Profecia
Nem me disseram ainda
para o que vim.
Se logro ou verdade,
se filho amado ou rejeitado.
Mas sei
que quando cheguei
os meus olhos viram tudo
e tontos de gula ou espanto
renegaram tudo
— e no meu sangue veias se abriram
noutro sangue…
A ele obedeço,
sempre,
a esse incitamento mudo.
Também sei
que hei-de perecer, exangue,
de excesso de desejar;
mas sinto,
sempre,
que nĂŁo posso recuar.Hei-de ir contigo
bebendo fel, sorvendo pragas,
ultrajado e temido,
abandonado aos corvos,
com o pus dos bolores
e o fogo das lavas.
Hei-de assustar os rebanhos dos montes
ser bandoleiro de estradas.
— Negro fado, feia sina,
mas nĂŁo sei trocar a minha sorte!NĂŁo venham dizer-me
com frases adocicadas
(não venham que os não oiço)
que levo caminho errado,
que tenho os caminhos cerrados
Ă minha febre!
Hei-de gritar,
cair, sofrer
— eu sei.
Mas nĂŁo quero ter outra lei,
outro fado, outro viver.
NĂŁo importa lá chegar…
O que eu quero Ă© ir em frente
sem loas, Ăłpios ou afagos
dos lábios que mentem.É esta, não é outra, a minha crença.
Raios vos partam, vĂłs que duvidais,
raios vos partam, cegos de nascença!