O Futuro do Homem
O homem pode sempre mais e coisa diversa daquilo que se esperaria dele. O homem é inacabado e inacabável e sempre aberto ao futuro. Não há homem total e não o haverá jamais. Por isso há dois modos de pensar o futuro do homem. Posso concebê-lo como um processo natural, análogo àquele que respeita aos objectos, e formular probabilidades. Ou então posso imaginar as situações que vão ocorrer sem saber a resposta que lhes dará o homem, sem saber como, através delas, mas espontaneamente, ele se encontrará a si próprio. No primeiro caso, aguardo um desenrolar necessário que poderia conhecer em princípio, mesmo se não o conheço. No segundo caso, o futuro, longe de ser o desenvolvimento de necessidades causais implicadas pela realidade dada, depende do que será realizado e vivido em liberdade. As inúmeras pequenas acções dos indivíduos, todas as suas livres decisões, todas as coisas que realizam, têm um alcance ilimitado. No primeiro caso submeto-me a uma necessidade contra a qual nada posso. No segundo procuro a fonte original que está na base da liberdade humana. Faço um apelo à vontade.
Caminhamos para um futuro que não pode ser conhecido, que, na sua totalidade, não está decidido.
Passagens sobre Fonte
378 resultadosNão há fonte de erro tão grande como a busca da verdade absoluta.
No meu Prato que Mistura de Natureza!
No meu prato que mistura de Natureza!
As minhas irmãs as plantas,
As companheiras das fontes, as santas
A quem ninguém reza…
E cortam-as e vêm à nossa mesa
E nos hotéis os hóspedes ruidosos,
Que chegam com correias tendo mantas
Pedem “Salada”, descuidosos…,
Sem pensar que exigem à Terra-Mãe
A sua frescura e os seus filhos primeiros,
As primeiras verdes palavras que ela tem,
As primeiras cousas vivas e irisantes
Que Noé viu
Quando as águas desceram e o cimo dos montes
Verde e alagado surgiu
E no ar por onde a pomba apareceu
O arco-íris se esbateu…
Elegia do Amor
Lembras-te, meu amor,
Das tardes outonais,
Em que íamos os dois,
Sozinhos, passear,
Para fora do povo
Alegre e dos casais,
Onde só Deus pudesse
Ouvir-nos conversar?
Tu levavas, na mão,
Um lírio enamorado,
E davas-me o teu braço;
E eu, triste, meditava
Na vida, em Deus, em ti…
E, além, o sol doirado
Morria, conhecendo
A noite que deixava.
Harmonias astrais
Beijavam teus ouvidos;
Um crepúsculo terno
E doce diluía,
Na sombra, o teu perfil
E os montes doloridos…
Erravam, pelo Azul,
Canções do fim do dia.
Canções que, de tão longe,
O vento vagabundo
Trazia, na memória…
Assim o que partiu
Em frágil caravela,
E andou por todo o mundo,
Traz, no seu coração,
A imagem do que viu.Olhavas para mim,
Às vezes, distraída,
Como quem olha o mar,
À tarde, dos rochedos…
E eu ficava a sonhar,
Qual névoa adormecida,
Quando o vento também
Dorme nos arvoredos.
Olhavas para mim…
Meu corpo rude e bruto
Vibrava,
Prejudicar a Estupidez
A reprovação do egoísmo, que se pregou com tamanha convicção casmurra, prejudicou certamente, no conjunto, esse sentimento (em benefício, hei-de repeti-lo milhares e milhares de vezes, dos instintos gregários do homem), e prejudicou-o, nomeadamente no facto de o ter despojado da sua boa consciência e de lhe ter ordenado a procurar em si próprio a verdadeira fonte de todos os males. «O teu egoísmo é a maldição da tua vida», eis o que se pregou durante milénios: esta crença, como eu ia dizendo, fez mal ao egoísmo; tirou-lhe muito espírito, serenidade, engenhosidade e beleza; bestializou-o, tornou-o feio, envenenado.
Os filósofos antigos indicavam, ao contrário, uma fonte completamente diferente para o mar; os pensadores não cessaram de pregar desde Sócrates: «É a vossa irreflexão, são a vossa estupidez, o vosso hábito de vegetar obedecendo à regra e de vos subordinar ao juízo do próximo, que vos impedem tão amiudadamente de serdes felizes; somos nós, pensadores, que o somos mais, porque pensamos». Não nos perguntemos aqui se este sermão contra a estupidez tem mais fundamentos do que o sermão contra o egoísmo; o que é certo é que despojou a estupidez da sua boa consciência: estes filósofos foram prejudiciais à estupidez!
Todas as fontes externas de felicidade e deleite são, segundo a sua natureza, extremamente inseguras, precárias, passageiras e submetidas ao acaso; podem, portanto, estancar com facilidade, mesmo sob as mais favoráveis circunstâncias.
Os teus clientes mais insatisfeitos são a tua maior fonte de aprendizagem.
Não Consentem os Deuses Mais que a Vida
Não consentem os deuses mais que a vida.
Tudo pois refusemos, que nos alce
A irrespiráveis píncaros,
Perenes sem ter flores.
Só de aceitar tenhamos a ciência,
E, enquanto bate o sangue em nossas fontes,
Nem se engelha conosco
O mesmo amor, duremos,
Como vidros, às luzes transparentes
E deixando escorrer a chuva triste,
Só mornos ao sol quente,
E refletindo um pouco.
Aspiração
Sinto que há na minha alma um vácuo imenso e fundo,
E desta meia morte o frio olhar do mundo
Não vê o que há de triste e de real em mim;
Muita vez, ó poeta, a dor é casta assim;
Refolha-se, não diz no rosto o que ela é,
E nem que o revelasse, o vulgo não põe fé
Nas tristes comoções da verde mocidade,
E responde sorrindo à cruel realidade.Não assim tu, ó alma, ó coração amigo;
Nu, como a consciência, abro-me aqui contigo;
Tu que corres, como eu, na vereda fatal
Em busca do mesmo alvo e do mesmo ideal.
Deixemos que ela ria, a turba ignara e vã;
Nossas almas a sós, como irmã junto a irmã,
Em santa comunhão, sem cárcere, sem véus.
Conversarão no espaço e mais perto de Deus.Deus quando abre ao poeta as portas desta vida
Não lhe depara o gozo e a glória apetecida;
Tarja de luto a folha em que lhe deixa escritas
A suprema saudade e as dores infinitas.
Alma errante e perdida em um fatal desterro,
Conclusão
Fui amante da morte
e da beleza. Vi a loucura,
acreditei na vida.
Da infância falei
como lugar de abismo.
O prazer
foi também a grande fonte
de perturbação e alegria.
Lembrei as mulheres
que recusaram submeter-se,
escrevi palavras fúnebres.Não poupei a adolescência,
o coração magoado
e não soube que fazer
de mim fora das palavras.
Escrevi para desistir
e depender
e ter identidade.
O Prazer no Costume
Uma importante variedade do prazer e, com isso, fonte da moralidade, provém do hábito. O usual faz-se mais facilmente, melhor, portanto, com mais agrado, sente-se nisso um prazer e sabe-se, por experiência, que o habitual deu bom resultado, daí é útil; um costume, com o qual se pode viver, está provado que é salutar, proveitoso, ao contrário de todas as tentativas novas, ainda não comprovadas. O costume é, por conseguinte, a união do agradável e do útil; além disso, não exige reflexão. Assim que o homem pode exercer coacção, exerce-a para impor e introduzir os seus costumes, pois para ele, eles são a comprovada sabedoria prática. De igual modo, uma comunidade de indivíduos obriga cada um deles ao mesmo costume.
Aqui está a conclusão errada: porque uma pessoa se sente bem com um costume ou, pelo menos, porque por intermédio do mesmo assegura a sua existência, então esse costume é necessário, pois passa por ser a única possibilidade de uma pessoa se conseguir sentir bem; o agrado da vida parece emanar exclusivamente dele. Esta concepção do habitual como uma condição da existência é aplicada até aos mais pequenos pormenores do costume: dado que o conhecimento da verdadeira causalidade é muito escasso entre os povos e as civilizações que se encontram a um nível baixo,
Amo-te Sempre
Amo-te sempre
com um pouco de barco e de vento
com uma humildade de mar à tua volta
dentro do meu corpo; com o desespero
de ser tempo;com um pouco de sol e uma fonte
adormecida na ternura.Merecer este minuto de palavras habitando
o que há sem fim no teu retrato;
Este mesmo minuto em que chegam e partem navios
– nesta mesma cidade deste
minuto, desta língua, deste
romance diário dos teus olhos –(e chegarão com armas? refugiados? trigo?
partirão com noivas? missionários? guerras? discursos?)Merecer a densa beleza do teu corpo
que tem água e ternura, células, penumbra,
que dormiu no berço, dormiu na memória,
que teve soluços, febre, e absurdos desejos
maiores que os braços,merecer os dias subindo das florestas – e vêm
banhar-se, lentos, nos teus olhos…Merecer a Igreja, o ajoelhar das palavras,
entre estes cinemas visitando, em duas horas, a alma,
estes eléctricos parando atrás do infinito
para subirem os namorados, a viúva, o cobrador da luz, a
costureira
entre estes homens que ganham dinheiro,
A Cegueira do Amor
Desde que se ame, o mais sensato dos homens não vê nenhum objecto tal como é. Exagera para menos as suas próprias vantagens e para mais os menores favores do objecto amado. Os temores e as esperanças transformam-se imediatamente em algo de romanesco. Deixa de atribuir seja o que for ao acaso; perde o sentido das probabilidades; uma coisa imaginada é uma coisa existente que influi na sua felicidade.
Um signo aterrador de que se está a perder a cabeça é que, ao pensar em qualquer facto, por minúsculo e difícil de observar que seja, o vejamos branco e o interpretemos em favor do nosso amor; um instante depois, verificamos que na realidade era negro, e mesmo assim ainda o achamos favorável ao nosso amor.
É nessa altura que uma alma presa de mortais incertezas sente vivamente a necessidade de um amigo; mas para um amante já não há amigos, como muito bem se sabia nas cortes. Eis a fonte da única espécie de indiscrição que uma mulher é capaz de perdoar.
A fonte será, pois, mais graciosa do que o rio, o desejo mais encantador do que o gozo, e o que se espera mais atraente do que aquilo que se possui?
Soneto Italiano
Frescuras das sereias e do orvalho,
Graça dos brancos pes dos pequeninos,
Voz das anhãs cantando pelos sinos,
Rosa mais alta no mais alto galho:De quem me valerei, se não me valho
De ti, que tens a chave dos destinos
Em que arderam meus sonhos cristalinos
Feitos cinza que em pranto ao vento espalho?Também te vi chorar… Também sofreste
A dor de ver secarem pela estrada
As fontes da esperança… E não cedeste!Antes, pobre, despida e trespassada,
Soubeste dar à vida, em que morreste,
Tudo – à vida, que nunca te deu nada!
Canção à Ausente
Para te amar ensaiei os meus lábios…
Deixei de pronunciar palavras duras.
Para te amar ensaiei os meus lábios!Para tocar-te ensaiei os meus dedos…
Banhei-os na água límpida das fontes.
Para tocar-te ensaiei os meus dedos!Para te ouvir ensaiei meus ouvidos!
Pus-me a escutar as vozes do silêncio…
Para te ouvir ensaiei meus ouvidos!E a vida foi passando, foi passando…
E, à força de esperar a tua vinda,
De cada braço fiz mudo cipreste.A vida foi passando, foi passando…
E nunca mais vieste!
O Fundamento da Cultura
O fundamento da cultura, assim como do carácter, é por fim o sentimento moral. Essa é a fonte do poder, que preserva a sua eterna jovialidade, e obtém a sua renda de cada novidade da ciência. A ciência corrige os velhos credos e põe de lado, com cada nova percepção, os nossos catecismos infantis. Mas ela necessita de uma fé comensurável com as órbitas mais largas e as leis universais que descobre. Mesmo assim, ela não surpreende o sentimento moral, pois este é mais antigo e aguardava expectante essas descobertas mais amplas.
Elogio da Distância
Na fonte dos teus olhos
vivem os fios dos pescadores do lago da loucura.
Na fonte dos teus olhos
o mar cumpre a sua promessa.Aqui, coração
que andou entre os homens, arranco
do corpo as vestes e o brilho de uma jura:Mais negro no negro, estou mais nu.
Só quando sou falso sou fiel.
Sou tu quando sou eu.Na fonte dos teus olhos
ando à deriva sonhando o rapto.Um fio apanhou um fio:
separamo-nos enlaçados.Na fonte dos teus olhos
um enforcado estrangula o baraço.
Tradução de João Barrento e Y. K. Centeno
Amar é Raro
Amar é dar, derramar-me num vaso que nada retém e sou um fio de cana por onde circulam ventos e marés. Amar é aspirar as forças generosas que me rodeiam, o sol e os lumes, as fontes ubérrimas que vêm do fundo e do alto, água e ar, e derramá-las no corpo irmão, no cadinho que tudo guarda e transforma para que nada se perca e haja um equilíbrio perfeito entre o mesmo e o outro que tu iluminas. Dar tudo ao outro, dar-lhe tanta verdade quanta ele possa suportar, e mais e mais; obrigar o outro a elevar-se a um grau superior de eminência, fulguração, mas não tanto que o fira ou destrua em overdose que o leve a romper o contrato — o difícil equilíbrio dos amantes! Amar é raro porque poucos somos capazes de respirar as vastas planícies com a metade do seu pulmão; e amar é raro porque poucos aceitam a presença do seu gémeo, a boca insaciável de um irmão que todos os dias o vento esculpe e destrói.
O Homem não é um Ser Egoísta
Todos os homens estão prontos a morrer pelo que amam. Não diferem a não ser pelo grau da coisa amada e da concentração ou dispersão do amor. Ninguém se desama a si mesmo. O homem deseja ser egoísta e não consegue. É a característica mais tocante da sua desgraça e a fonte da sua grandeza.
O homem dedica-se sempre a uma ordem. No entanto, salvo iluminação sobrenatural, esta ordem tem como núcleo o próprio ou um ser particular (que pode ser uma abstracção) para o qual se transferiu (Napoleão para os soldados, a Ciência, o Partido, etc.). Ordem perspectiva.