Passagens sobre Cães

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Frases sobre cães, poemas sobre cães e outras passagens sobre cães para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

O Cão

O cão da caravana acoita sarnas
pelos pêlos tragados de suor
que encarnam carnaduras já de cor
na salteada costa descarnada

O cão da caravana esconde as armas
o fogo e a cinza dessa cauda cor-
rente ao dorso de estrelas apagadas
se acendem cimitarras para a dor

Ao relho e aos ossos pó entre mil noites
dita a desdita escrita: Maktub!
E o cão se assenta dócil para o açoite

Mas lhe aguarda a tarefa de quem ladra
e exorcisa a baraka dos impuros
enquanto a vida caravana passa

Tabacaria

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo como quem pensou e achou e esqueceu.

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Guerra & Paz

Pedidos sacrifícios, as imagens
Foram trazidas na maré, enxutas.
Treme a escada torpe, e o cão ladra –
São os antepassados, fixos,
Na água das janelas.
Que podemos fazer, o fumo
Entra nas casas é preciso
Uma porta que nos leve ao mar.

Encontro

Felicidade, agarrei-te
Como um cão, pelo cachaço!
E, contigo, em mar de azeite
Afoguei-me, passo a passo…
Dei à minha alma a preguiça
Que o meu corpo não tivera.
E foi, assim, que, submissa,
Vi chegar a Primavera…
Quem a colher que a arrecade
(Há, nela, um segredo lento…)
Ó frágil felicidade!
— Palavra que leva o vento,
E, depois, como se a ideia
De, nos dedos, a ter tido
Bastasse, por fim, larguei-a,
Sem ficar arrependido…

É preferível ceder o caminho a um cão, a ser mordido por ele, pois mesmo matando o cachorro a dentada não ficaria curada.

Ode Marítima

Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,
Olho pro lado da barra, olho pro Indefinido,
Olho e contenta-me ver,
Pequeno, negro e claro, um paquete entrando.
Vem muito longe, nítido, clássico à sua maneira.
Deixa no ar distante atrás de si a orla vã do seu fumo.
Vem entrando, e a manhã entra com ele, e no rio,
Aqui, acolá, acorda a vida marítima,
Erguem-se velas, avançam rebocadores,
Surgem barcos pequenos de trás dos navios que estão no porto.
Há uma vaga brisa.
Mas a minh’alma está com o que vejo menos,
Com o paquete que entra,
Porque ele está com a Distância, com a Manhã,
Com o sentido marítimo desta Hora,
Com a doçura dolorosa que sobe em mim como uma náusea,
Como um começar a enjoar, mas no espírito.

Olho de longe o paquete, com uma grande independência de alma,
E dentro de mim um volante começa a girar, lentamente,

Os paquetes que entram de manhã na barra
Trazem aos meus olhos consigo
O mistério alegre e triste de quem chega e parte.

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GRITO

De ti que inventaste
a paz
a ternura
e a paixão
o beijo
o beijo fundo intenso e louco
e deixaste lá para trás
a côncava do medo
à hora entre cão e lobo
à hora entre lobo e cão.

De ti que em cada ano
cada dia cada mês
não paraste de acender
uma e outra vez
a flor eléctrica
do mais desvairado
coração.

De ti que fugiste à estepe
e obrigaste
à ordem dos caminhos
o pastor
a cabra e o boi
e do fundo do tempo
me chamaste teu irmão.

De ti que ergueste a casa
sobre estacas
e pariste
deuses e linguagens
guerras
e paisagens sem alento.

De ti que domaste
o cavalo e os neutrões
e conquistaste
o lírico tropel
das águas e do vento.

De ti que traçaste
a régua e esquadro
uma abóboda inquieta
semeada de nuvens e tritões
santidades e tormentos.

De ti que levaste
a volupta da ambição
a trepar erecta
contra as leis do firmamento.

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Quer Ver Uma Perdiz Chocar Um Rato

Quer ver uma perdiz chocar um rato,
Quer ensinar a um burro anatomia,
Exterminar de Goa a senhoria,
Ouvir miar um cão, ladrar um gato;

Quer ir pescar um tubarão no mato,
Namorar nos serralhos da Turquia,
Escaldar uma perna em água fria,
Ver um cobra castiçar co’um pato;

Quer ir num dia de Surrate a Roma,
Lograr saúde sem comer dois anos,
Salvar-se por milagre de Mafoma;

Quer despir a bazófia aos Castelhanos,
Das penas infernais fazer a soma,
Quem procura amizade em vis gafanos.

A Cidade de Palaguin

Na cidade de Palaguin
o dinheiro corrente era olhos de crianças.
Em todas as ruas havia um bordel
e uma multidão de prostitutas
frequentava aos grupos casas de chá.
Havia dramas e histórias de era uma vez
havia hospitais repletos:
o pus escorria da porta para as valetas.
Havia janelas nunca abertas
e prisões descomunais sem portas.
Havia gente de bem a vagabundear
com a barba crescida.
Havia cães enormes e famélicos
a devorar mortos insepultos e voantes.
Havia três agências funerárias
em todos os locais de turismo da cidade.
Havia gente a beber sofregamente
a água dos esgotos e das poças.
Havia um corpo de bombeiros
que lançava nas chamas gasolina.

Na cidade de Palaguin
havia crianças sem braços e desnudas
brincando em parques de pântanos e abismos.
Havia ardinas a anunciar
a falência do jornal que vendiam;
havia cinemas: o preço de entrada
era o sexo dum adolescente
(as mães cortavam o sexo dos filhos
para verem cinema).
Havia um trust bem organizado
para a exploração do homossexualismo.

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A Verdadeira Morte é a Decadência

– Nunca se faz nada da vida.
– Mas ela faz alguma coisa de nós.
– Nem sempre… O que espera você da sua?
– Penso que sei sobretudo o que não espero dela…
– De cada vez que você teve de optar, não se…
– Não sou eu que opto: é aquilo que resiste.
– Mas o quê?
– À consciência da morte.
– A verdadeira morte, é a decadência. É tão mais grave, envelhecer ! Aceitarmos o nosso destino, a nossa função, a casota de cão erguida na nossa vida única… Não se sabe o que é a morte quando se é novo…

A um Passo do Amor

A um passo do amor estarás a um passo do futuro e a duzentos mil anos do passado. O teu nome é o nome de todas as coisas-, quando todas as coisas respiram no teu nome. Entre o sofrimento e a felicidade, muito de ti se espalha pela vida, muita vida te aguarda, muita vida te procura. Um duplo coração bate dentro do peito e fora de ti. Tens a sabedoria das crianças e a sabedoria dos velhos. Sabes ferir e beijar e sentes o vento do orgulho. Pequeninos gestos, grandes pensamentos, constroem um dia excepcional, um amor excepcional, uma violência excepcional. Todas as noites são uma só noite, tanto desespero pode voltar a ser esperança. As tuas mãos são uma pátria. Os teus dedos são, umas vezes, o mais difícil dos rebanhos. E outras, os cães que o guardam, quando a verdade é triste e o amor tem a fome e a sede das estrelas.

Amor

Não vês como eu sigo
Teus passos, não vês?
O cão do mendigo
Não é mais amigo
Do dono talvez!

Ao pé de uma fonte
No fundo de um vale,
No alto de um monte
Do vasto horizonte,
Sem ti estou mal!

Sem ti, olho e canso
De olhar, e que vi?
Os olhos que lanço,
Acharem descanso,
Só acham em ti!

Os ventos que empolam
A face do mar,
E as ondas que rolam
Na praia, consolam
Tamanho pesar?

As formas estranhas
De nuvens que vão
Roçando as montanhas
Em ondas tamanhas
Distraem-me? Não!

A pomba que abraça
No ar o seu par,
E a nuvem que passa,
Não tem essa graça
Que tens a andar!

Parece o pezinho,
De lindo que é,
Ligeiro e levinho
O de um passarinho
Voando de pé!

O rosto, há em torno
Da pálida oval,
Daquele contorno
Tão puro, o adorno
Da auréola imortal!

Não sei que luz vaga,

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Soneto Na Morte De José Arthur Da Frota Moreira

Cantamos ao nascer o mesmo canto
De alegria, de súplica e de horror
E a mulher nos surgiu no mesmo encanto
Na mesma dúvida e na mesma dor.

Criamos toda a sedução, e tanto
Que de nós seduzido, o sedutor
Morreu nas mesmas lágrimas de amor
Ao milagre maior do amor em pranto.

Fui um pouco teu cão e teu mendigo
E tu, como eu, mendigo de outro pão
Sempre guardaste o pão do teu amigo

Meu misterioso irmão, sigo contigo
Há tanto, tanto tempo, mão na mão…
Ouve como chora o coração.

Um inteligência vulgar é como um mau cão de caça, que depressa encontra a pista de um pensamento e depressa a volta a perder; uma inteligência invulgar é como um cão de fila, que segue firme e resolutamente a pista até atingir o que é vida.

Efeito, n. O segundo de dois fenómenos que ocorrem sempre juntos e na mesma ordem. Do primeiro, ao qual se chama Causa, diz-se que gera o segundo — o que é tão sensato como dizer-se que, por se ter visto um cão a perseguir um coelho, o coelho é a causa do cão.