Poemas sobre Ausentes

41 resultados
Poemas de ausentes escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Beber Toda a Ternura

Não ter morada
habitar
como um beijo
entre os lábios
fingir-se ausente
e suspirar
(o meu corpo
não se reconhece na espera)
percorrer com um só gesto
o teu corpo
e beber toda a ternura
para refazer
o rosto em que desapareces
o abraço em que desobedeces

Envelhecem os Anos

Envelhecem os anos, mas nunca os meses
com seu crédito de imagens para quem morre
ou vive. É o título de quem se ergue pelos dentes
mais que o riso nesse colar de sonhos ao fim das tardes.
Aqui a coisa alheia tem a metade do já sentido
e não pode parar no mundo.

É que alguém não dá tempo ao coração
e solitário bate na coisa dura de sempre.
Há horas antigas agora: teu destino indeclinável,
um jogo antigo de olhos com lágrimas prontas desde o início
e adiante a demora dos ausentes, o universo fechado
em sua idade. Tu te juntas e deixas a monótona vida

exagerar a fé, estimular o preço num feriado
de diferenças. Então a natureza nesse dia de chuva fina,
ela e o vidro da janela que se turva,
tenta o início e arrasta os desejos da existência.

O Deus Mal Informado

No caminho onde pisou um deus
há tanto tenpo que o tempo não lembra
resta o sonho dos pés
sem peso
sem desenho.

Quem passe ali, na fracção de segundo,
em deus se erige, insciente, deus faminto,
saudoso de existência.

Vai seguindo em demanda de seu rastro,
é um tremor radioso, uma opulência
de impossíveis, casulos do possível.

Mas a estrada se parte, se milparte,
a seta não aponta
a destino algum, e o traço ausente
ao homem torna homem, novamente.

Tu? Eu?

Não morres satisfeito.
A vida te viveu
sem que vivesses nela.
E não te convenceu
nem deu qualquer motivo
para haver o ser vivo.

A vida te venceu
em luta desigual.
Era todo o passado
presente presidente
na polpa do futuro
acuando-te no beco.
Se morres derrotado,
não morres conformado.

Nem morres informado
dos termos da sentença
de tua morte, lida
antes de redigida.
Deram-te um defensor
cego surdo estrangeiro
que ora metia medo
ora extorquia amor.

Nem sabes se és culpado
de não ter culpa. Sabes
que morres todo o tempo
no ensaiar errado
que vai a cada instante
desensinando a morte
quanto mais a soletras,
sem que, nascido, more
onde, vivendo, morres.

Não morres satisfeito
de trocar tua morte
por outra mais (?) perfeita.
Não aceitas teu
como aceitaste os muitos
fins em volta de ti.

Testemunhaste a morte
no privilégio de ouro
de a sentires em vida
através de um aquário.
Eras tu que morrias
nesse,

Continue lendo…

Glosa a mote alheio

“Vejo-a na alma pintada,
Quando me pede o desejo
O natural que não vejo.”

Se só no ver puramente
Me transformei no que vi,
De vista tão excelente
Mal poderei ser ausente,
Enquanto o não for de mi.
Porque a alma namorada
A traz tão bem debuxada
E a memória tanto voa,
Que, se a não vejo em pessoa,
“Vejo-a na alma pintada.”

O desejo, que se estende
Ao que menos se concede,
Sobre vós pede e pretende,
Como o doente que pede
O que mais se lhe defende.
Eu, que em ausência vos vejo,
Tenho piedade e pejo
De me ver tão pobre estar,
Que então não tenho que dar,
“Quando me pede o desejo.”

Como àquele que cegou
É cousa vista e notória,
Que a Natureza ordenou
Que se lhe dobre em memória
O que em vista lhe faltou,
Assim a mim, que não rejo
Os olhos ao que desejo,
Na memória e na firmeza
Me concede a Natureza
“O natural que não vejo.”

Continue lendo…

Quero-te de Branco, Meu Amor

Quero-te de branco,
ou antes, modelada
nas roupas que cosesses
das bonecas, nos saltos,
nos baloiços, nos degraus
de uma porta qualquer donde saísses.
Quero-te de branco e intocada,
carregada porém dos anos buliçosos
e das vidas ausentes.
De branco, meu amor,
e de tão branco
que me desses o mundo em luz de sol.

Pernoitas em Mim

pernoitas em mim
e se por acaso te toco a memória… amas
ou finges morrer

pressinto o aroma luminoso dos fogos
escuto o rumor da terra molhada
a fala queimada das estrelas

é noite ainda
o corpo ausente instala-se vagarosamente
envelheço com a nómada solidão das aves

já não possuo a brancura oculta das palavras
e nenhum lume irrompe para beberes

Entre a Flor e o Tempo

Também de dor se morre pois é morte
o sentimento ausente. O ser feliz
é ser presente, sem que mais importe
esse profundo sulco e a cicatriz
que no corpo nos marca o sofrimento.
Assim é nossa vida, sempre o lance
de viver, mesmo em dor, e dos momentos
erguer templos, embora breve o alcance
em nós do tempo. E o que restar do ardor
com que se vive o amor enfim carrega
em rosa mais perfeita e em outro amor
sonhado da extensão de nossa entrega.
No impulso com que o espaço alcança o tempo
a vida se ergue além do sofrimento.

Lusíada Exilado

Nem batalhas nem paz: obscura guerra.
Dói-me um país neste país que levo.
Sou este povo que a si mesmo se desterra
meu nome são três sílabas de trevo.

Há nevoeiro em mim. Dentro de abril dezembro.
Quem nunca fui é um grito na memória.
E há um naufrágio em mim se de quem fui me lembro
há uma história por contar na minha história.

Trago no rosto a marca do chicote.
Cicatrizes as minha condecorações.
Nas minhas mãos é que é verdade D. Quixote
trago na boca um verso de Camões.

Sou este camponês que foi ao mar
lavrou as ondas e mondou a espuma
e andou achando como a vindimar
terra plantada sobre o vento e a bruma.

Sou este marinheiro que ficou em terra
lavrando a mágoa como se lavrar
não fosse mais do que a perdida guerra
entre o não ser na terra e o ser no mar.

Eu que parti e que fiquei sempre presente
eu que tudo mandava e nunca fui senhor
eu que ficando estive sempre ausente
eu que fui marinheiro sendo lavrador.

Continue lendo…

Requiem para um Defunto Vulgar

Antoninho morreu. Seu corpo resignado
é como um rio incolor, regressando à nascente
num silêncio de espanto e mistério revelado.
Está ali – estando ausente.

Jaz de corpo inteiro e fato preto.
Ele, da cabeça aos pés,
trivial e completo,
estátua de proa e moço de convés.

Jaz como se dormisse (pelo menos
é o que dizem as velhas carpideiras).
Jaz imóvel, sem gestos, sem acenos.
Jaz morto de todas as maneiras.

Jaz morto de cansaço, de pobreza, de fome
(sobretudo, de fome). Jaz morto sem remédio.
É apenas, sobre um papel azul, um nome.
De ser mais qualquer coisa, a morte impede-o.

Jaz alheio a tudo à sua volta,
à grita dos parentes, companheiros,
como um cavalo à rédea solta
ou no mar largo, os rápidos veleiros.

Jaz inútil, feio, pesado,
a colcha de crochet aconchega-o na cama.
Nunca esteve tão quente e animado.
Nunca foi tão menino de mama.

Os filhos olham-no e fazem contas cuidadosas:
padre, enterro, velório, certidão
de óbito… E discutem, com manhas de raposas,

Continue lendo…

Que Mimoso Prazer!

1

Que mimoso prazer! Teu rosto amado
Me raiou na alma! Oh astro meu luzente!
Desfez-se em continente
O negrume cerrado,
Que me assombrava o coração aflito,
Em saudades tristíssimas sopito.

2

Bem, como quando aponta o sol radiante
Pelos ervosos cumes dos outeiros;
Fogem bruscos nevoeiros,
Da roxa luz brilhante;
Assim, mal vi teu rosto, assim fugiam
As Mágoas, que de luto a alma cobriam

3

Quem sempre assim de amor nos brandos laços!
Doces queixas de amor absorto ouvira!
Da idade não sentira
O voo. Entre os teus braços
Me corte o fio, com a fouce, a Morte;
Que perco a vida, sem sentir o corte!

4

Se a meiga Vénus, se o gentil Cupido
Cede a meus votos, cede à minha Amada:
Se esta união prezada
Não rompe um Nume infido…
Não dou por mais feliz o vil Mineiro
Sobre montes de sórdido dinheiro.

5

Não dou por mais feliz o Rei no trono
Lisonjado de Cortesãos astutos.

Continue lendo…

Amor à Vista

Entras como um punhal
até à minha vida.
Rasgas de estrelas e de sal
a carne da ferida.

Instala-te nas minas.
Dinamita e devora.
Porque quem assassinas
é um monstro de lágrimas que adora.

Dá-me um beijo ou a morte.
Anda. Avança.
Deixa lá a esperança
para quem a suporte.

Mas o mar e os montes…
isso, sim.
Não te amedrontes.
Atira-os sobre mim.

Atira-os de espada.
Porque ficas vencida
ou desta minha vida
não fica nada.

Mar e montes teus beijos, meu amor,
sobre os meus férreos dentes.
Mar e montes esperados com terror
de que te ausentes.

Mar e montes teus beijos, meu amor!…

Onde o Mar Falta

Entreabertas as pernas, e pousada
de leve, sobre os ombros, a cabeça,
parecias às vezes, derramada
no fundo, mais espessa.

E eras líquida: vias, através
de tua própria sombra transparente
a luminosidade dos teus pés,
alados. Porque ausente.

Jamais dizias nada. Sempre tinhas
entre os lábios, a voz silenciosa
dos que voltam. Onda após onda, vinhas
(e vens) misteriosa.

Desde a profundidade, do mar. Brusco
nas suas reacções, onde o mar falta
sob as ondas, aí, aí te busco —
e és, como as ondas, alta.

Quando olho o horizonte: quando tudo
se dissolve em si mesmo e, onda após
onda, me calo. Vejo, e estou mudo.
O mar na tua voz.

Porque vias o mar (tinhas o mar
no olhar) fechando os olhos. E defronte
o víamos surgir. Bastava olhar,
que tudo era horizonte.

Preso ao Meu Destino

E preso ao meu destino eu principio
onde um pequeno sol por entre as árvores
perscruta o chão.
Ávido enfim de azul,
meu grito vive a ponte que o abismo
há muito conquistou.
O lume é ténue,
a chama é quase ausente e quase extinta.

No Crepusculo

Nasce a luz do luar dos derradeiros,
Êrmos, soturnos pincaros sósinhos…
Andam sombras no ar e murmurinhos
E vagidos de luz… e os Pegureiros
Descem, cantando, a encosta dos outeiros…

Tangendo amenas frautas amorosas,
Seus vultos, no crepusculo, desmaiam
E assim como os seus canticos, se espraiam
Em ondas de emoção. As fragarosas
Quebradas que o luar beija, misteriosas
Furnas, boccas de terra, murmurantes,
Arvoredos extaticos orando,
Rochedos, na penumbra, meditando,
Desfeitos em ternura, esvoaçantes,
Pairam tambem no espaço comovido,
Das primeiras estrelas já ferido,
Todo em luar e sombra amortalhado…

E eu choro sobre um monte abandonado…

E o Phantasma divino da Creança,
Sombra de Anjinho em flor,
Nos longes dos meus olhos aparece,
Como se, por ventura, ele nascesse
Da minha incerta e trémula esperança,
E não da minha firme e eterna dôr!

E choro; e alem das lagrimas, eu vejo
Aquele dôce Vulto pequenino,
Em seu leito de morte e soffrimento;
Jesus martirisado, inda Menino…
E é como cinza morte o meu desejo
E como extinta luz meu pensamento!

Continue lendo…

Enfim Fenece o Dia

Enfim fenece o dia,
Enfim chega da noite o triste espanto,
E não chega desta alma o doce encanta
Enfim fica triunfante a tirania,
Vencido o sofrimento,
Sem alívio meu mal, eu sem alento,
A sorte sem piedade,
Alegre a emulação, triste a vontade,
O gosto fenecido,
Eu infelice enfim, Lauro esquecido…
Quem viu mais dura sorte?
Tantos males, amor, para uma morte?
Não basta contra a vida
Esta ausência cruel, esta partida?

Não basta tanta dor? tanto receio?
Tanto cuidado, ai triste, e tanto enleio?
Não basta estar ausente,
Para perder a vida infelizmente?
Se não também, cruel, neste conflito
Me negas o socorro de um escrito?
Porque esta dor que a alma me penetra
Não ache o maior bem na menor letra,
Ai! bem fazes, amor, tira-me tudo!
Não há alívio, não, não há escudo,
Que a vida me defenda,
Tudo me falte, enfim, tudo me ofenda,
Tudo me tire a vida,
Pois eu a não perdi na despedida.

Se Me Deixares, Eu Digo

Se me deixares, eu digo
O contrario a toda a gente;
E, n’este mundo de enganos,
Falla verdade quem mente.
Tu dizes que a minha boca
Já não acorda desejos,
Já não aquece outra boca,
Já não merece os teus beijos;
Mas, tem cuidado commigo,
Não procures ser ausente:
– Se me deixares, eu digo
O contrario a toda a gente.

Fímbria de Melancolia

Fímbria de melancolia,
memória incerta da dor,
ouço-a no gravador,
no fado que não se ouvia
quando ouvia o seu clamor.

Porque era já no passado
o presente dessa hora
e que me ressoa agora
a um outro mais alongado.

Assim a dor que se sente
no outro obscuro de nós
nunca fala a nossa voz
mas de quem de nós ausente,
só a nós próprios consente
quando não estamos nós
mas mais sós do que ao estar sós.

Onde então estamos nós?

Triste Padeço

Aves que o ar discorrei,
No vôo as asas batendo,
E por vossas penas conta
Às minhas meu sentimento.

Compadecidas ouvi
De minha dor os excessos,
Mas em dizer que é saudade,
Digo o que posso dizer-vos.
Triste padeço, e ausente
Os golpes dos meus receios
Nas batalhas da distância,
Nos desafios do tempo.

Nas violências, do que choro,
Dos alívios desespero,
Que não adormece a queixa,
Quando a desperta o desvelo.

Esmoreceu a esperança
Nas dilações do desejo
Prognosticando a ruína
Frenético o pensamento.

Se meu mal são sintomas,
Mortais ausências, e zelos,
Era o remédio esquecer-me,
Se em mim houvera esquecimento.

Mas se faz no meu cuidado
Operações o veneno,
Viva de senti-lo quem,
Não morre de padecê-lo.

Já que morro, ingrata sorte,
Às mãos da tua porfia,
Deixa-me inquirir um dia
A causa da minha morte:

Se amor com impulso forte
Me rendeu, como me aparta
Do bem, que na alma retrata
Minha doce saudade,

Continue lendo…

Xácara do Infinito

Fazia papa-luaça
com lama azul dos paúis;
e embaciava a vidraça;
ou de olhos baços, azuis,
parados, largos, serenos,
como o silêncio dos mudos,
ou fitos, picos, pequenos,
venenos de ângulos agudos.

Ou gargalhava estridente
como um riscar de repente
de uma faúlha de luz
em escuros de urros e uuus
que arrefecia os cabelos!
E a dissonância em novelos
rolava fundo e medonho
a meio do chão:.. Catrapuz!…
como um vómito de luz
a estoirar dentro dum sonho!

Ou escancarava a vidraça
a rir pedradas de lata;
mas logo o feixe-desfeixe
porque a lata se desata
e cai em pata de pata
na lájea das cousas mortas
das mortas noites sem portas!

E logo a Noite corria,
e a vista via… – não via:
porque entre o ver e o não ver
há uma distância a correr
que pode ser… – ou não ser
uma distância a valer!

Aquele espaço intervalo
dum cabelo ou duma unha
à sensação de ter unha
é uma distância a cavalo
como a distância da unha
ao movimento da unha!

Continue lendo…