Sonetos sobre Mãos

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Sonetos de mãos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Prince Charmant

A Raul Proença

No lânguido esmaecer das amorosas
Tardes que morrem voluptuosamente
Procurei-O no meio de toda a gente.
Procurei-O em horas silenciosas!

Ó noites da minh’alma tenebrosas!
Boca sangrando beijos, flor que sente…
Olhos postos num sonho, humildemente…
Mãos cheias de violetas e de rosas…

E nunca O encontrei!…Prince Charmant…
Como audaz cavaleiro em velhas lendas
Virá, talvez, nas névoas da manhã!

Em toda a nossa vida anda a quimera
Tecendo em frágeis dedos frágeis rendas…
— Nunca se encontra Aquele que se espera!…

Soneto Quebradiço

Mão minha com maminha movediça
traçando vai na limpa areia branca
versos cambaios, frouxos, na liça
língua caçanje, claudicante, manca.

No pé quebrado o ritmo se atiça
para dançar com rimas pobres, franca
trança de cambalhota tão cediça,
que me corrompe o salto e que me estanca.

Queda de braço nas quebradas quebras
vou me quebrando como um bardo gauche:
pelas savanas sou mais uma zebra.

Mas consciente desse torto approuch
já me socorre a gíria de alma treta
para solar meu solo nos ouvidos moucos.

Princípio de Amores com Marília

Um rácimo ferral engrinaldado
Com rosas carmesins no seu regaço,
Tinha Marília um dia, e o pé, c’um laço,
De fita verde mar lhe tinha atado.

Eu, de seus magos olhos já tocado,
Junto dela cheguei com leve passo,
E furtando-lhe o cacho, dele faço
Néctar que a Jove, igual, nunca foi dado

Em taça de cristal, co’as mesmas rosas,
E do mesmo listão toda enfeitada,
O licor lhe fui pôr nas mãos mimosas.

Marília se sorriu, bebeu, corada,
O sagrado elixir e as deleitosas
Primícias deu d’Amor, por Baco instada.

As Tuas Mãos Terminam Em Segredo

As tuas mãos terminam em segredo.
Os teus olhos são negros e macios
Cristo na cruz os teus seios (?) esguios
E o teu perfil princesas no degredo…

Entre buxos e ao pé de bancos frios
Nas entrevistas alamedas, quedo
O vendo põe o seu arrastado medo
Saudoso o longes velas de navios.

Mas quando o mar subir na praia e for
Arrasar os castelos que na areia
As crianças deixaram, meu amor,

Será o haver cais num mar distante…
Pobre do rei pai das princesas feias
No seu castelo à rosa do Levante !

Languidez

Tardes da minha terra, doce encanto,
Tardes duma pureza de açucenas,
Tardes de sonho, as tardes de novenas,
Tardes de Portugal, as tardes de Anto,

Como eu vos quero e amo! Tanto! Tanto!
Horas benditas, leves como penas,
Horas de fumo e cinza, horas serenas,
Minhas horas de dor em que eu sou santo!

Fecho as pálpebras roxas, quase pretas,
Que poisam sobre duas violetas,
Asas leves cansadas de voar …

E a minha boca tem uns beijos mudos …
E as minhas mãos, uns pálidos veludos,
Traçam gestos de sonho pelo ar …

Desdéns

Realçam no marfim da ventarola
As tuas unhas de coral felinas
Garras com que, a sorrir, tu me assassinas,
Bela e feroz… O sândalo se evolua;

O ar cheiroso em redor se desenrola;
Pulsam os seios, arfam as narinas…
Sobre o espaldar de seda o torso inclinas
Numa indolência mórbida, espanhola…

Como eu sou infeliz! Como é sangrenta
Essa mão impiedosa que me arranca
A vida aos poucos, nesta morte lenta!

Essa mão de fidalga, fina e branca;
Essa mão, que me atrai e me afugenta,
Que eu afago, que eu beijo, e que me espanca!

Não Me Aflige Do Potro A Viva Quina;

Não me aflige do potro a viva quina;
Da férrea maça o golpe não me ofende;
Sobre as chamas a mão se não estende;
Não sofro do agulhete a ponta fina.

Grilhão pesado os passos não domina;
Cruel arrocho a testa me não fende;
À força perna ou braço se não rende;
Longa cadeia o colo não me inclina.

Água e pomo faminto não procuro;
Grossa pedra não cansa a humanidade;
A pássaro voraz eu não aturo.

Estes males não sinto, é bem verdade;
Porém sinto outro mal inda mais duro:
Da consorte e dos filhos a saudade!

Ingratos

Não maldigo o rigor da iníqua sorte,
Por mais atroz que fosse e sem piedade,
Arrancando-me o trono e a majestade,
Quando a dous passos só estou da morte.

Do jogo das paixões minha alma forte
Conhece bem a estulta variedade,
Que hoje nos dá contínua f’licidade
E amanhã nem — um bem que nos conforte.

Mas a dor que excrucia e que maltrata,
A dor cruel que o ânimo deplora,
Que fere o coração e pronto mata,

É ver na mão cuspir a extrema hora
A mesma boca aduladora e ingrata,
Que tantos beijos nela pôs — outrora.

De Martins Pena Foi Bem Triste A Sorte

De Martins Pena foi bem triste a sorte:
Moço, bem moço, quando o seu talento
Desabrochava n’um deslumbramento,
Caiu, ferido pela mão da morte!

Era, entretanto, um lutador, um forte,
E, como não merece o esquecimento,
Que a nossa festa, ao menos um momento,
O seu risonho espírito conforte.

Quem o amou e o leu em vão procura
O seu nome na placa de uma esquina
Ou sobre a pedra de uma sepultura!

Porém, voltando à brasileira cena,
Há de brilhar a estrela peregrina
Que se chamou Luiz Carlos Martins Pena!

O Desfecho

Prometeu sacudiu os braços manietados
E súplice pediu a eterna compaixão,
Ao ver o desfilar dos séculos que vão
Pausadamente, como um dobre de finados.

Mais dez, mais cem, mais mil e mais um bilião,
Uns cingidos de luz, outros ensangüentados…
Súbito, sacudindo as asas de tufão,
Fita-lhe a água em cima os olhos espantados.

Pela primeira vez a víscera do herói,
Que a imensa ave do céu perpetuamente rói,
Deixou de renascer às raivas que a consomem.

Uma invisível mão as cadeias dilui;
Frio, inerte, ao abismo um corpo morto rui;
Acabara o suplício e acabara o homem.

Pouso

Pervaguei muito tempo a procura de um pouso
como alguém que batesse em vão de porta em porta
– meu olhar, parecia perguntar ansioso:
quem me dá sua mão?… quem minha alma conforta!

Caminheiro sem rumo, a alma já quase morta,
via ao longe o caminho intérmino e sinuoso…
– (quanta coisa afinal na vida se suporta
antes de conseguir-se um pouco de repouso!)

Minha vida era assim… – uma estrada vazia…
E eu caminhava a olhar buscando o que surgisse
a frente, – e ao meu redor tudo aos poucos fugia…

Até que te encontrei! … E se não te encontrasse,
– talvez ha muito tempo eu já não existisse!
– talvez que ha muito tempo eu já não caminhasse!

Um Sorriso

Vinha caindo a tarde. Era um poente de agosto.
A sombra já enoitava as moutas. A umidade
Aveludava o musgo. E tanta suavidade
Havia, de fazer chorar nesse sol-posto.

A viração do oceano acariciava o rosto
Como incorpóreas mãos. Fosse ágoa ou saudade,
Tu olhavas, sem ver, os vales e a cidade.
– Foi então que senti sorrir o meu desgosto…

Ao fundo o mar batia a crista dos escolhos…
Depois o céu… e mar e céus azuis: dir-se-ia
Prolongarem a cor ingênua de teus olhos…

A paisagem ficou espiritualizada.
Tinha adquirido uma alma. E uma nova poesia
Desceu do céu, subiu do mar, cantou na estrada…

Eu Vi Dos Pólos O Gigante Alado

Eu vi dos pólos o gigante alado,
Sobre um montão de pálidos coriscos,
Sem fazer caso dos bulcões ariscos,
Devorando em silêncio a mão do fado!

Quatro fatias de tufão gelado
Figuravam da mesa entre os petiscos;
E, envolto em manto de fatais rabiscos,
Campeava um sofisma ensangüentado!

– “Quem és, que assim me cercas de episódios?”
Lhe perguntei, com voz de silogismo,
Brandindo um facho de trovões seródios.

– “Eu sou” – me disse, – “aquele anacronismo,
Que a vil coorte de sulfúreos ódios
Nas trevas sepultei de um solecismo…”

Sou Eu!

À minha ilustre camarada Laura haves

Pelos campos em fora, pelos combros,
Pelos montes que embalam a manhã,
Largo os meus rubros sonhos de pagã,
Enquanto as aves poisam nos meus ombros…

Em vão me sepultaram entre escombros
De catedrais duma escultura vã!
Olha-me o loiro sol tonto de assombros,
as nuvens, a chorar, chamam-me irmã!

Ecos longínquos de ondas… de universos..
Ecos dum Mundo… dum distante Além,
Donde eu trouxe a magia dos meus versos!

Sou eu! Sou eu! A que nas mãos ansiosas
Prendeu da vida, assim como ninguém,
Os maus espinhos sem tocar nas rosas!

Toledo

Diluído numa taça de oiro a arder
Toledo é um rubi. E hoje é só nosso!
O sol a rir… Vivalma… Não esboço
Um gesto que me não sinta esvaecer…

As tuas mãos tacteiam-me a tremer…
Meu corpo de âmbar, harmonioso e moço
É como um jasmineiro em alvoroço
Ébrio de sol, de aroma, de prazer!

Cerro um pouco o olhar onde subsiste
Um romântico apelo vago e mudo,
– Um grande amor é sempre grave e triste.

Flameja ao longe o esmalte azul do Tejo…
Uma torre ergue ao céu um grito agudo…
Tua boca desfolha-me num beijo…

A Vida que Vivemos

A vida que vivemos encerrou-se
na concha de coral duma lembrança.
Por muros altaneiros confmou-se,
volteia dentro deles em suave dança.

Liberta de sonhar, por tal fronteira,
condenada a um eterno redopio,
pusilânime e triste timoneira
balançando ao sabor do teu navio,

ó estranha expressão de movimento,
tão escrava de ti que não tens fim,
ó reduto fechado dum tormento

cujas mãos me maltratam só a mim,
deixa as aves lançarem no teu meio
essa sombra das asas por que anseio!

Ela, em meu Sonho

Ela vivia num palácio mouro…
Nas harpas, os seus dedos a espreitarem
como pajens curiosos, a afastarem
os cortinados todos fios de ouro.

As suas mãos, tão leves como as aves,
ora fugiam volitando, frias,
ora pesam, trêmulas, suaves,
nas cordas, a sonharem melodias…

E os sons que ela tangia, aos seus ouvidos
chegaram, receosos de senti-la,
voltavam a não ser nunca tangidos.

É que ela, as suas mãos, as harpas de ouro,
não eram mais do que um supor ouvi-la
e o meu julgá-la num palácio mouro.

Riso

Tive o jeito de rir, quando menino,
Até beber as lágrimas choradas:
Com carantonhas, gestos, desatino,
Passou a nuvem e os pequenos nadas.

A rir de escuridões, de encruzilhadas,
Tornei-me afeito logo em pequenino;
Porque ri é que trago as mãos geladas,
E choro porque ri do meu destino.

Vivi de mais num mundo idealizado
Comigo só: E só de mim descreio
Entornava-me riso a luz em cheio

Quando o meu mundo foi principiado;
Rio agora que não sei donde me veio
Sempre o mal que me trouxe o bem sonhado.

Ambiciosa

Para aqueles fantasmas que passaram,
Vagabundos a quem jurei amar,
Nunca os meus braços lânguidos traçaram
O vôo dum gesto para os alcançar…

Se as minhas mãos em garra se cravaram
Sobre um amor em sangue a palpitar…
– Quantas panteras bárbaras mataram
Só pelo raro gosto de matar!

Minha alma é como a pedra funerária
Erguida na montanha solitária
Interrogando a vibração dos céus!

O amor dum homem? – Terra tão pisada!
Gota de chuva ao vento baloiçada…
Um homem? – Quando eu sonho o amor dum deus!…

Noitinha

A noite sobre nós se debruçou…
Minha alma ajoelha, põe as mãos e ora!
O luar, pelas colinas, nesta hora,
É água dum gomil que se entornou…

Não sei quem tanta pérola espalhou!
Murmura alguém pelas quebradas fora…
Flores do campo, humildes, mesmo agora.
A noite, os olhos brandos, lhes fechou…

Fumo beijando o colmo dos casais…
Serenidade idílica de fontes,
E a voz dos rouxinóis nos salgueirais…

Tranquilidade… calma… anoitecer…
Num êxtase, eu escuto pelos montes
O coração das pedras a bater…