Poemas sobre Pudor

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Poemas de pudor escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Quase um Poema de Amor

Há muito tempo já que não escrevo um poema
De amor.
E Ă© o que eu sei fazer com mais delicadeza!
A nossa natureza
Lusitana
Tem essa humana
Graça
Feiticeira
De tornar de cristal
A mais sentimental
E baça
Bebedeira.

Mas ou seja que vou envelhecendo
E ninguém me deseje apaixonado,
Ou que a antiga paixĂŁo
Me mantenha calado
O coração
Num Ă­ntimo pudor,
— Há muito tempo já que não escrevo um poema
De amor.

Devo-te

Devo-te tanto como um pássaro
deve o seu voo Ă  lavada
planície do céu.

Devo-te a forma
novĂ­ssima de olhar
teu corpo onde Ă s vezes
desce o pudor o silĂŞncio
de uma pálpebra mais nada.

Devo-te o ritmo
de peixe na palavra,
a genesĂ­aca, doce
violĂŞncia dos sentidos;
esta tinta de sol
sobre o papel de silĂŞncio
das coisas – estes versos
doces, curtos, de abelhas
transportando o pĂłlen
levĂ­ssimo do dia;
estas formigas na sombra
da prĂłpria pressa e entrando
todas em fila no tempo:
com uma pergunta frágil
nas antenas, um recado invisĂ­vel, o peso
que as deixa ser e esquece;
e a tua voz que compunha
uma casa, uma rosa
a toda a volta – Ăł meu amor vieste
rasgar um sol das minhas mĂŁos!

Menina e Moça

Está naquela idade inquieta e duvidosa,
Que não é dia claro e é já o alvorecer;
Entreaberto botĂŁo, entrefechada rosa,
Um pouco de menina e um pouco de mulher.

Ă€s vezes recatada, outras estouvadinha,
Casa no mesmo gesto a loucura e o pudor;
Tem coisas de criança e modos de mocinha,
Estuda o catecismo e lĂŞ versos de amor.

Outras vezes valsando, e* seio lhe palpita,
De cansaço talvez, talvez de comoção.
Quando a boca vermelha os lábios abre e agita,
Não sei se pede um beijo ou faz uma oração.

Outras vezes beijando a boneca enfeitada,
Olha furtivamente o primo que sorri;
E se corre parece, Ă  brisa enamorada,
Abrir asas de um anjo e tranças de uma huri.

Quando a sala atravessa, Ă© raro que nĂŁo lance
Os olhos para o espelho; e raro que ao deitar
NĂŁo leia, um quarto de hora, as folhas de um romance
Em que a dama conjugue o eterno verbo amar.

Tem na alcova em que dorme, e descansa de dia,
A cama da boneca ao pé do toucador;

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Penélope

Mais do que sonho: comoção!
sinto-me tonto, enternecido,
quando, de noite, as minhas mĂŁos
sĂŁo o teu Ăşnico vestido.

E recompões com essa veste,
que eu, sem saber, tinha tecido,
todo o pudor que desfizeste
como uma teia sem sentido;
todo o pudor que desfizeste
a meu pedido.

Mas nesse manto que desfias,
e que depois voltas a pĂ´r,
eu reconheço melhores dias
do nosso amor.

Estes SĂ­tios!

Olha bem estes sĂ­tios queridos,
VĂŞ-os bem neste olhar derradeiro…
Ai! o negro dos montes erguidos,
Ai! o verde do triste pinheiro!
Que saudade que deles teremos…
Que saudade! ai, amor, que saudade!
Pois nĂŁo sentes, neste ar que bebemos,
No acre cheiro da agreste ramagem,
Estar-se alma a tragar liberdade
E a crescer de inocĂŞncia e vigor!
Oh! aqui, aqui sĂł se engrinalda
Da pureza da rosa selvagem,
E contente aqui sĂł vive Amor.
O ar queimado das salas lhe escalda
De suas asas o nĂ­veo candor,
E na frente arrugada lhe cresta
A inocĂŞncia infantil do pudor.
E oh! deixar tais delĂ­cias como esta!
E trocar este céu de ventura
Pelo inferno da escrava cidade!
Vender alma e razĂŁo Ă  impostura,
Ir saudar a mentira em sua corte,
Ajoelhar em seu trono Ă  vaidade,
Ter de rir nas angĂşstias da morte,
Chamar vida ao terror da verdade…
Ai! nĂŁo, nĂŁo… nossa vida acabou,
Nossa vida aqui toda ficou
Diz-lhe adeus neste olhar derradeiro,
Dize Ă  sombra dos montes erguidos,
Dize-o ao verde do triste pinheiro,

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A Invenção da Resposta

a invenção da resposta

outrora
em riste
o passo mĂ­tico espantoso condensava
da santidade
o insurrecto pudor
o gelo do rubor
a pressa cerrada

agora
em triste
vacuidade
o desafio que expande
cede
degola
o desgarrado nexo do rasgo

A DĂ©lia

Cuidas tu que a rosa chora,
Que Ă© tamanha a sua dor,
Quando, já passada a aurora,
O Sol, ardente de amor,
Com seus beijos a devora?
– Feche virgĂ­neo pudor
O que inda Ă© botĂŁo agora
E amanhã há-de ser flor;
Mas ela Ă© rosa nesta hora,
Rosa no aroma e na cor.

– Para amanhĂŁ o prazer
Deixe o que amanhĂŁ viver.
Hoje, DĂ©lia, Ă© nossa a vida;
AmanhĂŁ… o que há-de ser?
A hora de amor perdida
Quem sabe se há-de volver?
NĂŁo desperdices, querida,
A duvidar e a sofrer
O que Ă© mal gasto da vida
Quando o nĂŁo gasta o prazer.

O Amor Ă© o Amor

O amor é o amor — e depois?!
Vamos ficar os dois
a imaginar, a imaginar?…

O meu peito contra o teu peito,
cortando o mar, cortando o ar.
Num leito
há todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor
e trocamos — somos um? somos dois?
espĂ­rito e calor!

O amor é o amor — e depois?

Pureza

Vem toda nua
ou, se o nĂŁo consentir o teu pudor,
vestida de vermelho.

Teus tules brancos,
o azul, que desmaia,
de tuas sedas finas,
guarda-os p’ra outros dias.

P’ra quando, Amor!, teu ventre, já redondo,
merecer a pureza do azul…

Anjo És

Anjo Ă©s tu, que esse poder
Jamais o teve mulher,
Jamais o há-de ter em mim.
Anjo Ă©s, que me domina
Teu ser o meu ser sem fim;
Minha razĂŁo insolente
Ao teu capricho se inclina,
E minha alma forte, ardente,
Que nenhum jugo respeita,
Covardemente sujeita
Anda humilde a teu poder.
Anjo Ă©s tu, nĂŁo Ă©s mulher.

Anjo Ă©s. Mas que anjo Ă©s tu?
Em tua fronte anuviada
NĂŁo vejo a c’roa nevada
Das alvas rosas do céu.
Em teu seio ardente e nu
Não vejo ondear o véu
Com que o sĂ´frego pudor
Vela os mistĂ©rios d’amor.
Teus olhos tĂŞm negra a cor,
Cor de noite sem estrela;
A chama Ă© vivaz e Ă© bela,
Mas luz nĂŁo tĂŞm. – Que anjo Ă©s tu?
Em nome de quem vieste?
Paz ou guerra me trouxeste
De Jeová ou Belzebu?

NĂŁo respondes – e em teus braços
Com frenéticos abraços
Me tens apertado, estreito!…
Isto que me cai no peito
Que foi?… – Lágrima? – Escaldou-me…
Queima,

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O Amor em Visita

Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra
e seu arbusto de sangue. Com ela
encantarei a noite.
Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher.
Seus ombros beijarei, a pedra pequena
do sorriso de um momento.
Mulher quase incriada, mas com a gravidade
de dois seios, com o peso lĂşbrico e triste
da boca. Seus ombros beijarei.

Cantar? Longamente cantar.
Uma mulher com quem beber e morrer.
Quando fora se abrir o instinto da noite e uma ave
o atravessar trespassada por um grito marĂ­timo
e o pĂŁo for invadido pelas ondas –
seu corpo arderá mansamente sob os meus olhos palpitantes.
Ele – imagem vertiginosa e alta de um certo pensamento
de alegria e de impudor.
Seu corpo arderá para mim
sobre um lençol mordido por flores com água.

Em cada mulher existe uma morte silenciosa.
E enquanto o dorso imagina, sob os dedos,
os bordões da melodia,
a morte sobe pelos dedos, navega o sangue,
desfaz-se em embriaguez dentro do coração faminto.
– Oh cabra no vento e na urze,

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GĂ©nio do Mal

Gostavas de tragar o universo inteiro,
Mulher impura e cruel! Teu peito carniceiro,
Para se exercitar no jogo singular,
Por dia um coração precisa devorar.
Os teus olhos, a arder, lembram as gambiarras
Das barracas de feira, e prendem como garras;
Usam com insolĂŞncia os filtros infernais,
Levando a perdição às almas dos mortais.

Ă“ monstro surdo e cego, em maldades fecundo!
Engenho salutar, que exaure o sangue do mundo
Tu nĂŁo sentes pudor? o pejo nĂŁo te invade?
Nenhum espelho há que te mostre a verdade?
A grandeza do mal, com que tu folgas tanto.
Nunca, jamais, te fez recuar com espanto
Quando a Natura-mĂŁe, com um fim ignorado,
— Ó mulher infernal, rainha do Pecado! —
Vai recorrer a ti para um génio formar?

Ă“ grandeza de lama! Ăł ignomĂ­nia sem par.

Tradução de Delfim Guimarães

Existe a Noite

Existe a noite, e existe o breu.
Noite é o velado coração de Deus
Esse que por pudor nĂŁo mais procuro.
Breu Ă© quando tu te afastas ou dizes
Que viajas, e um sol de gelo
Petrifica-me a cara e desobriga-me
De fidelidade e de conjura. O desejo
Esse da carne, a mim nĂŁo me faz medo.
Assim como me veio, também não me avassala.
Sabes por quĂŞ? Lutei com Aquele.
E dele também não fui lacaia.

LĂşcia

(Alfred de Musset)

Nós estávamos sós; era de noite;
Ela curvara a fronte, e a mĂŁo formosa,
Na embriaguez da cisma,
TĂŞnue deixava errar sobre o teclado;
Era um murmĂşrio; parecia a nota
De aura longĂ­nqua a resvalar nas balsas
E temendo acordar a ave no bosque;
Em torno respiravam as boninas
Das noites belas as volĂşpias mornas;
Do parque os castanheiros e os carvalhos
Brando embalavam orvalhados ramos;
OuvĂ­amos a noite, entre-fechada,
A rasgada janela
Deixava entrar da primavera os bálsamos;
A várzea estava erma e o vento mudo;
Na embriaguez da cisma a sós estávamos
E tĂ­nhamos quinze anos!

Lúcia era loura e pálida;
Nunca o mais puro azul de um céu profundo
Em olhos mais suaves refletiu-se.
Eu me perdia na beleza dela,
E aquele amor com que eu a amava – e tanto ! –
Era assim de um irmĂŁo o afeto casto,
Tanto pudor nessa criatura havia!

Nem um som despertava em nossos lábios;
Ela deixou as suas mĂŁos nas minhas;
TĂ­bia sombra dormia-lhe na fronte,

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