Sonetos sobre Vergonha

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Sonetos de vergonha escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Arrependimento

Deste amor torturado e sem ventura
Resta-me o alívio do arrependimento.
O pouco que me deste de ternura
Não vale o que te dei de encantamento.

Abri para o teu sonho o firmamento,
Semeei de estrelas tua noite escura.
Dei-te alma, exaltação e sentimento.
Fiz de um bloco de pedra uma criatura.

Hoje, ambos à mercê de sorte avessa,
Se para te esquecer luto e me esforço,
Manda-me o coração que não te esqueça.

Padecemos idêntico suplício:
Tu – corroída de pena e de remorso,
Eu – com vergonha do meu sacrifício.

Pecador

Este é o altivo pecador sereno,
Que os soluços afoga na garganta,
E, calmamente, o copo de veneno
Aos lábios frios sem tremer levanta.

Tonto, no escuro pantanal terreno
Rolou. E, ao cabo de torpeza tanta,
Nem assim, miserável e pequeno,
Com tão grandes remorsos se quebranta.

Fecha a vergonha e as lágrimas consigo…
E, o coração mordendo impenitente,
E, o coração rasgando castigado,

Aceita a enormidade do castigo,
Com a mesma face com que antigamente
Aceitava a delícia do pecado.

Desengano

A pensionista pálida que gosta
(Fundada pretensão!) que a digam bela,
E do colégio, à tarde, na janela,
Para dar-me um sorriso se recosta;

Que me escreve nas férias, de Bemposta,
Aonde vai visitar a parentela,
Pedindo-me que não me esqueça dela
E dando-me uns beijinhos…, pela posta;

Essa ninfa gentil dos olhos pretos,
Essa beleza de anjo… oh, sorte varia;
Vergonha eterna para os meus bisnetos!

Com um pançudo burguês, uma alimária
Que não a sabe amar, nem faz sonetos,
Vai casar-se amanhã na Candelária.

Os Versos, que Cantei Importunado

Os versos, que cantei importunado
Da mocidade cega a quem seguia,
Queimei (como vergonha me pedia)
Chorando, por haver tão mal cantado.

Se nestes não ficar tão desculpado
Quanto mais alto estilo merecia,
Não me podem negar a melhoria
Da mudança, que diz dum noutro estado.

Que vai que sejam bem ou mal aceitos?
Pois não os escrevi para louvores
Humanos, pelo menos perigosos,

Senão para plantar em tenros peitos
Desejos de colher divinas flores
À força de suspiros saudosos.

Arvore, Cujo Pomo, Belo E Brando

Arvore, cujo pomo, belo e brando,
natureza de leite e sangue pinta,
onde a pureza, de vergonha tinta,
está virgíneas faces imitando;

nunca da ira e do vento, que arrancando
os troncos vão, o teu injúria sinta;
nem por malícia de ar te seja extinta
a cor, que está teu fruto debuxando;

que, pois me emprestas doce e idóneo abrigo
a meu contentamento, e favoreces
com teu suave cheiro minha glória,

se não te celebrar como mereces,
cantando te, sequer farei contigo
doce, nos casos tristes, a memória.

Soneto XVI

Já tramontado o Sol do assento puro,
Debuxadas se vêem no claro rio
As seis filhas de Atlante pelo estio,
Cobre-se Electra, só, de um manto escuro.

Já que com tanto risco me aventuro,
E sou tachado por escuro e frio,
Mostrem-se todos, que eu num só desvio
De vergonha escondido estar procuro.

Mas bem sabeis, engenho ilustre e nobre,
Que inda que o lavrador bárbaro veja
Que não são mais que seis estas estrelas,

O Astrólogo sábio, que descobre
Mais avante e co’a vista além peleja,
Diz que são sete, esconde-se ua delas.

Três Rosas

Sempre, mas sobretudo nas brumosas
Horas da tarde, quando acaba o dia,
Quando se estrela o céu, tenho a mania
De descobrir, de ver almas nas cousas.

Pendem deste gomil três lindas rosas;
Uma é rosada, a outra branca e fria,
Rubra a terceira; e a minha fantasia
Torna-as humanas, vivas, amorosas.

Sei que são rosas, rosas só! mas nada
Impede, enquanto cai lá fora a chuva,
Que a minha mente a fantasiar se ponha:

Por ser noiva a primeira, é que é rosada;
Branca a segunda está, por ser viúva;
A vermelha pecou … e tem vergonha!

Esbelta Surge! Vem Das Águas, Nua

Esbelta surge! Vem das águas, nua,
Timonando uma concha alvinitente!
Os rins flexíveis e o seio fremente…
Morre-me a boca por beijar a tua.

Sem vil pudor! Do que há que ter vergonha?
Eis-me formoso, moço e casto, forte.
Tão branco o peito! – para o expor à Morte…
Mas que ora – a infame! – não se te anteponha.

A hidra torpe!… Que a estrangulo! Esmago-a
De encontro à rocha onde a cabeça te há de,
Com os cabelos escorrendo água,

Ir inclinar-se, desmaiar de amor,
Sob o fervor da minha virgindade
E o meu pulso de jovem gladiador.