O Pressuposto Indispensável para se Ser um Grande-Escritor
O pressuposto indispensável para se ser um grande-escritor Ă©, entĂŁo, o de escrever livros e peças de teatro que sirvam para todos os nĂveis, do mais alto ao mais baixo. Antes de produzir algum bom efeito, Ă© preciso primeiro produzir efeito: este princĂpio Ă© a base de toda a existĂŞncia como grande-escritor. É um princĂpio miraculoso, eficaz contra todas as tentações da solidĂŁo, por excelĂŞncia o princĂpio goethiano do sucesso: se nos movermos apenas num mundo que nos Ă© propĂcio, tudo o resto virá por si. Pois quando um escritor começa a ter sucesso dá-se logo uma transformação significativa na sua vida. O seu editor pára de se lamentar e de dizer que um comerciante que se torna editor se parece com um idealista trágico, porque faria muito mais dinheiro negociando com tecidos ou papel virgem. A crĂtica descobre nele um objecto digno da sua actividade, porque os crĂticos muitas vezes atĂ© nem sĂŁo más pessoas, mas, dadas as circunstâncias epocais pouco propĂcias, ex-poetas que precisam de um apoio do coração para poderem pĂ´r cá fora os seus sentimentos;sĂŁo poetas do amor ou da guerra, consoante o capital interior que tĂŞm de aplicar com proveito, e por isso Ă© perfeitamente compreensĂvel que escolham o livro de um grande-escritor e nĂŁo o de um comum escritor.
Textos sobre Baixo de Robert Musil
2 resultadosO EspĂrito Desfaz a Ordem das Coisas
O espĂrito aprendeu que a beleza nos faz bons, maus, estĂşpidos ou sedutores. Disseca uma ovelha e um penitente e encontra em ambos humildade e paciĂŞncia. Analisa uma substância e descobre que, tomada em grandes quantidades, pode ser um veneno, e em pequenas doses, um excitante. Sabe que a mucosa dos lábios tem afinidades com a do intestino, mas tambĂ©m sabe que a humildade desses lábios tem afinidades com a humildade de tudo o que Ă© sagrado. O espĂrito desfaz a ordem das coisas, dissolve-as e volta a recompĂ´-las de forma diferente. O bem e o mal, o que está em cima e o que está em baixo nĂŁo sĂŁo para ele noções de um relativismo cĂ©ptico, mas termos de uma função, valores que dependem do contexto em que se encontram. Os sĂ©culos ensinaram-lhe que os vĂcios se podem transformar em virtudes e as virtudes em vĂcios, e conclui que, no essencial, sĂł por inĂ©pcia se nĂŁo consegue fazer de um criminoso um homem Ăştil no tempo de uma vida. NĂŁo reconhece nada como lĂcito ou ilĂcito, porque tudo pode ter uma qualidade graças Ă qual um dia participará de um novo e grande sistema. Odeia secretamente como a morte tudo aquilo que se apresenta como se fosse definitivo,