Sonetos sobre Poder

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Sonetos de poder escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Luiz Gama

A Raul Pompéia

Tantos triunfos te contando os dias,
Iam-te os dias descontando e os anos,
Quando bramavas, quando combatias
Contra os bĂĄrbaros, contra os desumanos;

Quando a alma brava e procelosa abrias
InvergĂĄvel ao pulso dos tiranos,
E Ă­gnea, como os desertos africanos
Dilacerados pelas ventanias…

Contra o inimigo atroz rompeste em guerra,
GrilhÔes a rebentar por toda a parte,
Por toda a parte a escancarar masmorras.

Morreste!… Embalde, EscravidĂŁo! Por terra
Rolou… Morreu por nĂŁo poder matar-te!
Também não tarda muito que tu morras!

Robespierre

Alma inquebrĂĄvel – bravo sonhador
De um fim brilhante, de um poder ingente,
De seu cérebro audaz, a luz ardente
É que gerava a treva do Terror!

Embuçado num lívido fulgor
Su’alma colossal, cruel, potente,
Rompe as idades, lĂșgubre, tremente,
Cheia de glórias, maldiçÔes e dor!

HĂĄ muito que, soberba, ess’alma ardida
Afogou-se cruenta e destemida
– Num dilĂșvio de luz: Noventa e trĂȘs…

HĂĄ muito jĂĄ que emudeceu na histĂłria
Mas ainda hoje a sua atroz memĂłria
É o pesadelo mais cruel dos reis!…

O Fim Das Coisas

Pode o homem bruto, adstricto Ă  ciĂȘncia grave,
Arrancar, num triunfo surpreendente,
Das profundezas do Subconsciente
O milagre estupendo da aeronave!

Rasgue os broncos basaltos negros, cave,
SĂŽfrego, o solo sĂĄxeo; e, na Ăąnsia ardente
De perscrutar o Ă­ntimo do orbe, invente
A limpada aflogĂ­stica de Davy!

Em vĂŁo! Contra o poder criador do Sonho
O Fim das Coisas mostra-se medonho
Como o desaguadouro atro de um rio …

E quando, ao cabo do Ășltimo milĂȘnio,
A humanidade vai pesar seu gĂȘnio
Encontra o mundo, que ela encheu, vazio!

Amor Fero e Cruel, Fortuna Escura

GrĂŁo tempo hĂĄ jĂĄ que soube da Ventura
A vida que me tinha destinada,
Que a longa experiĂȘncia da passada
Me dava claro indĂ­cio da futura.

Amor fero e cruel, Fortuna escura,
Bem tendes vossa força exprimentada;
Assolai, destruĂ­, nĂŁo fique nada;
Vingai-vos desta vida, que inda dura.

Soube Amor da Ventura que a nĂŁo tinha,
E por que mais sentisse a falta dela,
De imagens impossĂ­veis me mantinha.

Mas vĂłs, Senhora, pois que minha estrela
NĂŁo foi melhor, vivei nesta alma minha,
Que nĂŁo tem a Fortuna poder nela.

Vós, Crédulos Mortais, Alucinados

Vós, crédulos mortais, alucinados
de sonhos, de quimeras, de aparĂȘncias
colheis por uso erradas consequĂȘncias
dos acontecimentos desastrados.

Se à perdição correis precipitados
por cegas, por fogosas, impaciĂȘncias,
indo a cair, gritais que sĂŁo violĂȘncias
de inexoråveis céus, de negros fados.

Se um celeste poder tirano e duro
Ă s vezes extorquisse as liberdades,
que prestava, Ăł RazĂŁo, teu lume puro?

Não forçam coraçÔes as divindades,
fado amigo nĂŁo hĂĄ nem fado escuro:
fados são as paixÔes, são as vontades.

Se Comparo Poder ou Ouro ou Fama

Se comparo poder ou ouro ou fama,
Venturas que em si tĂȘm occulto o damno,
Com aquele outro affecto soberano,
Que amor se diz e Ă© luz de pura chama,

Vejo que sĂŁo bem como arteira dama,
Que sob honesto riso esconde o engano,
E o que as segue, como homem leviano
Que por um vĂŁo prazer deixa quem ama.

Nasce do orgulho aquele esteril goso
E a glĂłria d’ele Ă© cousa fraudulenta,
Como quem na vaidade tem a palma:

Tem na paixĂŁo seu brilho mais formoso
E das paixĂ”es tambem some-o a tormenta…
Mas a glĂłria do amor… essa vem d’alma!

Soneto Da Desesperança

De não poder viver sua esperança
Transformou-a em estĂĄtua e deu-lhe um nicho
Secreto, onde ao sabor do seu capricho
Fugisse a vĂȘ-la como uma criança.

TĂŁo cauteloso fez-se em seus cuidados
De nĂŁo mostrĂĄ-la ao mundo, que a queria
Que por zelo demais, ficaram um dia
Irremediavelmente separados.

Mas eram tais os seus ciĂșmes dela
TĂŁo grande a dor de nĂŁo poder vivĂȘ-la,
Que em desespero, resolveu-se: – Mato-a!

E foi assim que triste como um bicho
Uma noite subiu até o nicho
E abriu o coração diante da eståtua.

A Um Livro

No silĂȘncio de cinzas do meu Ser
Agita-se uma sombra de cipreste,
Sombra roubada ao livro que ando a ler,
A esse livro de mĂĄgoas que me deste.

Estranho livro que escreveste,
Artista da saudade e do sofrer!
Estranho livro aquele em que puseste
Tudo o que eu sinto, sem poder dizer!

Leio-o, e folheio, assim, toda a minh’alma!
O livro que me deste Ă© meu, e salma
As oraçÔes que choro e rio e canto!…

Poeta igual a mim, ai quem me dera
Dizer o que tu dizes!… Quem soubera
Velar a minha Dor desse teu manto!…

Otelo

Quem minha angĂșstia suportar, prefira
a morte, redentora, Ă  desventura
de nĂŁo poder, nas vascas da loucura,
distinguir a verdade da mentira.

Infrene dĂșvida, implacĂĄvel ira,
esta que me alucina e me tortura!
– Ter ciĂșmes da luz, formosa e pura,
do chĂŁo, da sombra e do ar que se respira!

Invejo a veste que te esconde! a espuma
que, beijando teu corpo, linha a linha,
toda do teu aroma se perfuma!

Amo! E o delĂ­rio desta dor mesquinha,
faz que eu deseje ser tu mesma, em suma,
para ter a certeza de que Ă©s minha!