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Textos de autores conhecidos para ler e compartilhar. Os melhores textos estão em Poetris.

O Humor é um Indicador do Equilíbrio

O humor surge quando a razão não está em perfeito equilíbrio com as coisas e, das duas uma, ou luta por dominá-las sem o conseguir – caso em que se fala do «mau humor» -, ou se deixa dominar até certo ponto por elas, não se importando, salvo honore, de entrar no jogo – caso em que estamos perante o chamado «bom humor». Um bom símbolo para estas vicissitudes da razão seria um pai que condescende em brincar com os filhos e que acaba por ter mais prazer com a brincadeira do que aquele que lhes proporciona.

Escuta, Amor

Quando damos as mãos, somos um barco feito de oceano, a agitar-se sobre as ondas, mas ancorado ao oceano pelo próprio oceano. Pode estar toda a espécie de tempo, o céu pode estar limpo, verão e vozes de crianças, o céu pode segurar nuvens e chumbo, nevoeiro ou madrugada, pode ser de noite, mas, sempre que damos as mãos, transformamo-nos na mesma matéria do mundo. Se preferires uma imagem da terra, somos árvores velhas, os ramos a crescerem muito lentamente, a madeira viva, a seiva. Para as árvores, a terra faz todo o sentido. De certeza que as árvores acreditam que são feitas de terra.

Por isto e por mais do que isto, tu estás aí e eu, aqui, também estou aí. Existimos no mesmo sítio sem esforço. Aquilo que somos mistura-se. Os nossos corpos só podem ser vistos pelos nossos olhos. Os outros olham para os nossos corpos com a mesma falta de verdade com que os espelhos nos reflectem. Tu és aquilo que sei sobre a ternura. Tu és tudo aquilo que sei. Mesmo quando não estavas lá, mesmo quando eu não estava lá, aprendíamos o suficiente para o instante em que nos encontrámos.

Aquilo que existe dentro de mim e dentro de ti,

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O Caminho de um Criador

Creio que tem havido sempre na nossa terra uma descabida preocupação canónica à ilharga de cada artista. Interessa mais ao zelo nacional averiguar se um poeta morreu sacramentado, do que ler os seus versos. Ninguém quer saber se o caminho de um criador o leva à morada das musas e da beleza; espreita-se da janela, mas é para ver se ele vai à missa. Ora isto é de analfabetos, de pessoas que verdadeiramente não sabem nem querem saber do valor de um poema, do mundo de liberdade e de independência que ele encerra. E uma gente assim não me convém, nem tão-pouco o Deus intolerante que servem. Por isso me vou divertindo com as minhas divindades naturais, luciferinamente, certo de que o diabo é ainda uma grande companhia. Foi a ele que Jesus disse que o seu reino não era deste mundo. E o meu, precisamente, é.

A Leitura não Deve Substituir o Pensamento

Enquanto a leitura for para nós a iniciadora cujas chaves mágicas nos abrem no fundo de nós próprios a porta das habitações onde não teríamos conseguido penetrar, o papel dela na nossa vida será salutar. É perigoso ao invés quando, em vez de nos despertar para a vida pessoal do espírito, a leitura tende a substituí-la, quando a verdade deixa de nos surgir como um ideal que só podemos realizar através do progresso íntimo do nosso pensamento e do esforço do nosso coração, mas como uma coisa material, depositada eritre as folhas dos livros como um mel preparado pelos outros e que só temos de nos dar ao trabalho de alcançar nas prateleiras das estantes e de saborear em seguida passivamente num perfeito repouso de corpo e de espírito.

O Verdadeiro Filósofo

Se a ideia de Deus não é conhecida na natureza, deve portanto tratar-se de uma invenção humana… Mas não me olheis como se eu não tivesse sãos princípios e não fosse um fiel servidor do meu rei. Um verdadeiro filósofo não pretende de modo algum subverter a ordem natural das coisas. Aceita-a. Só pretende que o deixem cultivar os pensamentos que consolam uma alma forte. Para os outros, é uma sorte que existam papas e bispos para reter as multidões da revolta e do crime. A ordem do Estado exige uma uniformidade do comportamento, a religião é necessária ao povo e o sábio deve sacrificar parte da sua independência para que a sociedade se mantenha firme.

A Chave do Desejo

Todos os desejos são contraditórios como o do alimento. Gostaria que aquele que amo me amasse. Mas se ele me for totalmente dedicado, deixa de existir, e eu deixo de o amar. E enquanto não me for totalmente dedicado, não me amará o suficiente. Fome e saciedade.
O desejo é mau e ilusório, mas, no entanto, sem o desejo não esquadrinharíamos o verdadeiro absoluto, o verdadeiro ilimitado. É preciso ter passado por isto. Infelizes os seres a quem o cansaço subtrai esta energia suplementar que é a fonte do desejo.
Infeliz, também, aquele a quem o desejo cega.
É preciso arrastar o desejo até ao eixo dos pólos.

O Artista é Maior que Deus

Como é bom escrever ao apelo incerto do que nos faz sinais. Como é fascinante escrever para saber o que é. Indeciso apelo, motivo que o não é, até se saber o que é. Trazê-lo à vida da sua nebulosa, captá-la na errância de uma inquieta procura. Obedecer ao impulso que sobe em nós em energia e movimentação, na necessidade de o realizar e ele coalhar em escrita, no irreal da sua realização. Estremecer ao aviso, persegui-lo até onde não sabemos o seu tudo, depois da surpresa do que lá estava.
Escrever é não saber para saber. Mas o que se sabe é frágil e há que procurá-lo até à eternidade. Porque o que se encontra é ainda a procura, o além de todo o aquém. E é porque nunca se encontra, que a arte continua. Assim o artista é maior do que Deus. Porque ele já tinha criado, antes de criar, e assim não teve surpresas. E quem escreve só no infinito realiza a sua criação e só aí as não terá.

Aprender a Morrer para Saber Viver

Diz Cícero que filosofar não é outra coisa senão preparar-se para a morte. Isso porque de certa forma o estudo e a contemplação retiram a nossa alma para fora de nós e ocupam-na longe do corpo, o que é um certo aprendizado e representação da morte; ou então porque toda a sabedoria e discernimento do mundo se resolvem por fim no ponto de nos ensinarem a não termos medo de morrer. Na verdade, ou a razão se abstém ou ela deve visar apenas o nosso contentamento, e todo o seu trabalho deve ter como objectivo, em suma, fazer-nos viver bem e ao nosso gosto, como dizem as Santas Escrituras. Todas as opiniões do mundo coincidem em que o prazer é a nossa meta, embora adoptem meios diferentes para isso; de outra forma as rejeitaríamos logo de início, pois quem escutaria alguém que estabelecesse como fim o nosso penar e descontentamento?

A Cura pelo Tédio

Sempre que fores atingido pelo tédio, deixa-te ser esmagado por este; submerge, bate no fundo. Em geral, com as coisas desagradáveis, a regra é: quanto mais cedo bateres no fundo, mais rápido voltas à tona. A ideia aqui é teres logo uma visão completa do pior. A razão pela qual o tédio merece tal escrutínio é que este representa tempo puro não diluído, de uma forma repetitiva, redundante e monótona.

O tédio é a tua janela para as propriedades do tempo, que tendemos a ignorar, necessário ao nosso equilíbrio mental. É a tua janela para o infinito. Uma vez que esta janela se abra, não a tentes fechar. Pelo contrário, abre-a completamente.

O tédio fala a linguagem do tempo, e ensina-te a mais importante lição da tua vida – a lição da tua total insignificância. E por isso é valioso, assim como para aqueles com quem esfregas os teus ombros. «Tu és finito», diz-te o tempo com uma voz de tédio, «e qualquer coisa que faças é, do meu ponto de vista, fútil». Como música para os teus ouvidos, claro, não deve contar; contudo, o sentimento de inutilidade, da importância limitada mesmo das tuas melhores, mais ardentes acções,

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Só o Dinheiro é o Bem Absoluto

Numa espécie tão carente e constituída de necessidades como a humana, não é de admirar que a riqueza, mais do que qualquer outra coisa, seja tão estimada e com tanta sinceridade, chegando a ser venerada; e mesmo o poder é apenas um meio para chegar a ela. Assim, não é surpreendente que, objectivando a aquisição, todo o resto seja colocado de lado ou atirado para um canto. Por exemplo, a filosofia pelos professores de filosofia.
Os homens são amiúde repreendidos porque os seus desejos são direccionados sobretudo para o dinheiro e eles amam-no acima de tudo. Todavia, é natural, e até mesmo inevitável, amar aquilo que, como um Proteu infatigável, está pronto em qualquer instante para se converter no objecto momentâneo dos nossos desejos e das nossas necessidades múltiplas. De facto, qualquer outro bem só pode satisfazer a um desejo, a uma necessidade: os alimentos são bons apenas para os famintos; o vinho, para os de boa saúde; os medicamentos, para os doentes; uma peliça, para o inverno; as mulheres, para os jovens, etc. Todos eles, por conseguinte, são meramente bons para algo, ou seja, apenas relativamente bons. .

Arthur Schopenhauer, in ‘Aforismos para a Sabedoria de Vida’

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A Supressão dos Desejos

Nenhuma das coisas que se admiram e se buscam com zelo é útil aos que as obtiveram; mas quando ainda não se as têm, imagina-se que, se acontecerem, todos os bens estarão presentes com elas; e, quando estão diante de nós, sentimos a mesma febre, a mesma agitação e aborrecimento, o mesmo desejo pelas coisas que não temos. Pois não é saciando-se com as coisas desejadas que se prepara a liberdade, é pela supressão dos desejos.

A Diplomacia é um Exercício de Grande Violência Interior

Há momentos em que somos obrigados a conviver com pessoas de natureza tão distinta da nossa que bastam cinco minutos de contacto para percebermos que, cedo ou tarde, os diques que sustêm a hostilidade latente acabarão por ceder e quanto mais pressão pusermos sobre eles maior será a catástrofe. A questão que nos colocamos é a de saber se o ideal é passar de imediato para a fase de conflito declarado ou aguardar diplomaticamente que, como dizem alguns entendidos nas matérias, as coisas sigam ao seu ritmo, na vã esperança de que uma relação franca e honesta, ainda que difícil, seja possível. A diplomacia, sabe quem já esteve na guerra, é um exercício de grande violência interior.

Tempo e Experiência

A noção de experiência é complexa. Todo o espaço é de vidro – um vidro que não parte por fora mas parte por dentro. Estamos sempre a esbarrar com invisíveis barreiras. O que ele revela não é precisamente o que queremos saber. E se tivermos os olhos abertos até ao fim: vemos o quê? Como o espaço, o tempo não revela nada de especial. Só percursos. Folhas de uma agenda descartável. A curva da vida de que fala Homero revela que a nossa existência é uma rápida passagem pelo mundo em efeito Doppler.

Sonhar é Preciso

Sem sonhos, as pedras do caminho tornam-se montanhas, os pequenos problemas são insuperáveis, as perdas são insuportáveis, as decepções transformam-se em golpes fatais e os desafios em fonte de medo.
Voltaire disse que os sonhos e a esperança nos foram dados como compensação às dificuldades da vida. Mas precisamos de compreender que os sonhos não são desejos superficiais. Os sonhos são bússolas do coração, são projectos de vida. Os desejos não suportam o calor das dificuldades. Os sonhos resistem às mais altas temperaturas dos problemas. Renovam a esperança quando o mundo desaba sobre nós.

John F. Kennedy disse que precisamos de seres humanos que sonhem o que nunca foram. Tem fundamento o seu pensamento, pois os sonhos abrem as janelas da mente, arejam a emoção e produzem um agradável romance com a vida.
Quem não vive um romance com a sua vida será um miserável no território da emoção, ainda que habite em mansões, tenha carros luxuosos, viaje em primeira classe nos aviões e seja aplaudido pelo mundo.

Precisamos de perseguir os nossos mais belos sonhos. Desistir é uma palavra que tem de ser eliminada do dicionário de quem sonha e deseja conquistar, ainda que nem todas as metas sejam atingidas.

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Não Há Amor como o Primeiro

Não há amor como o primeiro. Mais tarde, quando se deixa de crescer, há o equivalente adulto ao primeiro amor — é o primeiro casamento; mas não é igual. O primeiro amor é uma chapada, um sacudir das raízes adormecidas dos cabelos, uma voragem que nos come as entranhas e não nos explica. Electrifica-nos a capacidade de poder amar. Ardem-nos as órbitas dos olhos, do impensável calor de podermos ser amados. Atiramo-nos ao nosso primeiro amor sem pensar onde vamos cair ou de onde saltámos. Saltamos e caímos. Enchemos o peito de ar, seguramos as narinas com os dedos a fazer de mola de roupa, juramos fazer três ou quatro mortais de costas, e estatelamo-nos na água ou no chão, como patos disparados de um obus, com penas a esvoaçar por toda a parte.

Há amores melhores, mas são amores cansados, amores que já levaram na cabeça, amores que sabem dizer “Alto-e-pára-o-baile”, amores que já dão o desconto, amores que já têm medo de se magoarem, amores democráticos, que se discutem e debatem. E todos os amores dão maior prazer que o primeiro. O primeiro amor está para além das categorias normais da dor e do prazer. Não faz sentido sequer.

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Os homens preferiram as trevas à luz porque as suas acções eram más

Os homens preferiram as trevas à luz porque as suas acções eram más.