Passagens sobre Folhas

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Frases sobre folhas, poemas sobre folhas e outras passagens sobre folhas para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Poeta

– Poeta errante,
de olhar vago e distante
e azul,
o teu perfil singular
recorta-se angular
ao norte e ao sul.

– Os teus fatos coçados
bate-os o vento
e leva-os aos bocados…

E os sapatos gastos
pedem grandes repastos,
abrem bocas, esfomeados.

(Nos bolsos, imagino
asas de borboletas,
molhos de folhas secas,
poeiras e papéis…)

– Poeta errante,
caem por terra os livros e a estante,
e as torres esguias das igrejas,
e as paredes velhas dos bordéis!…

– Poeta errante,
vamos dormir na sombra dos vergéis!…

As verdades diferentes na aparência são como inúmeras folhas que parecem diferentes e estão na mesma árvore.

Setentrional

Talvez já te não lembres, triste Helena,
Dos passeios que dávamos sozinhos,
À tardinha, naquela terra amena,
No tempo da colheita dos bons vinhos.

Talvez já te não lembres, pesarosa,
Da casinha caiada em que moramos,
Nem do adro da ermida silenciosa,
Onde nós tantas vezes conversamos.

Talvez já te esquecesses, ó bonina,
Que viveste no campo só comigo,
Que te osculei a boca purpurina,
E que fui o teu sol e o teu abrigo.

Que fugiste comigo da Babel,
Mulher como não há nem na Circássia,
Que bebemos, nós dois, do mesmo fel,
E regamos com prantos uma acácia.

Talvez já te não lembres com desgosto
Daquelas brancas noites de mistério,
Em que a Lua sorria no teu rosto
E nas lajes campais do cemitério.

Talvez já se apagassem as miragens
Do tempo em que eu vivia nos teus seios,
Quando as aves cantando entre as ramagens
O teu nome diziam nos gorjeios.

Quando, à brisa outoniça, como um manto,
Os teus cabelos de âmbar, desmanchados,
Se prendiam nas folhas dum acanto,

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Existimos em Função do Futuro

Tentai apreender a vossa consciência e sondai-a. Vereis que está vazia, só encontrareis nela o futuro. Nem sequer falo dos vossos projectos e expectativas: mas o próprio gesto que surpreendeis de passagem só tem sentido para vós se projectardes a sua realização final para fora dele, fora de vós, no ainda-não. Mesmo esta taça cujo fundo não se vê – que se poderia ver, que está no fim de um movimento que ainda não se fez -, esta folha branca cujo reverso está escondido (mas poderia virar-se a folha) e todos os objectos estáveis e sólidos que nos rodeiam ostentam as suas qualidades mais imediatas, mais densas, no futuro.
O homem não é de modo nenhum a soma do que tem, mas a totalidade do que não tem ainda, do que poderia ter. E, se nos banhamos assim no futuro, não ficará atenuada a brutalidade informe do presente? O acontecimento não nos assalta como um ladrão, visto que é, por natureza, um Tendo-sido-Futuro.

SMS

Ela caminha já a tarde vai alta pelo passeio que segue paralelo ao mar, por cima das praias. Em baixo, a areia estende-se vazia até à água, acabando numa espuma branca, das ondas que rebentam com o fragor dos dias de Inverno. Vai sozinha. Cruza-se com jovens a passo de corrida, outros que deslizam em patins, um casal com o filho pequeno feliz na sua bicicleta de rodinhas, acompanhado por um cãozinho saltitante que corre para a frente e para trás em redor dele.
Leva na mão o telemóvel e nos olhos castanhos brilhantes uma esperança. Vai pensativa e sem horas, caminhando sem pressa, reparando nas pessoas, no mar desabrido que se atira à praia, no ar fresco que respira, no vento que se levanta com uma promessa de tempestade. Cruza o casaco grosso, azul-escuro, à frente do peito, sem apertar os botões. Cruza os braços. Uma folha de jornal passa por ela a esvoaçar, notícias antigas, pensa divertida, logo se concentrando no navio de carga iluminado que vem de Lisboa e ruma ao mar aberto com o vagar de quem tem um destino certo num dia certo.

Acaba por apertar os botões do casaco e levantar a gola para se sentir mais protegida do vento,

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Árvore

Conheço as suas raízes. É tudo o que vejo.
Há um movimento que a percorre devagar. Não sei
se ela existe. Imagino apenas como são os ramos,
este odor mais secreto, as primeiras folhas
aquecidas. Mas eu existo para ela. Sou
a sua própria sombra, o espaço que fica à volta
para que se torne maior. É assim que chega
o que não passa de um pressentimento. Ela compreende
este segredo. Estremece. Comigo procuro trazer
só um pouco de terra. É a terra de que ela precisa.

Carrego as Estações Comigo

Carrego as estações comigo
e tenho as mãos cansadas.
No bolso esquerdo um riacho murmura.
Ali, onde pequenas pedras se acumulam,
uma canção exala seu vapor,
depois se perde.

Jardins de Primavera circulam no meu corpo
Um céu de ouro verte seu perfume
e um vento ignorado agita suas asas.
Pasto de segredos, mescla de memória
e desejo, meu corpo caminha com a chuva
(carrego as estações comigo)
à procura do sonho de uma nuvem fria.

Tantas folhas trago nos braços
que um pássaro, solidário, se oferece
para carregar as estações comigo.
Do peito aberto os meus jardins se vão
e o pássaro me ajuda, memória
e desejo, a semear meu corpo.

Ali planto meus braços.
Debaixo daquelas flores meus olhos ficam.
Os pés, roídos pela terra, penduro numa árvore.
O tronco multiplico em cem pedaços:
Lá vai, junto com as pedras,
no bojo do riacho antigo.

E pois que carrego as estações comigo
os lábios deixo além, no descampado.
E peço ao pássaro que pelos cabelos atire
o que sobrou de mim
àquele mar onde me espera a memória
e o desejo do tempo em que não soube
carregar as estações comigo.

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Um ancião é uma grande árvore que, já não tendo nem frutos nem folhas, ainda está presa á terra.

Coroava-te de Rosas

Se pudesse, coroava-te de rosas
neste dia —
de rosas brancas e de folhas verdes,
tão jovens como tu, minha alegria.

Terra onde os versos vão abrindo,
meu coração, não tem rosas para dar;
olhos meus, onde as águas vão subindo,
cerrai-vos, deixai de chorar.

Coroai-me de Rosas

Coroai-me de rosas,
Coroai-me em verdade,
De rosas —

Rosas que se apagam
Em fronte a apagar-se
Tão cedo!

Coroai-me de rosas
E de folhas breves.
E basta.

Sobre A Neve

Sobre mim, teu desdém pesado jaz
Como um manto de neve…Quem dissera
Porque tombou em plena Primavera
Toda essa neve que o Inverno traz!

Coroavas-me inda pouco de lilás
E de rosas silvestres…quando eu era
Aquela que o destino prometera
Aos teus rútilos sonhos de rapaz!

Dos beijos que me deste não te importas,
Asas paradas de andorinhas mortas…
Folhas de Outono e correria louca…

Mas inda um dia, em mim, ébrio de cor,
Há-de nascer um roseiral em flor
Ao sol de Primavera doutra boca!

As carícias são tão necessárias para a vida dos sentimentos como as folhas para as árvores. Sem elas, o amor morrer pela raiz.

A Dor

Que venha, refúgio ou insónia, futuro
antigo e comece no campo ou no flanco, à
direita, onde consome a alma, à esquerda
onde exclama no corpo, na seiva ou no chão

dos sobressaltos. Venha, amantíssima e espessa,
orelha ou folha acesa, fugaz ou rasgada,
planície vermelha, doce, gélida ou rápida.
Obedeça ao enleio, desperte ou descanse,

corre pelo sangue como cervo na noite,
sol que despedaça o peito. O rosto se cobre
de grandes cinzas, pesado como uma lágrima,

a alma, sendo ar, em nenhum lugar sereno.
Única posse de que dispomos. É seu
absurdo desejo, subtil e sem domínio.

Repara como o poeta humaniza as coisas: dá hesitação às folhas, anseios ao vento. Talvez seja assim que Deus dá alma aos homens.

Dobre

Peguei no meu coração
E pu-lo na minha mão

Olhei-o como quem olha
Grãos de areia ou uma folha.

Olhei-o pávido e absorto
Como quem sabe estar morto;

Com a alma só comovida
Do sonho e pouco da vida.

Outonal

Caem as folhas mortas sobre o lago!
Na penumbra outonal, não sei quem tece
As rendas do silêncio…Olha, anoitece!
— Brumas longínquas do País Vago…

Veludos a ondear…Mistério mago…
Encantamento…A hora que não esquece,
A luz que a pouco e pouco desfalece,
Que lança em mim a bênção dum afago…

Outono dos crepúsculos doirados,
De púrpuras, damascos e brocados!
— Vestes a Terra inteira de esplendor!

Outono das tardinhas silenciosas,
Das magníficas noites voluptuosas
Em que soluço a delirar de amor…

Saudade

Tu és o cálix;
Eu, o orvalho!
Se me não vales,
Eu o que valho?

Eu se em ti caio
E me acolheste
Torno-me um raio
De luz celeste!

Tu és o collo
Onde me embalo,
E acho consolo,
Mimo e regalo:

A folha curva
Que se aljofara,
Não d’agoa turva,
Mas d’agoa clara!

Quando me passa
Essa existencia,
Que é toda graça,
Toda innocencia,

Além da raia
D’este horizonte—
Sem uma faia,
Sem uma fonte;

O passarinho
Não se consome
Mais no seu ninho
De frio e fome,

Se ella se ausenta,
A boa amiga,
Ah! que o sustenta
E que o abriga!

Sinto umas magoas
Que se confundem
Com as que as agoas
Do mar infundem!

E quem um dia
Passou os mares
É que avalia
Esses pezares!

Só quem lá anda
Sem achar onde
Sequer expanda
A dôr que esconde;

Longe do berço,

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