Passagens sobre Desventuras

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XXI

De um ramo desta faia pendurado
Veja o instrumento estar do pastor Fido;
Daquele, que entre os mais era aplaudido,
Se alguma vez nas selvas escutado.

Ser eternamente consagrado
Um ai saudoso, um fúnebre gemido;
Enquanto for no monte repetido
O seu nome, o seu canto levantado.

Se chegas a este sítio, e te persuade
A algum pesar a sua desventura,
Corresponde em afetos de piedade;

Lembra te, caminhante, da ternura
De seu canto suave; e uma saudade
Por obséquio dedica à sepultura.

XXXVII

Continuamente estou imaginando,
Se esta vida, que logro, tão pesada,
Há de ser sempre aflita, e magoada,
Se como o tempo enfim se há de ir mudando:

Em golfos de esperança flutuando
Mil vezes busco a praia desejada;
E a tormenta outra vez não esperada
Ao pélago infeliz me vai levando.

Tenho já o meu mal tão descoberto,
Que eu mesmo busco a minha desventura;
Pois não pode ser mais seu desconcerto.

Que me pode fazer a sorte dura,
Se para não sentir seu golpe incerto,
Tudo o que foi paixão, é já loucura!

A Desventura Máxima é a Solidão

A desventura máxima é a solidão. É tão verdade que o reconforto supremo – a religião – consiste em encontrar uma companhia que nunca falhe – Deus. A oração é um desabafo, como com um amigo. A obra equivale à oração, porque nos põe em contacto com os que dela tirarão proveito. O problema da vida é, portanto, o seguinte: como romper a nossa solidão, como comunicar com os outros. Assim se explica a existência do matrimónio, da paternidade, das amizades. Mas que a felicidade resida nisto, balelas! Porque se deva estar melhor comunicando com os outros do que só, é estranho. É talvez apenas uma ilusão: a maior parte do tempo, estamos muitíssimo bem sós. É agradável ter, de tempos a tempos, um odre em que nos possamos despejar e, em seguida, bebermo-nos a nós próprios: dado que pedimos aos outros apenas aquilo que já temos em nós. É um mistério o motivo por que não basta perscrutar e beber em nós próprios e seja preciso reavermo-nos por intermédio dos outros. (O sexo é um incidente: o que recebemos é momentâneo e casual; pretendemos algo de mais secreto e misterioso de que o sexo é apenas um sinal, um símbolo).

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Lamenta-se o homem que teve a desventura de casar com má mulher, mas aquele que pela segunda vez se expõe, não é digno de que o lastimem, porque terá apenas o que mereceu, se a última se assemelhar à primeira.

O Assinalado

Tu és o louco da imortal loucura,
O louco da loucura mais suprema.
A Terra é sempre a tua negra algema,
Prende-te nela a extrema Desventura.

Mas essa mesma algema de amargura,
Mas essa mesma Desventura extrema
Faz que tu’alma suplicando gema
E rebente em estrelas de ternura.

Tu és o Poeta, o grande Assinalado
Que povoas o mundo despovoado,
De belezas etrenas, pouco a pouco…

Na Natureza prodigiosa e rica
Toda a audácia dos nervos justifica
Os teus espasmos imortais de louco!

A um Poeta Morto

Quando a primeira vez a harmonia secreta
De uma lira acordou, gemendo, a terra inteira,
– Dentro do coração do primeiro poeta
Desabrochou a flor da lágrima primeira.

E o poeta sentiu os olhos rasos de água;
Subiu-lhe â boca, ansioso, o primeiro queixume:
Tinha nascido a flor da Paixão e da Mágoa,
Que possui, como a rosa, espinhos e perfume.

E na terra, por onde o sonhador passava,
Ia a roxa corola espalhando as sementes:
De modo que, a brilhar, pelo solo ficava
Uma vegetação de lágrimas ardentes.

Foi assim que se fez a Via Dolorosa,
A avenida ensombrada e triste da Saudade,
Onde se arrasta, à noite, a procissão chorosa
Dos órfãos do carinho e da felicidade.

Recalcando no peito os gritos e os soluços,
Tu conheceste bem essa longa avenida,
– Tu que, chorando em vão, te esfalfaste, de bruços,
Para, infeliz, galgar o Calvário da Vida.

Teu pé também deixou um sinal neste solo;
Também por este solo arrastaste o teu manto…
E, ó Musa, a harpa infeliz que sustinhas ao colo,

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XV

Formoso, e manso gado, que pascendo
A relva andais por entre o verde prado,
Venturoso rebanho, feliz gado, Que à bela
Antandra estais obedecendo;

Já de Corino os ecos percebendo
A frente levantais, ouvis parado;
Ou já de Alcino ao canto levantado,
Pouco e pouco vos ides recolhendo;

Eu, o mísero Alfeu, que em meu destino
Lamento as sem razões da desventura,
A seguir vos também hoje me inclino:

Medi meu rosto: ouvi minha ternura;
Porque o aspecto, e voz de um peregrino
Sempre faz novidade na espessura.

Baby!

Baby! Sossega a tua voz. Não digas mais
Essas canções do Mundo. Deixa que eu esqueço
Que fui menino ao colo de seus pais.
Deixa! Que o coração em si mesmo o adormeço…

Com olhos de criança olho os desiguais
Dias e nuvens, sós, passando, e empalideço…
Canto de Prometeu todo desfeito em ais!
E a vida, a vida até, brinquedo que aborreço…

Mundo dos meus enganos como a desventura!
Experiência, – pobre fumo! Anela o meu cabelo
E põe-me o bibe azul e antigo da Ternura…

Que a vida, essa Babel desfeita que se embala,
ainda é para mim – criança de Deus, pesadelo
Da infância das fanfarras, fogo de Bengala!

Otelo

Quem minha angústia suportar, prefira
a morte, redentora, à desventura
de não poder, nas vascas da loucura,
distinguir a verdade da mentira.

Infrene dúvida, implacável ira,
esta que me alucina e me tortura!
– Ter ciúmes da luz, formosa e pura,
do chão, da sombra e do ar que se respira!

Invejo a veste que te esconde! a espuma
que, beijando teu corpo, linha a linha,
toda do teu aroma se perfuma!

Amo! E o delírio desta dor mesquinha,
faz que eu deseje ser tu mesma, em suma,
para ter a certeza de que és minha!