Sonetos sobre Céu

360 resultados
Sonetos de céu escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

A. S. Francisco Tomando O Poeta O Habito De Terceyro

Ă“ magno serafim, que a Deus voaste
Com asas de humildade, e paciĂŞncia,
E absorto já nessa divina essência
Logras o eterno bem, a que aspiraste:

Pois o caminho aberto nos deixaste,
Para alcançar de Deus também clemência
Na ordem singular de penitĂŞncia
Destes Filhos Terceiros, que criaste.

A Filhos, como Pai, olha queridos,
E intercede por nĂłs, Francisco Santo,
Para que te sigamos, e imitemos.

E assim desse teu hábito vestidos
Na terra blasonemos de bem tanto,
E depois para o Céu juntos voemos.

O Sr. Abbade

Quando vem Junho e deixo esta cidade,
Batina, Caes, tuberculozos céus,
Vou para o Seixo, para a minha herdade:
Adeus, cavaco e luar! choupos, adeus!

Tomo o regimen do Sr. Abbade,
E faço as pazes, elle o quer, com Deus.
No seu direito olhar vejo a bondade,
E ás capellinhas vou ver os judeus.

Que homem sem par! Ignora o que sĂŁo dores!
Para elle uma ramada Ă© o pallio verde,
Os cachos d’uvas sĂŁo as suas flores!

Ao seu passal chama elle o mundo todo…
Sr. Abbade! olhe que nada perde:
Viva na paz, ahi, longe do lodo.

LXXIX

Entre este álamo, o Lise, e essa corrente,
Que agora estĂŁo meus olhos contemplando,
Parece, que hoje o céu me vem pintando
A mágoa triste, que meu peito sente.

Firmeza a nenhum deles se consente
Ao doce respirar do vento brando;
O tronco a cada instante meneando,
A fonte nunca firme, ou permanente.

Na líquida porção, na vegetante
CĂłpia daquelas ramas se figura
Outro rosto, outra imagem semelhante:

Quem nĂŁo sabe, que a tua formosura
Sempre móvel está, sempre inconstante,
Nunca fixa se viu, nunca segura?

Tentara o Amor de Abril

Tentara o amor de Abril tornar mais duro,
Naquele mês de céu azul cortado
Pelas pandorgas cor do assombro, o brado
Que no meu peito armava o meu futuro;

Porque de novo, a procurar, procuro,
De bruços na janela, e debruçado
Por sobre as mágoas deste amor calado,
Nas portas tenebrosas, o ar mais puro.

Firmando para o Norte, o brando povo
Das andorinhas parte, e fervoroso
Consuma o seu destino. Eu tento armá-lo

No céu da alma, e durmo procurando
Essa firmeza no abandono, e calo,
Por pouco tempo embora o como e o quando.

Tese e AntĂ­tese

I

Já não sei o que vale a nova idéia,
Quando a vejo nas ruas desgrenhada,
Torva no aspecto, Ă  luz da barricada,
Como bacchante apĂłs lĂşbrica ceia…

Sanguinolento o olhar se lhe incendeia;
Respira fumo e fogo embriagada:
A deusa de alma vasta e sossegada
Ei-la presa das fĂşrias de Medeia!

Um século irritado e truculento
Chama Ă  epilepsia pensamento,
Verbo ao estampido de pelouro e obuz…

Mas a idea Ă© n’um mundo inalterável,
N’um cristalino cĂ©u, que vive estável…
Tu, pensamento, não és fogo, és luz!

II

N’um cĂ©u intemerato e cristalino
Pode habitar talvez um Deus distante,
Vendo passar em sonho cambiante
O Ser, como espectáculo divino.

Mas o homem, na terra onde o destino
O lançou, vive e agita-se incessante:
Enche o ar da terra o seu pulmĂŁo possante…
Cá da terra blasfema ou ergue um hino…

A idéia encarna em peitos que palpitam:
O seu pulsar sĂŁo chamas que crepitam,
Paixões ardentes como vivos sóis!

Combatei pois na terra árida e bruta,

Continue lendo…

Soneto III

A D. FernĂŁo Martins Mascarenhas quando o fizeram Bispo.

Espanta crecer tanto o Crocodilo
SĂł por seu acanhado nascimento,
Que se maior nascera, mais isento
Estivera d’espanto o pátrio Nilo.

Em vão levantará meu baixo estilo
Vosso Pontifical novo ornamento,
Pois no ventre o imortal merecimento
Vo-lo talhou, para despois visti-lo.

Tardou, mas veio, que a quem mais merece
Muito mais tarde vir o prémio é certo,
E sempre tarda, inda que venha cedo.

Os Céus, que do primeiro estão mais perto,
Mais devagar se movem; quem soubesse
Trás d’aquele segredo, este segredo?

No mundo quis o Tempo que se achasse

No mundo quis o Tempo que se achasse
O bem que por acerto ou sorte vinha;
E, por exprimentar que dita tinha,
Quis que a Fortuna em mim se exprimentasse.

Mas por que meu destino me mostrasse
Que nem ter esperanças me convinha,
Nunca nesta tĂŁo longa vida minha
Cousa me deixou ver que desejasse.

Mudando andei costume, terra e estado,
Por ver se se mudava a sorte dura;
A vida pus nas mĂŁos de um leve lenho.

Mas, segundo o que o Céu me tem mostrado,
Já sei que deste meu buscar ventura
Achado tenho já que não a tenho.

Retrato da Beleza Nova e Pura

Retrato da beleza nova e pura
Que com divina mĂŁo, divino engenho,
Amor retratou na alma, onde vos tenho
Das injĂşrias do tempo mais segura,

NĂŁo mostreis aspereza em tal brandura,
Por vos vingar de mim, vendo que venho
a tanta confiança, que detenho
Os olhos em tamanha formosura.

O resplendor do Céu, sem dar mais pena
A quem olha seus raios em direito,
A vista só por breve espaço assombra,

Mas vossa luz mais clara, mais serena,
Juntamente me cega, e abrasa o peito:
Vede o Sol que fará, de que sois sombra!

ProdĂ­gio!

Como o Rei Lear nĂŁo sentes a tormenta
Que te desaba na fatal cabeça!
(Que o cĂ©u d’estrelas todo resplandeça.)
A tua alma, na Dor, mais nobre aumenta.

A Desventura mais sanguinolenta
Sobre os teus ombros impiedosa desça,
Seja a treva mais funda e mais espessa,
Todo o teu ser em mĂşsicas rebenta.

Em mĂşsicas e em flores infinitas
De aromas e de formas esquisitas
E de um mistĂ©rio singular, nevoento…

Ah! sĂł da Dor o alto farol supremo
Consegue iluminar, de extremo a extremo,
o estranho mar genial do Sentimento!

Miserável

A Carvalho Junior.

O noivo, como noivo, Ă© repugnante:
MaterialĂŁo, estĂşpido, chorudo,
Arrotando, a propĂłsito de tudo,
O ser comendador e negociante.

Tem a viuvinha, a noiva interessante,
Todo o arsenal de um poeta guedelhudo:
Alabastro, marfim, coral, veludo,
Azeviche, safira e tutti quanti.

Da misteriosa alcova a porta geme,
O noivo dorme n’um lençol envolto…
Entra a viuvinha, a noiva… Oh, cĂ©u, contem-me!

Ela deita-se… espera… Qual! Revolto,
O leito estala… Ela suspira… freme…,
E o miserável dorme a sono solto!…

Presença Bela, Angélica Figura

Presença bela, angélica figura,
em quem, quanto o Céu tinha, nos tem dado;
gesto alegre, de rosas semeado,
entre as quais se está rindo a Fermosura;

olhos, onde tem feito tal mistura
em cristal branco o preto marchetado,
que vemos já no verde delicado
não esperança, mas enveja escura;

brandura, aviso e graça, que aumentando
a natural beleza cum desprezo,
com que, mais desprezada, mais se aumenta;

são as prisões de um coração que, preso,
seu mal ao som dos ferros vai cantando,
como faz a sereia na tormenta.

TitĂŁs Negros

Hirtas de Dor, nos áridos desertos
Formidáveis fantasmas das Legendas,
Marcham além, sinistras e tremendas,
As caravanas, dentre os cĂ©us abertos…

Negros e nus, negros TitĂŁs, cobertos
Das bocas vis das chagas vis e horrendas,
Marcham, caminham por estranhas sendas,
Passos vagos, sonâmbulos, incertos…

Passos incertos e os olhares tredos,
Na convulsão de trágicos segredos,
De agonias mortais, febres vorazes…

TĂŞm o aspecto fatal das feras bravas
E o rir pungente das legiões escravas,
De dantescos e torvos Satanases!…

Cuidado!

Ă“ namorados que passais, sonhando,
quando bóia, no céu, a lua cheia!
Que andais traçando corações na areia
e corações nos peitos apagando!

Desperta os ninhos vosso passo… E quando
pelas bocas em flor o amor chilreia,
nem sei se Ă© o vosso beijo que gorjeia,
se sĂŁo as aves que se estĂŁo beijando…

Mais cuidado! Não vá vossa alegria
afligir tanta gente que seria
feliz sem nunca ouvir nem nunca ver!

Poupai a ingenuidade delicada
dos que amaram sem nunca dizer nada,
dos que foram amados sem saber!

Bendita

Bendita sejas, minha mĂŁe, bendito
Seja o teu seio, imaculado e santo,
Onde derrama as gotas de seu pranto
Meu dolorido coração aflito.

Ă“ minha mĂŁe, Ăł anjo sacrossanto,
Bendito seja o teu amor, bendito!
Ouve do Céu o amargurado grito
Cheio da dor de quem soluça tanto.

E deixa que repouse em teus joelhos
A minha fronte, ouvindo os teus conselhos
Longe do mundo, Ăł sempiterna dita!

Envia lá do céu no teu sorriso
A morte que levou-te ao ParaĂ­so…
Bendita sejas, minha mĂŁe, bendita!

Falando Ao Céu

Falas ao Céu, Amor! Em vão tu falas!
Mas o céu, esse é velho, esse é velhinho,
Todo ele Ă© branco, faz lembrar o linho
Dos leitos alvos onde tu te embalas.

A alma do céu é como velhas salas
Sem ar, sem luz, como lares sem vinho
Sem água e pão, sem fogo e sem carinho,
Sem as mais toscas, as mais simples galas.

Sempre surdo, hoje o cĂ©u Ă© mudo, Ă© cego…
Jamais o coração ao céu entrego,
Eu que tĂŁo cego vou por entre abrolhos.

Mas se queres tornar jovem e louro
Dá-lhe o bordão do teu amor um pouco
Fala e vista, com a vida dos teus olhos…

Noiva

Ei-la toda de branco. Aos pés, o imenso véu
como em flocos de espuma, espalhado no chĂŁo…
No ar, dentro do olhar, cabe inteirinho um céu,
e leva um cĂ©u maior dentro do coração…

Nos lábios… Ah! nos lábios o sabor do mel,
e uma carĂ­cia em flor se entreabre em cada mĂŁo,
– e que tremor no braço, ao deixar no papel
o nome dela, o dele… os dois desde entĂŁo…

Quem lhe falou da vida ? A vida Ă© um sonho, a vida
é esse caminho azul, esse estranho embaraço
de sentir-se ao seu lado adorada e querida…

Aos seus pĂ©s, como nuvem branca, o imenso vĂ©u…
Quem dirá, que ao seguir apoiada ao seu braço
nĂŁo pensa que caminha em direção ao cĂ©u ?…

Soneto V – Ă€ Sra. Marieta Landa

Disseste a nota amena d’alegria,
E, arrebatado entĂŁo nesse momento
De um doce, divinal contentamento,
Eu senti que minh’alma aos cĂ©us subia.

Disseste a nota da melancolia,
Negra nuvem toldou-me o pensamento;
Senti que agudo espinho virulento
Do coração as fibras me rompia.

És anjo ou nume, tu que desta sorte
Trazes o peito humano arrebatado
Em sucessivo e rápido transporte?!

Anjo ou nume não és; mas, se te é dado
No canto dar a vida, ou dar a morte,
Tens nas mĂŁos teu Porvir, teu bem, teu fado.

Prece

Bendita sejas tu em meu caminho!
Bendita sejas tu, pela coragem
com que fizeste de um amor selvagem
esse amor que se humilha ao teu carinho!

Bendita sejas, porque a tua imagem
suaviza toda angĂşstia e todo espinho…
Já não maldigo a insipidez da viagem,
nem me sinto sĂł, nem vou sozinho…

Bendita sejas tantas vezes quantas
são as aves no céu; e são as plantas
na terra; e são as horas de emoção

em que juntos ficamos, de mĂŁos dadas,
como se nossas vidas irmanadas
vivessem por um mesmo coração!

Ambos

VĂŁo pela estrada, Ă  margem dos caminhos
Arenosos, compridos, salutares,
Por onde, a noite, os lĂ­mpidos luares
DĂŁo Ă s verduras leves tons de arminhos.

Nuvens alegres como os alvos linhos
Cortam a doce compridĂŁo dos ares,
Dentre as canções e os tropos singulares
Dos inefáveis, meigos passarinhos.

Do céu feliz na branda curvidade,
A luz expande a inteira alacridade,
O mais supremo e encantador afago.

E com o olhar vibrante de desejos
VĂŁo decifrando os trĂŞmulos arpejos,
E as reticĂŞncias que produz o vago.

PlenilĂşnio

Vês este céu tão límpido e constelado
E este luar que em fĂşlgida cascata,
Cai, rola, cai, nuns borbotões de prata…
VĂŞs este cĂ©u de mármore azulado…

Vês este campo intérmino, encharcado
Da luz que a lua aos páramos desata…
Vês este véu que branco se dilata
Pelo verdor do campo iluminado…

VĂŞs estes rios, tĂŁo fosforescentes,
Cheios duns tons, duns prismas reluzentes,
VĂŞs estes rios cheios de ardentias…

VĂŞs esta mole e transparente gaze…
Pois Ă©, como isso me parecem quase
Iguais, assim, Ă s nossas alegrias!