Textos sobre Visionários

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Textos de visionários escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Sentido de Possibilidade

Poderia definir-se o sentido de possibilidade como aquela capacidade de pensar tudo aquilo que também poderia ser e de não dar mais importância àquilo que é do que àquilo que não é. Como se vê, as consequências desta disposição criadora podem ser notáveis; infelizmente, não é raro que façam aparecer como falso aquilo que as pessoas admiram e como lícito aquilo que elas proíbem, ou então as duas coisas como sendo indiferentes. Esses homens do possível vivem, como se costuma dizer, numa trama mais subtil, numa teia de névoa, fantasia, sonhos e conjuntivos; se uma criança mostra tendências destas, acaba-se firmemente com elas, e diz-se-lhe que tais pessoas são visionários, sonhadores, fracos, gente que tudo julga saber melhor e em tudo põe defeito.
Quando se quer elogiar estes loucos, chama-se-lhes também idealistas, mas é claro que com isso só se alude à sua natureza débil, incapaz de compreender a realidade, ou que a evita por melancolia, uma natureza na qual a falta do sentido de realidade é um verdadeiro defeito. O possível, porém, não abarca apenas os sonhos dos neurasténicos, mas também os desígnios ainda adormecidos de Deus. Uma experiência possível ou uma verdade possível não são iguais a uma experiência real e uma verdade real menos o valor da sua realidade,

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A Inteligência e o Sentido Moral

A inteligência é quase inútil para aqueles que só a possuem a ela. O intelectual puro é um ser incompleto, infeliz, pois é incapaz de atingir aquilo que compreende. A capacidade de apreender as relações das coisas só é fecunda quando associada a outras actividades, como o sentido moral, o sentido afectivo, a vontade, o raciocínio, a imaginação e uma certa força orgânica. Só é utilizável à custa de esforço.
Os detentores da ciência preparam-se longamente realizando um duro trabalho. Submetem-se a uma espécie de ascetismo. Sem o exercício da vontade, a inteligência mantém-se dispersa e estéril. Uma vez disciplinada, torna-se capaz de perseguir a verdade. Mas só a atinge plenamente se for ajudada pelo sentido moral. Os grandes cientistas têm sempre uma profunda honestidade intelectual. Seguem a realidade para onde quer que ela os conduza. Nunca procuram substituí-la pelos seus próprios desejos, nem ocultá-la quando se torna opressiva. O homem que quiser contemplar a verdade deve manter a calma dentro de si mesmo. O seu espírito deve ser como a água serena de um lago. As actividades afectivas, contudo, são indispensáveis ao progresso da inteligência. Mas devem reduzir-se a essa paixão que Pasteur chamava deus inteiror, o entusiasmo.

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Como Nasce o Amor?

Nem eu nem vós sabemos como nasce o amor. Em fisiologia, que é a ciência do homem físico, não se sabe. A psicologia também não diz nada a este respeito. Os romances, que são os mais amplos expositores da matéria, não avançam cousa nenhuma ao que está dito desde Labão e Rachel até á neta do arcediago e o filho de Ricarda.
Dizer que o amor é a sensualidade, além de grosseira definição, é falsidade desmentida pela experiência. Há um amor que não rasteja nunca no raso estrado das propensões orgânicas.
Dizer que o amor é uma operação puramente espiritual é um devaneio de visionários, que trazem sempre as mulheres pelas estrelas, ao mesmo tempo que elas, gravitando materialmente para o centro do globo, comem e bebem á maneira dos mortais, e até das divindades do cantor de Aquiles.
Eu conheço homens, sem faísca de espírito, que se abrazam tocados pelo amor como o fósforo em presença do ar. Eis aqui um fenómeno eminentemente importante. Ele, só, sustenta em tese que o amor não tem nada com o corpo nem com o espirito. Eu creio que é um fluido. É pena, porém, que eu não saiba o que é fluido para me dar aqui uns ares pedantescos,

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O Interior da Alma

O olho do espírito em parte nenhuma pode encontrar mais deslumbramentos, nem mais trevas, do que no homem, nem fixar-se em coisa nenhuma, que seja mais temível, complicada, misteriosa e infinita. Há um espectáculo mais solene do que o mar, é o céu; e há outro mais solene do que o céu, é o interior da alma.
Fazer o poema da consciência humana, mas que não fosse senão a respeito de um só homem, e ainda nos homens o mais ínfimo, seria fundir todas as epopeias numa epopeia superior e definitiva. A consciência é o caos das quimeras, das ambições e das tentativas, o cadinho dos sonhos, o antro das ideias vergonhosas: é o pandemónio dos sofismas, é o campo de batalha das paixões. Penetrai, a certas horas, através da face lívida de um ser humano, e olhai por trás dela, olhai nessa alma, olhai nessa obscuridade. Há ali, sob a superfície límpida do silêncio exterior, combates de gigante como em Homero, brigas de dragões e hidras, e nuvens de fantasmas, como em Milton, espirais visionárias como em Dante.

O Paradoxo da Verdade

O homem deseja e odeia a verdade. Quer mentir aos outros – quer que o enganem (prefere a ficção à realidade), mas por outro lado receia o engano, quer o fundo das coisas, o verdadeiro verdadeiro, etc.
Somente a razão conduz à verdade. Mas só os fanáticos, os visionários e os iluminados fazem as coisas grandiosas, mudanças, descobertas. A verdade, de tanto se tornar necessária, conduz à secura, à dúvida, à inércia – à morte.
É muito natual que os homens odeiem aqueles que dizem ou tentam dizer a verdade. A verdade é triste (dizia Renan) – mas, com maior frequência, é horrível, temível, anti-social. Destrói as ilusões, os afectos. Os homens defendem-se como podem. Isto é, defendem a sua pequena vida, apenas suportável à força de compromissos, de embustes, de ficções, etc. Não querem sofrer, não querem ser heróis. Rejeição do heroísmo-mentira.

Mente Estável e Mente Instável

O homem capaz de sacrificar de ânimo leve um hábito mental há muito tempo formado constitui uma excepção. A grande maioria dos seres humanos não gosta e, na realidade, até detesta todas as noções com as quais não estão familiarizados. .
A tendência do homem de mente estável, quer seja introvertido ou extrovertido, visionário ou não visionário, será sempre para verificar que «aquilo que está, está certo». Menos sujeito aos hábitos de raciocínio formados na mocidade, os de mente instável naturalmente que sentem prazer em tudo o que é novo e revolucionário. É aos de mente instável que devemos o progresso em todas as suas formas, assim como todas as formas de revolução destrutiva. Os de mente estável, devido à sua relutância em aceitar modificações, dão à estrutura social a sua sólida durabilidade. Há no mundo muito mais gente de mente estável que instável (se as proporções fossem trocadas viveríamos num caos); mas em todos menos em alguns momentos muito excepcionais, eles possuem o poder e a riqueza mais do que proporcional ao seu número. Daí resulta que, ao aparecerem pela primeira vez, os inovadores foram geralmente perseguidos e sempre escarnecidos como lunáticos e loucos.
Um herético, de acordo com a admirável definição de Bossuet,

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