Passagens sobre Fados

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Dizem que temos valor (os portugueses), mas que nos falta dinheiro e união; e todos nos prognosticam os fados que naturalmente se seguem destas infelizes premissas.

Da Verdade não Quero Mais que a Vida

Sob a leve tutela
De deuses descuidosos,
Quero gastar as concedidas horas
Desta fadada vida.
Nada podendo contra
O ser que me fizeram,
Desejo ao menos que me haja o Fado
Dado a paz por destino.
Da verdade não quero
Mais que a vida; que os deuses
Dão vida e não verdade, nem talvez
Saibam qual a verdade.

Ah! Fortuna Cruel! Ah! Duros Fados!

Ah! Fortuna cruel! Ah! duros Fados!
Quão asinha em meu dano vos mudastes!
Passou o tempo que me descansastes,
agora descansais com meus cuidados.

Deixastes-me sentir os bens passados,
para mor dor da dor que me ordenastes;
então nü’hora juntos mos levastes,
deixando em seu lugar males dobrados.

Ah! quanto milhor fora não vos ver,
gostos, que assi passais tão de corrida,
que fico duvidoso se vos vi:

sem vós já me não fica que perder,
se não se for esta cansada vida,
que por mor perda minha não perdi.

Camões, Grande Camões, quão Semelhante

Camões, grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu, quando os cotejo!
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo,
Arrostar co’o sacrílego gigante;

Como tu, junto ao Ganges sussurrante,
Da penúria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
Também carpindo estou, saudoso amante.

Ludíbrio, como tu, da Sorte dura
Meu fim demando ao Céu, pela certeza
De que só terei paz na sepultura.

Modelo meu tu és, mas… oh, tristeza!…
Se te imito nos transes da Ventura,
Não te imito nos dons da Natureza.

Tudo isto é fado

Perguntaste-me outro dia
Se eu sabia o que era o fado
Eu disse que não sabia
Tu ficaste admirado
Sem saber o que dizia
Eu menti naquela hora
E disse que não sabia
Mas vou-te dizer agora

Almas vencidas
Noites perdidas
Sombras bizarras
Na mouraria
Canta um rufia
Choram guitarras
Amor ciúme
Cinzas e lume
Dor e pecado
Tudo isto existe
Tudo isto é triste
Tudo isto é fado

Se queres ser meu senhor
E teres-me sempre a teu lado
Não me fales só de amor
Fala-me também do fado
É canção que é meu castigo
Só basceu p’ra me perder
O fado é tudo o que eu digo
Mais o que eu não sei dizer

A rádio foi para a música o que o jornalismo foi para a literatura. Da mesma maneira que não há Cervantes que resista entre duas colunas de uma gazeta, não há Beethoven que se aguente entre dois fados da Mouraria.

Tudo quanto Sonhei se Foi Perdido

O que sonhei e antes de vivido
Era perfeito e lúcido e divino,
Tudo quanto sonhei se foi perdido
Nas ondas caprichosas do destino.

Que os fados em mim mesmo depuseram
Razões de ser e de não ser, contrárias,
Nas emoções que, dentro em mim, cresceram
Tumultuosas, carinhosas, várias.

Naqueles seres que fui dentro de um ser,
Que viveram de mais para eu viver
A minha vida luminosa e calma,

Se desdobraram gestos de menino
E rudes arremedos de assassino.
Foram almas de mais numa só alma.

Soneto V – À Sra. Marieta Landa

Disseste a nota amena d’alegria,
E, arrebatado então nesse momento
De um doce, divinal contentamento,
Eu senti que minh’alma aos céus subia.

Disseste a nota da melancolia,
Negra nuvem toldou-me o pensamento;
Senti que agudo espinho virulento
Do coração as fibras me rompia.

És anjo ou nume, tu que desta sorte
Trazes o peito humano arrebatado
Em sucessivo e rápido transporte?!

Anjo ou nume não és; mas, se te é dado
No canto dar a vida, ou dar a morte,
Tens nas mãos teu Porvir, teu bem, teu fado.

Soneto II – A Uma Inconstante

De uma ingrata em troféu despedaçado
Meu coração devora amor cruento,
Trocando em fero e bárbaro tormento
Quantos prazeres concedeu-me o fado.

No seio d’alma, já dilacerado,
Negras fúrias do báratro apascento!
Filtra-me o delirante pensamento
De zelos negro fel envenenado.

Desprezo, ingratidão, fria esquivança
Da cruel por quem morro, em tal procela
Apagaram-me a estrela da esperança.

E eu (ao confessá-lo a dor me gela)
Humilhado a seus pés, minha vingança
É carpir, delirar, morrer por ela.

Chorai, Ninfas, Os Fados Poderosos

Chorai, Ninfas, os fados poderosos
daquela soberana fermosura!
Onde foram parar na sepultura
aqueles reais olhos graciosos?

Ó bens do mundo, falsos e enganosos!
Que mágoas para ouvir! Que tal figura
jaza sem resplandor na terra dura,
com tal rosto e cabelos tão fermosos!

Das outras que será, pois poder teve
a morte sobre cousa tanto bela
que ela eclipsava a luz do claro dia?

Mas o mundo não era dino dela,
por isso mais na terra não esteve;
ao Céu subiu, que já *se* lhe devia.

Correm Turvas As Águas Deste Rio

Correm turvas as águas deste rio,
que as do Céu e as do monte as enturbaram;
os campos florecidos se secaram,
intratável se fez o vale, e frio.

Passou o Verão, passou o ardente Estio,
üas cousas por outras se trocaram;
os fementidos Fados já deixaram
do mundo o regimento, ou desvario.

Tem o tempo sua ordem já sabida;
o mundo, não; mas anda tão confuso,
que parece que dele Deus se esquece.

Casos, opiniões, natura e uso
fazem que nos pareça desta vida
que não há nela mais que o que parece.

Não é desgraça ser pobre

Não é desgraça ser pobre,
não é desgraça ser louca:
desgraça é trazer o fado
no coração e na boca.

Nesta vida desvairada,
ser feliz é coisa pouca.
Se as loucas não sentem nada,
não é desgraça ser louca.

Ao nascer trouxe uma estrela;
nela o destino traçado.
Não foi desgraça trazé-la:
desgraça é trazer o fado.

Desgraça é andar a gente
de tanto cantar, já rouca,
e o fado, teimosamente,
no coração e na boca.

Da Nossa Semelhança com os Deuses

Da nossa semelhança com os deuses
Por nosso bem tiremos
Julgarmo-nos deidades exiladas
E possuindo a Vida
Por uma autoridade primitiva
E coeva de Jove.

Altivamente donos de nós-mesmos,
Usemos a existência
Como a vila que os deuses nos concedem
Para, esquecer o estio.
Não de outra forma mais apoquentada
Nos vale o esforço usarmos
A existência indecisa e afluente
Fatal do rio escuro.

Como acima dos deuses o Destino
É calmo e inexorável,
Acima de nós-mesmos construamos
Um fado voluntário
Que quando nos oprima nós sejamos
Esse que nos oprime,
E quando entremos pela noite dentro
Por nosso pé entremos

Meus Olhos, Atentai no Meu Jazigo

Meus olhos, atentai no meu jazigo,
Que o momento da morte está chegado;
Lá soa o corvo, intérprete do fado;
Bem o entendo, bem sei, fala comigo:

Triunfa, Amor, gloria-te, inimigo;
E tu, que vês com dor meu duro estado,
Volve à terra o cadáver macerado,
O despojo mortal do triste amigo:

Na campa, que o cobrir, piedoso Albano,
Ministra aos corações, que Amor flagela,
Terror, piedade, aviso, e desengano:

Abre em meu nome este epitáfio nela:
“Eu fui, ternos mortais, o terno Elmano;
Morri de ingratidões, matou-me Isabela.”

Nada é Prémio: Sucede o que Acontece

A cada qual, como a ‘statura, é dada
A justiça: uns faz altos
O fado, outros felizes.

Nada é prêmio: sucede o que acontece.
Nada, Lídia, devemos
Ao fado, senão tê-lo.

LX

Valha-te Deus, cansada fantasia!
Que mais queres de mim? que mais pretendes?
Se quando na esperança mais te acendes,
Se desengana mais tua porfia!

Vagando regiões de dia em dia,
Novas conquistas, e troféus empreendes:
Ah que conheces mal, que mal entendes,
Onde chega do fado a tirania!

Trata de acomodar-te ao movimento
Dessa roda volúvel, e descansa
Sobre tão fatigado pensamento.

E se inda crês no rosto da esperança,
Examina por dentro o fingimento;
E verás tempestade o que é bonança.

Ambiente

A Alexandre de Médicis

A rua é tão estreita
que o luar mal chega às pedras
que pisei, ao vir aqui.

A casa tem pior fama
do que a rua, onde só passa
quem não tem outro caminho.

A sala, onde vim juntar-me
com a baixeza da vida,
tem menos luz do que a rua
e os olhos não têm estrelas.
Há uma mulher perdida
que diz a sua desgraça.
Um marinheiro possante
fala de terras, do mar,
e as suas mãos têm saudade
da guitarra que está longe…

Anda, no ar, perturbante,
um cheiro de vinho novo
que enjoa, mas faz querê-lo
junto com reles comidas.

O pensamento da gente
não se fixa em coisa alguma:
vai como nota de música…

As almas estão com sono.
As horas passam
sem se dar por elas…

… E só longe
alguém cantará o fado.

Cantata de Dido

Já no roxo oriente branqueando,
As prenhes velas da troiana frota
Entre as vagas azuis do mar dourado
Sobre as asas dos ventos se escondiam.
A misérrima Dido,
Pelos paços reais vaga ululando,
C’os turvos olhos inda em vão procura
O fugitivo Eneias.
Só ermas ruas, só desertas praças
A recente Cartago lhe apresenta;
Com medonho fragor, na praia nua
Fremem de noite as solitárias ondas;
E nas douradas grimpas
Das cúpulas soberbas
Piam nocturnas, agoureiras aves.
Do marmóreo sepulcro
Atónita imagina
Que mil vezes ouviu as frias cinzas
De defunto Siqueu, com débeis vozes,
Suspirando, chamar: – Elisa! Elisa!
D’Orco aos tremendos numens
Sacrifícios prepara;
Mas viu esmorecida
Em torno dos turícremos altares,
Negra escuma ferver nas ricas taças,
E o derramado vinho
Em pélagos de sangue converter-se.
Frenética, delira,
Pálido o rosto lindo
A madeixa subtil desentrançada;
Já com trémulo pé entra sem tino
No ditoso aposento,
Onde do infido amante
Ouviu, enternecida,
Magoados suspiros, brandas queixas.
Ali as cruéis Parcas lhe mostraram
As ilíacas roupas que,

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Só Esta Liberdade nos Concedem os Deuses

Só esta liberdade nos concedem
Os deuses: submetermo-nos
Ao seu domínio por vontade nossa.
Mais vale assim fazermos
Porque só na ilusão da liberdade
A liberdade existe.

Nem outro jeito os deuses, sobre quem
O eterno fado pesa,
Usam para seu calmo e possuído
Convencimento antigo
De que é divina e livre a sua vida.

Nós, imitando os deuses,
Tão pouco livres como eles no Olimpo,
Como quem pela areia
Ergue castelos para encher os olhos,
Ergamos nossa vida
E os deuses saberão agradecer-nos
O sermos tão como eles.

Minha Culpa

A Artur Ledesma

Sei lá! Sei lá! Eu sei lá bem
Quem sou?! Um fogo-fátuo, uma miragem…
Sou um reflexo… um canto de paisagem
Ou apenas cenário! Um vaivém…

Como a sorte: hoje aqui, depois além!
Sei lá quem Sou?! Sei lá! Sou a roupagem
Dum doido que partiu numa romagem
E nunca mais voltou! Eu sei lá quem!…

Sou um verme que um dia quis ser astro…
Uma estátua truncada de alabastro…
Uma chaga sangrenta do Senhor…

Sei lá quem sou?! Sei lá! Cumprindo os fados,
Num mundo de vaidades e pecados,
Sou mais um mau, sou mais um pecador…