Poemas sobre Pecado

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Poemas de pecado escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Verão

Estás no verão,
num fio de repousada água, nos espelhos perdidos sobre
a duna.
Estás em mim,
nas obscuras algas do meu nome e à beira do nome
pensas:
teria sido fogo, teria sido ouro e todavia é pó,
sepultada rosa do desejo, um homem entre as mágoas.
És o esplendor do dia,
os metais incandescentes de cada dia.
Deitas-te no azul onde te contemplo e deitada reconheces
o ardor das maçãs,
as claras noções do pecado.
Ouve a canção dos jovens amantes nas altas colinas dos
meus anos.
Quando me deixas, o sol encerra as suas pérolas, os
rituais que previ.
Uma colmeia explode no sonho, as palmeiras estão em
ti e inclinam-se.
Bebo, na clausura das tuas fontes, uma sede antiquíssima.
Doce e cruel é setembro.
Dolorosamente cego, fechado sobre a tua boca.

A Piedosa Beppa

Enquanto o meu corpo for belo
É pecado ser piedosa,
É sabido que Deus gosta das mulheres,
E das bonitas sobretudo.
Ele perdoará, tenho a certeza,
Facilmente ao pobre fradezinho
Que tanto procura a minha companhia
Como muitos outros fradezinhos.

Não é um velhorro padre da Igreja,             .
Não, é jovem, muitas vezes vermelho,
Muitas vezes, apesar da mais cinzenta tristeza,
Pleno de desejo e de ciúme.
Não gosto dos velhos.
Ele não gosta das velhas:
Que admiráveis e sábios
São os caminhos do Senhor!

A Igreja sabe viver,
Sonda os corações e os rostos,
Insiste em perdoar-me…
Quem não me perdoará, então?
Três palavras na ponta da língua,
Uma reverência e ide embora:
O pecado deste minuto
Apagará o antigo.

Bendito seja Deus na Terra,
Gosta das raparigas bonitas
E perdoa de bom grado
Os tormentos do amor.
Enquanto o meu corpo for belo
É pena ser piedosa;
Case o diabo comigo
Quando eu já não tiver dentes.

Passo Triste no Mundo

Passo triste no mundo, alheio ao mundo.
Passo no mundo alheio, sem o ver,
E místico, ideal e vagabundo,
Sinto erguer-se minh’Alma do profundo
Abismo do seu Ser.

Vivo de Mim, em Mim, e para Mim,
E para Deus em Mim ressuscitado,
Sou Saudade do Longe donde vim,
E sou Ânsia do Longe, em que por fim
Serei transfigurado.

Vivo de Deus, em Deus, e para Deus,
E minh’alma, sonâmbula, esquecida,
Nele fitando os tristes olhos seus,
Passa triste e sozinha, olhando os céus,
No caminho da Vida.

Fui Outro, e, Outro sendo, Outro serei;
Outro vivendo a mística beleza,
Por esta humana forma que encarnei,
Por lágrimas de sangue que chorei
Na terra da tristeza.

Espírito na Dor purificado,
Ser que passa no mundo, sem o ver,
Em esta pobre terra de pecado,
Amor divino em Deus extasiado,
O meu Ser é Não-Ser em Outro-Ser.

Queixa das almas jovens censuradas

Dão-nos um lírio e um canivete
e uma alma para ir à escola
mais um letreiro que promete
raízes, hastes e corola

Dão-nos um mapa imaginário
que tem a forma de uma cidade
mais um relógio e um calendário
onde não vem a nossa idade

Dão-nos a honra de manequim
para dar corda à nossa ausência.
Dão-nos um prémio de ser assim
sem pecado e sem inocência

Dão-nos um barco e um chapéu
para tirarmos o retrato
Dão-nos bilhetes para o céu
levado à cena num teatro

Penteiam-nos os crâneos ermos
com as cabeleiras das avós
para jamais nos parecermos
connosco quando estamos sós

Dão-nos um bolo que é a história
da nossa historia sem enredo
e não nos soa na memória
outra palavra que o medo

Temos fantasmas tão educados
que adormecemos no seu ombro
somos vazios despovoados
de personagens de assombro

Dão-nos a capa do evangelho
e um pacote de tabaco
dão-nos um pente e um espelho
pra pentearmos um macaco

Dão-nos um cravo preso à cabeça
e uma cabeça presa à cintura
para que o corpo não pareça
a forma da alma que o procura

Dão-nos um esquife feito de ferro
com embutidos de diamante
para organizar já o enterro
do nosso corpo mais adiante

Dão-nos um nome e um jornal
um avião e um violino
mas não nos dão o animal
que espeta os cornos no destino

Dão-nos marujos de papelão
com carimbo no passaporte
por isso a nossa dimensão
não é a vida,

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Tudo isto é fado

Perguntaste-me outro dia
Se eu sabia o que era o fado
Eu disse que não sabia
Tu ficaste admirado
Sem saber o que dizia
Eu menti naquela hora
E disse que não sabia
Mas vou-te dizer agora

Almas vencidas
Noites perdidas
Sombras bizarras
Na mouraria
Canta um rufia
Choram guitarras
Amor ciúme
Cinzas e lume
Dor e pecado
Tudo isto existe
Tudo isto é triste
Tudo isto é fado

Se queres ser meu senhor
E teres-me sempre a teu lado
Não me fales só de amor
Fala-me também do fado
É canção que é meu castigo
Só basceu p’ra me perder
O fado é tudo o que eu digo
Mais o que eu não sei dizer

Moral Estelar

Presdestinada à tua órbita,
Que te importa, estrela, a noite?
Rola, bem-aventurada, através do tempo!
Que a sua miséria te permaneça estranha.
A tua luz está destinada ao mais distante dos mundos:
A piedade deve ser-te um pecado.
Admite apenas uma lei: sê pura!

A Secreta Viagem

No barco sem ninguém, anónimo e vazio,
ficámos nós os dois, parados, de mão dada…
Como podem só dois governar um navio?
Melhor é desistir e não fazermos nada!

Sem um gesto sequer, de súbito esculpidos,
tornamo-nos reais, e de madeira, à proa…
Que figuras de lenda! Olhos vagos, perdidos…
Por entre nossas mãos, o verde mar se escoa…

Aparentes senhores de um barco abandonado,
nós olhamos, sem ver, a longínqua miragem…
Aonde iremos ter? — Com frutos e pecado,
se justifica, enflora, a secreta viagem!

Agora sei que és tu quem me fora indicada.
O resto passa, passa… alheio aos meus sentidos.
— Desfeitos num rochedo ou salvos na enseada,
a eternidade é nossa, em madeira esculpidos!

De Que São Feitos os Dias?

De que são feitos os dias?
– De pequenos desejos,
vagarosas saudades,
silenciosas lembranças.

Entre mágoas sombrias,
momentâneos lampejos:
vagas felicidades,
inactuais esperanças.

De loucuras, de crimes,
de pecados, de glórias
– do medo que encadeia
todas essas mudanças.

Dentro deles vivemos,
dentro deles choramos,
em duros desenlaces
e em sinistras alianças…

O que Poderá Ver quem já da Vista Cegou?

Ante Sintra, a mui prezada,
e serra de Ribatejo
que Arrábeda é chamada,
perto donde o rio Tejo
se mete n’água salgada,
houve um pastor e pastora,
que com tanto amor se amaram
como males lhe causaram
este bem, que nunca fora,
pois foi o que não cuidarom.

A ela chamavam Maria
e ao pastor Crisfal,
ao qual, de dia em dia,
o bem se tornou em mal,
que ele tão mal merecia.
Sendo de pouca idade,
não se ver tanto sentiam
que o dia que não se viam,
se via na saudade
o que ambos se queriam.

Algumas horas falavam,
andando o gado pascendo;
e então se apascentavam
os olhos, que, em se vendo,
mais famintos lhe ficavam.
E com quanto era Maria
pequena e, tinha cuidado
de guardar melhor o gado
o que lhe Crisfal dizia;
mas, em fim, foi mal guardado;

Que, depois de assim viver
nesta vida e neste amor,
depois de alcançado ter
maior bem pera mor dor,
em fim se houve de saber
por Joana,

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Anda vem…

Anda vem…, porque te negas,
Carne morena, toda perfume?
Porque te calas,
Porque esmoreces,
Boca vermelha – rosa de lume?

Se a luz do dia
Te cobre de pejo,
Esperemos a noite presos num beijo.

Dá-me o infinito gozo
De contigo adormecer
Devagarinho, sentindo
O aroma e o calor
Da tua carne, meu amor!

E ouve, mancebo alado:
Entrega-te, sê contente!
– Nem todo o prazer
Tem vileza ou tem pecado!

Anda, vem!… Dá-me o teu corpo
Em troca dos meus desejos…
Tenho saudades da vida!
Tenho sede dos teus beijos!

Evolução

Arde o corpo do sol, brotam feixes de luz:
O que é a luz?
Sol que morreu.

Dardeja a luz, dardeja e pulveriza a fraga:
Vai nesse pó, que há-de ser terra,
A luz extinta.

Gerou a terra a seara verde:
Hastes e folhas da seara verde
Comeram terra.

A seara é grada, o trigo é loiro:
Deu trigo loiro,
Morrendo ela.

O trigo é pão, é carne e é sangue:
Sangue vermelho, carne vermelha,
Trigo defunto.

Em carne e em sangue, eis o desejo:
Vive o desejo,
De carne morta.

Arde o desejo, eis o pecado:
Que são pecados?
Desejos mortos.

Queima o pecado o pecador:
Nasceu a dor; findou na dor
Pecado e morte.

A alma branca, iluminada,
Transfigurada pela dor,
Essa não vai à sepultura
Porque é já Deus na criatura,
Porque é o Espírito, é o Amor.

Na vida vã da terra sepulcral
Só o amor é infinito e só ele é imortal.

Morreu a luz,

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Saudades Trágico-Marítimas

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Na praia, de bruços,
fico sonhando, fico-me escutando
o que em mim sonha e lembra e chora alguém;
e oiço nesta alma minha
um longínquo rumor de ladainha,
e soluços,
de além…

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.

São meus Avós rezando,
que andaram navegando e que se foram,
olhando todos os céus;
são eles que em mim choram
seu fundo e longo adeus,
e rezam na ânsia crua dos naufrágios;
choram de longe em mim, e eu oiço-os bem,
choram ao longe em mim sinas, presságios,
de além, de além…

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.

Naufraguei cem vezes já…
Uma, foi na nau S. Bento,
e vi morrer, no trágico tormento,
Dona Leonor de Sá:
vi-a nua, na praia áspera e feia,
com os olhos implorando
– olhos de esposa e mãe –
e vi-a, seus cabelos desatando,
cavar a sua cova e enterrar-se na areia.
– E sozinho me fui pela praia além…

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Memória

Tudo que sou, no imaginado
silêncio hostil que me rodeia,
é o epitáfio de um pecado
que foi gravado sobre a areia.

O mar levou toda a lembrança.
Agora sei que me detesto:
da minha vida de criança
guardo o prelúdio dum incesto.

O resto foi o que eu não quis:
perseguição, procura, enlace,
desse retrato feito a giz
pra que não mais eu me encontrasse.

Tu foste a noiva que não veio,
irmã somente prometida!
— O resto foi a quebra desse enleio.
O resto foi amor, na minha vida.

A Alvorada do Amor

Um horror grande e mudo, um silêncio profundo
No dia do Pecado amortalhava o mundo.
E Adão, vendo fechar-se a porta do Éden, vendo
Que Eva olhava o deserto e hesitava tremendo,
Disse:

“Chega-te a mim! entra no meu amor,
E à minha carne entrega a tua carne em flor!
Preme contra o meu peito o teu seio agitado,
E aprende a amar o Amor, renovando o pecado!
Abençôo o teu crime, acolho o teu desgosto,
Bebo-te, de uma em uma, as lágrimas do rosto!

Vê! tudo nos repele! a toda a criação
Sacode o mesmo horror e a mesma indignação…
A cólera de Deus torce as árvores, cresta
Como um tufão de fogo o seio da floresta,
Abre a terra em vulcões, encrespa a água dos rios;
As estrelas estão cheias de calefrios;
Ruge soturno o mar; turva-se hediondo o céu…

Vamos! que importa Deus? Desata, como um véu,
Sobre a tua nudez a cabeleira! Vamos!
Arda em chamas o chão; rasguem-te a pele os ramos;
Morda-te o corpo o sol; injuriem-te os ninhos;
Surjam feras a uivar de todos os caminhos;

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Quem Diz que Amor é um Crime

Quem diz que amor é um crime
Calunia a natureza,
Faz da causa organizante
Criminosa a singeleza.

Que vejo, céus! Que não seja
De uma atracção resultado?
Atracção e amor é o mesmo;
Logo amor não é pecado.

Se respiro, a atmosfera,
Com um fluido combinado,
É quem me sustenta a vida
Dentro do peito agitado.

Se vejo mares, se fontes,
Rio, cristalino lago,
Dois gases se unem, formando
Aguas com que a sede apago.

Uma lei de afinidade
Se acha nos corpos terrenos;
Ácidos, metais, alcalis,
Tudo se une mais ou menos.

De que sou feita? – De terra;
Nela me hei de converter:
Se amor arder em meu peito
É da essencia do meu ser.

Sem que te ofenda razão,
Quero defender o amor;
Se contigo não concorda
Não é virtude, é furor.

Elegia

O teu corpo,
uma vez o meu altar e pecado,
O teu corpo
agora amarelo e viscoso,
hostil como a freira enclausurada,
é uma forma obscena ao sol.

Tu estás morta –
tu, o meu pão e vinho santo!

Tu foste
a minha dor,
o sol
e a chuva;
Tu foste
saudade,
tudo
e desejo,
quando nós
sofrendo,
quando nós
encontramos
uma nova luz
uma nova fé!

Tu estás morta –
tu, o meu pão e vinho santo.

Carta de Amor

Para te dizer tão-só que te queria
Como se o tempo fosse um sentimento
bastava o teu sorriso de um outro dia
nesse instante em que fomos um momento.
Dizer amor como se fosse proibido
entre os meus braços enlaçar-te mais
como um livro devorado e nunca lido.
Será pecado, amor, amar-te demais?
Esperar como se fosse (des) esperar-te,
essa certeza de te ter antes de ter.
Ensaiar sozinho a nossa arte
de fazer amor antes de ser.
Adivinhar nos olhos que não vejo
a sede dessa boca que não canta
e deitar-me ao teu lado como o Tejo
aos pés dessa Lisboa que ele encanta.
Sentir falta de ti por tu não estares
talvez por não saber se tu existes
(percorrendo em silêncio esses altares
em sacrifícios pagãos de olhos tristes).
Ausência, sim. Amor visto por dentro,
certezas ao contrário, por estar só.
Pesadelo no meu sonho noite adentro
quando, ao meu lado, dorme o que não sou.
E, afinal, depois o que ficou
das noites perdidas à procura
de um resto de virtude que passou
por nós em co(r)pos de loucura?

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Responso

I
Num castelo deserto e solitário,
Toda de preto, às horas silenciosas,
Envolve-se nas pregas dum sudário
E chora como as grandes criminosas.

Pudesse eu ser o lenço de Bruxelas
Em que ela esconde as lágrimas singelas.

II
É loura como as doces escocesas,
Duma beleza ideal, quase indecisa;
Circunda-se de luto e de tristezas
E excede a melancólica Artemisa.

Fosse eu os seus vestidos afogados
E havia de escutar-lhe os seu pecados.

III
Alta noite, os planetas argentados
Deslizam um olhar macio e vago
Nos seus olhos de pranto marejados
E nas águas mansíssimas do lago.

Pudesse eu ser a Lua, a Lua terna,
E faria que a noite fosse eterna.

IV
E os abutres e os corvos fazem giros
De roda das ameias e dos pegos,
E nas salas ressoam uns suspiros
Dolentes como as súplicas dos cegos.

Fosse eu aquelas aves de pilhagem
E cercara-lhe a fronte, em homenagem.

V
E ela vaga nas praias rumorosas,
Triste como as rainhas destronadas,

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Livro de Horas

Aqui, diante de mim,
Eu, pecador, me confesso
De ser assim como sou.
Me confesso o bom e o mau
Que vão ao leme da nau
Nesta deriva em que vou.

Me confesso
Possesso
De virtudes teologais,
Que são três,
E dos pecados mortais,
Que são sete,
Quando a terra não repete
Que são mais.

Me confesso
O dono das minhas horas.
O das facadas cegas e raivosas,
E o das ternuras lúcidas e mansas.
E de ser de qualquer modo
Andanças
Do mesmo todo.

Me confesso de ser charco
E luar de charco, à mistura.
De ser a corda do arco
Que atira setas acima
E abaixo da minha altura.

Me confesso de ser tudo
Que possa nascer em mim.
De ter raízes no chão
Desta minha condição.
Me confesso de Abel e de Caim.

Me confesso de ser Homem.
De ser um anjo caído
Do tal Céu que Deus governa;
De ser um monstro saído
Do buraco mais fundo da caverna.

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Olhos Castanhos

Teus olhos castanhos
de encantos tamanhos
são pecados meus,
são estrelas fulgentes,
brilhantes, luzentes,
caídas dos céus,
Teus olhos risonhos
são mundos, são sonhos,
são a minha cxruz,
teus olhos castanhos
de encantos tamanhos
são raios de luz.
Olhos azuis são ciúme
e nada valem para mim,
Olhos negros são queixume
de uma tristeza sem fim,
olhos verdes são traição
são crueis como punhais,
olhos bons com coração
os teus, castanhos leais.