O homem Ă© o Ășnico ser que, ao nascer, nu sobre a terra nua, Ă© abandonado ao vagido e ao pranto; e nenhum animal Ă© mais propenso Ă s lĂĄgrimas do que ele, desde o inĂcio da vida.
Passagens sobre Abandono
155 resultadosSaudade
Aqui outrora retumbaram hinos;
Muito coche real nestas calçadas
E nestas praças, hoje abandonadas,
Rodou por entre os ouropĂ©is mais finos…Arcos de flores, fachos purpurinos,
Trons festivais, bandeiras desfraldadas,
GirĂąndolas, clarins, atropeladas
LegiĂ”es de povo, bimbalhar de sinos…Tudo passou! Mas dessas arcarias
Negras, e desses torreÔes medonhos,
AlguĂ©m se assenta sobre as lĂĄjeas frias;E em torno os olhos Ășmidos, tristonhos,
Espraia, e chora, como Jeremias,
Sobre a JerusalĂ©m de tantos sonhos!…
Poeminha Tentando Justificar Minha Incultura
Ler na cama
Ă uma difĂcil operação
Me viro e reviro
E não encontro posição
Mas se, afinal,
Consigo um cĂłmodo abandono,
Pego no sono.
Sentimento Esquisito
à céu estéril dos desesperados,
Forma impassĂvel de cristas sidĂ©reo,
Dos cemitérios velho cemitério
Onde dormem os astros delicados.PĂĄtria d’estrelas dos abandonados,
Casulo azul do anseio vago, aéreo,
Formidåvel muralha de mistério
Que deixa os coraçÔes desconsolados.CĂ©u imĂłvel milĂȘnios e milĂȘnios,
Tu que iluminas a visĂŁo dos GĂȘnios
E ergues das almas o sagrado acorde.Céu estéril, absurdo, céu imoto,
Faz dormir no teu seio o Sonho ignoto,
Esta serpente que alucina e morde…
Desejo que vocĂȘ nĂŁo esmoreça, porque Ă© tĂŁo bom estar de bom jeito. Acho que devia abandonar minha tragĂ©dia em um ato…
Pesada Noite
A noite cai de bruços,
cai com o peso fundo do cansaço,
cai como pedra, como braço,
cai como um século de cera,
aos tombos, aos soluços,
entre a maçã maciça e a perene pĂȘra,
entre a tarde e o crepĂșsculo,
dilatação da madrugada, elåstica,
cai, de borracha,
imitação de mĂșsculo,
cai, parecendo que se agacha
na sombra, e feminina, e ĂĄgil
salta, com molas de ginĂĄstica
nos pés, o abismo
do pressĂĄgio,
a noite, essa mandĂbula do trismo,
tétano e espasmo,
ao mesmo tempo, a noite
amorosa, Ă espreita do orgasmo,
ferina, mas também açoite,
contraditĂłria
como existir esquecimento
no Ăntimo do homem,
na intimidade viva da memĂłria,
reminiscĂȘncias que o consomem
fugindo com o vento,
a noite, a noite acata
tudo que ocorre,
tanto aquele que mata
quanto aquele que morre,
a noite, a sensação e aguda
de um sono
fechando os olhos, invencĂvel
como fera que estuda
a vĂtima, abandono
completo, fuga, salto
nas garras do impossĂvel,
a noite pétrea do basalto,
Vingança
“Vingança…”
II
Quero sentir-te nos meus braços presa
e dizer bem baixinho ao teu ouvido,
um segredo de amor terno e sentido
que guardo no meu peito com avareza…Quero ter afinal plena certeza
deste amor que na vida me tem sido:
o meu sonho mais lindo e mais querido,
a luz de uma esperança, sempre acesa…Nesta rosa que tens, viva e vermelha
esmigalhada em tua boca – a abelha
do meu beijo algum dia hei de pousar…Quero unir minha vida Ă tua vida,
sentir que Ă©s minha sĂł, ter-te possuĂda,
para entĂŁo, sĂł depois, te abandonar!…
SilĂȘncio, Nostalgia…
SilĂȘncio, nostalgia…
Hora morta, desfolhada,
sem dor, sem alegria,
pelo tempo abandonada.Luz de Outono, fria, fria…
Hora inĂștil e sombria
de abandono.
Não sei se é tédio, sono,
silĂȘncio ou nostalgia.InterminĂĄvel dia
de indizĂveis cansaços,
de funda melancolia.
Sem rumo para os meus passos,
para que servem meus braços,
nesta hora fria, fria?
O medo de sofrer Ă© pior do que o prĂłprio sofrimento. Ă preciso correr riscos, seguir certos caminhos e abandonar outros.
Preguiça Corporal e Preguiça Espiritual
Hå um trabalho servil, que é do corpo e para o corpo, embora a mente ajude, e um trabalho régio, que é da alma e para a alma, e quase ninguém exige às mãos. Hå, portanto, uma preguiça corporal e outra espiritual, uma ou outra senhora de todos.
A primeira Ă© dominada – nĂŁo destruĂda – pela necessidade e pelo tĂ©dio; a outra, reforçada pela arrogĂąncia, raramente Ă© vencida. Os homens sĂŁo indolentes que trabalham contra a vontade com os braços e a inteligĂȘncia para fugir ao trabalho mais difĂcil da alma.
As actividade imoderadas de muitos nĂŁo passam de pretextos da ociosidade espiritual. Em vez de se afadigarem para conseguir a renĂșncia dos bens materiais, sujeitam-se a um trabalho totalmente exterior que por vezes se converte, devido a inĂ©rcia ou embriaguez, em frenesim.
Mas reformar a natureza doente e transviada, abandonar a senda da concupiscĂȘncia e alcançar a liberdade serena dos filhos da luz representa um trabalho incomparavelmente mais duro do que dirigir uma empresa, fĂĄbrica ou banco. A maioria, por cĂĄclculo de indolĂȘncia, prefere o trabalho servil, embora penoso, ao real, mais ĂĄspero e duro – torna-se escravo das coisas terrestres para evitar o esforço que o tornaria dono do espĂrito.
Ă Actuando que Devemos Abandonar
Eu odeio, no fundo, toda a moral que diz: «NĂŁo faças isto, nĂŁo faças aquilo. Renuncia. Domina-te…». Gosto, pelo contrĂĄrio, da moral que me leva a fazer uma coisa, a refazĂȘ-la, a pensar nela de manhĂŁ Ă noite, a sonhar com ela durante a noite, e a nĂŁo ter jamais outra preocupação que nĂŁo seja fazĂȘ-la bem, tĂŁo bem quanto for capaz entre todos os homens. A viver assim despojamo-nos, uma a uma, de todas as preocupaçÔes que nĂŁo tĂȘm nada a ver com esta vida: vĂȘ-se sem Ăłdio nem repugnĂąncia desaparecer hoje isto, amanhĂŁ aquilo, folhas amarelas que o menor sopro um pouco vivo solta da ĂĄrvore; ou mesmo nem sequer se dĂĄ por isso, de tal modo o objectivo absorve o olhar, de tal modo o olhar se obstina em ver para diante, nĂŁo se desviando nunca, nem para a direita nem para a esquerda, nem para cima nem para baixo. «à a nossa actividade que deve determinar o que temos de abandonar; Ă© actuando que deixaremos», eis o que amo, eis o meu prĂłprio placitum! Mas eu nĂŁo quero trabalhar para me empobrecer mantendo os olhos abertos, nĂŁo quero essas virtudes negativas que tĂȘm por essĂȘncia a negação e a renĂșncia.
Jura
Pelas rugas da fronte que medita…
Pelo olhar que interroga â e nĂŁo vĂȘ nada…
Pela miséria e pela mão gelada
Que apaga a estrela que nossa alma fita…Pelo estertor da chama que crepita
No ultimo arranco d’uma luz minguada…
Pelo grito feroz da abandonada
Que um momento de amante fez maldita…Por quanto hĂĄ de fatal, que quanto hĂĄ misto
De sombra e de pavor sob uma lousa…
Oh pomba meiga, pomba de esperança!Eu t’o juro, menina, tenho visto
Cousas terriveis â mas jamais vi cousa
Mais feroz do que um riso de criança!
Se um homem nĂŁo trava novos conhecimentos ao longo da vida, vai em breve sentir-se abandonado. Um homem, senhor, deve manter as suas amizades sob constantes cuidados.
Ocorreu-lhe que a vida toda de um homem era desempenhar um papel, e que achava perigoso abandonar, por um momento que fosse, sua falsa personalidade.
Imortal Atitude
Abre os olhos Ă Vida e fica mudo!
Oh! Basta crer indefinidamente
Para ficar iluminado tudo
De uma luz imortal e transcendente.Crer Ă© sentir, como secreto escudo,
A alma risonha, lĂșcida, vidente…
E abandonar o sujo deus cornudo,
O sĂĄtiro da Carne impenitente.Abandonar os lĂąnguidos rugidos,
O infinito gemido dos gemidos
Que vai no lodo a carne chafurdando.Erguer os olhos, levantar os braços
Para o eterno SilĂȘncio dos Espaços
E no SilĂȘncio emudecer olhando…
Antes de Amar-te Eu nada Tinha
Antes de amar-te, amor, eu nada tinha:
vacilei pelas ruas e pelas coisas:
nada contava nem tinha nome:
o mundo era do ar que aguardava.Conheci salÔes cinzentos,
tĂșneis habitados pela lua,
hangares cruéis que se despediam,
perguntas que teimavam sobre a areia.Tudo estava vazio, morto e mudo,
caĂdo, abandonado e abatido,
tudo era inalienavelmente alheio,tudo era dos outros e de ninguém,
até que a tua beleza e a tua pobreza
encheram o outono de presentes.
A sublimidade de desperdiçar uma vida que podia ser Ăștil, de nunca executar uma obra que por força seria bela, de abandonar a meio caminho a estrada certa da vitĂłria!
Janela do Sonho
Abri as janelas
que havia dentro de ti
e entrei abandonado
nos teus braços generosos.Senti dentro de mim
o tempo a criar silĂȘncio
para te beber altiva e plena.Mil vezes
repeti teu nome,
mil vezes,
de forma aveludada
e era a chave
que se expunha
e fecundava dentro de mim.JĂĄ nĂŁo se sonha,
deixei de sonhar,
o sonho Ă© poeira dos tempos
Ă© a voz da extensĂŁo
Ă© a voz da pureza
que dardejava na nossa doçura.Quando abri as tuas janelas
e despi teus braços
perdi a vaidade
e a pressa,
amei a partida
e em silĂȘncio abri,
(sem saber que abria)
uma noite hĂșmida
em combustĂŁo secreta
desmaiado no teu ombro
de afrodite.
Amizade Correcta
O sĂĄbio, ainda que se baste a si mesmo, deseja ter um amigo, quanto mais nĂŁo fosse para exercer a amizade, para nĂŁo deixar definhar tĂŁo grande virtude. Ele nĂŁo busca, como dizia Epicuro, «alguĂ©m que lhe vele Ă cabeceira em caso de doença, que o socorra quando esteja em grilhĂ”es ou na indigĂȘncia». Busca alguĂ©m a cuja cabeceira de doente possa velar; alguĂ©m que, quando implicado numa contenda, ele possa salvar dos cĂĄrceres inimigos. Pensar em si prĂłprio, e empenhar-se numa amizade com esse pensamento preconcebido, Ă© cometer um erro de cĂĄlculo. A empresa terminarĂĄ como começou. Fulano arranjou um amigo para dispor, um dia, de um libertador que o preserve dos grilhĂ”es. Ao primeiro tinido de cadeias, lĂĄ se vai o amigo.
Tais sĂŁo as amizades que o mundo chama de «ligaçÔes temporĂĄrias». O homem a quem se escolhe para prestar serviços deixarĂĄ de agradar no dia em que nĂŁo sirva para mais nada. DaĂ a constelação de amigos ao redor das grandes fortunas. Vinda a ruĂna, faz-se, Ă volta, a solidĂŁo: os amigos esquivam-se dos lugares onde sĂŁo postos Ă prova. DaĂ, todos esses escĂąndalos: amigos abandonados, amigos traĂdos, sempre por medo! Ă inevitĂĄvel que o fim concorde com o começo: o interesse fez de sicrano teu amigo;
Emprestai aos pobres e pedi emprestado aos ricos, que logo sereis abandonado por uns e por outros.