Amar!
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar sĂł por amar: Aqui… alĂ©m…
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente…
Amar! Amar! E nĂŁo amar ninguĂ©m!Recordar? Esquecer? Indiferente!…
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!E se um dia hei de ser pĂł, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder… pra me encontrar…
Sonetos sobre Primavera
58 resultadosSoneto Do Breve Momento
Plumas de ninhos em teus seios; urnas
De rubras flores em teu ventre; flores
Por todo corpo teu, terso das dores
De primaveras loucas e noturnas.Pântanos vegetais em tuas pernas
A fremir de serpentes e de saĂşrios
Itinerantes pelos multivários
Rios de águas estáticas e eternas.Feras bramindo nas estepes frias
De tuas brancas nádegas vazias
Como um deserto transmudado em neve.E em meio a essa inumana fauna e flora
Eu, nu e sĂł, a ouvir o Homem que chora
A vida e a morte no momento breve.
Quarenta Anos
Sim! como um dia de verĂŁo, de acesa
Luz, de acesos e cálidos fulgores,
Como os sorrisos da estação das flores,
Foi passando também tua beleza.Hoje, das garras da descrença presa,
Perdes as ilusões. Vão-se-te as cores
Da face. E entram-te n’alma os dissabores,
Nublam-te o olhar as sombras da tristeza.Expira a primavera, O sol fulgura
Com o brilho extremo. . . E aĂ vĂŞm as noites frias,
AĂ vem o inverno da velhice escura…Ah! pudesse eu fazer, novo Ezequias,
Que o sol poente dessa formosura
Volvesse Ă aurora dos primeiros dias!
XLI
Cantem outros a clara cor virente
Do bosque em flor e a luz do dia eterno…
Envoltos nos clarões fulvos do oriente,
Cantem a primavera: eu canto o inverno.Para muitos o imoto céu clemente
É um manto de carinho suave e terno:
Cantam a vida, e nenhum deles sente
Que decantando vai o prĂłprio inferno.Cantam esta mansĂŁo, onde entre prantos
Cada um espera o sepulcral punhado
De Ăşmido pĂł que há de abafar-lhe os cantos…Cada um de nĂłs Ă© a bĂşssola sem norte.
Sempre o presente pior do que o passado.
Cantem outros a vida: eu canto a morte…
Primavera
Ah! quem nos dera que isto, como outrora,
Inda nos comovesse! Ah! quem nos dera
Que inda juntos pudéssemos agora
Ver o desabrochar da primavera!SaĂamos com os pássaros e a aurora.
E, no chĂŁo, sobre os troncos cheios de hera,
Sentavas-te sorrindo, de hora em hora:
“Beijemo-nos! amemo-nos! espera!”E esse corpo de rosa recendia,
E aos meus beijos de fogo palpitava,
Alquebrado de amor e de cansaço.A alma da terra gorjeava e ria…
Nascia a primavera… E eu te levava,
Primavera de carne, pelo braço!
Há Um Poeta Em Mim Que Deus Me Disse
Há um poeta em mim que Deus me disse…
A Primavera esquece nos barrancos
As grinaldas que trouxe dos arrancos
Da sua efĂŞmera e espectral ledice…Pelo prado orvalhado a meninice
Faz soar a alegria os seus tamancos…
Pobre de anseios teu ficar nos bancos
Olhando a hora como quem sorrisse…Florir do dia a capitĂ©is de Luz…
Violinos do silĂŞncio enternecidos…
TĂ©dio onde o sĂł ter tĂ©dio nos seduz…Minha alma beija o quadro que pintou…
Sento-me ao pé dos séculos perdidos
E cismo o seu perfil de inĂ©rcia e vĂ´o…
Ă€ Fragilidade da Vida Humana
Esse baixel nas praias derrotado
Foi nas ondas Narciso presumido;
Esse farol nos céus escurecido
Foi do monte libré, gala do prado.Esse nácar em cinzas desatado
Foi vistoso pavĂŁo de Abril florido;
Esse estio em vesĂşvios encendido
Foi Zéfiro suave em doce agrado.Se a nau, o sol, a rosa, a Primavera
Estrago, eclipse, cinza, ardor cruel
Sentem nos auges de um alento vago,Olha, cego imortal, e considera
Que és rosa, primavera, sol, baixel,
Para ser cinza, eclipse, incĂŞndio, estrago.
O EspĂrito
Nada a fazer amor, eu sou do bando
Impermanente das aves friorentas;
E nos galhos dos anos desbotando
Já as folhas me ofuscam macilentas;E vou com as andorinhas. Até quando?
Ă€ vida breve nĂŁo perguntes: cruentas
Rugas me humilham. NĂŁo mais em estilo brando
Ave estroina serei em mĂŁos sedentas.Pensa-me eterna que o eterno gera
Quem na amada o conjura. Além, mais alto,
Em ileso beiral, aĂ espera:Andorinha indemne ao sobressalto
Do tempo, nĂşncia de perene primavera.
Confia. Eu sou romântica. Não falto.
O Meu Orgulho
Lembro-me o que fui dantes. Quem me dera
NĂŁo me lembrar! Em tardes dolorosas
Lembro-me que fui a Primavera
Que em muros velhos faz nascer as rosas!As minhas mĂŁos outrora carinhosas
Pairavam como pombas… Quem soubera
Porque tudo passou e foi quimera,
E porque os muros velhos nĂŁo dĂŁo rosas!O que eu mais amo Ă© que mais me esquece…
E eu sonho: “Quem olvida nĂŁo merece…”
E já não fico tão abandonada!Sinto que valho mais, mais pobrezinha:
Que também é orgulho ser sozinha,
E também é nobreza não ter nada!
AtĂ© que um Dia…
Meus versos eram rosas, lĂrios, heras,
borboletas, regatos, cotovias
cantando suas doces melodias,
anjos, sereias, ninfas e quimeras.Meus versos eram pombas entre as feras
e, na festa das horas e dos dias,
ia dançando penas e alegrias
e o ano tinha quatro primaveras.E a festa continua… Ă© tambĂ©m festa
o cardo e a urze, o tojo, a murta, a giesta,
a chuva no beiral, o vento Norte,o gosto a mar, a lágrimas, a sal,
até que um dia a vida, a bem ou mal,
exausta de cantar me empreste Ă morte.
Romantismo
Quisera repousar desta vida de agora,
e esquecer no silĂŞncio a dor que me lacera…
– nĂŁo posso ter em mim o ardor da primavera,
– na casa de meu peito uma saudade chora…E há sempre uma lembrança a recordar de outrora
que me faz sonhador… E há sempre uma quimera,
que ainda vive em minha alma à semelhança da hera
pregada sobre o muro em ruĂnas que a vigora…Quisera me afastar do mundo, e a alma selvagem
repousar bem distante Ă beira de um remanso
entre o beijo do vento e o choro da folhagem…E esperar sem ninguĂ©m o prosseguir da vida…
Depois… chegando a morte, em preito ao meu descanso
deixar a minha cruz na solidĂŁo perdida!…
Nada se Pode Comparar Contigo
O ledo passarinho, que gorjeia
D’alma exprimindo a cândida ternura;
O rio transparente, que murmura,
E por entre pedrinhas serpenteia;O Sol, que o céu diáfano passeia,
A Lua, que lhe deve a formosura,
O sorriso da Aurora, alegre e pura,
A rosa, que entre os Zéfiros ondeia;A serena, amorosa Primavera,
O doce autor das glĂłrias que consigo,
A Deusa das paixões e de Citera;Quanto digo, meu bem, quanto não digo,
Tudo em tua presença degenera.
Nada se pode comparar contigo.
5A E 6A Sombras – Cândida E Laura
Como no tanque de um palácio mago,
Dous alvos cisnes na bacia lisa,
Como nas águas que o barqueiro frisa,
Dous nenúfares sobre o azul do lago,Como nas hastes em balouço vago
Dous lĂrios roxos que acalenta a brisa,
Como um casal de juritis que pisa
O mesmo ramo no amoroso afago….Quais dous planetas na cerĂşlea esfera,
Como os primeiros pâmpanos das vinhas,
Como os renovos nos ramais da hera,Eu vos vejo passar nas noites minhas,
Crianças que trazeis-me a primavera…
Crianças que lembrais-me as andorinhas! …
XXXI
Longe de ti, se escuto, porventura,
Teu nome, que uma boca indiferente
Entre outros nomes de mulher murmura,
Sobe-me o pranto aos olhos, de repente…Tal aquele, que, mĂsero, a tortura
Sofre de amargo exĂlio, e tristemente
A linguagem natal, maviosa e pura,
Ouve falada por estranha gente…Porque teu nome Ă© para mim o nome
De uma pátria distante e idolatrada,
Cuja saudade ardente me consome:E ouvi-lo Ă© ver a eterna primavera
E a eterna luz da terra abençoada,
Onde, entre flores, teu amor me espera.
No Claustro De Celas
Eis quanto resta do idĂlio acabado,
– Primavera que durou um momento…
Como vĂŁo longe as manhĂŁs do convento!
– Do alegre conventinho abandonado…Tudo acabou… AnĂŞmonas, hidrângeas,
Silindras, – flores tĂŁo nossas amigas!
No claustro agora viçam as ortigas,
Rojam-se cobras pelas velhas lájeas.Sobre a inscrição do teu nome delido!
– Que os meus olhos mal podem soletrar,
Cansados… E o aroma fenecidoQue se evola do teu nome vulgar!
Enobreceu-o a quietação do olvido,
Ó doce, ingênua, inscrição tumular.
Dona Flor
Ela Ă© tĂŁo meiga! Em seu olhar medroso
Vago como os crepĂşsculos do estio,
Treme a ternura, como sobre um rio
Treme a sombra de um bosque silencioso.Quando, nas alvoradas da alegria,
A sua boca Ăşmida floresce,
Naquele rosto angelical parece
Que Ă© primavera, e que amanhece o dia.Um rosto de anjo, lĂmpido, radiante…
Mas, ai! sob êsse angélico semblante
Mora e se esconde uma alma de mulherQue a rir-se esfolha os sonhos de que vivo
– Como atirando ao vento fugitivo
As folhas sem valor de um malmequer…
Paisagens De Inverno I
Ó meu coração, torna para trás.
Onde vais a correr, desatinado?
Meus olhos incendidos que o pecado
Queimou! – o sol! Volvei, noites de paz.Vergam da neve os olmos dos caminhos.
A cinza arrefeceu sobre o brasido.
Noites da serra, o casebre transido…
Ă“ meus olhos, cismai como os velhinhos.Extintas primaveras evocai-as:
– Já vai florir o pomar das maceiras.
Hemos de enfeitar os chapéus de maias.-Sossegai, esfriai, olhos febris.
-E hemos de ir cantar nas derradeiras
Ladainhas…Doces vozes senis…-
Sonetos
Do som, da luz entre os joviais duetos,
Como uma chusma alada de gaivotas,
Vindos das largas amplidões remotas,
Batem as asas todos os sonetos.VĂŁo — por estradas, por difĂceis rotas,
Quatorze versos — entre dois quartetos
E duas belas e luzidas frotas
Rijas, seguras, de mais dois tercetos.Com a brunida lâmina da lima,
Vão céus radiosos, horizontes acima,
Pelas paragens lĂmpidas, gentis,Atravessando o campo das quimeras,
Aberto ao sol das flĂłreas primaveras,
Todo estrelado de áureos colibris.
Estoicismo
(A Manoel Duarte de Almeida)
Tu que nĂŁo crĂŞs, nem amas, nem esperas,
EspĂrito de eterna negação,
Teu hálito gelou-me o coração
E destroçou-me da alma as primaveras…Atravessando regiões austeras,
Cheias de noite e cava escuridĂŁo,
Como n’um sonho mau, sĂł oiço um nĂŁo,
Que eternamente ecoa entre as esferas…— Porque suspiras, porque te lamentas,
Cobarde coração? Debalde intentas
OpĂ´r á Sorte a queixa do egoĂsmo…Deixa aos tĂmidos, deixa aos sonhadores
A esperança vĂŁ, seus vĂŁos fulgores…
Sabe tu encarar sereno o abismo!
Primavera
Passei a Primavera de meus anos
Com maternais desvelos amorosos.
Com meiguices, afagos carinhosos,
Com mimos de solĂcitos afanos.Desenfaixado dos primeiros panos,
Pus-me em pé, dei passinhos vagarosos,
Logo corridas, saltos brincalhosos,
Travessuras de meninais enganos.Nesta idade infantil da Primavera,
Com outros meus iguais brincões folgava.
Ah, quĂŁo gostoso, entĂŁo, o tempo me era!Inocente brincar sĂł me encantava:
Feliz, se aqui ficando eu conhecera
A força do prazer que desfrutava!