Sonetos sobre Povos

32 resultados
Sonetos de povos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Trabalho E Luz I

Luz e trabalho, eis a divisa imensa
Da nova legiĂŁo de um mundo novo.
Das águias do porvir fecunde-se o ovo
No vigor do trabalho unido à crença.

D’árvore humanidade Ă  luz intensa
Do livre ensino brota o sĂŁo renovo
Rico de luz se nobilita o povo
Do trabalho na santa recompensa.

Trabalham para a luz almas, que alentam
O brilho do trabalho. Os benefĂ­cios
Da luz da educação a Deus contentam.

Trabalho e luz contra o furor dos vĂ­cios,
No trabalho e na luz que a paz sustentam,
GlĂłria ao Liceu de Artes e de OfĂ­cios.

Saudade

Aqui outrora retumbaram hinos;
Muito coche real nestas calçadas
E nestas praças, hoje abandonadas,
Rodou por entre os ouropĂ©is mais finos…

Arcos de flores, fachos purpurinos,
Trons festivais, bandeiras desfraldadas,
Girândolas, clarins, atropeladas
Legiões de povo, bimbalhar de sinos…

Tudo passou! Mas dessas arcarias
Negras, e desses torreões medonhos,
Alguém se assenta sobre as lájeas frias;

E em torno os olhos Ăşmidos, tristonhos,
Espraia, e chora, como Jeremias,
Sobre a JerusalĂ©m de tantos sonhos!…

Afrodite II

Cabelo errante e louro, a pedraria
Do olhar faiscando, o mármore luzindo
AlvirrĂłseo do peito, – nua e fria,
Ela Ă© a filha do mar, que vem sorrindo.

Embalaram-na as vagas, retinindo,
Ressoantes de pĂ©rolas, – sorria
Ao vĂŞ-la o golfo, se ela adormecia
Das grutas de âmbar no recesso infindo.

Vede-a: veio do abismo! Em roda, em pĂŞlo
Nas águas, cavalgando onda por onda
Todo o mar, surge um povo estranho e belo;

Vêm a saudá-la todos, revoando,
Golfinhos e tritões, em larga ronda,
Pelos retorsos bĂşzios assoprando.

Ă€ Revolta

A Cassiano CĂ©sar

O sĂ©culo Ă© de revolta — do alto transformismo,
De Darwin, de LittrĂ©, de Spencer, de Laffite —
Quem fala, quem dá leis é o rubro niilismo
Que traz como divisa a bala-dinamite!…

Se é força, se é preciso erguer-se um evangelho,
Mais reto, que instrua — estĂ©tico — mais novo
Esmaguem-se do trono os dogmas de um Velho
E lance-se outro sangue aos mĂşsculos do povo!…

O vício azinhavrado e os cérebros raquíticos,
É pô-los ao olhar dos sérios analíticos,
Na ampla, social e esplĂŞndida vitrine!…

Ă€ frente!… — Trabalhar a luz da idĂ©ia nova!…
— Pois bem! Seja a idĂ©ia, quem lance o vĂ­cio Ă  cova,
— Pois bem! — Seja a idĂ©ia, quem gere e quem fulmine!…

LXXXIII

Polir na guerra o bárbaro gentio,
Que as leis quase ignorou da natureza,
Romper de altos penhascos a rudeza,
Desentranhar o monte, abrir o rio;

Esta a virtude, a glória, o esforço, o brio
Do Russiano HerĂłi, esta a grandeza,
Que igualou de Alexandre a fortaleza,
Que venceu as desgraças de Dario:

Mas se a lei do heroĂ­smo se procura,
Se da virtude o espĂ­rito se atende,
Outra idéia, outra máxima o segura:

Lá vive, onde no ferro não se acende;
Vive na paz dos povos, na brandura:
VĂłs a ensinais, Ăł Rei; em vĂłs se aprende.

Tentara o Amor de Abril

Tentara o amor de Abril tornar mais duro,
Naquele mês de céu azul cortado
Pelas pandorgas cor do assombro, o brado
Que no meu peito armava o meu futuro;

Porque de novo, a procurar, procuro,
De bruços na janela, e debruçado
Por sobre as mágoas deste amor calado,
Nas portas tenebrosas, o ar mais puro.

Firmando para o Norte, o brando povo
Das andorinhas parte, e fervoroso
Consuma o seu destino. Eu tento armá-lo

No céu da alma, e durmo procurando
Essa firmeza no abandono, e calo,
Por pouco tempo embora o como e o quando.

Por Entre O Beberibe, E O Oceano

Por entre o Beberibe, e o Oceano
Em uma areia sáfia, e lagadiça
Jaz o Recife povoação mestiça,
Que o Belga edificou Ă­mpio tirano.

O Povo Ă© pouco, e muito pouco urbano,
Que vive à mercê de uma lingüiça,
Unha de velha insípida enfermiça,
E camarões de charco em todo o ano.

As damas cortesĂŁs, e por rasgadas
Olhas podridas, sĂŁo, e pestilĂŞncias,
Elas com purgações, nunca purgadas.

Mas a culpa tĂŞm vossas reverĂŞncias,
Pois as trazem rompidas, e escaladas
Com cordões, com bentinhos, e indulgências.

Prece A Anchieta

Santo: erguesses a cruz na selva escura;
HerĂłi: plantasses nossa velha aldeia;
Mestre: ensinasses a doutrina pura;
Poeta: escrevesses versos sobre a areia!

Golpeia a cruz a foice inculta e dura;
Invade a vila multidĂŁo alheia;
Morre a voz santa entre a distância e a altura;
Apaga o poema a onda espumejante e cheia…

Santo, herói, mestre e poeta: — Pela glória
que destes a esta Terra e a sua HistĂłria,
Pela dor que sofremos sempre nĂłs.

Pelo bem que quisesses a este povo,
O novo Cristo deste Mundo Novo,
Padre José de Anchieta, orai por nós!

Adagas Cujas JĂłias Velhas Galas

Adagas cujas jĂłias velhas galas…
Opalesci amar-me entre mĂŁos raras,
E fluido a febres entre um lembrar de aras,
O convĂ©s sem ninguĂ©m cheio de malas…

O Ă­ntimo silĂŞncio das opalas
Conduz orientes até jóias caras,
E o meu anseio vai nas rotas claras
De um grande sonho cheio de Ăłcio e salas…

Passa o cortejo imperial, e ao longe
O povo só pelo cessar das lanças
Sabe que passa o seu tirano, e estruge

Sua ovação, e erguem as crianças
Mas o teclado as tuas mĂŁos pararam
E indefinidamente repousaram…

Disputa em FamĂ­lia

I

Sai das nuvens, levanta a fronte e escuta
O que dizem teus filhos rebelados,
Velho Jeová de longa barba hirsuta,
Solitário em teus Céus acastelados:

« — Cessou o império enfim da força bruta!
NĂŁo sofreremos mais, emancipados,
O tirano, de mĂŁo tenaz e astuta,
Que mil anos nos trouxe arrebanhados!

Enquanto tu dormias impassĂ­vel,
Topámos no caminho a liberdade
Que nos sorriu com gesto indefinĂ­vel…

Já provámos os frutos da verdade…
Ă“ Deus grande, Ăł Deus forte, Ăł Deus terrĂ­vel.
NĂŁo passas d’uma vĂŁ banalidade! — »

II

Mas o velho tirano solitário,
De coração austero e endurecido,
Que um dia, de enjoado ou distraido,
Deixou matar seu filho no Calvário,

Sorriu com rir estranho, ouvindo o vário
Tumultuoso coro e alarido
Do povo insipiente, que, atrevido,
Erguia a voz em grita ao seu sacrário:

« — Vanitas vanitatum! (disse). É certo
Que o homem vão medita mil mudanças,
Sem achar mais do que erro e desacerto.

Muito antes de nascerem vossos pais
D’um barro vil,

Continue lendo…

O Teu Olhar

Passam no teu olhar nobres cortejos,
Frotas, pendões ao vento sobranceiros,
Lindos versos de antigos romanceiros,
CĂ©us do Oriente, em brasa, como beijos,

Mares onde nĂŁo cabem teus desejos;
Passam no teu olhar mundos inteiros,
Todo um povo de herĂłis e marinheiros,
Lanças nuas em rútilos lampejos;

Passam lendas e sonhos e milagres!
Passa a ĂŤndia, a visĂŁo do Infante em Sagres,
Em centelhas de crença e de certeza!

E ao sentir-te tĂŁo grande, ao ver-te assim,
Amor, julgo trazer dentro de mim
Um pedaço da terra portuguesa!

DantĂŁo

Parece-me que o vejo iluminado.
Erguendo delirante a grande fronte
– De um povo inteiro o fĂşlgido horizonte
Cheio de luz, de idéias constelado!

De seu crânio vulcĂŁo – a rubra lava
Foi que gerou essa sublime aurora
– Noventa e trĂŞs – e a levantou sonora
Na fronte audaz da populaça brava!

Olhando para a histĂłria – um sĂ©culo e a lente
Que mostra-me o seu crânio resplandente
Do passado atravĂ©s o vĂ©u profundo…

Há muito que tombou, mas inquebrável
De sua voz o eco formidável
Estruge ainda na razĂŁo do mundo!

Mancebos! De Mil Louros Triunfantes

Mancebos! De mil louros triunfantes
Adornai o Moisés da mocidade,
O Anjo que nos guia da verdade
Pelos doces caminhos sempre ovantes.

Coroai de grinaldas verdejantes
Quem rompeu para a Pátria nova idade,
Guiando pelas leis sĂŁs da amizade
Os moços do progresso sempre amantes.

VĂŞ, Brasil, este filho que o teu nome
Sobre o mapa dos povos ilustrados
Descreve qual o forte de VendĂ´me.

Conhece que os Andradas e os Machados,
Que inda vivem nas asas do renome
Não morrem nestes céus abençoados;

Já Foste Rico e Forte e Soberano

Já foste rico e forte e soberano,
Já deste leis a mundos e nações,
Heróico Portugal, que o gram Camões
Cantou, como o nĂŁo pĂ´de um ser humano!

Zombando do furor do mar insano,
Os teus nautas, em fracos galeões,
Descobriram longínquas regiões,
Perdidas na amplidĂŁo do vasto oceano.

Hoje vejo-te triste e abatido,
E quem sabe se choras, ou entĂŁo,
Relembras com saudade o tempo ido?

Mas a queda fatal nĂŁo temas, nĂŁo.
Porque o teu povo, outrora tĂŁo temido,
Ainda tem ardor no coração.

Um Dia Guttemberg

Um dia Guttemberg c’o a alma aos cĂ©us suspensa,
Pegou do escopro ingente e pĂ´s-se a trabalhar!
E fez do velho mundo um rútilo alcançar
Ao mágico clangor de sua idéia imensa!

Rolou por todo o globo a luz da sacra imprensa!
Ruiu o despotismo no pĂł, a esbravejar…
Uniram-se n’um lago, o cĂ©u, a terra, o mar…
Rasgou-se o manto atroz da horrĂ­vel treva densa!…

Ergueram-se mil povos ao som das melopéias,
Das grandes cavatinas olĂ­mpicas da arte!
Raiou o novo sol das fĂşlgidas idĂ©ias!…

Porém, quem lance luz maior por toda a parte
És tu, sublime atriz, ó misto de epopéias
Que sabes no tablado subir, endeusar-te!…

Campesinas III

As papoulas da saĂşde
Trouxeram-te um ar mais novo,
Ă“ bela filha do povo,
Rosa aberta de virtude.

Do campo viçoso e rude
Regressas, como um renovo,
E eu ao ver-te, os olhos movo
De um modo que nunca pude.

Bravo ao campo e bravo a seara
Que deram-te a pele clara
SĂŁo rubores de alvorada.

Que esses teus beijos agora
Tenham sabores de amora
E de romĂŁ estalada.

Rompeu-Se O Denso VĂ©u Do Atroz Marasmo

Rompeu-se o denso véu do atroz marasmo
E como por fatal, negro hebetismo
De antro sepulcral, de fundo abismo
O povo ressurgiu com entusiasmo!

O Zoilo mazorral se queda pasmo
Supõe quimera ser, ser cataclismo
Roga, já por dobrez, por ceticismo
De néscio, vil truão solta o sarcasmo.

PerdĂŁo, Filho da Luz, minh’alma exora,
Porém, a pátria diz, somente agora
Os grilhões biparti de atroz moleza!

E ele, o nosso herói já redivivo
De pé, sem se curvar, sereno, altivo
Co’as raias do porvir mede a grandeza!

3A Sombra – Ester

Vem! no teu peito cálido e brilhante
O nardo oriental melhor transpira!
Enrola-te na longa cachemira,
Como as judias moles do Levante,

Alva a clâmide aos ventos – roçagante…
TĂşmido o lábio, onde o saltĂ©rio gira…
Ă“ musa de Israel! pega da lira…
Canta os martĂ­rios de teu povo errante!

Mas nĂŁo… brisa da pátria alĂ©m revoa,
E ao delamber-lhe o braço de alabastro,
Falou-lhe de partir… e parte… e voa. . .

Qual nas algas marinhas desce um astro…
Linda Ester! teu perfil se esvai… s’escoa…
SĂł me resta um perfume… um canto… um rastro…

Lusitânia Querida

Lusitânia querida! Se não choro
Vendo assim lacerado o teu terreno,
NĂŁo Ă© de ingrata filha o dĂł pequeno;
Rebeldes julgo os ais, se te deploro.

Admiro de teus danos o decoro.
Bebeu SĂłcrates firme seu veneno;
E em qualquer parte do perigo o aceno
Encontra e cresce o teu valor, que adoro.

Mais que a vitĂłria vale um sofrer belo;
E assaz te vingas de opressões fatais,
Se arrasada te vĂŞs, sem percebĂŞ-lo.

Povos! a independência que abraçais
Aplaude, alegre, o estrago, e grita ao vĂŞ-lo:
“RuĂ­na sim, mas servidĂŁo jamais!”

A Gonçalves Dias

Celebraste o domĂ­nio soberano
Das grandes tribos, o tropel fremente
Da guerra bruta, o entrechocar insano
Dos tacapes vibrados rijamente,

O maracá e as flechas, o estridente
Troar da inĂşbia, e o canitar indiano…
E, eternizando o povo americano,
Vives eterno em teu poema ingente.

Estes revoltos, largos rios, estas
Zonas fecundas, estas seculares
Verdejantes e amplĂ­ssimas florestas

Guardam teu nome: e a lira que pulsaste
Inda se escuta, a derramar nos ares
O estridor das batalhas que contaste.