Mentir sem Prejudicar
Julgar os discursos dos homens através dos efeitos que produzem equivale frequentemente a apreciá-los mal. Tais efeitos, para além de nem sempre serem sensíveis e fáceis de conhecer, variam infinitamente, tal como as circunstâncias em que esses discursos são proferidos.
A intenção daquele que os profere, porém, é a única que permite apreciá-los e que determina o seu grau de malícia ou de bondade. Proferir afirmações falsas só é mentir quando existe intenção de enganar, e mesmo essa intenção, longe de se aliar sempre à de prejudicar, tem por vezes um objectivo oposto. Todavia, para tornar inocente uma mentira, não basta que a intenção de prejudicar não seja expressa, é necessário também ter a certeza de que o erro em que se induz aqueles a quem se fala não poderá prejudicá-los a eles nem a ninguém, seja de que maneira for. É raro e difícil ter-se essa certeza e, por isso, é difícil e raro que uma mentira seja perfeitamente inocente.
Passagens sobre Malícia
30 resultadosOs homens são animais muito estranhos: uma mistura do nervosismo de um cavalo, da teimosia de uma mula e da malícia de um camelo.
Respondiam-lhe que durante muitos anos tinham ficado sem padre, arranjando os negócios da alma diretamente com Deus, e haviam perdido a malícia do pecado mortal.
Nunca veja malícia no que pode ser explicado pela incompetência.
Piedade? Não!
Piedade? Não! Não a desejo.
Ela seria escárnio maior,
Cruel desdém feito gracejo
Com olhar sério para conter
A rude graça. Não! A dor
Eu chore em paz. Deixem doer!Piedade? Não! Escárnio venha,
Mais indiferença e mais desdém:
Confortos desses meu lar os tenha.
Mudar em pena o seu olhar
Já dor de mais fora também.
Fingir bondade, não pode ser.
Que os males pareçam como eles são.
Querer mascará-los é escarnecer,
Rara malícia sem coração.
A malícia de Deus foi criar o homem à sua semelhança, mas finito e limitado, para evitar competição.
Os homens são animais muito estranhos: a mistura do nervosismo de um cavalo, da teimosia de uma mula e da malícia de um camelo.
A malícia tem vista fraca e memória forte.
Arvore, Cujo Pomo, Belo E Brando
Arvore, cujo pomo, belo e brando,
natureza de leite e sangue pinta,
onde a pureza, de vergonha tinta,
está virgíneas faces imitando;nunca da ira e do vento, que arrancando
os troncos vão, o teu injúria sinta;
nem por malícia de ar te seja extinta
a cor, que está teu fruto debuxando;que, pois me emprestas doce e idóneo abrigo
a meu contentamento, e favoreces
com teu suave cheiro minha glória,se não te celebrar como mereces,
cantando te, sequer farei contigo
doce, nos casos tristes, a memória.
A verdade é inconvertível, a malícia pode atacá-la, a ignorância pode zombar dela, mas no fim; lá está ela.
Soneto De Intimidade
Nas tardes da fazenda há muito azul demais.
Eu saio às vezes, sigo pelo pasto agora
Mastigando um capim, o peito nu de fora
No pijama irreal de há três anos atrás.Desço o rio no vau dos pequenos canais
Para ir beber na fonte a água fria e sonora
E se encontro no mato o rubro de uma amora
Vou cuspindo-lhe o sangue em torno dos currais.Fico ali respirando o cheiro bom do estrume
Entre as vacas e os bois que me olham sem ciúme
E quando por acaso uma mijada ferveSeguida de um olhar não sem malícia e verve
Nós todos, animais sem comoção nenhuma
Mijamos em comum numa festa de espuma.
Os Vivos Ouvem Poucamente
Os vivos ouvem poucamente. As plantas,
como o elemento aquático domina,
são dadas à conversa. A menor brisa abala
a urna de concórdia estremecida
que, assim, sensível, se derrama
e é solidão solícita.
Os vivos não ouvem nada.
Mas, havendo acedido a essa malícia
de experiência cândida,
os mortos deixam que o ouvido siga
o fluvial diálogo das plantas
umas com outras e todas com a brisa.
Melhor ainda. Quando, nas noites cálidas,
as plantas se sentem mais sozinhas,
os mortos brincam à imitação das águas
inventando palavras de consonâncias líquidas.
E esse amoroso cuidado de palavras
a urna de concórdia vegetal espevita
até que, a horas altas,
a noite, os mortos e as plantas
caiam no sono duma luz solícita.
Sobre a Diferença dos Espíritos
Apesar de todas as qualidades do espírito se poderem encontrar num grande espírito, algumas há, no entanto, que lhe são próprias e específicas: as suas luzes não têm limites, actua sempre de igual modo e com a mesma actividade, distingue os objectos afastados como se estivessem presentes, compreende e imagina as coisas mais grandiosas, vê e conhece as mais pequenas; os seus pensamentos são elevados, extensos, justos e intelegíveis; nada escapa à sua perspicácia, que o leva sempre a descobrir a verdade, através das obscuridades que a escondem dos outros. Mas, todas estas grandes qualidades não impedem por vezes que o espírito pareça pequeno e fraco, quando o humor o domina.
Um belo espírito pensa sempre nobremente; produz com facilidade coisas claras, agradáveis e naturais; torna visíveis os seus aspectos mais favoráveis, e enfeita-os com os ornamentos que melhor lhes convêm; compreende o gosto dos outros e suprime dos seus pensamentos tudo o que é inútil ou lhe possa desagradar. Um espírito recto, fácil e insinuante sabe evitar e ultrapassar as dificuldades; adapta-se facilmente a tudo o que quer; sabe conhecer e acompanhar o espirito e o humor daqueles com quem priva e ao preocupar-se com os interesses dos amigos,
Feita a lei, inventada a malícia.
A ignorância tem a discrição por malícia.
Lágrimas de mulher, é tempero de malícia.
Normalmente, a maledicência é mais uma questão de vaidade que de malícia.
Aprovar tudo costuma ser ignorância; reprovar tudo, malícia.
A Vida Passa como se Temêssemos
Deixemos, Lídia, a ciência que não põe
Mais flores do que Flora pelos campos,
Nem dá de Apolo ao carro
Outro curso que Apolo.Contemplação estéril e longínqua
Das coisas próximas, deixemos que ela
Olhe até não ver nada
Com seus cansados olhos.Vê como Ceres é a mesma sempre
E como os louros campos intumesce
E os cala prás avenas
Dos agrados de Pã.Vê como com seu jeito sempre antigo
Aprendido no orige azul dos deuses,
As ninfas não sossegam
Na sua dança eterna.E como as heniadríades constantes
Murmuram pelos rumos das florestas
E atrasam o deus Pã.
Na atenção à sua flauta.Não de outro modo mais divino ou menos
Deve aprazer-nos conduzir a vida,
Quer sob o ouro de Apolo
Ou a prata de Diana.Quer troe Júpiter nos céus toldados.
Quer apedreje com as suas ondas
Netuno as planas praias
E os erguidos rochedos.Do mesmo modo a vida é sempre a mesma.
Nós não vemos as Parcas acabarem-nos.
A vida do homem consiste em uma milícia contra a malícia do homem.