Passagens sobre Esquecimento

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Nocturno

Espírito que passas, quando o vento
Adormece no mar e surge a Lua,
Filho esquivo da noite que flutua,
Tu só entendes bem o meu tormento…

Como um canto longínquo – triste e lento-
Que voga e subtilmente se insinua,
Sobre o meu coração que tumultua,
Tu vestes pouco a pouco o esquecimento…

A ti confio o sonho em que me leva
Um instinto de luz, rompendo a treva,
Buscando, entre visões, o eterno Bem.

E tu entendes o meu mal sem nome,
A febre de Ideal, que me consome,
Tu só, Génio da Noite, e mais ninguém!

Sentiu-se esquecido, não com o esquecimento remediável do coração, mas com outro esquecimento mais cruel e irrevogável que ele conhecia muito bem, porque era o esquecimento da morte.

Mais Há-de Perder quem Mais Alcança

De vós me parto, ó vida, e em tal mudança
Sinto vivo da morte o sentimento.
Não sei para que é ter contentamento,
Se mais há-de perder quem mais alcança!

Mas dou-vos esta firme segurança:
Que, posto que me mate o meu tormento,
Pelas águas do eterno esquecimento
Segura passará minha lembrança.

Antes sem vós meus olhos se entristeçam,
Que com cousa outra alguma se contentem:
Antes os esqueçais, que vos esqueçam.

Antes nesta lembrança se atormentem,
Que com esquecimento desmereçam
A glória que em sofrer tal pena sentem.

Escolher Para Desfrutar

A angústia invade quer o inquieto, exclusivamente deslumbrado por aquilo que arde com uma luz vaga, quer o poeta cheio de amor pelos poemas que nunca escreveu o seu, quer a mulher apaixonada pelo amor, mas incapaz de devir por não saber escolher. Eles bem sabem que eu os curaria da angústia se lhes permitisse esse dom que exige sacrifícios e escolha e esquecimento do universo. Porque determinada flor é, em primeiro lugar, uma renúncia a todas as outras flores. E, no entanto, só com esta condição é bela. É o que acontece com o objecto da troca. E o insensato, que vem censurar a esta velha o seu bordado, sob o pretexto de que ela poderia ter tecido outra coisa, demonstra com isso que prefere o nada à criação.

É Inútil Tudo

Chega através do dia de névoa alguma coisa do esquecimento,
Vem brandamente com a tarde a oportunidade da perda.
Adormeço sem dormir, ao relento da vida.

É inútil dizer-me que as ações têm conseqüências.
É inútil eu saber que as ações usam conseqüências.
É inútil tudo, é inútil tudo, é inútil tudo.

Através do dia de névoa não chega coisa nenhuma.

Tinha agora vontade
De ir esperar ao comboio da Europa o viajante anunciado,
De ir ao cais ver entrar o navio e ter pena de tudo.

Não vem com a tarde oportunidade nenhuma.

Dormir já não é mais um banho de cura, a recuperação das forças vitais, mas um esquecimento, uma escovagem nocturna aniquiladora.

Se ao Mundo Predissesses teu Morrer

Se ao mundo predissesses teu morrer
na morte a natureza ir-te-ia à frente
volvendo com mandado intransigente
no eterno esquecimento o próprio ser

O céu se rosaria docemente
por do teu corpo a roupa enfim descer
florestas tingiria o teu sofrer
de negro e a noite o mar barca silente

Luto sem nome com estrelas mede
a estela ao teu olhar no arco celeste
e a escuridão de espesso muro impede

que a luz da nova primavera preste
A estação vê nos astros que pararam
as cisternas que a morte te espelharam.

Tradução de Vasco Graça Moura

Em Memória de Angélica

Quantas vidas possíveis já descansam
Nesta bem pobre e diminuta morte,
Quantas vidas possíveis que outra sorte
Daria ao esquecimento ou à lembrança!

Quando eu morrer, morrerá um passado;
Com esta flor, morreu só um futuro
Nas águas que o ignoram, o mais puro
Porvir hoje pios astros arrasado.

Eu, como ela, morro em infinitos
Destinos que já não me oferece o acaso;
Procura a minha sombra os gastos mitos

De uma pátria que sempre deu a face.
Um breve mármore diz a sua memória;
Sobre nós todos cresce, atroz, a história.

O Ciclo da Vida

O homem domina a natureza e é por ela dominado. Só ele lhe resiste e ao mesmo tempo ultrapassa as suas leis, amplia o seu poderio graças à sua vontade e actividade. Afirmar no entanto que o mundo foi criado para o homem é algo que está longe de ser evidente. Tudo o que o homem constrói é, como ele, efémero: o tempo derruba os edifícios, atulha os canais, apaga o saber – e até o nome das nações. (…) Dir-me-ão que as novas gerações recebem a herança das gerações que as precederam e que, por consequência, a perfeição ou o aperfeiçoamento não têm limites. Mas o homem está longe de receber intacta a súmula dos conhecimentos acumulados pelos séculos que o precederam e se aperfeiçoa algumas dessas invenções no que diz respeito a outras fica bastante atrás dos seus próprios inventores; um grande número dessas invenções chega mesmo a perder-se.
Não preciso sequer de sublinhar como certos pretensos melhoramentos foram nocivos à moral e ao bem-estar. Determinada invenção, suprimindo ou diminuindo o trabalho e o esforço, enfraqueceu a dose de paciência necessária para suportar as contrariedades – ou a energia que temos de dar provas para as vencer.

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Alimentar o Amor

Começar é fácil. Acabar é mais fácil ainda. Chega-se sempre à primeira frase, ao primeiro número da revista, ao primeiro mês de amor. Cada começo é uma mudança e o coração humano vicia-se em mudar. Vicia-se na novidade do arranque, do início, da inauguração, da primeira linha na página branca, da luz e do barulho das portas a abrir.
Começar é fácil. Acabar é mais fácil ainda. Por isso respeito cada vez menos estas actividades. Aprendi que o mais natural é criar e o mais difícil de tudo é continuar. A actividade que eu mais amo e respeito é a actividade de manter.
Em Portugal quase tudo se resume a começos e a encerramentos. Arranca-se com qualquer coisa, de qualquer maneira, com todo o aparato. À mínima comichão aparece uma «iniciativa», que depois não tem prosseguimento ou perseverança e cai no esquecimento. Nem damos pela morte.
É por isso que eu hoje respeito mais os continuadores que os criadores. Criadores não nos faltam. Chefes não nos faltam. Faltam-nos continuadores. Faltam-nos tenentes. Heróis não nos faltam. Faltam-nos guardiões.

É como no amor. A manutenção do amor exige um cuidado maior. Qualquer palerma se apaixona, mas é preciso paciência para fazer perdurar uma paixão.

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