Passagens sobre Tontos

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Energia atrai energia. Se és tonto atrais pessoas tontas; se és afetuoso atrais pessoas afetuosas; e se tens medo atrais mais motivos para continuares a tê-lo.

Soneto 434 A Néstor Perlongher

Na frente esteve e está, depois ou antes.
Poeta já portento de portenho,
em Néstor o barroco ganha engenho
e os verbos reverberam mais brilhantes.

Da Frente mítico entre os militantes,
aqui tem maior campo seu empenho.
Da causa negra um dado a depor tenho:
tratou mais que os tratados dos tratantes.

Aos putos imputou novo valor.
Da língua tinha humor sempre na ponta.
Das classes, luta e amor, é professor.

Mediu o que a estatística não conta.
Territorializou do corpo a cor.
Deu tom de santa a tanta tinta tonta!

Eu Sou Nostálgica Demais

De súbito a estranheza. Estranho-me como se uma câmera de cinema estivesse filmando meus passos e parasse de súbito, deixando-me imóvel no meio de um gesto: presa em flagrante. Eu? Eu sou aquela que sou eu? Mas isto é um doido faltar de sentido! Parte de mim é mecânica e automática — é neurovegetativa, é o equilíbrio entre não querer e o querer, do não poder e de poder, tudo isso deslizando em plena rotina do mecanicismo. A câmera fotográfica singularizou o instante. E eis que automaticamente saí de mim para me captar tonta de meu enigma, diante de mim, que é insólito e estarrecedor por ser extremamente verdadeiro, profundamente vida nua amalgamada na minha identidade. E esse encontro da vida com a minha identidade forma um minúsculo diamante inquebrável e radioso indivisível, um único átomo e eu toda sinto o corpo dormente como quando se fica muito tempo na mesma posição e a perna de repente fica «esquecida».
Eu sou nostálgica demais, pareço ter perdido uma coisa não se sabe onde e quando.

Tempestade Amazônica

O calor asfixia e o ar escurece. O rio,
Quieto, não tem uma onda. Os insetos na mata
Zumbem tontos de medo. E o pássaro, o sombrio
Da floresta procura, onde a chuva não bata.

Súbito, o raio estala. O vento zune. Um frio
De terror tudo invade… E o temporal desata
As peias pelo espaço e, bufando, bravio,
O arvoredo retorce e as folhas arrebata.

O anoso buriti curva a copa, e farfalha.
Aves rodam no céu, num estéril esforço,
Entre nuvens de folha e fragmentos de palha.

No alto o trovão repousa e em baixo a mata brama.
Ruge em meio a amplidão. Das nuvens pelo dorso
Correm serpes de fogo. E a chuva se derrama…

Amor que morre

O nosso amor morreu… Quem o diria!
Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta,
Ceguinha de te ver, sem ver a conta
Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria…
E outro clarão, ao longe, já desponta!
Um engano que morre… e logo aponta
A luz doutra miragem fugidia…

Eu bem sei, meu Amor, que pra viver
São precisos amores, pra morrer,
E são precisos sonhos para partir.

E bem sei, meu Amor, que era preciso
Fazer do amor que parte o claro riso
De outro amor impossível que há-de vir!

Quando nos Apaixonamos

Quando nos apaixonamos, ou estamos prestes a apaixonar-nos, qualquer coisinha que essa pessoa faz – se nos toca na mão ou diz que foi bom ver-nos, sem nós sabermos sequer se é verdade ou se quer dizer alguma coisa — ela levanta-nos pela alma e põe-nos a cabeça a voar, tonta de tão feliz e feliz de tão tonta. E, logo no momento seguinte, larga-nos a mão, vira a cara e espezinha-nos o coração, matando a vida e o mundo e o mundo e a vida que tínhamos imaginado para os dois. Lembro-me, quando comecei a apaixonar-me pela Maria João, da exaltação e do desespero que traziam essas importantíssimas banalidades. Lembro-me porque ainda agora as senti. Não faz sentido dizer que estou apaixonado por ela há quinze anos. Ou ontem. Ainda estou a apaixonar-me.

Gosto mais de estar com ela a fazer as coisas mais chatas do mundo do que estar sozinho ou com qualquer outra pessoa a fazer as coisas mais divertidas. As coisas continuam a ser chatas mas é estar com ela que é divertido. Não importa onde se está ou o que se está a fazer. O que importa é estar com ela. O amor nunca fica resolvido nem se alcança.

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A Cigarra Que Ficou

Depois de ouvir por tanto tempo, a fio,
As cigarras, bem perto ou nas distâncias,
Só me ficou no coração vazio
A saudade de antigas ressonâncias…

Todas se foram… bando fugidio
Em busca do calor de outras estâncias,
Carregando nas asas como um rio
Leva nas águas – seus desejos e ânsias…

E ainda cantaram na hora da partida:
Era um clamor dentro da madrugada…
Essa, entretanto, desgarrou daquelas,

E entrou, tonta de luz, na minha vida,
Porque sabia que era a mais amada,
E cantava melhor que todas elas…

Ninguém Tem Pena das Pessoas Felizes

Ninguém tem pena das pessoas felizes. Os Portugueses adoram ter angústias, inseguranças, dúvidas existenciais dilacerantes, porque é isso que funciona na nossa sociedade. As pessoas com problemas são sempre mais interessantes. Nós, os tontos, não temos interesse nenhum porque somos felizes. Somos felizes, somos tontaços, não podemos ter graça nem salvação. Muitos felizardos (a própria palavra tem um soar repelente, rimador de «javardo») vêem-se obrigados a fingir a dor que deveras não sentem, só para poderem «brincar» com os outros meninos.
É assim. Chega um infeliz ao pé de nós e diz que não sabe se há-de ir beber uma cerveja ou matar-se. E pergunta, depois de ter feito o inventário das tristezas das últimas 24 horas: «E tu? Sempre bem disposto, não?». O que é que se pode responder? Apetece mentir e dizer que nos morreu uma avó, que nos atraiçoou uma namorada, que nos atropelaram a cadelinha ali na estrada de Sines.
E, no entanto, as pessoas felizes também sofrem muito. Sofrem, sobretudo, de «culpa». Se elas estão felizes, rodeadas de pessoas tristes, é lógico que pensem que há ali qualquer coisa que não bate certo. As infelizes acusam sempre os felizes de terem a culpa.

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Plangência Da Tarde

Quando do campo as prófugas ovelhas
Voltam a tarde, lépidas, balando
Com elas o pastor volta cantando
E fulge o ocaso em convulsões vermelhas.

Nos beirados das casas, sobre as telhas
Das andorinhas esvoaça o bando…
E o mar, tranqüilo, fica cintilando
Do sol que morre as últimas centelhas.

O azul dos montes vago na distância…
No bosque, no ar, a cândida fragrância
Dos aromas vitais que a tarde exala.

Às vezes, longe, solta, na esplanada,
A ovelha errante, tonta e desgarrada,
Perdida e triste pelos ermos bala …

Falo de Ti às Pedras das Estradas

Falo de ti às pedras das estradas,
E ao sol que e louro como o teu olhar,
Falo ao rio, que desdobra a faiscar,
Vestidos de princesas e de fadas;

Falo às gaivotas de asas desdobradas,
Lembrando lenços brancos a acenar,
E aos mastros que apunhalam o luar
Na solidão das noites consteladas;

Digo os anseios, os sonhos, os desejos
Donde a tua alma, tonta de vitória,
Levanta ao céu a torre dos meus beijos!

E os meus gritos de amor, cruzando o espaço,
Sobre os brocados fúlgidos da glória,
São astros que me tombam do regaço!

Te Quero

Pássaro perdido em raaresia, te quero,
com teus seios de nêsperas e teu colo de safira.
Assim prenhe de rosas, te quero,
assim estranha e múltipla, não consentida,
assim tranqüila, dispersa em sonho,
fantástica e só.

E mais que por isso te quero,
ave de asa tonta,
corpo e forma do meu canto.

Boneca da infância esquecida,
eis que te quero.

Escrava

Ó meu Deus, ó meu dono, ó meu senhor,
Eu te saúdo, olhar do meu olhar,
Fala da minha boca a palpitar,
Gesto das minhas mãos tontas de amor!

Que te seja propício o astro e a flor,
Que a teus pés se incline a Terra e o Mar,
Plos séculos dos séculos sem par,
Ó meu Deus, ó meu dono, ó meu senhor!

Eu, doce e humilde escrava, te saúdo,
E, de mãos postas, em sentida prece,
Canto teus olhos de oiro e de veludo.

Ah! esse verso imenso de ansiedade,
Esse verso de amor que te fizesse
Ser eterno por toda a eternidade!…

Os sábios falam porque têm algo a dizer. Os tontos falam porque precisam dizer algo.

Conta a Lenda que Dormia

Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.

Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.

A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.

Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.

Mas cada um cumpre o Destino —
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.

E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera,
A cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.

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Dormindo

De qual de vós desceu para o exílio do mundo
A alma desta mulher, astros do céu profundo?
Dorme talvez agora… Alvíssimas, serenas,
Cruzam-se numa prece as suas mãos pequenas.
Para a respiração suavíssima lhe ouvir,
A noite se debruça… E, a oscilar e a fulgir,
Brande o gládio de luz, que a escuridão recorta,
Um arcanjo, de pé, guardando a sua porta.
Versos! podeis voar em torno desse leito,
E pairar sobre o alvor virginal de seu peito,
Aves, tontas de luz, sobre um fresco pomar…
Dorme… Rimas febris, podeis febris voar…
Como ela, num livor de névoas misteriosas,
Dorme o céu, campo azul semeado de rosas;
E dois anjos do céu, alvos e pequeninos,
Vêm dormir nos dois céus dos seus olhos divinos…
Dorme… Estrelas, velai, inundando-a de luz!
Caravana, que Deus pelo espaço conduz!
Todo o vosso dano nesta pequena alcova
Sobre ela, como um nimbo esplêndido, se mova:
E, a sorrir e a sonhar, sua leve cabeça
Como a da Virgem Mie repouse e resplandeça!

Imaginamos muitas vezes que a beleza é sinónimo do bem. Uma mulher bela diz coisas estúpidas e nós acreditamos que são coisas inteligentes. Comporta-se como uma tonta e só reparamos no seu feitiço.

Soneto A Oxford

Ó Oxford, prende o sol em tuas pontas
Góticas; dormem divinas harmonias
Em tuas torres puras e sombrias
E em teus jardns de grandes flores tontas.

O eterno farfalhar de Christ Church Meadows
E as mesmas águas trêmulas dos Ices
Enchem meu coração da antiga fé
Dos bardos que ilustraram tuas classes.

Rebanhos de hoje e sempre; hoje meninos
De capa preta, que o pastor dos sinos
Tange dos sinos que me estão chamando

Aos claustros de presságio e na penumbra
Sobre os quais, pela noite, se vislumbra
O fantasma de Magdalen, perscrutando…

Uma Direcção, e Não Soluções

A diferença entre solução e direcção é esta: a solução é sempre um remédio passageiro para disfarçar a desgraça. Ao passo que a direcção é a própria dignidade posta nas mãos do desgraçado para que deixe de o ser, e a direcção única é a garantia perpétua dessa dignidade. E foi o que fez Goethe: Descobriu a direcção única. Artista, na verdadeira acepção da palavra; Artista é aquele que precede a própria ciência. Por isso Goethe afastou-se de quantas realidades irrealizáveis onde costumam habitar instaladas as gentes. E impassível, desde cima, assistiu ao desenrolar da tragédia. E viu o mundo inteiro por cima de todas as cabeças, e viu a Europa toda e com cada um dos seus pedaços, e viu cada indivíduo da Humanidade como um pequenino astro tonto que nem sabe sequer ir na parábola da sua própria trajectória, e viu que de todos os seres deste mundo o único que errava o seu fim era o Homem, o dono da Terra! E viu que era na Humanidade que estavam os únicos seres deste mundo que não cumpriam com o seu próprio destino, e finalmente viu! Viu com os seus próprios olhos o que ninguém tinha visto antes dele.

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É muito fácil viver fazendo-se de tonto. Se o tivesse sabido antes, ter-me-ia declarado idiota desde a minha juventude, e poderia ser que, por esta altura, até fosse mais inteligente. Porém, quis ter engenho demasiado depressa, e eis-me aqui agora, feito um imbecil.