Sonetos sobre Lábios de Augusto dos Anjos

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Sonetos de lábios de Augusto dos Anjos. Leia este e outros sonetos de Augusto dos Anjos em Poetris.

A Esmola De Dulce

Ao Alfredo A.

E todo o dia eu vou como um perdido
De dor, por entre a dolorosa estrada,
Pedir a Dulce, a minha bem amada,
A esmola dum carinho apetecido.

E ela fita-me, o olhar enlanguescido,
E eu balbucio trĂŞmula balada:
– Senhora, dai-me u’a esmola – e estertorada
A minha voz soluça num gemido.

Morre-me a voz, e eu gemo o Ăşltimo harpejo,
Estendo à Dulce a mão, a fé perdida,
E dos lábios de Dulce cai um beijo.

Depois, como este beijo me consola!
Bendita seja a Dulce! A minha vida
Estava unicamente nessa esmola.

A Meu Pai Depois De Morto

Podre meu Pai! A Morte o olhar lhe vidra.
Em seus lábios que os meus lábios osculam
Micro-organismos fĂşnebres pululam
Numa fermentação gorda de cidra.

Duras leis as que os homens e a hĂłrrida hidra
A uma sĂł lei biolĂłgica vinculam,
E a marcha das moléculas regulam,
Com a invariabilidade da clepsidra!…

Podre meu Pai! E a mĂŁo que enchi de beijos
RoĂ­da toda de bichos, como os queijos
Sobre a mesa de orgĂ­acos festins!…

Amo meu Pai na atĂ´mica desordem
Entre as bocas necrĂłfagas que o mordem
E a terra infecta que lhe cobre os rins!