Sonetos sobre Mil

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Sonetos de mil escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Eu Vivia De Lágrimas Isento

Eu vivia de lágrimas isento,
num engano tĂŁo doce e deleitoso
que em que outro amante fosse mais ditoso,
nĂŁo valiam mil glĂłrias um tormento.

Vendo-me possuir tal pensamento,
de nenhĂĽa riqueza era envejoso;
vivia bem, de nada receoso,
com doce amor e doce sentimento.

Cobiçosa, a Fortuna me tirou
deste meu tĂŁo contente e alegre estado,
e passou-me este bem, que nunca fora:

em troco do qual bem sĂł me deixou
lembranças, que me matam cada hora,
trazendo-me Ă  memĂłria o bem passado.

Mancebos! De Mil Louros Triunfantes

Mancebos! De mil louros triunfantes
Adornai o Moisés da mocidade,
O Anjo que nos guia da verdade
Pelos doces caminhos sempre ovantes.

Coroai de grinaldas verdejantes
Quem rompeu para a Pátria nova idade,
Guiando pelas leis sĂŁs da amizade
Os moços do progresso sempre amantes.

VĂŞ, Brasil, este filho que o teu nome
Sobre o mapa dos povos ilustrados
Descreve qual o forte de VendĂ´me.

Conhece que os Andradas e os Machados,
Que inda vivem nas asas do renome
Não morrem nestes céus abençoados;

Tristeza De Momo

Pela primeira vez, Ă­mpias risadas
Susta em pranto o deus da zombaria;
Chora; e vingam-se dele, nesse dia,
Os silvanos e as ninfas ultrajadas;

Trovejam bocas mil escancaradas,
Rindo; arrombam-se os diques da alegria;
E estoira descomposta vozeria
Por toda a selva, e apupos e pedradas…

Fauno, indigita; a Náiade o caçoa;
Sátiros vis, da mais indigna laia,
Zombam. Não há quem dele se condoa!

E Eco propaga a formidável vaia,
Que além por fundos boqueirões reboa
E, como um largo mar, rola e se espraia…

VI

P. SiĂŁo que dorme ao luar. Vozes diletas
Modulam salmos de visões contritas…
E a sombra sacrossanta dos Profetas
Melancoliza o canto dos levitas.

As torres brancas, terminando em setas,
Onde velam, nas noites infinitas,
Mil guerreiros sombrios como ascetas,
Erguem ao Céu as cúpulas benditas.

As virgens de Israel as negras comas
Aromatizam com os ungĂĽentos brancos
dos nigromantes de mortais aromas…

Jerusalém, em meio às Doze Portas,
Dorme: e o luar que lhe vem beijar os flancos
Evoca ruĂ­nas de cidades mortas.

Soneto XXXXVII

Como depois de tanta idade de ano
Agora o Céu vos dá, Jacinto, à terra?
Esta tardança algua culpa encerra
Ou mistério, que passa o ser humano.

Foi descuido do Céu, ou foi engano
Da terra, que sem Céu mil vezes erra?
Ou pouco merecer, que este desterra
De tanta glória o prémio soberano?

Nem foi erro da terra, nem foi vosso,
Nem do Céu foi, mas foi mistério seu
Que Ă  CatĂłlica Igreja se aparelha.

Filhos na mocidade o Céu lhe deu:
Guardou-vos, por vos dar filho mais moço
Para consolação desta Mãe velha.

Soneto XXIIII

De ua esperança vã suspenso mouro,
Mas quando a fortes cabos mais me amarro,
Então vou através, então desgarro,
Como barca no Tejo, ou rio Douro.

Ah’ quem fora um pastor que seu tesouro
Tem no leve cortiço e tosco tarro,
E de ledo e contente os pés de barro
Julga consigo por cabeça de ouro.

Mas aquele que tem de ouro a cabeça
E pés que são de barro em cima sente,
Como não sintirá tanta desgraça.

Viva ufano, porém viva contente:
Quebra o barro, por mais que se endureça,
O imortal ouro mil idades passa.

Aquele, a Quem Mil Bens Outorga o Fado

Aquele, a quem mil bens outorga o Fado,
Desejo com razĂŁo da vida amigo
Nos anos igualar Nestor, o antigo,
De trezentos invernos carregado:

Porém eu sempre triste, eu desgraçado,
Que sĂł nesta caverna encontro abrigo,
Porque nĂŁo busco as sombras do jazigo,
Refúgio perdurável, e sagrado?

Ah! bebe o sangue meu, tosca morada;
Alma, quebra as prisões da humanidade,
Despe o vil manto, que pertence ao nada!

Mas eu tremo!…Que escuto?…É a Verdade,
É ela, é ela que do céu me brada:
Oh terrĂ­vel pregĂŁo da eternidade!

Chuva E Sol

Agrada Ă  vista e Ă  fantasia agrada
Ver-te, através do prisma de diamantes
Da chuva, assim ferida e atravessada
Do sol pelos venábulos radiantes…

Vais e molhas-te, embora os pés levantes:
– Par de pombos, que a ponta delicada
Dos bicos metem nágua e, doidejantes,
Bebem nos regos cheios da calçada…

Vais, e, apesar do guarda-chuva aberto,
Borrifando-te colmam-te as goteiras
De pérolas o manto mal coberto;

E estrelas mil cravejam-te, fagueiras,
Estrelas falsas, mas que assim de perto,
Rutilam tanto, como as verdadeiras…

Soneto X

Quais no soberbo mar Ă  nao, que cansa
Lidando c’os assaltos da onda e vento,
Os Ebálios irmãos do Etéreo assento
Lhe confirmam do porto a esperança,

Tal vossa vista ao tempo, que se alcança
Desta, que nĂŁo tem mor contentamento,
No mar de meu cuidado e meu tormento
Mil esperanças cria de bonança.

Comparação, conforme a causa, ufana,
Pois quando um me aparece, outro se esconde,
Como no Céu faz ua, e outra estrela.

Iguais também no Amor, que em vós responde
Também no desamor da Irmã Troiana,
Que ambos vos conjurais em Ăłdio dela.

Cinco Sentidos

Cinco sentidos sĂŁo os cinco dedos
Com que o homem tacteia a escuridĂŁo,
Rodeado de sombras e segredos
De que busca, e não acha, a solução.

Mas decerto haverá mundos mais ledos
Onde outros seres, de maior visĂŁo,
Rompendo brumas, dissipando medos,
A treva finalmente vencerĂŁo.

E sendo sete as cores, e outros tantos
Os sons da escala, mas com mil matizes
Que prolongam seu eco e seus encantos,

Talvez nos seja um dia transmitido,
Por esses mundos fortes e felizes,
Um novo sexto e sétimo sentido!

Por esta SolidĂŁo, que nĂŁo Consente

Por esta solidĂŁo, que nĂŁo consente
Nem do sol, nem da lua a claridade,
Ralado o peito pela saudade
Dou mil gemidos a MarĂ­lia ausente:

De seus crimes a mancha inda recente
Lava Amor, e triunfa da verdade;
A beleza, apesar da falsidade,
Me ocupa o coração, me ocupa a mente:

Lembram-me aqueles olhos tentadores,
Aquelas mĂŁos, aquele riso, aquela
Boca suave, que respira amores…

Ah! Trazei-me, ilusões, a ingrata, a bela!
Pintai-me vĂłs, oh sonhos, entre as flores
Suspirando outra vez nos braços dela!

Já o Inverno, expremendo as cãs nevosas

Já o Inverno, expremendo as cãs nevosas,
Geme, de horrendas nuvens carregado;
Luz o aéreo fuzil, e o mar inchado
Investe ao pĂłlo em serras escumosas;

Ă“ benignas manhĂŁs!, tardes saudosas,
Em que folga o pastor, medrando o gado,
Em que brincam no ervoso e fértil prado
Ninfas e Amores, Zéfiros e Rosas!

Voltai, retrocedei, formosos dias:
Ou antes vem, vem tu, doce beleza
Que noutros campos mil prazeres crias;

E ao ver-te sentirá minha alma acesa
Os perfumes, o encanto, as alegrias,
Da estação que remoça a natureza.

Soneto XXXXII

Dai-me razĂŁo, Baptista, que conclua
Porque sois voz que no deserto brada,
Se Deus tem já sua palavra dada
De a seu filho chamar palavra sua.

E nĂŁo Ă© bem que se vos atribua
Nome que a Deus para seu filho agrada.
Quanto ua confissĂŁo desenganada
Obrou, temo esta voz tanto destrua.

Ah! quanto Ă© seu ofĂ­cio Ă  voz conforme,
Desperta a voz, mas a palavra fala,
Mil vezes com quem dorme usamos isto.

Vem Deus falar c’o Mundo, e porque dorme
Primeiro a voz lhe manda que o abala,
O Baptista desperta, e fala Cristo.

Um Dia Guttemberg

Um dia Guttemberg c’o a alma aos cĂ©us suspensa,
Pegou do escopro ingente e pĂ´s-se a trabalhar!
E fez do velho mundo um rútilo alcançar
Ao mágico clangor de sua idéia imensa!

Rolou por todo o globo a luz da sacra imprensa!
Ruiu o despotismo no pĂł, a esbravejar…
Uniram-se n’um lago, o cĂ©u, a terra, o mar…
Rasgou-se o manto atroz da horrĂ­vel treva densa!…

Ergueram-se mil povos ao som das melopéias,
Das grandes cavatinas olĂ­mpicas da arte!
Raiou o novo sol das fĂşlgidas idĂ©ias!…

Porém, quem lance luz maior por toda a parte
És tu, sublime atriz, ó misto de epopéias
Que sabes no tablado subir, endeusar-te!…

MarĂ­lia De Dirceu

Soneto 1

É gentil, é prendada a minha Altéia;
As graças, a modéstia de seu rosto
Inspiram no meu peito maior gosto
Que ver o prĂłprio trigo quando ondeia.

Mas, vendo o lindo gesto de Dircéia
A nova sujeição me vejo exposto;
Ah! que é mais engraçado, mais composto
Que a pura esfera, de mil astros cheia!

Prender as duas com grilhões estritos
É uma ação, ó deuses, inconstante,
Indigna de sinceros, nobres peitos.

Cupido, se tens dĂł de um triste amante,
Ou forma de Lorino dois sujeitos,
Ou forma desses dois um sĂł semblante.

Versos

Versos! Versos! Sei lá o que sĂŁo versos…
Pedaços de sorriso, branca espuma,
Gargalhadas de luz, cantos dispersos,
Ou pĂ©talas que caem uma a uma…

Versos!… Sei lá! Um verso Ă© o teu olhar,
Um verso Ă© o teu sorriso e os de Dante
Eram o teu amor a soluçar
Aos pés da sua estremecida amante!

Meus versos!… Sei eu lá tambĂ©m que sĂŁo…
Sei lá! Sei lá!… Meu pobre coração
Partido em mil pedaços sĂŁo talvez…

Versos! Versos! Sei lá o que sĂŁo versos…
Meus soluços de dor que andam dispersos
Por este grande amor em que nĂŁo crĂŞs…

Vita Nuova

Se ao mesmo gozo antigo me convidas,
Com esses mesmos olhos abrasados,
Mata a recordação das horas idas,
Das horas que vivemos apartados!

Não me fales das lágrimas perdidas,
NĂŁo me fales dos beijos dissipados!
Há numa vida humana cem mil vidas,
Cabem num coração cem mil pecados!

Amo-te! A febre, que supunhas morta,
Revive. Esquece o meu passado, louca!
Que importa a vida que passou? que importa,

Se inda te amo, depois de amores tantos,
E inda tenho, nos olhos e na boca,
Novas fontes de beijos e de prantos?!

O Tonel do Rancor

O Rancor Ă© o tonel das Danaidas alvĂ­ssimas;
A Vingança, febril, grandes olhos absortos,
procura em vĂŁo encher-lhes as trevas profundĂ­ssimas,
Constante, a despejar pranto e sangue de mortos.

O Diabo faz-lhe abrir uns furos misteriosos
Por onde se estravasa o lĂ­quido em tropel;
Mil anos de labor, de esforços fatigosos,
Tudo seria vĂŁo para encher o tonel.

O Rancor é qual ébrido em sórdida taverna,
Que quanto mais bebeu inda mais sede tem,
Vendo-a multiplicar como a hidra de Lerna.

– Mas se o Ă©brio feliz sabe com quem se avĂ©m,
O Rancor, por seu mal, nĂŁo logra conseguir,
Qual torvo beberrĂŁo, acabar por dormir.

Tradução de Delfim Guimarães

Soneto XXV

Do bravo mar onde Ă s voltas ando
Ora temendo as ondas, ora o vento,
Na esperança maior de salvamento,
A minha barca vai Ă  costa dando.

Pus os olhos na costa, imaginando
Achar remanso de pirigo isento,
Vendo, porém, frustrado o pensamento,
Louvo o mar já demais seguro e brando.

Ai fementido amor, amor tirano,
Que onde minha esperança tinha posta
Me trouxeste a fazer naufrágio amargo.

Porém ainda comigo foste humano,
Que mais quero perder-me dando Ă  costa,
Que andar com mil temores em mar largo.

Soneto VI

Qual naufragante mĂ­sero que cai
Da rota barca no soberbo pego,
E, lidando c’os braços sem sossego,
A cada onda receia que desmaie,

Tal, sem ter já lugar onde se espraie
Neste mar de meu mal, cansado e cego
Ando, aqui desfaleço, ali me anego,
E a cada encontro seu [a] alma me sai.

Em meio de mil barcas clamo, e brado:
“Me lancem por piedade um cabo forte!”,
Mas a ninguém magoa meu cuidado.

Ah, nĂŁo queirais que vida tal se corte
Que se vida me dais, ganhais dobrado,
Livrando muitas vidas de ua morte.