Tu? Eu?
Não morres satisfeito.
A vida te viveu
sem que vivesses nela.
E não te convenceu
nem deu qualquer motivo
para haver o ser vivo.A vida te venceu
em luta desigual.
Era todo o passado
presente presidente
na polpa do futuro
acuando-te no beco.
Se morres derrotado,
não morres conformado.Nem morres informado
dos termos da sentença
de tua morte, lida
antes de redigida.
Deram-te um defensor
cego surdo estrangeiro
que ora metia medo
ora extorquia amor.Nem sabes se és culpado
de não ter culpa. Sabes
que morres todo o tempo
no ensaiar errado
que vai a cada instante
desensinando a morte
quanto mais a soletras,
sem que, nascido, more
onde, vivendo, morres.Não morres satisfeito
de trocar tua morte
por outra mais (?) perfeita.
Não aceitas teu
como aceitaste os muitos
fins em volta de ti.Testemunhaste a morte
no privilégio de ouro
de a sentires em vida
através de um aquário.
Eras tu que morrias
nesse, naquela; e vias
teu ser evaporado
fugir à percepção.
Estranho vivo, ausente
na suposta consciência
de imperador cativo.Foste morrendo só
como sobremorrente
no lodoso telhado
(era prémio, castigo?)
de onde a vista captava
o que era abraço e não
durava ou se perdia
em guerra de extermínio,
horror de lado a lado.E tudo foi a caça
veloz fugindo ao tiro
e o tiro se perdendo
em outra caça ou planta
ou barro, arame, gruta.
E a procura do tiro
e do atirador
(nem sequer tinha mãos),
procura, a procura
da razão de procura.Não morres satisfeito,
morres desinformado.