada. Jonas não rezava, profetizava, era talvez um bom «profissional» que realizava as suas tarefas, mas nunca abria a porta ao Senhor com a oração.
A beleza pode abrir portas, mas somente a virtude entra.
Agrada-me ver a santidade no paciente povo de Deus: nos pais que criam com tanto amor os filhos, nos homens e nas mulheres que trabalham para levar o pão para casa, nos doentes, nas religiosas idosas que continuam a sorrir. Nessa constância para andar em frente dia após dia vejo a santidade da Igreja. Esta é tantas vezes a santidade «da porta ao lado», daqueles que vivem perto de nós e são um reflexo da presença de Deus.
A necessidade fecha a porta a todos os conselhos quando é irremediável.
Deixa o que Seduz a Multidão
Se nós nada fizermos senão de acordo com os ditames da razão, também nada evitaremos senão de acordo com os ditames da razão. Se quiseres escutar a razão, eis o que ela te dirá: deixa de uma vez por todas tudo quanto seduz a multidão! Deixa a riqueza, deixa os perigos e os fardos de ser rico; deixa os prazeres, do corpo e do espírito, que só servem para amolecer as energias; deixa a ambição que não passa de uma coisa artificialmente empolada, inútil, inconsciente, incapaz de reconhecer limites, tão interessada em não ter superiores como em evitar até os iguais, sempre torturada pela inveja, e uma inveja ainda por cima dupla. Vê como de facto é infeliz quem, objecto de inveja ele próprio, tem inveja por outros.
Não estás a ver essas casas dos grandes senhores, as suas portas cheias de clientes que se atropelam na entrada? Para lá entrares, teria de sujeitar-te a inúmeras injúrias, mas mais ainda terias de suportar se entrasses. Passa frente às escadarias dos ricos senhores, aos seus átrios suspensos como terraços: se lá puseres os pés será como estares à beira de uma escarpa, e de uma escarpa prestes a ruir. Dirige ante os teus passos na via da sapiência,
Testamento Aberto
Só para ver curar minhas pernas partidas
Nas dores eternas
Dos saltos gorados,
Eu amo a aparente inconsciência dos loucos,
Embora fique aos poucos nos meus saltos
Desabridos e falhados.Apraz-me, no espelho, esta face esmagada,
À força de querer transpor o além
Da minha porta fechada…Porém,
Seja o que for, que seja,
Se uma CERTEZA alcanço
E uma mulher me beija.Que importa
Que eu fique molemente olhando a minha porta
Aberta,
Ou que eu parta e a morte me espreite
Num desfiladeiro?…
E quem virá chorar e quem virá,
Se a morte que vier for a de lá
Certeira e minha…
E merecida como um sono que se dorme
Após a noite perdida?…E que piedade anda a escrever um frágil,
Na embalagem dos ossos
Que trago emprestados…
Que deixarei ficar ao sol e à chuva
E que serão limados
No entulho dos calhaus que também foram rocha?…Para quê, se mil vezes provoco
Os tombos do chegar e do partir?!
–
Se um dia fecharem-lhe as portas da vida, pule a janela.
Torniquete
A tômbola anda depressa,
Nem sei quando irá parar –
Aonde, pouco me importa;
O importante é que pare…
– A minha vida não cessa
De ser sempre a mesma porta
Eternamente a abanar…Abriu-se agora o salão
Onde há gente a conversar.
Entrei sem hesitação –
Somente o que se vai dar?
A meio da reunião,
Pela certa disparato,
Volvo a mim a todo o pano:Às cambalhotas desato,
E salto sobre o piano…
– Vai ser bonita a função!
Esfrangalho as partituras,
Quebro toda a caqueirada,
Arrebento à gargalhada,
E fujo pelo saguão…Meses depois, as gazetas
Darão críticas completas,
Indecentes e patetas,
Da minha última obra…
E eu – prà cama outra vez,
Curtindo febre e revés,
Tocado de Estrela e Cobra…
À Braseira
Saio da tua casa. Escorrega,
do codo, a rua. Alcanço a porta amiga
de teu Tio, que espera a suecada.
Ah! que rica braseira! Levas, pronto,
uma chita, ou lavagem, ou lambida,
ou rapada. Um jagodes, na Emissora,
alude a um trintanário de missas
que impôs um qualquer coiso em testamento.
Eu barafusto. Rica bacorada!
Que viva a bela pândega dos burros!
A braseira consola. Cai folheca
lá fora. Os vidros suam, lagrimejam.
Apanhas, de seguida, três capotes.
Quando se está preso, o pior é não poder fechar-se a porta.
Opiário
Ao Senhor Mário de Sá-Carneiro
É antes do ópio que a minh’alma é doente.
Sentir a vida convalesce e estiola
E eu vou buscar ao ópio que consola
Um Oriente ao oriente do Oriente.Esta vida de bordo há-de matar-me.
São dias só de febre na cabeça
E, por mais que procure até que adoeça,
já não encontro a mola pra adaptar-me.Em paradoxo e incompetência astral
Eu vivo a vincos de ouro a minha vida,
Onda onde o pundonor é uma descida
E os próprios gozos gânglios do meu mal.É por um mecanismo de desastres,
Uma engrenagem com volantes falsos,
Que passo entre visões de cadafalsos
Num jardim onde há flores no ar, sem hastes.Vou cambaleando através do lavor
Duma vida-interior de renda e laca.
Tenho a impressão de ter em casa a faca
Com que foi degolado o Precursor.Ando expiando um crime numa mala,
Que um avô meu cometeu por requinte.
Tenho os nervos na forca, vinte a vinte,
E caí no ópio como numa vala.
Os Comunistas
… Passaram bastantes anos desde que ingressei no Partido… Estou contente… Os comunistas constituem uma boa família… Têm a pele curtida e o coração valoroso… Por todo o lado recebem pauladas… Pauladas exclusivamente para eles… Vivam os espiritistas, os monárquicos, os aberrantes, os criminosos de vários graus… Viva a filosofia com fumo mas sem esqueletos… Viva o cão que ladra e que morde, vivam os astrólogos libidinosos, viva a pornografia, viva o cinismo, viva o camarão, viva toda a gente menos os comunistas… Vivam os cintos de castidade, vivam os conservadores que não lavam os pés ideológicos há quinhentos anos… Vivam os piolhos das populações miseráveis, viva a força comum gratuita, viva o anarco-capitalismo, viva Rilke, viva André Gide com o seu coribantismo, viva qualquer misticismo… Tudo está bem… Todos são heróicos… Todos os jornais devem publicar-se… Todos devem publicar-se, menos os comunistas… Todos os políticos devem entrar em São Domingos sem algemas… Todos devem festejar a morte do sanguinário Trujillo, menos os que mais duramente o combateram… Viva o Carnaval, os derradeiros dias do Carnaval… Há disfarces para todos… Disfarces de idealistas cristãos, disfarces de extrema-esquerda, disfarces de damas beneficentes e de matronas caritativas… Mas, cuidado, não deixem entrar os comunistas…
Aperta-me para Sempre
O dia adormece-me debaixo dos olhos, e as tuas mãos são a pele que Deus escolheu para tocar o mundo; não existe nenhum lugar mais divino do que o teu beijo, e quando quero voar deito-me a teus pés.
Peço-te que não vás, que fiques apenas para eu ficar, que permaneças no teu lado da cama, e eu no meu, a sentirmos que o tempo corre, e podes até adormecer, podes ler a revista das mulheres das passadeiras vermelhas e os homens com os abdominais que ninguém tem, ou simplesmente olhar o tecto e pensar em ti; eu fico aqui, a olhar-te para saber que existo, a pensar no quanto te quero e no tamanho que tem o teu corpo dentro do meu. Saber que há a curva das tuas costas para encontrar a curva da vida, percorrer com os olhos o cair do teu suor, e perceber a eternidade possível.
A imortalidade é um orgasmo contigo.
Gemes até ao fim do mundo por dentro dos meus ouvidos, todo o meu corpo se vem quando estás a chegar, e a verdade do universo é a física exígua do espaço entre nós. Aperta-me para sempre até ao princípio dos ossos,
Só nós dois
Só nós dois é que sabemos
O quanto nos queremos bem
Só nós dois é que sabemos
Só nós dois e mais ninguém
Só nós dois avaliamos
Este amor, forte, profundo…
Quando o amor acontece
Não pede licença ao mundoAnda, abraça-me… beija-me
Encosta o teu peito ao meu
Esqueça o que vai na rua
Vem ser meu, eu serei tua
Que falem não nos interessa
O mundo não nos importa
O nosso mundo começa
Ca; dentro da nossa porta.Só nós dois é que sabemos
O calor dos nossos beijos
Só nós dois é que sofremos
As torturas dos desejos
Vamos viver o presente
Tal-qual a vida nos dá
O que reserva o futuro
Só Deus sabe o que será.