O Amor Tudo Mata quando Morre
Eu morro dia a dia, sabendo-o, sentindo-o,
com a morte do amor em mim.
Esvaiu-se, ensandeceu, partiu,
espécie de sol sepultado por mãos ímpias,
numa cratera de lua, algures,
ou na tristeza de um retrato emudecido
pela ausência de vozes em redor.
Sem ele, a casa ficou deserta
de risos, acenos e afectos, de tudo,
as mãos ficaram ásperas, secas,
a pele do rosto gretada, fria,
e o sangue tornou-se lento e espesso,
incapaz de dar vida às pequenas folhas
orvalhadas da imaginação das noites.
A erva cresce em redor de mim,
os limões ficaram ressequidos sobre
a toalha bordada, num canto da mesa.
O amor tudo mata quando morre,
detendo no seu movimento elementar,
a máquina que ilumina o coração do dia.
Passagens sobre Morte
1650 resultadosPosso não concordar com o que você faz, mas lutarei até a morte pelo seu direito de continuar fazendo.
Que cada um olhe o mais fundo da sua própria consciência e escute aquelas palavras:
«Sai dos teus interesses que atrofiam o coração, supera a indiferença para com o outro que te torna insensível, vence as tuas razões de morte e abre-te à aceitação, à reconciliação.»
A minha fé impele-me a olhar para a Cruz.
Como eu queria que por um instante os homens e as mulheres de boa vontade olhassem para a Cruz!
Pode ler-se lá a resposta de Deus, á violência respondeu-se com a mansidão, à morte não se respondeu com o ódio.
Embora as pessoas sintam uma mágoa e sentimento de perda genuínos pela morte dos entes queridos, esta dor está relacionada com o apego ou uma falsa identificação da mente, e não com o amor. Para além disso, uma vida de isolamento e solidão não salva ninguém do apego e do sofrimento.
Não Existe Início Nem Fim da Civilização
É minha convicção que aquilo a que decidimos chamar civilização não começou em nenhum desses pontos do tempo que os nossos eruditos, com o seu saber e inteligência limitados, fixam como origens. Não vejo início nem fim em lugar nenhum. Vejo a vida e a morte, avançando lado a lado, como gémeos unidos pela cintura. Vejo que em todos os estados de evolução ou de involução, independentemente da paz ou da guerra, da ignorãncia ou da cultura, da idolatria ou da espiritualidade, há apenas e sempre a luta do indivíduo, o seu triunfo ou derrota, a sua emancipação ou servidão, a sua libertação ou extermínio. Essa luta, de natureza cósmica, desafia toda a análise, quer científica, quer metafísica, religiosa ou histórica.
De certo modo, Aureliano José foi um homem alto e moreno que durante meio século lhe foi anunciado pelo rei de copas, e que como todos os enviados pelo baralho chegou ao seu coração quando já estava marcado pelo signo da morte. Ela viu isso nas cartas.
A cremação é ainda forma de vaidade: querer destruir a morte.
O Sono como Condição de Saúde
Eu presto homenagem à saúde como a primeira musa, e ao sono como condição de saúde. O sono beneficia-nos principalmente pela saúde que propicia; e também ocasionalmente pelos sonhos, em cuja confusa trama uma lição divina por vezes se infiltra. A vida dá-se em breves ciclos ou períodos; depressa nos cansamos, mas rapidamente nos relançamos. Um homem encontra-se exaurido pelo trabalho, faminto, prostrado; ele mal é capaz de erguer a mão para salvar a sua vida; já nem pensa. Ele afunda-se no sono profundo e desperta com renovada juventude, cheio de esperança, coragem, pródigo em recursos e pronto para ousadas aventuras. «O sono é como a morte, e depois dele o mundo parece recomeçar de novo. Pensamentos claros surgem firmes e luminosos, como estátuas sob o sol. Refrescada por fontes supra-sensíveis, a alma escala a mais clara visão» [William Allingham].
Os Loucos
Há vários tipos de louco.
O hitleriano, que barafusta.
O solícito, que dirige o trânsito.
O maníaco fala-só.O idiota que se baba,
explicado pelo psiquiatra gago.
O legatário de outros,
o que nos governa.O depressivo que salva
o mundo. Aqueles que o destroem.E há sempre um
(o mais intratável) que não desiste
e escreve versos.Não gosto destes loucos.
(Torturados pela escuridão, pela morte?)
Gosto desta velha senhora
que ri, manso, pela rua, de felicidade.
De Amor
Considera o amor como um retoque num quadro antigo
que subitamente o vem iluminar:
vimo-nos muitas vezes antes de seres no meu olhar
aquela luz em um país perdido
que tu quiseste em vão esconder, negar.O quadro manteve o mesmo fulgor:
a reverberação no silêncio da perda,
o desamor.Quem avivou o brilho das tintas, quem corrigiu o baço
sinal da morte? Falámos de uma dor
num fundo esbatido. Falámos do grito mudo do teu corpo.
Falámos de amor.
Gosto de Amar
gosto de amar com os dedos,
encontrar o centímetro em que nasce o orgasmo
em ti, perceber a extensão da forma como te sobressaltas,
e encostar-te o meu ouvido à boca para ouvir a voz de
deus.gosto de amar com os olhos,
gastar a hipótese do sono e ver-te adormecer,
a noite escura e o silêncio de um abraço,
e se queres que te diga
só te escolhi por engano, queria o amor dos livros
e virei escritor, os dias inteiros à espera do teu corpo
para que as metáforas aconteçam.gosto de amar com as lágrimas,
praticar o abismo, a largura estreita dos teus lábios,
a sensação de mar excessivo da tua língua,
até a maneira como me percorres o sexo
com a extremidade da tua respiração parada,
e sobretudo submeter-me ao castigo da emoção
de te amar ainda depois do final do prazer,
a pequena morte acabada
e a vida toda outra vez a começar.gosto de amar com o que me resta,
e tudo o que sei é que me resta amar-te.
A morte parece menos terrível quando se está cansado.
A morte que desordena muitas coisas, coordena muitas outras.
Tenho medo da morte e da dor, mas convivo bem com isso. O medo me fascina.
Mensagem – Mar Português
MAR PORTUGUÊS
Possessio Maris
I. O Infante
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!II. Horizonte
Ó mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
’Splendia sobre as naus da iniciação.Linha severa da longínqua costa —
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves,
Morte desejada, vida dobrada.
A morte rouba toda a seriedade à vida.
O que extingue a vida e os seus sinais, não é a morte, mas o esquecimento. A diferença entre morte e vida é essa.
Chega sempre um momento na história em que quem se atreve a dizer que dois e dois são quatro é condenado à morte.